C O N S U L T A
Formula-me, o consulente, a seguinte consulta:
"1. Tem a presente a finalidade de solicitar a V .Sa. a elaboração de um parecer jurídico sobre a constitucionalidade e legalidade da instituição de obrigação acessória, para os estabelecimentos industriais dos produtos classificados nas posições 2202 e 2203, consistente em exigência ´de instalação de equipamentos medidores de vazão e condutivímetros, bem como de aparelhos para o controle, registro e gravação dos quantitativos medidos.
Legislação
2. A obrigação foi instituída por meio da Medida Provisória n° 2158-35, de 24.08.2001 que, em seus artigos 36 e 37, disciplinou a exigência, atribuindo à Secretaria da Receita Federal a competência para dispor sobre forma, condições e prazos. O Secretário da Receita Federal, por sua vez, baixou a Instrução Normativa n° 265, de 20.12.2002, determinando, no artigo 2°, que a Coordenação-Geral de Fiscalização (Cofis), por meio de Ato Declaratório Executivo (ADE), estabelecesse as condições de funcionamento, bem assim as características técnicas e de segurança dos equipamentos; os procedimentos para homologação e credenciamento dos equipamentos e respectivos fabricantes dos mesmos; os limites mínimos de produção ou faturamento, a partir do qual os estabelecimentos ficariam obrigados à instalação dos equipamentos.
3. A Coordenação-Geral de Fiscalização (Cofis) baixou, em 1° de outubro de 2003, o Ato Declaratório Executivo (ADE) n° 20, regulando a forma e condições de instalação de Sistema de Medição de Vazão (SMV), e, nos termos da autorização contida no artigo 36, § 1°, II da Medida Provisória n° 2158-35, de 24.08.2001, dispensou da obrigação os estabelecimentos industriais envasadores pertencentes a empresa cuja capacidade instalada de produção anual seja inferior a 5 ( cinco) milhões de litros, computadas as capacidades das respectivas filiais, pessoas jurídicas associadas, coligadas, controladas e controladoras.
4. Em cumprimento às determinações legais, o Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja -SINDICERV, atendendo ao Convênio firmado com a União Federal, por meio da Secretaria da Receita Federal (alínea a, item II, cláusula 23), contratou a FACTI - FUNDAÇÃO DE APOIO AO CTI, para elaborar uma especificação de requisitos de um Sistema de Medição de Vazão de Bebidas e o documento "Especificação do Processo de Verificação de Atendimento dos Requisitos do Sistema de Medição de Vazão".
5. Por outro lado, ainda, o SINDICERV comprometeu-se com a Secretaria da Receita Federal, formalmente, a arcar com todos os custos decorrentes da produção e da instalação dos equipamentos medidores de vazão e dos condutivímetros, bem como dos aparelhos para o controle, registro e gravação dos quantitativos medidos.
Consulta
6. Entende-se que o objetivo propugnado pela medida provisória em referência foi o de possibilitar um maior controle na arrecadação do IPI; como conseqüência impedir-se-ia que a evasão fiscal pudesse ser utilizada como meio de distorção da concorrência. Nesse sentido, o seu artigo 37 dispõe que o estabelecimento industrial das bebidas sujeitas à tributação pelo IPI deva apresentar, em meio magnético, quadro resumo dos registros dos medidores e demonstrativo da apuração do IPI.
7. O sistema de controle de volume produzido adotado pela legislação nacional, consistente na determinação de instalação de equipamento de medidor de vazão, além de necessário e adequado à fiscalização tributária, corresponde a modelo utilizado pela legislação de outros países, com êxito. De fato, com variações de tecnologia e uso, o sistema foi implantado por alguns países, tais como, alguns Estados dos Estados Unidos da América, Tailândia, Bélgica e Venezuela.
8. Entretanto, há eventual possibilidade de empresas do setor de bebidas insurgirem-se contra a obrigação, impedindo a eficácia das normas fiscalizadoras.
9. A leitura dos dispositivos poderia suscitar questões relativas (i) aos limites ao exercício do poder de fiscalização (poder de polícia), (ii) à aplicação do princípio da proporcional idade na determinação do cumprimento de obrigações acessórias, (iii) à competência para a prática dos atos (Secretaria da Receita Federal e Cofis) e, por fim, (iv) à atenção ao princípio da neutralidade concorrencial dos atos administrativos .
