EXCELENTISSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE ALÇADA DO ESTADO DO PARANÁ :
, já qualificado nos Autos de Apelação Cível 106.002-0 e de Embargos de Declaração 106.002-0/01 que trâmitou perante a Colenda Quinta Câmara Cível , vem pôr intermédio do seu advogado e procurador nos autos, em tempo hábil , interpor o presente RECURSO EXTRAORDINÁRIO (simultaneamente com o RECURSO ESPECIAL), na forma das RAZÕES ANEXAS, que ficam fazendo parte integrante e inseparável desta petição.Termos em que, requer com fundamento no princípio da isonomia constitucional (Art. 5, caput, 1 parte; STF, RTJ 119/465) e no dever de prestação jurisdicional (Art. 5, XXXV da CF/88; STF RTJ 99/794, item III) que uma vez exaurido o prazo das CONTRA-RAZÕES, seja exercido o juízo de Admissibilidade e que seja DEFERIDO PROCESSAMENTO E ENVIO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO, que se encontra alinhado com farta jurisprudência uniforme em favor da RECORRENTE para o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
TERMOS EM QUE PEDE E ESPERA DEFERIMENTO
Curitiba, 02 de Junho de 1998
EXCELENTISSIMO MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL RECURSO EXTRAORDINÁRIO
REF. APELAÇÃO CIVEL N. 106.002-0
RECORRENTE: EDSON D´ AQUINO SILVA
RECORRIDA : BANCO ECONÔMICO S. A.
EXCELENTISSIMO MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
COLENDA TURMA JULGADORA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
EDSON D´AQUINO SILVA, já qualificado nos Autos de Apelação Cível 106.002-0 e de Embargos de Declaração 106.002-0/01 que trâmitou perante a Colenda Quinta Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado do Paraná , vem pôr intermédio do seu advogado e procurador nos autos, em tempo hábil , interpor o presente
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Pelo inconformismo contra a decisão do MM. Colegiado da
Quinta Câmara Cível do Tribunal de Alçada
do Estado do Paraná que se posicionou favorável
a penhorabilidade do bem de família e contrária
à Limitação Constitucional de Juros e com
supedâneo no Artigo 102, inciso III e alínea a da
Constituição Federal, visando assim a reforma da
decisão o que faz pelos fatos e fundamentos jurídicos
a seguir expendidos :
I - EXPOSIÇÃO FÁCTICA
é um empresário
do Ramo de Distribuição de Perfumes e Cosméticos
na Cidade de Curitiba e atua no presente processo na qualidade
de avalista da DISTRIBUIDORA DE PERFUMES E COSMÉTICOS
SILVA LTDA, que exerce uma atividade econômica lícita,
contribuindo para o desenvolvimento econômico e social da
sua cidade.
02. Em função dos Planos de Estabilização Econômica, foi obrigado em data de 20 de Julho de 1995 a firmar um Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente, com limite para cobertura de cheques sem suficiente provisão de fundos até R$ 5.000,00 (Cinco Mil Reais) e que em função de alguns pequenos percalços financeiros, ultrapassou pôr algumas oportunidades o limite estipulado, pagando uma taxa de juros na ordem mensal de até 14,00% , conforme ficou bem demonstrado em todo o devido processo judicial.
03. Entretanto, com os avanços generalizados dos juros e que cumulados com indexadores do extinto BANCO ECONÔMICO, enfrentou uma situação semelhante à Quarenta Milhões de Brasileiros, que era a inadimplência no uso do cheque especial. Diante desta situação e principalmente pela dificuldade em obter uma Renegociação, pois o BANCO RECORRIDO encontrava-se em liquidação extrajudicial, veio em data de 31 de Janeiro de 1996 propor a presente medida executória.
