Redução da maioridade penal

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Elaboração de um parecer acerca do prequestionamento feito a favor ou contra a PEC 171, a constitucionalidade da redução da maioridade penal e possíveis soluções e alterações ao ECA.

Ilustríssima Senhora Professora de Direito da Faculdade de Ilhéus

Parecer Jurídico

RELATÓRIO

Trata-se de uma consulta elaborada pela professora Taiana Cordeiro, acerca da constitucionalidade da redução da maioridade penal, os pontos favoráveis e desfavoráveis acerca dessa redução, a necessidade de reformulação ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e possíveis soluções caso não haja a aprovação do senado para a PEC 171.

FUNDAMENTAÇÃO

A discussão acerca da maioridade penal não é nova. Tal temática já vem sendo discutida no cenário brasileiro desde 1993, onde em 19 de agosto do referido ano, o Deputado Benedito Domingos apresentou a proposta de emenda constitucional nº 171, popularmente conhecida como PEC 171.

Essa discussão voltou à tona devido a grande onda de violência praticada por menores de 18 anos que tem assolado o país, fato este que tem causado grande revolta por parte da população devido à ausência de medidas punitivas para a prática de crimes por esses indivíduos.

Entretanto, a crescente sede por justiça pode acabar se confundindo com sede por vingança. Ora, a vontade de impor a menores infratores a pena privativa de liberdade tem sido observada apenas na sua ótica punitiva e preventiva, mas pouco, ou quase nada, tem sido avaliada a sua mais importante finalidade: a reeducação social, ou seja, a capacidade do individuo passar pelo sistema carcerário e voltar, após o cumprimento de sua pena, pronto para uma vida fora da criminalidade.

Assim, a sociedade, parte dela sob muita influência midiática, tem sido levada a pensar somente no viés punitivo, em formas de endurecer as penas, mas não tem refletido acerca das raízes da criminalidade, ou seja, os motivos pelos quais aquele menor foi levado a praticar delitos.

A PEC 171, como já mencionado, voltou a ser discutida com força hodiernamente, tendo sido aprovada em 2

 º turno pela câmara dos Deputados, em 19/08/2015, com quórum de 320 votos a favor e 152 contra, estando aguardando votação no senado federal. Contudo, a mudança da maioridade penal não abrange a todos os crimes previstos no Código Penal, estando limitada aos crimes de homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte e crimes hediondos, como o estupro.

Ressalta-se ainda, que a redução da maioridade penal tem sido um assunto bastante discutido entre os legisladores, juristas e principalmente, entre a população. Assunto este que gera polêmica e uma divergência enorme de posicionamento sejam eles favoráveis ou não acerca da PEC 171.

 Embora não seja o posicionado adotado para a elaboração do presente parecer, o entendimento favorável adotado por parte dos juristas e da população entende que se um jovem de 16 anos pode votar, assumir responsabilidades civis, também tem o discernimento necessário para responder penalmente pelos seus atos.

Há de se falar ainda, que possuindo esse discernimento, a falta de uma punição mais gravosa, gera mais violência, isto é, a certeza que não será punido, faz com que o menor sinta maior liberdade para cometimento de delitos.

Muito se fala das penas brandas trazidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), uma vez que, esse estatuto não possui grande efetividade, o que traz para a sociedade a sensação de impunidade, porque se acredita que as instituições que acolhem o menor não cumprem sua principal finalidade de ressocialização, o que faz com que o menor, ao tornar-se adulto, acabe na vida da criminalidade e por fim, envolto no sistema carcerário.

Já coadunando com o entendimento que envolve esse parecer, estão os posicionamentos desfavoráveis a redução da maioridade penal de 18 anos para 16 anos, uma vez que reduzir a maioridade penal, não vai acarretar grandes mudanças na redução da violência.

Não obstante a mídia coloque a culpa da violência relacionada ao adolescente, esse fato não é verdade, uma vez que menos de 10% dos crimes são cometidos por adolescentes, sendo que dessa porcentagem aproximadamente 75% dos crimes cometidos por adolescentes são de caráter pecuniário, isto é, crimes relacionados a economia, como roubo e furto.

Entretanto, com a intensificação dos crimes cometidos por jovens e adolescentes que tem passado na mídia, realmente parece que o problema da violência está na faixa etária que não responde pelo código penal, mas sim pelo ECA.

Ainda que seja importante a criação de regras rígidas, mais importante que isto é necessário que se dê um “remédio” a sociedade como um todo e não no adolescente. É necessário que haja uma mudança na raiz do problema, e não apenas no que está superficialmente exposto. A educação é muito mais eficiente que a punição, logo, é melhor que se faça investimento na educação do menor do que investimento em mais prisões para os mesmo, uma vez que o problema da criminalidade será resolvido mais facilmente através de uma mentalidade educada de que tal conduta é errada, ou seja, melhor educar pelo amor, do que pela dor.

Há de se falar ainda, que o sistema carcerário brasileiro é um caos, há superlotação de presídio, e os mesmo são considerados uma faculdade para a criminalidade, já que o índice de reincidência dos que entram nesse sistema é enorme, cerca de 70% dos presos ao serem reinseridos na sociedade, voltam a praticar crimes. Entretanto, o índice de reincidência entre jovens internos da fundação Casa é de apenas 16%, assim, resta claro, que inserir jovens e adolescentes no sistema carcerário brasileiro não vai diminuir a criminalidade, podendo, todavia, aumentar, uma vez que o índice de reincidência entre os presos são alarmantes.

Coadunando com esse pensamento, tem-se que o jovem e adolescente ainda estão em fase de formação psicológica, ou seja, a influência que sofrerão em meio ao sistema carcerário será de maior valor para a sua formação como pessoa, adquirindo desta maneira, características das pessoas com quem convive, ou seja, afundando-se cada vez mais no mundo caótico da criminalidade.