10. Quanto ao item (i) trata-se de responder se existe, na legislação complementar e ordinária, limitação à criação de obrigações acessórias no âmbito do poder de fiscalização; no que respeita ao item (ii) cuida.:.se de examinar se o princípio da proporcionalidade caracteriza-se como limite ao poder de fiscalização e se, no caso, ele foi respeitado, considerando-se que o ônus a ser imposto aos contribuintes na aquisição de equipamentos é razoável e compatível com o faturamento das empresas; relativamente ao item (iii) indaga-se quanto à legitimidade da delegação de competência contida no artigo 36 da Medida Provisória n° 2158-35/2001, bem como da estabelecida no artigo 2° da IN n° 265/2002 e, quanto ao item (iv) discute-se se os dispositivos referidos provocam algum desequilíbrio concorrencial no mercado de bebidas.
11. Por tais razões, formula-se a presente consulta, solicitando-se sejam respondidos os quesitos seguintes:
(a) Quais os limites impostos à lei para a criação de obrigações acessórias como instrumento de fiscalização?
(b) Como o princípio da proporcional idade se aplica às obrigações acessÓrias?
(c) A obrigação acessória de que tratam os artigos 36 e 37 da Medida Provisória n° 2158-35/2001 e os artigos 1° e 2° da Instrução Normativa n° 265/2002 é adequada como meio para atingir os fins lá propostos?
(d) O controle de produção e de faturamento por meio de medidores de vazão atende ao princípio da eficiência a que se submete a Administração Pública ( art. 37, da Constituição Federal)?
(e) E adequada a designação da SRF , por lei, como órgão competente para dispor sobre medidas instrumentais visando evitar a evasão de tributos? Pode a SRF delegar a órgão que a integra (unidade central) tal competência?
(f) A evasão fiscal pode ser instrumento de desequilíbrio da justa concorrência?
(g) A obrigação acessória objeto da consulta atende ao princípio da neutralidade concorrencial dos atos administrativos? A obrigação acessória de que tratam os artigos 36 e 37 da Medida Provisória n° 2158-35/2001 e os artigos 1° e 2° da Instrução Normativa n° 265/2002 é adequada como meio para atingir os fins lá propostos ?
R E S P O S T A
A questão merece algumas considerações preliminares sobre as obrigações acessórias e a sua razão de ser.
Reza o artigo 113 do CTN que:
"A obrigação tributária é principal ou acessória"
§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.
§ 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.
§ 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária".
O § 2º, claramente, determina que a obrigação acessória:
1) é decorrente da legislação tributária;
2) seu objeto são prestações positivas ou negativas;
3) no interesse da arrecadação e
4) no interesse da fiscalização de tributos.
E conclui, o § 3º, que a inobservância das obrigações acessórias transforma-as, no concernente a penalidade pecuniária, em obrigação principal.
Em outras palavras, o legislador complementar distingue a obrigação principal da acessória por seu caráter pecuniário. Sempre que a obrigação for pecuniária é principal. Quando vinculada a obrigações formais de fazer ou deixar de fazer (não impedir a fiscalização de fiscalizar) são acessórias.
De rigor, antecipa, o CTN, o disposto no § 1º do artigo 145 da Constituição Federal, assim redigido:
"§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte".
Pela respectiva disposição, cabe à fiscalização:
a) conferir efetividade aos objetivos da política tributária imposta;
b) identificando patrimônio;
c) identificando renda;
d) identificando atividades econômicas dos contribuintes;
e) respeitando sempre os direitos individuais, nos termos da lei.
Como se percebe, o § 1º do artigo 145 da C.F. e os §§ 2º e 3º do artigo 113 do CTN, nitidamente, tornam a imposição tributária um dever do contribuinte podendo a fiscalização utilizar-se de seu próprio trabalho para exercer essa função e conformar o nível dos tributos a pagar.