04 . Diante disto, o MM. Juiz de Direito da 20 Vara Cível da Capital Dr. JOSÉ JOAQUIM GUIMARÃES DA COSTA em despacho inicial, mandou citar a Distribuidora e o seu Sócio Gerente o qual veio a ofertar alguns bens à penhora, o que foi refutado pelo Banco, que gananciosamente indicou à penhora o único bem da família, residencial próprio do casal ,adquirido pela importância de R$ 314.547,00, com pagamento à construtora de R$ 134.547,00 e que encontrava-se hipotecado desde 01 de Fevereiro de 1996 junto ao Itaú .
05. Entretanto o MM. Juiz de Direito acatou o abusivo pedido do Banco e ficou pôr formalizado a penhora do bem residencial. Lavrado o Auto de Penhora com a assinatura dos dois ofíciais e tendo como depositário o ora Apelante. Sem qualquer tipo de anuência ou a notificação da esposa do ora RECORRENTE, foi formalizado o ato processual. Posteriormente o RECORRENTE propôs os Embargos à Execução, recebido pelo MM. Juiz de Direito e impugnado pelo Banco. Sem a devida perícia dos valores que pudessem comprovar o excesso da execução, foram julgados improcedentes os embargos e mantido a penhora sobre o bem hipotecado.
06. Tempestivamente e após a sentença que julgou IMPROCEDENTES OS EMBARGOS , ingressou com o Recurso de Apelação que foi distribuído a Colenda Quinta Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado do Paraná. Manejada o RECURSO DE APELAÇÃO, foi apresentado os MEMORIAIS, com substanciosas razões e farta jurisprudência do TRIBUNAL DE ALÇADA CÍVEL DO RIO GRANDE DO SUL, DE SÃO PAULO, DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL .
07. Entretanto, veio a mesma ser improvida pelo v. acórdão, com alheamento total a essa jurisprudência e às relevantes razões de defesa e que ensejou o RECURSO ESPECIAL e agora o RECURSO EXTRAORDINÁRIO. A decisão se deu com o seguinte teor jurídico:
APELAÇÃO CÍVEL N. 106.002-0 CURITIBA
APELANTE: EDSON D´AQUINO SILVA
APELADO: BANCO ECONÔMICO S.A.
RELATOR : JUIZ CONV. ANTONIO MARTELOZO
EMBARGOS À EXECUÇÃO -
EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL -
CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE -
SUBSCRIÇÃO PÔR DUAS TESTEMUNHAS -
CRÉDITO EXIGÍVEL, LÍQUIDO E CERTO
- JUROS E ENCARGOS PACTUADOS, DEVIDOS DEMANDA INCIDENTAL IMPROCEDENTE
- APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. É título executivo extrajudicial o contrato de abertura de crédito em conta corrente, contendo a assinatura de duas testemunhas, acompanhado de extratos bancários.
2. Juros e encargos são devidos, desde que pactuados; quanto aos primeiros, ainda que acima da limitação constitucional, prevista no Artigo 193 parag. 3 da CF.
(ACÓRDÃO N. 7364 - QUINTA CÂMARA CÍVEL TAPR)
08. Posteriormente após a publicação do v. acórdão , foi interposto o RECURSO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO , novamente com a anexação de farta jurisprudência e com um parecer da Procuradoria contrária a decisão, mas o RECURSO obteve o seguinte pronunciamento de ordem judicial:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO N. 106.002-0/01
EMBARGANTE: EDSON D´AQUINO SILVA
EMBARGADO: BANCO ECONÔMICO S.A.
RELATOR : JUIZ CONV. ANTONIO MARTELOZZO
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO, OMISSÃO - INOCORRÊNCIA - CARÁTER INFRINGENTE - INADMISSIBILIDADE - REJEIÇÃO.