O ECA, é um dos melhores estatutos no que tange a proteção da criança e do adolescente, faltando para tanto meios que tornem possível sua aplicação e efetividade.

Ante o exposto, resta claro, que a solução da redução da violência, não está ligada a redução da maioridade penal, mas em um investimento governamental, na educação das crianças e dos jovens. Além do que, toda a problemática envolvendo a criminalidade brasileira está ligada a diferença social, onde aqueles que não possuem educação de qualidade estão mais suscetíveis à vida criminosa.

Acerca da redução da maioridade penal questiona-se ainda a constitucionalidade dessa redução, uma vez que entende-se que o disposto no artigo 228 da Constituição Federal é um cláusula Pétrea, o que de imediato impossibilitaria essa redução, por se tratar de uma norma de natureza imutável.

Assim, além de todo ponto negativo explanado, a redução da maioridade penal é inconstitucional, consoante o estabelecido no artigo 60, parágrafo 4º, Inciso IV, da Constituição Federal, que aponta que direitos e garantias individuais não podem ser objeto de deliberação de emenda constitucional. Desta forma, o artigo 228, da CF que constitui que são inimputáveis os menores de 18 anos, trata-se de um direito e garantia individual, sendo desta forma cláusula pétrea e imutável.

Destarte, o disposto no artigo 228, CF não esteja contido no artigo 5º da carta magna, trata-se de uma garantia assegurada constitucionalmente, já que o parágrafo segundo do artigo 5º, aponta que os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

Conjugando o referido parágrafo e o artigo 228, CF pode-se entender que não há um esgotamento dos direitos e garantias individuais, ao contrário, os direitos e garantias podem estar além da carta magna, portanto, é perfeitamente possível considerar a imutabilidade do artigo 228, cf.

Diante do exposto, resta comprovada que a inimputabilidade penal compreende norma pétrea, por se manifestar como garantia da pessoa menor de 18 anos, portanto, no Brasil, a maioridade penal somente poderá ser alterada se criada uma nova Constituição, todavia, se aceita a PEC 171, cairia por terra toda a sua validade, tornando possível, que seja alterada por emenda constitucional a qualquer tempo, o que geraria uma instabilidade e perda da segurança jurídica.

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CONCLUSÃO

Em face ao exposto, OPINO PELA NÃO REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL.

Melhor que reduzir a maioridade penal, seria a aplicação de um outro projeto que também esta tramitando no congresso, o PL nº 1895/2011, de autoria do Deputado Alexandre Leite, o qual não prevê alteração constitucional, mas somente a mudança no ECA para aumentar a internação máxima de três.

Este projeto propõe a aplicação excepcional do Estatuto da Criança e do Adolescente, nos casos expressos em lei, estabelecendo exceções ao período máximo de internação de 3 anos (previsto no ECA), nos seguintes casos:

- Se o adolescente praticar ato infracional com emprego de violência ou grave ameaça, o período de internação será de três anos, findo o qual haverá reavaliação, pelo juiz competente, o qual autorizará a sua liberação, ou o encaminhamento para o regime de semiliberdade ou de liberdade assistida.

- Se o adolescente realizar pluralidade de atos infracionais com violência ou grave ameaça, o período de internação de três anos será por cada ato infracional cometido.           

- Se do ato infracional, com emprego de violência ou grave ameaça, resultar morte ou lesão corporal de natureza grave, o período de internação será seis anos, findo o qual haverá reavaliação, pelo juiz competente, que autorizará a sua liberação, ou o encaminhamento para o regime de semiliberdade ou de liberdade assistida.

Medidas como essas diminuiria o anseio da sociedade que tem uma resposta de punição para os crimes de acordo com a periculosidade e reincidiva do menor. Mas também respeitando a Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU, de 1989, a qual o Brasil ratificou, e, que define como crianças, genericamente, todas as pessoas com menos de 18 anos de idade e estabelece que devem receber tratamento especial e totalmente diferenciado dos adultos, principalmente nos casos de envolvimento criminal.

Não podemos esquecer que o ECA utiliza o termo “medidas socioeducativas”, isso não retira o caráter punitivo de sua aplicação. Tratando-se apenas de nomenclatura adotada pelo legislador para diferenciar as espécies de punição aplicadas no sistema penal de adolescentes daquelas do sistema penal de adultos. Portanto, em ambos o caráter penal estaria presente.

No entanto, aumentar as medidas punitivas definitivamente não solucionam a problemática da onda de violência e insegurança que estamos vivendo em nosso país. Cabe ao governo criar medidas que se preocupem em dar soluções “macro”, que visem melhorar a sociedade como um todo, com programas para a educação e ações sociais, alicerçando a família, base constitutiva da sociedade. As alterações no âmbito penal, que no tocante do Direito deveria ser a “ultima Ratio”, somente leva a sociedade a uma falsa sensação de segurança social.

         Assim sendo, reiteramos a posição contrária à redução da maioridade penal, inclusive reforçamos que um dos principais fatores agravantes para delinquência de adolescentes é a falta de escolarização adequada. É dever de todos, promover a reintegração desses jovens à sociedade, com as medidas socioeducativas adequadas e propiciando os meios necessários para a ressocialização.

É O PARECER, S.M.J.

Local, data.

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Advogado – OAB-BA

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Sobre os autores
Elaine Suniga Garrido Bertacco

Estudante do 7º semestre do curso de Direito da Faculdade de Ilhéus - CESUPI.

Taiana Levinne Carneiro Cordeiro

Advogada criminalista, professora de penal e processo penal da faculdade de Ilhéus/BA, professora de cursinho preparatório para concurso, especialista em processo penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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