É que, conforme formulei em meu livro "Teoria da Imposição Tributária", a norma do tributo é necessária, mas está entre aquelas de rejeição social, em face de servir tanto para o Estado prestar serviços públicos, como para sustentar os privilégios dos detentores do poder, sendo, sempre, desmedida. Apenas, pois, uma rígida fiscalização e sanções severas, permitem o cumprimento da norma tributária. Esta é a razão pela qual constituinte e legislador complementar garantem, de um lado, os direitos dos contribuintes, mas exigem que estes colaborem na determinação do fato imponível, para acolitar o Fisco na fiscalização e arrecadação de tributos.
Compreende-se, pois, a expressão "no interesse da fiscalização", vale dizer, transferem, constituinte e legislador complementar, obrigações administrativas próprias da Receita para os pagadores de tributos, com duplo intento, ou seja, facilitar sua ação, sem maiores ônus a fiscalização, assim como tornar menos tensa a própria vida do contribuinte, que não tem necessidade de ver inúmeros agentes fiscais atuando dentro da empresa para, por exemplo, emitir documentação fiscal.
Esta dupla e mútua facilidade implica responsabilidades, quais sejam, a de cumprimento do determinado em lei, tendo a obrigação formal e acessória de fazer ou não fazer a potencialidade de, no descumprimento, tornar-se obrigação principal .
O certo, todavia, é que, "no interesse da fiscalização", deve ser tal obrigação sempre adequada à necessidade de controle, razão pela qual, conforme às peculiaridades inerentes ao fato tributário, sua conformação e perfil podem variar.
Desta forma, "o interesse da arrecadação e fiscalização" é o mote que leva ao tratamento legal, em nível constitucional e complementar, das obrigações acessórias.
O segundo aspecto preambular a ser examinado, diz respeito à questão, que hoje se debate, no mundo inteiro, relacionada à descompetitividade empresarial, provocada por técnicas de concorrência, à luz de atuação legal ou ilegal de contribuintes, na busca de conquista de mercados.
Coordenei, com o Prof. Alejandro Altamirano, o I Colóquio Internacional de Direito Tributário do Centro de Extensão Universitária e da Universidade Austral de Buenos Aires, em 1999, em que um dos temas debatidos por juristas argentinos e brasileiros foi o da descompetitividade, à luz de políticas tributárias desestabilizadoras.
A guerra fiscal do ICMS, por exemplo, tem gerado inúmeros conflitos entre os Estados junto ao STF. Nada obstante, a iterativa jurisprudência pela qual, sem autorização do CONFAZ, são inconstitucionais incentivos fiscais ofertados pelos Estados, mesmo que por lei, tal conflito é exemplo da descompetitividade, com "verniz" de legalidade. A inconstitucionalidade de legislação dessa natureza, embora decretada pelo STF, não tem sido, contudo, tão simplesmente atalhada.
Há descompetitividade empresarial e concorrência desleal sempre que ocorra sonegação tributária, visto que, neste ponto, a empresa que sonega leva incomensurável vantagem sobre seus concorrentes que pagam tributos. A questão mais grave acontece, se a empresa que sonega considera haver pequena possibilidade de ser fiscalizada, pela dificuldade de apuração de suas atividades, pela multiplicidade de contribuintes ou pelo tipo de produto que fabrica, com o que o Fisco, com quadros reduzidos de agentes fiscais, torna-se impotente em combatê-la .
Esta é a razão pela qual, conforme o meio de atividade, há necessidade de diversos meios de fiscalização e controle, todos eles para que os tributos sejam pagos e não haja concorrência desleal, decorrente da sonegação de tributos.
É interessante como, nesta matéria, a quase totalidade dos participantes do I Colóquio Internacional de Direito Tributário do Centro de Extensão Universitária – CEU e Universidade Austral concluiu que a luta contra tal modalidade de concorrência desleal pressupõe uma intensa colaboração entre Fisco e contribuinte no sentido de evitá-la.
De outra forma, o princípio da livre concorrência é nitidamente atingido, restando inócuo o inciso IV do artigo 170 da C.F., assim redigido:
"Art. 170 A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: ........... IV. livre concorrência".
Mais do que isto, a maioria concluiu que tal tipo de concorrência desleal, via tributos, é forma possível de ser combatida nos termos do § 4º do artigo 173, com a seguinte dicção:
"§ 4º A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros",
não se resumindo, o espectro de aplicação desse dispositivo constitucional, às hipóteses mencionadas na lei n. 8884/94.