Não incidindo na espécie, obscuridade, contradição e omissão no v. acórdão hostilizado e, também, não se registrando manifesto erro de julgamento, quer material ou de fato, rejeitam-se os EMBARGOS DE DECLARAÇÃO que hajam opostos
(ACÓRDÃO N. 7631 - QUINTA CÂMARA CÍVEL TAPR)
09. Finalmente, queremos aduzir que os
dispositivos invocados no presente RECURSO foram prequestionados
de forma explícita na APELAÇÃO E NOS EMBARGOS
DE DECLARAÇÃO , estando assim cumpridas as exigências
das Súmulas 282 e 356 do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
II- DO CABIMENTO JURÍDICO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO - ARTIGO 102, III, A CF tem o seu cabimento placitado pelo Artigo 102, inciso III alínea "a" da Constituição Federal, tendo sido contrariados os dispositivos do Direito Constitucional, a seguir elencados com a demonstração em que consistiu essa contrariedade :
RECURSO EXTRAORDINÁRIO PELA ALÍNEA
"A"
É
pacífica a jurisprudência de diversos Tribunais sobre
a Limitação Constitucional dos Juros no patamar
anual de 12%, pôr tratar-se de norma auto aplicabilidade
imediata, em função da própria omissão
do Congresso Nacional na promulgação da Lei Complementar.
2) OFENSA DO V. ACÓRDÃO AOS DISPOSITIVOS
CONTIDO NO DECRETO 22626/33 - LEI DE USURA, SÚMULA 121
DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL e ARTIGO 1062 DO CÓDIGO CIVIL
BRASILEIRO :A Contrariedade aos dispositivos acima descritos
se deu e com a comprovação técnica que o
RECORRIDO cumulou valores indevidamente como a correção
monetária, comissão de permanência , multas
, honorários e os juros. Com relação a questão
dos juros, ficou devidamente demonstrado que excederam a teto
constitucional de 12 % ao ano, ou ao disposto no Artigo 1062 do
CCB ou a própria Lei de Usura.
III - RAZÕES DE REFORMA DO ACORDÃO
se funda ainda nos seguintes temas e que serão objetos
das RAZÕES e como os pressupostos de admissibilidade:
- A matéria que fundamenta este RECURSO é
constitucional pura e as ofensas à Constituição
Federal são diretas e frontais;
- Foi cumprido o requisito do prequestionamento de todas as
questões ou matérias constitucionais;
- Sendo a matéria de transcendental relevância,
a nível de interesse nacional, o RECURSO deve subir
para melhor exame e interpretação dos dispositivos
constitucionais que ele invoca, decisão essa que é
a competência exclusiva do Guardião da Constituição
Federal, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL DOS JUROS
LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL DOS JUROS
14. Devemos inicialmente lembrar que a norma constitucional contida no parágrafo 3 do Artigo 192 da Constituição Federal é clara ,de plena eficácia e de autoaplicabilidade imediata e com o seguinte teor constitucional que limita os juros: As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze pôr cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar.(Constituição da República Federativa do Brasil; Artigo 192, §3º.)
15. Sendo a taxa anual máxima de juros, prevista na lei constitucional acima descrita e que deve ser observada primordialmente pela esfera do Poder Judiciário, pois trata-se de norma constitucional de eficácia jurídica plena, aplicabilidade imediata. No tocante ao teor jurídico do v. acórdão ele deveria obedecer ao limite constitucional de juros.
16. Logo, a soma dos juros pactuados e outras verbas remuneratórias, incluindo o que exceder à correção monetária na comissão de permanência, não poderia superar a casa dos doze pôr cento ao ano, nos exatos termos da norma constitucional sub examine, principalmente após a omissão legislativa na criação da lei complementar .
1 - CONCEPÇÕES DE ORDEM LEGISLATIVA SOBRE OS JUROS
em que o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL firmou a posição de que os juros constitucionais dependiam de regulamentação por lei ordinária (ADIn n.º 4), a Constituição estava em vigor há pouco tempo.18. Poderia ser plausível, à época, que o Congresso fosse regulamentar o dispositivo constitucional em curto espaço de tempo. Todavia, tal não somente não ocorreu, como também quando, sete anos depois, o Senado Federal buscou tal regulamentação, o Governo Federal conseguiu refrear tal iniciativa na Câmara de Deputados. Assim, é patente que regulamentação nunca será feita. Destarte, ou se dá eficácia ao dispositivo constitucional, através do Judiciário, ou se terá um caso manifesto em que a omissão do legislador ordinário (poder constituído) vale mais do que a afirmação clara do poder constituinte.
