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Certidão sobre vigência de leis

13/11/2005 às 00:00
Leia nesta página:

Parecer sobre pedido de certidão, feito por servidores públicos, que emita opinião sobre a vigência ou não de leis municipais.

PARECER.

            As funcionárias públicas municipais, em exercício na Prefeitura Municipal, apresentaram à Presidência da Câmara Municipal requerimento pedindo informações, através de certidão, sobre a vigência de diversas leis municipais vinculadas ao regime jurídico. A petição solicita que a Câmara informe, simplesmente, se estão em vigor até a presente data as leis precitadas.

            Não houve qualquer justificação ou esclarecimento sobre o motivo do pedido

            Este o relatório.


Normas legais.

            Preliminarmente se deve afirmar, que a obtenção de certidão em repartições públicas é um dos direitos individuais assegurados pela Constituição da República, em seu art. 5°, inc.XXXIV, letra "b", que estabelece expressamente que:

            "Art. 5°. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade, nos seguintes termos:

             ...................................................................................

            XXXIV – são a todos assegurados, independente do pagamento de taxas:

            a)... ...........................................................................

            b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimentos de situações de interesse pessoal".

            A Lei Orgânica local estatui, em um dos seus dispositivos, que:

            Art... A Prefeitura e a Câmara são obrigadas fornecer a qualquer interessado, no prazo de 15 (quinze) dias, certidões dos atos, contratos e decisões (g.n.) desde que requeridas para fim de direito determinado sob pena de responsabilidade da autoridade ou servidor que negar ou retardar a sua expedição. No mesmo prazo deverão atender as requisições judiciais se outro não for fixado pelo juiz."

            Pelas normas legais citada, o interessado fica subordinado a obediência das condições impostas para o fornecimento de certidões. Deve no pedido vir esclarecido quais os direitos a serem defendidos ou quais as situações de interesse pessoal que precisam ser esclarecidas. Sem atendimento a estes requisitos constitucionais, fica a autoridade competente impedida e impossibilitada de fornecer certidões de qualquer natureza.

            A certidão é um documento lavrado pela Administração Pública a pedido do interessado, atestando tudo o que conste de seus registros e arquivos e deve sempre observar os ditames constitucionais.

            A jurisprudência tem se manifestado amplamente para bem situar o direito à certidão, ensina o mestre Pinto Ferreira, em seus Comentários à Constituição Brasileira (1° vol.p.140). Acentua o eminente constitucionalista que deve o requerente referir o objetivo concreto da certidão pretendida e assinala, citando a RT., 135.208, que "a simples alegação de que a certidão se destina a fins de direito, sem assinalar a finalidade específica a que se destina, autoriza a recusa da certidão pelo Poder Público"

            Além do atendimento as exigências do preceito constitucional, impõem-se o interesse legítimo da parte, do contrário o pedido de certidão pode ser indeferido (autor e obra citada).

            As requerentes, em sua petição, não demonstraram explicitamente o interesse legítimo, bem como e principalmente, não declinaram os direitos a serem defendidos que pretendem provar e não demonstraram quais as situações de interesse pessoal que precisam ser esclarecidas,

            Kiyoshi Harada [01]preleciona que "

            "Os pedidos de ceertidão somente são cabíveis se tratar de matéria certificável. Assim são inviáveis os pedidos dispersos, não identificados, sobre questões em tese, condicionadas ou futuras, enfim sobre o que não estiver documentado."... "a administração deve cuidar para que as certidões expressem fielmente os originais, de modo a evitar o uso indevido das peças fornecidas."

            Diante das razões acima apontadas, não vemos como possa a Presidência da Câmara municipal deferir o pedido em questão.

            Ademais, o pedido de certidão não solicita o inteiro teor de qualquer ato ou documento, restringindo-se a requerer se informe se determinadas leis estão em vigor até a presente data.


Conceito e objeto de certidão.

            Cremos importante conceituar a expressão certidão, a fim de que, se os casos impeditivos antes analisados fossem superados, ainda assim não haveria fundamentação legal e doutrinária para a expedição do documento pretendido.

            ‘Ensino o prof. Pedro Nunes, em sua respeitada obra Dicionário de Tecnologia Jurídica (54ª ed. Vol I, p.190) que:

            Certidão é a reprodução textual e autêntica de escrito original ou assento extraído de livro de registro ou dede notas públicas, papéis, peças judiciais ou autos, por oficial público, escrivão ou qualquer outro serventuário ou funcionário competente, que os tenha a seu cargo, em seu poder ou cartório."

            Podemos ainda conceituar este termo como sendo cópias de atos constantes dos livros oficiais de repartições públicas em geral, registros públicos, tabeliães ou declarações do que se passou na presença de funcionário público ou de pessoa que tem fé pública.

            Em sua notável obra Direito Administrativo Brasileiro, [02]o pranteado jurista Hely Lopes Meirelles assinala que:

            "Certidões administrativas são cópias ou fotocópias fieis e autenticadas de atos ou fatos constantes de processo, livro ou documento que se encontre nas repartições públicas. Em tais atos o Poder Público não manifesta sua vontade, limitando-se a trasladar para o documento a ser fornecido ao interessado o que consta de seus arquivos."