Um terceiro aspecto preambular, antes de começar a responder às questões formuladas.
O princípio da equivalência, consagrado no inciso II do art. 150 da Constituição, oferta garantia maior do que o princípio da isonomia.
Sobre a matéria já escrevi:
"Equivalente é um vocábulo de densidade ôntica mais abrangente do que "igual". A igualdade exige absoluta consonância em todas as partes, o que não é da estrutura do princípio da equivalência. Situações iguais na eqüipolência, mas diferentes na forma, não podem ser tratadas diversamente. A equivalência estende à similitude de situações a necessidade de tratamento igual pela política impositiva, afastando a tese de que os desiguais devem ser tratados, necessariamente, de forma desigual. Os desiguais, em situação de aproximação, devem ser tratados, pelo princípio da equivalência, de forma igual em matéria tributária, visto que a igualdade absoluta, na equivalência não existe, mas apenas a igualdade na equiparação de elementos (peso, valor etc.). Qual foi a razão para tal elasticidade ofertada pelo constituinte, para proteção dos contribuintes, vedando ao Poder Tributante adoção de técnica diversa?
A tradição brasileira de pouco respeito aos direitos dos cidadãos em matéria tributária --o Presidente Collor acaba de pedir ao Congresso a redução dos direitos dos contribuintes para fazer uma reforma tributária, que tem na essência o princípio de "maiores tributos, menores direitos"--, certamente levou o constituinte a amarrar os poderes tributantes (três sobre o mesmo "pagador de tributos") aos grilhões seguros do princípio da igualdade, evitando simultaneamente: a) que, a título de tratamento desigual dos desiguais, se multiplicassem as hipóteses de situações diversas para neutralização do princípio da igualdade; b) servisse a redução legislativa do princípio da igualdade como forma de tratamento aplicável às perseguições fiscais em relação a setores, que estivessem em conflito com os governos.
Entendo ter sido esta a razão fundamental que levou o constituinte, em relação ao princípio da igualdade, seja em seu aspecto subjetivo, seja naquele objetivo, a proteger todos os contribuintes contra o tratamento desigual, exigindo que este tratamento deva ser igual não apenas para situações iguais, mas para situações equiparadas, equivalentes, com núcleo comum de identidade. Compreende-se assim porque o discurso do inc. II é concluído com a afirmação de que a situação equivalente será detectada independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos dos contribuintes.
Em outras palavras, quaisquer que sejam os contribuintes, quaisquer que sejam os fatos imponíveis, o tratamento isonômico se impõe, vedada qualquer forma de atuação discriminatória" .
Diria, hoje, que é mais abrangente que o princípio da isonomia no seu aspecto material e espacial e menor em seu aspecto pessoal.
Com efeito, se a norma declarar que a equivalência abrange até situações heterogêneas que impliquem resultado final homogêneo (equivalência patrimonial no balanço das empresas, por exemplo), fica caracterizada, a sua maior abrangência espacial e material. Se declarar que apenas os contribuintes na mesma situação são protegidos, é menos abrangente no aspecto pessoal.
Desta forma, consagra, o comando constitucional, o princípio de que a igualdade pode acarretar desigualdades entre "iguais-desiguais", para resultar num princípio da igualdade justo e proporcional à diferença.
Isto leva à adoção de critérios diferentes para a mesma classe de contribuintes, em função, quase sempre, da expressão e grandeza de suas atividades.
O artigo 179 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei",
sugere, com nitidez, hipótese da menor abrangência pessoal para equilíbrio de desiguais, o mesmo ocorrendo com disposição do artigo 170, inciso IX, da lei suprema.
A adoção, por exemplo, das técnicas de lucro presumido para apuração do lucro das empresas de pequeno porte, ou do "simples", para estas empresas no que concerne a totalidade dos tributos federais, são demonstrações de que a equivalência, no texto constitucional, pressupõe uma desigualdade no tratamento para igualar os desiguais.
Colocadas tais premissas, passo a responder às questões formuladas.