19. A esse respeito, importante a leitura do instigante texto do eminentíssimo constitucionalista português, JOSÉ JOAQUIM CANOTILHO, intitulado:
"Tomemos a sério o
silêncio dos poderes públicos -
o direito à emanação de normas
jurídicas e a proteção judicial
contra as omissões normativas"
(incluído na obra coletiva "As garantias do cidadão na Justiça". Pelo Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira - Saraiva, 1993, págs. 351 e seguintes).
20. Diante da omissão do CONGRESSO NACIONAL na elaboração da lei complementar, os tribunais de todo o País firmaram a jurisprudência da autoaplicabilidade da norma constitucional limitadora dos juros. Diante disto, alguns DEPUTADOS e SENADORES começaram a se manifestar a respeito do assunto e pugnando pela aplicação da norma constitucional.
21. Devemos expor que o DEPUTADO FEDERAL VIVALDO BARBOSA teve uma manifestação importante a respeito do assunto: SR. PRESIDENTE DO CONGRESSO NACIONAL
"ESTÁ CRISTALINO NO PARAG. 3 QUE AS TAXAS DE JUROS REAIS NÃO PODERÃO SER SUPERIORES A 12% AO ANO. QUALQUER COBRANÇA SUPERIOR A 12% SERÁ CONTRA O TEXTO CONSTITUCIONAL... O PARÁG. 3 TEM REDAÇÃO CRISTALINA, LÍMPIDA E AUTÔNOMA DOS INCISOS E DO CAPUTA DO ARTIGO"
22. Finalmente e em sentido semelhante tivemos o pronunciamento do atual SENADOR BERNARDO CABRAL a respeito do assunto:
"A REMISSÃO, NOS TERMOS DA LE, É FEITA QUANTO AO CRIME DE USURA. O QUE SE ESTABELECE NO TEXTO PERMANENTE É QUE AS TAXAS DE JUROS NÃO PODERÃO SER SUPERIORES A 12 % AO ANO. ISTO É AUTO-APLICÁVEL, EVIDENTEMENTE"
2- CONCEPÇÕES DE ORDEM DOUTRINÁRIA SOBRE OS JUROS
:"Está previsto no parágrafo terceiro do artigo 192 que as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze pôr cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar. Este dispositivo causou muita celeuma e muita controvérsia quanto a sua aplicabilidade. Pronunciamo-nos, pela imprensa, a favor de sua aplicabilidade imediata, porque se trata de uma norma autônoma, não subordinada à lei prevista no caput do artigo.
Todo parágrafo tecnicamente bem situado (e este não está, porque contém autonomia de artigo) liga-se ao conteúdo do artigo, mas tem autonomia normativa. Veja-se, pôr exemplo, o parágrafo primeiro do mesmo artigo 192. Ele disciplina o assunto que consta dos incisos I e II do artigo, mas suas determinações, pôr si, são autônomas, pois uma vez outorgada qualquer autorização, imediatamente ela fica sujeita às limitações impostas no citado parágrafo. Se o texto em causa fosse inciso de artigo, embora com normatividade formal autônoma, ficaria na dependência do que viesse a estabelecer a lei complementar. Mas tendo sido organizado num parágrafo, com normatividade autônoma, sem ferir a qualquer previsão legal ulterior, detém eficácia plena e aplicabilidade imediata.
