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Casamento religioso espírita é ato inexistente

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05/12/2005 às 00:00
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CONCLUSÃO

            06.01. Todas as perguntas encaminhadas já foram devidamente respondidas acima. Não obstante, verificamos que a situação in tela evidencia que a Exmª. Desembargadora Lucy Lopes Moreira – Corregedora-Geral de Justiça do Estado da Bahia – agiu corretamente, em consonância com o Espiritismo codificado por Allan Kardec, com a Lei e com a Constituição Federal de 1988, ao indeferir o requerimento que pretendia atribuir efeitos civis a uma cerimônia de matrimônio realizada pressupostamente sob a chancela do Espiritismo.

            06.02. Todavia, se o Sr. José Medrado insiste em invocar a liberdade de culto para que a cerimônia celebrada por ele seja reconhecida como de cunho matrimonial religioso e produza efeitos civis, esclarecemos ao consulente que poderá se contrapor a tal situação, utilizando os meios jurídicos lícitos e disponíveis - invocando a liberdade de crença (CF/88, art. 5º, VI) - para: 1) provocar o Ministério Público para que pleiteie judicialmente a declaração de inexistência de cerimônias matrimoniais iguais à examinada; 2) requerer do Poder Judiciário que, ao reconhecer como afeita ao Espiritismo a celebração de tal ato, declare inexistente o casamento, pois o Espiritismo não se firma como uma religião, não admite cerimônias, sacerdote ou autoridade religiosa; ou sucessivamente, 3) requerer do Poder Judiciário que, na hipótese de reconhecer como válida a mencionada cerimônia matrimonial para efeitos civis, que a desvincule do Espiritismo codificado por Allan Kardec, como já fez o Supremo Tribunal Federal em situação análoga. [61]

            Este é o nosso parecer, S.M.J.

            Salvador, 15 de agosto de 2005.

            CARLOS BERNARDO LOUREIRO

            JÚLIO NOGUEIRA

            ALBERTO DE CARVALHO JÚNIOR


NOTAS

            01

Eduardo de Oliveira Leite. Tratado de direito de família: origem e evolução do casamento. Curitiba: Juruá, 1991. p. 208.

            02

Arnoldo Wald. O Novo Direito de Família, RT, 12ª ed., 1999, p. 17.

            03

Art. 7º, Título 2 – "A lei considera o casamento somente como um contrato civil."

            04

"Art. 146. O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento perante o ministro de qualquer confissão religiosa, cujo o rito não contrarie a ordem pública ou os bons costumes, produzirá, todavia, os mesmos efeitos que o casamento civil, desde que perante a autoridade civil, na habilitação dos nubentes, na verificação dos impedimentos e no processo de oposição, sejam observadas as disposições da lei civil e seja ele inscrito no Registro Civil. O registro será gratuito e obrigatório."

            05

Art. 146, §1º - "O casamento será civil, e gratuita a sua celebração. O casamento religioso equivalerá ao civil se, observados os impedimentos e as prescrições da lei, assim requerer o celebrante ou qualquer interessado, contanto que seja o ato inscrito no Registro Público."

            06

Art. 17 da LICC.

            07

Luís Roberto Barroso. Interpretação e Aplicação da Constituição, Saraiva, 6ª ed., 2004, p. 250.

            08

Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros, 23ª ed., 2004, p. 246.

            09

"Art. 22.Compete privativamente à União legislar sobre:

            I – direito civil,. ..".

            10

Humberto Ávila. Teoria dos Princípios: da Definição à Aplicação dos Princípios Jurídicos, Malheiros, 2ª ed., 2003, pp. 70/75; Humberto Ávila. Revista Dialética de Direito Tributário, Pareceres, "Contribuição social sobre o faturamento. Cofins. Base de Cálculo. Distinção entre receita e faturamento. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal", Dialética, nº 107, Agosto de 2004, pp. 96/97 e 99/102.