Os artigos 36 e 37 da M.P. n. 2158-35/2001 têm a seguinte redação:
"Art. 36. Os estabelecimentos industriais dos produtos classificados nas posições 2202 e 2203 da TIPI ficam sujeitos à instalação de equipamentos medidores de vazão e condutivímetros, bem assim de aparelhos para o controle, registro e gravação dos quantitativos medidos, na forma, condições e prazos estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal.
§ 1º A Secretaria da Receita Federal poderá:
I - credenciar, mediante convênio, órgãos oficiais especializados e entidades de âmbito nacional representativas dos fabricantes de bebidas, que ficarão responsáveis pela contratação, supervisão e homologação dos serviços de instalação, aferição, manutenção e reparação dos equipamentos;
II - dispensar a instalação dos equipamentos previstos neste artigo, em função de limites de produção ou faturamento que fixar-
§ 2º No caso de inoperância de qualquer dos equipamentos previstos neste artigo, o contribuinte deverá comunicar a ocorrência à unidade da Secretaria da Receita Federal com jurisdição sobre seu domicílio fiscal, no prazo de vinte e quatro horas, devendo manter controle do volume de produção enquanto perdurar a interrupção.
Art.37. O estabelecimento industrial das bebidas sujeitas ao regime de tributação pelo IPI de que trata a Lei n. 7.798, de 1989, deverá apresentar, em meio magnético, nos prazos, modelos e condições estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal:
I - quadro resumo dos registros dos medidores de vazão e dos condutivímetros, a partir da data de entrada em operação dos equipamentos;
II - demonstrativo da apuração do IPI".
Nitidamente, impõem obrigação acessória, que é fundamental para o setor, visto que não tem, a Receita, possibilidade de controlar, com eficácia, a produção dos produtos classificados nas posições 2202 e 2203 do Regulamento do IPI - RIPI, pois é insuficiente o controle exclusivamente pela documentação fiscal.
Por outro lado, a falta de fiscalização dos quantitativos de tais produtos pode gerar concorrência desleal, se algumas empresas decidirem sonegar o tributo, que é elevado, ganhando mercado –não por qualidade do seu produto— mas pelo preço mais reduzido, além de gerar capacidade de reinvestimento maior, à luz do ilícito fiscal.
Nada mais justo que, nos exatos termos do artigo 113 § 2º do CTN e do § 1º do artigo 145 da Constituição Federal, institua-se sistema de controle de mediação capaz de refletir a verdade material, evitando a evasão fiscal e a concorrência desleal, no setor de bebidas.
Os artigos 36 e 37 da M.P. n. 2158-35/2001 criam sistema de controle através da saída do produto do equipamento fabril, que medirá a quantidade de litros produzida para efeitos de definição do exato tributo a ser recolhido.
A Instrução Normativa n. 265 de 20/12/2002, por sua vez, apenas explicita, em seus artigos 1º e 4º, de que forma serão instalados e controlados tais medidores de produção, sendo uma decorrência do ato legislativo emanado do Poder Executivo.
"No interesse da fiscalização e da arrecadação", como impõe o artigo 113 § 2º do CTN, os dispositivos foram veiculados pela M.P. n. 2158-35/2001, não havendo qualquer inconstitucionalidade ou ilegalidade nos dois artigos do ato com eficácia legislativa e naquele explicitador (art. 1º a 4º). O próprio legislador complementar faz clara menção que se trata
a) de obrigação acessória
e
b) é imposta no interesse da fiscalização e arrecadação, e este interesse resta evidente, para que se evite concorrência desleal e sonegação.
O tratamento diferencial para os pequenos produtores, por outro lado, é previsto pela própria Constituição, no artigo 150, inciso II, como atrás comentado, em que a abrangência espacial e material maior não implica maior abrangência pessoal, mas menor. A todos os contribuintes de menor potencial econômico, ou seja, às empresas de pequeno porte, está assegurado um tratamento desigual para dar-lhes condições de competitividade, nos termos também do artigo 179 e 170, inciso IX, da C.F. .
A dispensa, para tais empresas, de controle dessa natureza, tem, também, respaldo, como demonstrei no início deste parecer, na própria Constituição. Não fere o princípio da isonomia, mas, ao contrário, é justificada pelos 3 dispositivos (150 inc. II, 179 e 170, inciso IX, da lei suprema).