Juros reais os economistas e financistas sabem que são aqueles que constituem valores efetivos, e se constituem sobre toda desvalorização da moeda. Revela ganho efetivo e não simples modo de corrigir a desvalorização monetária. As cláusulas contratuais que estipularem juros superiores são nulas. A cobrança acima dos limites estabelecidos, diz o texto, será considerada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei dispuser. Neste particular, parece-nos que a velha Lei da Usura (Decreto 22.626/33) ainda está em vigor."
(Direito Constitucional Positivo, 6ª edição, Editora LRT, 1990, páginas 694 e 695)
24. Diante disto, Emérito Magistrado da Corte Suprema , sempre que se depare com taxa superior à permitida pôr lei, correção monetária mais juros de 12% ao ano impõe-se necessária redução. O fato do recorrido ser um banco não o situa em patamar superior e privilegiado, a descoberto de exigências legais, que não tiveram limitado seu campo de aplicação. Os juros compensatórios ou remuneratórios, devem ser cobrados, à razão de 12% ao ano, sendo inviável a capitalização.
25. Devemos ainda expor que são favoráveis a limitação dos juros constitucionais em 12 % ao ano os Juristas: Régis Fernandes de Oliveira (RT666/233)),Edvaldo Brito (A Constituição Brasileira, 1988, vários autores, Forense Universitária, p. 393 e segs.), Eros Roberto Grau, Sergio Gischklow Pereira, Araken de Assis ( artigo e decisões publicadas em A Luta contra a usura, Organização Fernando Gasparian, Coordenação de Roberto Fernandes de Almeida, Graal ed. p. 37 à 123), José Afonso da Silva (Curso de Direito Constitucional Positivo, RT, 5 ed., p. 692 à 693), Nagib Slaib Filho (Anotações à Constituição Federal de 1988, Forense, 1989, p. 400 à 406) e Luis Roberto Barroso (O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas.
26. Em primeiro lugar temos o estudo doutrinário do ilustre Jurista PAULO HENRIQUE MATTA MACHADO que esclarece com profundo conhecimento que:
"Reconheça-se, sobremais, que a proibição constituinte da cobrança de juros insuportáveis traduz decisão política do povo brasileiro que revoga a indecorosa legislação anterior, ao advento da Constituição, cujo resultado foi, sem sofisma o de sepultar de vez o monopólio da usura em nosso Pais, até então explorado com a cupidez pantagruélica dos banqueiros".
27. Ao mesmo sentido temos o posicionamento do antigo Parecer do Consultor da República RUY CARLOS DE BARROS MONTEIRO, esclareceu com tamanha grandeza a questão dos juros de 12 % ao ano:
"Verifica-se, com efeitos, que a historicidade legislativa do dogma da limitação dos juros reais enaltece a sua auto-aplicabilidade imediata, imprimindo-lhe a natureza self executing rule. Ao estabelecer a vedação da cobrança de taxas de juros reais além do limite anual de 12% nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, a Constituição Brasileira disse tudo o que deveria ser dito:
Determinou, em frase tão abrangente quando destituído de ressalvas, que tudo o que sobejar ao indice inflacionário e aos tributos incidentes nas operações de financiamento e de mútuo de dinheiro constitui juros reais"
28. O maior Jurista Brasileiro , RUY BARBOSA , transcreveu a respeito da questão da auto-aplicabilidade das normas constitucionais:
"Entre os textos constitucionais executáveis sem o concurso de legislação , aplicativa sobressaem os de caráter proibitório.
"It is the prevailing doctrine, though there is contrary authority, that prohibitory constitucional provisions are self- executing (6 Americ and Engl. Encycl. Of law 912 b)
"All negative or prohibitive provisions in a constitution are self executing "
(Law v. People 87 Illinois, 385 Cooley Constitucional Limit. P. 120 not. 5)
"É que a norma proibitiva encerra em si mesma tudo quanto se há mister, para que desde logo se torne obrigatória a proibição, embora a sanção contra o ato, que a violar, ainda, não esteja definida".
