Jurista critica tratamento a servidores em processos disciplinares

Aos funcionários são negados direitos que a Justiça não recusa a homicidas ou narcotraficantes

07/03/2019 às 19:17
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Funcionários experimentam tortura psicológica ao nível das piores ditaduras. Muitos, acometidos de doenças psicossomáticas, perecem no caminho; outros, invadidos pela depressão, buscam a a solução extrema do suicídio.

Autor de mais de 40 livros sobre responsabilidade de agentes públicos, Léo da Silva Alves tem questionado inclusive no espaço internacional a forma como são tratados os servidores públicos federais quando supostamente incidem em ilícitos administrativos. Os chamados processos disciplinares são classificados como “farsas jurídicas” pelo professor de Direito, que vê nesse modelo desperdício de recursos públicos, falta de solução para o problema central e situações que ferem as garantias dos acusados, levando muitos deles ao desespero do suicídio, às doenças oportunistas ou, no mínimo, ao completo desestímulo pela carreira.

Ninguém discute que é preciso enfrentar a corrupção em todos os níveis e garantir a regularidade dos serviços públicos, diz o professor, mas essa ação de controle deve ser feita com técnica, obedecendo aos princípios constitucionais da eficiência e da legalidade; no entanto – argui – a Administração insiste com um modelo antiquado, de forma que o servidor, ao ser acusado, já tem a condenação escrita nas entrelinhas.

Prerrogativas da advocacia – como acesso aos autos, o direito de manifestação e o direito de ver as razões consideradas – são frequentemente tratadas com desprezo nos balcões da burocracia. Teses sustentadas com esmero resultam ignoradas sem a devida motivação; ou os arrazoados para desconstituí-las são desprovidos de mínimo agasalho nos fundamentos da ciência, reclama o professor, que tem o maior número de publicações sobre o tema e é conferencista com atuação na América do Sul, Europa e África. Ele aponta, por exemplo, caso de um funcionário das mais relevantes carreiras de Estado que foi demitido sem que contra ele houvesse qualquer prova nos autos. Mas a conclusão da administração foi que o fato de não haver provas não significava que o servidor não era culpado.

Inexistência de provas e provas obtidas por meios ilícitos são recorrentes nas ações disciplinares intentadas pela administração federal. E Léo da Silva Alves é categórico: não há, no espaço administrativo, possibilidade real de reconhecimento do arbítrio. Diz-se, em relação a uma corregedoria federal, por exemplo, que quem advoga perante ela está apto a atuar em qualquer tribunal de exceção do mundo. Isso porque os processos ali instaurados seguem como trens desgovernados, cuja maior probabilidade é produzir desgraças. O que acontece, explica, é que a corrupção escancarada, associada às negociações espúrias entre governo e parlamento, campeia em grandes espaços da vida nacional; em contraponto, aos servidores são debitados os males nacionais. Todo semestre, com lustre nas palavras, o órgão controlador da União apresenta relatório com o número de cabeças decepadas ao longo do período. Sob o rótulo de corruptos demitidos, estão muitos funcionários dignos, pessoas com a vida dedicada ao serviço público, que, por uma fatalidade da burocracia ou por ações de narcisistas destrutivos, acabam esmagadas pelo rolo compressor do sistema, conclui o jurista.

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Sobre o autor
Léo da Silva Alves

Jurista, autor de 58 livros. Advogado especializado em responsabilidade de agentes públicos e responsabilidades de pessoas físicas e jurídicas. Atuação em Tribunais de Contas, Tribunais Superiores e inquéritos perante a Polícia Federal. Preside grupo internacional de juristas, com trabalhos científicos na América do Sul, Europa e África. É professor convidado junto a Escolas de Governo, Escolas de Magistratura e Academias de Polícia em 21 Estados.

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