Por fim, resta a questão da onerosidade do sistema, que, no caso, deixará de existir para as empresas diretamente, visto que o próprio Sindicato Patronal assumirá a instalação, Tal argumento resta, portanto, esvaziado, redundando, a instalação dos equipamentos necessários, para cada contribuinte isolado, em ônus zero, assim também ocorrendo para a Receita Federal.
Como se percebe, não só a legislação permite a criação dessa obrigação acessória, como admite critérios diferenciais em relação às empresas de pequeno porte. A exigência mostra-se, ademais, proporcional à necessidade de maior controle de segmento, onde há potencialidade de sonegação, além de não representar ônus maior ao contribuinte, não havendo, de rigor, delegação de competência legislativa para a imposição do sistema de controle, mas sim explicitação dos dispositivos das M.P. (36 e 37), dentro da competência regulatória do Estado.
Por fim, evita-se a concorrência desleal, na linha do que foi deliberado no I Colóquio Internacional de Direito Tributário, do Centro de Extensão Universitária e da Universidade Austral, de Buenos Aires, ou seja, de que a evasão tributária é forma de abuso do poder econômico e de concorrência desleal.
Postas tais premissas, passo a responder às questões formuladas:
1) Os limites impostos à lei para a criação de obrigações acessórias com intuito de fiscalização são vinculados aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e a não onerosidade excessiva, assim como do respeito aos direitos fundamentais do cidadão. Por outro lado, o princípio da eficiência, introduzido, constitucionalmente, pela E.C. n. 3/93 é imposição ao administrador público.
Assim, desde que a eficiência seja obtida sem ônus excessivos ao contribuinte –algum ônus sempre existe, em qualquer obrigação acessória--, a imposição de encargos razoáveis e proporcionais ao objetivo colimado, que é viabilizar a atividade de fiscalização, é absolutamente cabível e legítima
E, no caso, todos os aspectos atrás mencionados foram rigorosamente observados.
2) O princípio da proporcionalidade vinculado está ao princípio da igualdade, no que diz respeito às obrigações acessórias, comportando tratamento desigual entre contribuintes de potencial econômico diverso. Está, por outro lado, também vinculado ao princípio da razoabilidade, porque um ônus proporcional à dimensão dos contribuintes, pode ser, todavia, irrazoável para o conjunto deles.
Ora, o sistema proposto --e que será suportado pela entidade patronal, não trazendo ônus maiores aos contribuintes de potencial econômico superior, e havendo dispensa, nos termos do art. 170 inciso IX e 179 da C.F., para as empresas menores-- é proporcional e razoável, gerando maior eficiência na fiscalização e conforma-se, integralmente, no espírito do § 2º do art. 113 do CTN.
c) A resposta, na linha daquela dada aos dois quesitos anteriores, é afirmativa. Adequada, razoável, proporcional e eficiente.
d) Sim. O princípio foi inserido no texto constitucional, em 1993, estando o artigo 37 "caput" da lei suprema, assim redigido:
"A administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também ao seguinte: ............".
Embora, seja da essência da Administração Pública, à serviço do interesse público, buscar a eficiência plena, como princípio expresso apenas passou a compor o texto constitucional a partir do fim de 2003.
À evidência, antes também já estava implícito no direito pátrio, visto que não se pode, nem em tese admitir, que um governo possa ser, deliberadamente, ineficiente, à falta de norma positivando expressamente esse princípio.
O "status" da constitucionalização objetivou ressaltar a importância de algo que é inerente ao Direito Administrativo, como ramo do Direito Público.
E, à evidência, as disposições mencionadas atendem plenamente a obtenção dessa maior eficiência no combate à sonegação fiscal e à concorrência desleal.
e) Os artigos 1º a 4º da Instrução Normativa SRF n. 265, de 20/12/2002, explicitam medidas contidas nos artigos 36 e 37 da M.P. n. 2158-35/2001, não havendo, a meu ver, qualquer delegação de competência legislativa, nos referidos dispositivos.
O artigo 36 da M.P. 2158-35/2001, no "caput", faz menção à instalação de equipamentos medidores de vazão e conduvímetros.