29. Outro posicionamento jurídico favorável a aplicação da norma constitucional foi do jurista CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO (in Eficácia das Normas Constitucionais Sobre Justiça Social, RDP 57-58/233) :
"O critério classificador da eficácia é a consistência e amplitude dos direitos imediatamente resultantes para os indivíduos"
30. Finalmente devemos observar os pronunciamentos das maiores autoridades doutrinárias a respeito do assunto. Primeiramente temos a posição do JUIZ FEDERAL HUGO DE BRITO MACHADO:
JUIZ FEDERAL HUGO DE BRITO MACHADO
"Do ponto de vista jurídico , portanto, nada impede a aplicação da norma contida no par. 3 do Artigo 192 , da vigente Constituição. Também do ponto de vista econômico não nos parece inviável o limite constitucional em foco. O sistema financeiro paga aos aplicadores em cadernetas de poupança apenas 6 % de juros.
Tem-se, portanto, que o titular do capital está recebendo apenas a metade do rendimento situado no referido limite. Seria absurdo sustentar que intermediário entre o proprietário do capital e os que o utilizam nas atividades produtivas tem direito a remuneração duas vezes maior, pela simples intermediação.
Por tudo isto, concluímos que a proibição , contido no par. 3 do Art. 192 , da vigente Constituição, da cobrança de juros reais superiores a 12% ao ano é norma jurídica vigente e auto-aplicável. Assim, qualquer pessoa prejudicada pelas condutas violadoras dessa norma pode utilizar os instrumentos processuais que a ordem jurídica lhes assegura, para fazer valer o direito de não pagar juros superiores ao citado limite".
(Repertório IOB Jurisprudência 2/89 - 1/1839)
31. Neste mesmo sentido se manifestou o Professor JOSÉ AFONSO DA SILVA:
"Pronunciamo-nos, pela imprensa a favor da aplicabilidade imediata, do artigo 192 parag. 3 da Constituição Federal pôrque se trata de uma norma autônoma, não subordinada a lei prevista no caput do artigo".
(Curso de Direito Constitucional Positivo p. 692)
32. Brilhante foi o estudo do Professor e Juiz SÉRGIO GISCHOKOW, defendido como a TESE DO VIII ENCONTRO DOS TRIBUNAIS DE ALÇADA:
PROFESSOR E JUIZ SERGIO GISCHKOW
TESE VIII ENCONTRO TRIBUNAIS DE ALÇADA
"A limitação constitucional da taxa de juros é aplicável de imediato. Entende-se pôr juro real o juro nominal defla-cionado, ou seja, o juro excedente à taxa inflacionária. No juro real incluem-se os administrativos e operacionais, as contribuições sociais (Finsocial, Pis e Pasep) e os tributos devidos pela instituição financeira. Está proibido o juro composto. "
33. Em profundo estudo acerca do tema, tivemos o PARECER JURÍDICO DO JURISTA RÉGIS FERNANDES DE OLIVEIRA:
JURISTA RÉGIS FERNANDES DE OLIVEIRA
"Percebe-se, claramente, que a norma constitucional gerou um direito exercitável no círculo do sistema financeiro, criador de uma limitação. Esta ela plenamente delimitada no corpo da norma constitucional, independentemente de qualquer lei ou norma jurídica posterior. Bem, se vê que as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referida à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze pôr cento ao ano.
Desfrute de tal limitação constitucional àqueles que lidam no mercado financeiro é imediato. A limitação aos que operam no sistema, emprestando dinheiro é imediata. Do direito de um nasce a obrigação do outro. A relação jurídica intersubjetiva que se instaura gera a perspectiva do imediato desfrute da limitação imposta."