            11

RE 166.772-9, Rel. Min. Marco Aurélio, DJU 16.12.94; RE 71.758, Rel. Min. Thompson Flores, RTJ 66, p. 150; ADI 2.010-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 12.04.02

            12

Sobre este assunto, o primeiro subscritor deste parecer já teve a oportunidade de escrever: "A Maçonaria é uma sociedade secreta, de origem remota espalhada por todo o mundo, cujos membros, que professam os princípios da igualdade e fraternidade, se dão a conhecer entre si por meio de sinais esotéricos. (...) Os símbolos maçônicos constituem os elementos de uma linguagem coerente e complexa, mas não uma doutrina ideológica nem de um sistema dogmático. A tolerância de cada interpretação individual de uma mesma língua esotérica e inciática basta para distinguir a franco-maçonaria dos partidos políticos e das confissões religiosas". Carlos Bernardo Loureiro. As Seitas Secretas, TELMA, 2005, p. 06.

            13

"Art. 5º (...):

            VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença,(...)".

            14

Ob. Cit., p. 216.

            15

Sobre este assunto o primeiro subscritor deste parecer já teve a oportunidade de escrever: "Seria, talvez, demasiado contar, em minudências, o que sucedeu após o lançamento da Obra. Sabe-se, porém, que suscitou grandes celeumas, porque ele surgia em uma época assaz conturbada por uma série de ideologias as mais desencontradas possíveis. O homem, contemporâneo de Allan Kardec, liberto das correntes dogmáticas, iniciava-se nos caminhos da investigação científica e das conquistas tecnológicas". O Livro dos Espíritos "fundamentava-se na Lei Divina ou Natural, e não sobre abstrações metafísicas, até então apanágios de certas e incoerentes concepções religiosas". In Carlos Bernardo Loureiro. Elucidações Kardecistas, Alvorada, 1990, pp. 28/29.

            16

O Livro dos Espíritos. Lake, 55ª ed., 1996, p. XXXV.

            17

O que é o Espiritismo. Edicel, 13ª ed., pp. 44 e 63.

            18

Allan Kardec. Revista Espírita de julho de 1859, Edicel, 1999, p. 213.

            19

Allan Kardec. O Livro dos Médiuns, LAKE, 18ª ed., 1994, p. 15.

            20

Allan Kardec. A Gênese, FEB, 36ª ed., 1994, pp. 20/21.

            21

Allan Kardec. Revista Espírita de Dezembro de 1868, Instituto de Difusão Espírita, 2ª ed., pp. 359.

            22

Fernando Ortis. Filosofia Penal dos Espíritas, LAKE, 1951, p. 179.

            23

Allan Kardec. A Gênese, Ob Cit., p. 250.

            24

Allan Kardec. O Livro dos Espíritos, Ob. Cit., p. 222.

            25

Antonio Ferreira de Almeida Júnior foi Diretor de Ensino da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo; Professor Catedrático de Medicina Legal da Faculdade de Direito da USP; Secretário de Educação e Saúde Pública do Estado de São Paulo e Membro do Conselho Federal de Educação. in Maria de Lourdes A. Fávero e Jader M. Britto (org.) Dicionário de Educadores do Brasil. Rio de Janeiro, Editora UFRJ, 1999.

            26

Revista de Educação, vols. XXI e XXII, março e junho de 1938; vide Religião, Livraria Editora da Federação Espírita Brasileira, 1942, pp. 63/68.

            27

Allan Kardec. O Livro dos Médiuns, LAKE, 18ª ed., 1994, pp. 32 e 203; Allan Kardec. O Livro dos Espíritos, Ob. Cit., pp. 228/233; Leon Denis. Cristianismo e Espiritismo, FEB, 10ª ed., 1994, pp. 80/106; Deolindo Amorim. O Espiritismo e as Doutrinas Espiritualistas, CELD, 6ª ed., 1996, p. 110; J. Herculano Pires,. O Centro Espírita, LAKE, 3ª ed., 1993, pp. 74/75; Carlos Imbassahy. O Espiritismo à Luz dos Fatos, LFEP, 1955, pp. 236/241.