O § 1º da IN SRF n. 265/2002 cuida de credenciamentos para manutenção de tais equipamentos, vale dizer admitindo, que no ato de exercitar a disposição legislativa, busque, a Receita Federal, a menor onerosidade e a maior eficiência na instalação dos equipamentos, assim como pode dispensar empresas de pequeno porte das obrigações, nos termos dos artigos 179 e 170, inciso IX, da C.F.
O § 2º declara a necessidade de estar, a Receita Federal, sempre informada do funcionamento adequado do equipamento pelo contribuinte.
O artigo 37 da M.P. n. 2158-35/2001, por seu lado, impõe haja informação correta sobre o controle mencionado, nos termos que seriam explicitados pela Receita Federal.
A meu ver, não há delegação de competência legislativa, mas determinação para que a Secretaria da Receita Federal esclareça, em seu poder discricionário, a forma como a lei poderá ser operacionalizada, o que o fez nos artigos 1º e 4º da I.N. n. 265/2002.
Como já escrevi, as únicas delegações de competência legislativa possíveis, são a edição de Medida Provisória (art. 62 da C.F.) e a da lei delegada (art. 68 da C.F.). Não há, pois, delegação na hipótese, mas autorização legal exclusivamente para o exercício do poder discricionário .
Por outro lado, a Receita Federal exerceu seu direito regulatório, à luz do poder discricionário atribuído pelos arts. 36 e 37 da Medida Provisória –que tem força de lei-- e não pelo prisma de "competência delegada", que não ocorre, na hipótese.
Ver, na mera regulamentação de disposição legal, delegação de competência legislativa –impossível no ordenamento nacional senão nas hipóteses expressamente autorizadas pela Lei Maior— seria eliminar o poder regulamentar do Estado, impondo sempre a rigorosa repetição, nos diplomas executivos, do que foi disposto nos diplomas legislativos.
Os artigos 1º e 4º, necessários à implantação da referida M.P., apenas explicitam o conteúdo ôntico de seus artigos 36 e 37.
f) Já respondi, quando da introdução deste parecer, ser a evasão fiscal, forma de concorrência desleal e atitude condenável (fere o concorrente e fere o contribuinte, que paga corretamente seus impostos, assim como retira recursos a serem destinados ao atendimento, pelo Estado, das necessidades da população carente.
O pior é que a evasão fiscal, sobre desequilibrar a concorrência, gera uma rede de sonegação, visto que, na cadeia de produção, muitos passam a compartilhar do procedimento ilícito, por uma questão de sobrevivência, quando as fiscalizações são insuficientes.
E, no tempo, pode, inclusive, levar empresas que pagam regularmente seus tributos, a terem que adotar procedimento semelhante, para poder permanecer no mercado, o que é péssimo para todos.
Combater a evasão fiscal, restabelecer a livre concorrência e desestimular a sonegação. São, a meu ver, imperativos éticos a que não pode, a Receita, furtar-se, não vislumbrando eu, nos referidos artigos (36 e 37 da M.P. 2158-35/2001 e 1º a 4º da IN SRF 265/2002), qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade. Antes, entendo hospedarem conduta compatível com o que determina o § 2º do artigo 113 do CTN, tendo sido editados no "interesse da fiscalização e arrecadação de tributos" e, por decorrência, no interesse de toda a sociedade na eliminação da concorrência desleal.
g) A resposta já está contida nas explicações preambulares e nas respostas as questões anteriores. Há absoluta neutralidade concorrencial, assim como, respeito ao regime de controle mais simplificado das empresas de pequeno porte.
É neutro, o sistema, visto que as empresas não suportarão grandes ônus –o Sindicato Patronal instalará, por sua conta, os equipamentos— e terão a certeza de que a Receita Federal guardará os dados recebidos, com sigilo, por força do disposto no artigo 198 "caput", do CTN assim redigido:
"Art. 198. Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades".
As empresas de pequeno porte, por sua vez, estão dispensadas da obrigação de instalação. Atende, portanto, o regime criado, rigorosamente, o princípio da neutralidade concorrencial.
Concluo, entendendo, serem constitucionais os artigos 36 e 37 da M.P. 2158-35/01 e legais os artigos 1 a 4 da IN SRF 265/02, pelos fundamentos conforme exposto no presente parecer.
S.M.J.
São Paulo, 27 de Janeiro de 2004.