            Destaca o festejado constitucionalista Celso Ribeiro Bastos, na admirável obra Comentários à Constituição do Brasil [03]que:

            ..."Tem as repartições públicas o dever de atestar tudo o que conste de seus registros e arquivos. A certidão tem, pois, um caráter declarativo e não consultivo" (g.n.)

            Observa com grande propriedade o Prof. José Cretella Júnior que:

            "Certidão pública ou certidão administrativa é o documento fornecido pela Administração ao interessado, afirmando a existência de um fato fundamentado em busca efetuada nos arquivos da repartição (g.n.)... É escusado advertir-se que o requerimento há de dizer qual o direito que se afirma, para que se saiba qual a matéria que interessa para a afirmação e prova dele".

            Ainda devemos traze o ensinamento do mesmo autor, contido na Enciclopédia Saraiva de Direito [04], onde define o vocábulo certidão da forma seguinte:

            "Certidão – Documento fornecido pela Administração ao interessado, afirmando a existência de um fato fundamentado em busca efetuada nos arquivos da repartição."

            Seguindo, pois, a melhor doutrina, é de se assinalar que a CERTIDÃO só poderá ser extraída quando transcrever, fielmente, qualquer escrito original constante de livro de registro, de notas, de processos ou outros documentos que exista nos arquivos da repartição pública, sempre com um caráter declarativo. É indispensável a existência de qualquer dos documentos citado, em registro ou arquivo, para que haja possibilidade legal de se reproduzir textualmente ou em forma de relatório o escrito original.

            O comentado nos parágrafos anteriores clarifica que o pedido de certidão realizado pelas peticionarias não trata de matéria que conste expressamente em qualquer documento arquivado ou registrado na Câmara Municipal ou em alguma outra repartição pública.

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Vigência das leis.

            O assunto objeto do requerimento está situado entre aqueles que se inserem no campo do Direito Intertemporal e não figura em qualquer registro, anotações ou outro documento constante de arquivo para que possa ser fielmente transcrito. Não se trata, na verdade, de atos ou fatos, circunstâncias ou situações certificáveis.

            Deflui-se, portanto, que não vemos possibilidade jurídica de se deferir o pedido das interessadas. Na certidão o Poder Público não manifesta sua vontade, conforme explicitado; limita-se, apenas e tão somente a trasladar o que consta de seus registros ou arquivos.

            A vigência de uma lei vem disciplinada no art. 2° e seus parágrafos da Lei de Introdução ao Código Civil.

            "Não se destinando a vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue (art. 2° caput). "A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior" (§ 1°,art.2°).

            Assim, quando há uma revogação expressa, se te, certeza que a lei revogada deixa de ter existência no mundo jurídico.

            O problema começa a surgir quando se pretende concluir, que a nova lei seja incompatível com disposições legais em vigor. Trata-se, neste caso, de revogação tácita, que fica sujeita aos princípios do Direito Intertemporal. Da mesma forma se afirme quando a lei nova regular inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. É forçoso que, realmente o previsto ocorra, pois há casos em que a vigência de alguns dispositivos possam subsistir, quando haverá de se recorrer ao Direito Intertemporal para qualquer conclusão. A matéria é complexa e, em alguns casos, motivo, inclusive, de pendência judicial.


Direito Intertemporal.

            O conflito de leis no tempo se resolve pelo que se denomina de, repetimos, Direito Intertemporal, que o respeitável civilista João Franzen de Lima

            assim o conceitua [05]:

            "É o conjunto de regras estabelecidas pelo legislador ou criadas pela Ciência para conciliar a aplicação da lei nova com as conseqüências da anterior"

            Com efeito dessume-se de tais enunciados que somente quando a lei nova revogue expressamente a anterior é que se pode afirmar que uma lei está em vigor, mesmo assim não em certidão.


Conclusão.

            Em conclusão resumida afirme-se que o requerimento das peticionarias deve ser indeferido pela Presidência da Edilidade, pelas seguintes razões:

            a) o requerimento não atende ao dispositivo constitucional pertinente, nem as diretrizes constantes da Lei Orgânica Municipal, posto que não indica os direitos a serem defendidos ou as situações de interesse pessoal que necessitem de esclarecimentos;

            b) o interesse legítimo das partes não está demonstrado cabalmente:

            c) não se trata de matéria que possa ser objeto de certidão;

            d) a matéria objeto do pedido não se encontra em qualquer documento arquivado na Câmara Municipal que possa ser objeto de transcrição.

            Opinamos, motivados pelo exposto, pelo indeferimento do pedido.

            Jundiaí, 21 de outubro de 2.005.


Notas

            01

Dicionário de Direito Público. Ed.Atlas. 1.999. pg.60.

            02

(20ª edição. Ed. Malheiros, p.175).

            03

Ed.Saraiva, 1989, 2° vol. p.167.

            04

Vol.13, p.152.

            05

Curso de Direito Civil Brasileiro, 3ª edição, p.62.
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Sobre o autor
Archippo Fronzaglia Júnior

Advogado em São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FRONZAGLIA JÚNIOR, Archippo. Certidão sobre vigência de leis. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 863, 13 nov. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/16647. Acesso em: 28 mar. 2024.

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