            28

Allan Kardec. Revista Espírita de dezembro de 1868, Edicel, 1999, p. 357.

            29

Allan Kardec. Revista Espírita de Maio de 1859, Edicel, 1999, p. 148.

            30

A Agonia das Religiões, Paidéia, 4ª ed., 1994, p. 99.

            31

www.febnet.org.br

            32

Allan Kardec. O Evangelho Segundo o Espiritismo, LAKE, 14ª ed., 2000, pp. 16/18.

            33

Allan Kardec. Revista Espírita de Maio de 1859, Edicel, 1999, p. 148.

            34

Neste particular, cabe ainda esclarecer as valiosas pesquisas científicas realizadas sobre os fenômenos espíritas por Allan Kardec, Alfred Russel Wallace, Alexandre Aksakof, Arthur Conan Doyle, Albert de Rochas, Cesare Lombroso, Charles Richet, Ernesto Bozzano, Frederic Myers, Gabriel Dellane, Gustave Geley, Henry Sidgwick, Hector Durville, Johann Karl Friedrich Zöllner, José Herculano Pires, Joseph Banks Rhine, Juiz John W. Edmonds, Julien Ochorowicz, Marie Curie, Paul Gibier, Robert Owen, Thomas Edson, William Crookes, William James, William Thomas Stead. In Carlos Bernardo Loureiro. Dos Raps à Comunicação Instrumental, Sociedade Editora Espírita F. V. Lorenz, Rio de Janeiro, 1993.

            35

Ob. Cit., p. 105.

            36

Camilo de Lelis Colani Barbosa. Direito de Família – Manual de Direitos do Casamento, Suprema Cultura, 1ª ed., 2002, p. 37.

            37

"De acordo com a vontade que ambos acabais de afirmar perante mim, de vos receberdes por marido e mulher, eu, em nome da lei, vos declaro casados".

            38

Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa.

            39

Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. s.m. (sXIII cf. FichIVPM) 1 rel rito sagrado instituído por Jesus Cristo para dar, confirmar ou aumentar a graça [São sete: batismo, confirmação, comunhão, penitência, extrema-unção, ordem e matrimônio.] 2 rel ato religioso que tem por objetivo a santificação daquele ou daquilo que é objeto desse ato 3 rel a custódia em que fica encerrada a hóstia; a hóstia consagrada 3.1 rel a Eucaristia 4 (1553) ant. juramento 5 p.ext. norma ou comportamento exigidos pela moral ou pela lei  s. de iniciação rel o batismo, a crisma e a Eucaristia  s. do altar rel a Eucaristia  s. dos enfermos rel m.q. extrema-unção  com todos os s. infrm. com todos os requisitos, sem faltar nada, completamente  ligar-se pelo s. unir-se por matrimônio; casar  santo s. rel a Eucaristia, a hóstia consagrada  últimos s. rel penitência, eucaristia e extrema-unção que os católicos recebem quando em perigo de morte  etim lat. ecles. sacramentum,i ´mistério, a palavra de Deus, sacramento; lat.cl., depósito que os litigantes colocavam nas mãos do pontífice romano, obrigação, juramento militar, juramento´, der. v.lat. sacráre ´consagrar, sagrar, dar caráter sagrado a´; ver sac(r)-; f.hist. sXIII sacrameto, sXIV sacramento, sXIV ssacramentos, sXIV sagramento  sin/var ver sinonímia de juramento  hom sacramento(fl.sacramentar)

            40

Em reportagem do Jornal A Tarde, Caderno Local, 10/07/2005, p. 03, o celebrante do casamento – Sr. José Medrado – informa que o ritual do "casamento espírita" "é chamado de celebração do Evangelho, com reflexões sobre a doutrina. O celebrante exorta os noivos a manifestarem o consentimento mútuo para a união. Há a celebração do compromisso entre eles. O celebrante os leva a refletir sobre a nova fase das suas vidas".

            41

Só a título de argumentação, se o Espiritismo fosse uma religião poderiam ser invocadas as mesmas razões que levaram o Min. Hahnemann Guimarães a julgar o RE 31.179-DF, uma vez que o Centro Espírita "não poderia conseguir seus fins sem respeitar" a Doutrina Espírita. E como a Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec não admite em seu meio a celebração de matrimônio, por óbvio, que a cerimônia não encontraria legitimidade.

            42

Deolindo Amorim. O Espiritismo e as Doutrinas Espiritualistas, CELD, 6ª ed., 1996, p. 97 – "O Espiritismo não tem culto material; O Espiritismo não tem ritual; O Espiritismo não prescreve qualquer forma de paramento nem comporta o formalismo de funções sacerdotais."

            43

Deolindo Amorim. Ob. Cit., p. 230 – "O que não é possível é justificar um ritual espírita,...".

            44

Allan Kardec. Obras Póstumas, FEB, 26ª ed., 1994, pp. 348/349 – "... seitas poderão formar-se ao lado da Doutrina, seitas que não lhe adotem os princípios ou todos os princípios, porém não dentro da Doutrina, por efeito de interpretação de textos...".

            45

Allan Kardec. Obras Póstumas, FEB, 26ª ed., 1994, p. 346.

            46

Deolindo Amorim. Ob. Cit., p. 149.

            47

Proc. 21207/05 – Comarca da Capital – Corregedoria-Geral de Justiça do Estado da Bahia.

            48

Sílvio de Salvo Venosa. Direito Civil: Direito de Família, Atlas, 2ª ed., Vol. 6, p. 111.

            49

Tratado de Direito Privado, Brosoi, 3ª ed., 1971, p. 365.

            50

Maria Amália de Figueiredo P. Alvarenga. O Casamento Inválido no Novo Código Civil – Reflexos no Direito Canônico e na Legislação Civil, Lemos & Cruz, 2003, p. 42.

            51

Sílvio de Salvo Venosa. Ob. Cit., p. 113

            52

Caio Mário da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil, Forense, 11ªed., 1996, p. 85.

            53

Ob. Cit., p. 114.

            54

Ob. Cit., p. 368.

            55

Mesmo já se tendo visto anteriormente que o Espiritismo não é religião.

            56

Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil Brasileiro, Saraiva, 17ª ed., Vol. 5, 2002, p. 107; Camilo de Lelis Colani Barbosa. Direito de Família – Manual de Direitos do Casamento, Suprema Cultura, 1ª ed., 2002, p. 45.

            57

Jornal A Tarde, Caderno Local, Domingo, 10/07/2005, p. 03

            58

Proc. 21.207/05 – Comarca da Capital, Corregedoria-Geral de Justiça do Estado da Bahia

            59

Deolindo Amorim. O Espiritismo e as Doutrinas Espiritualistas, p. 110.

            60

Deolindo Amorim. Ob. Cit., pp. 112 e 97/99.

            61

Neste sentido já se pronunciou o STF favoravelmente à criação de uma igreja nacional, com o mesmo rito da católica, mas desvinculada do Pontífice Romano. Vide Pontes de Miranda. Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda n. 1 de 1969, t. V, pp. 133 e 135; Pe. José Scambini. Liberdade Religiosa nas Constituições Brasileiras, Vozes, 1978, pp. 222 a 224.
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Sobre o autor
Carlos Bernardo Loureiro

Advogado, Delegado da Confederação Espírita Pan-Americana, Membro do Instituto de Cultura Espírita do Brasil, Presidente da Sociedade de Pesquisas e Estudos Espíritas da Bahia - SPEE-BA e do Teatro Espírita Leopoldo Machado - TELMA

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOUREIRO, Carlos Bernardo. Casamento religioso espírita é ato inexistente. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 885, 5 dez. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/16655. Acesso em: 19 abr. 2024.

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