(Taxas de Juros, Aplicabilidade Imediata, 312)
34. No informativo ADV Semanal 46/502, o eminente Magistrado NAGIB SLAIB FILHO afirmou com procedência:
"Na exegese do mencionado Artigo 192 deve ser observado que a exigência de lei complementar, contida no caput do dispositivo, não implica em diminuição da aplicabilidade da norma contida no parág. 3, estabelecedor do limite máximo da taxa de juros"
35. Finalmente, acerca do assunto, mister o pronunciamento do Jurista J. C. BARBOSA MOREIRA que se definiu acerca da limitação dos juros:
JURISTA J. C . BARBOSA MOREIRA
"As normas constitucionais são, de regra, auto-aplicáveis, vale dizer, são de eficácia plena e de aplicabilidade imediata. A orientação doutrinária moderna é no sentido de reconhecer eficácia plena e aplicabilidade imediata à maioria das normas constitucionais, mesmo a grande parte daqueles sócio-ideológicas, as quais até bem recentemente não passavam de princípios programáticos
É o caso da ´taxa de juros reais´ inscrita no § 3º do art. 192 da Constituição, que tem conceito jurídico indeterminado, e que, por isso mesmo, deve o juiz concretizar-lhe o conceito, que isto constitui característica da função constitucional : " todo conceito jurídico indeterminado é passível de concretização pelo juiz, como é o conceito de bons costumes, como é o conceito de ordem pública e tantos outros com os quais estamos habituados a lidar em nossa tarefa cotidiana´
(J. C. Barbosa Moreira, RTJ 147/816-817).
36. A resistência à observação imediata de dispositivos constitucionais tem sido objeto de inúmeros trabalhos, e não é fato singular ao sistema brasileiro. Luiz Roberto Barroso, em primoroso estudo sobre "O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas" (Renovar, Rio de Janeiro, 1990), entre os casos de inoperância das normas constitucionais aponta justamente :
´aquele em que as disposições constitucionais deixam de ser cumpridas por resistência dos setores econômicos e politicamente influentes´ (ob. Cit., p. 191).
´Os agrupamentos conservados sofrem aparente derrota quando da elaboração legislativa, mas impedem, na prática, no jogo político do poder e da influência, a consecução dos avanços sociais´
37. Também procedência não merece a tese da insuficiência dos elementos normativos que compõem a regra (outros dos fundamentos, aliás, encontrável em famoso parecer, encomendado à Procuradoria Geral da República, publicado no dia seguinte à promulgação da Constituição Federal; e que mereceu resposta no mencionado estudo de Barroso, aqui utilizado francamente. Ensina esse autor:
´O conceito de juros não é controvertido. Trata-se de rendimento do capital, em cujo conteúdo se integram duas idéias: a de remuneração pelo uso da quantia pelo devedor e a de cobertura do risco que sofre o credor. Devem ser considerados juros reais tudo aquilo que exceder a inflação e for pago a título compensatório ou moratório, excetuadas as multas moratórias (Ob. cit., p. 195).
´Até o advento da Constituição de 1988, a questão da taxa de juros sujeitava-se a regime dúplice. Era vedada a todas as pessoas a estipulação m contrato de juros superiores a 12% (doze por cento), por força do Decreto 22.626/33, que, todavia, não se aplicava às instituições do Sistema Financeiro. Agora, sob a nova ordem constitucional, cuida-se tão-somente de fazer aplicar a todos, inclusive aos bancos e instituições afins, as regras que já vigoravam há muitas décadas para quase todos. Juridicamente não há qualquer dificuldade nisso, muito embora, deve-se reconhecer, não tenham faltado pareceristas procurando criá-las .
38. MAURO CAPPELLETTI já havia dito, em obra clássica que:
A Constituição pretende ser, no direito moderno, uma forma legalista de superar o legalismo, um retorno ao jusnaturalismo, com os instrumentos do positivismo jurídico. (...) A norma constitucional, sendo também uma norma positiva, traz em si, uma reaproximação do direito à justiça. Na concepção moderna, a norma constitucional outra coisa não é senão a tentativa de transformar em direito escrito os supremos valores´
(in "O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado", FABRIS, Porto Alegre, 1984, páginas 129 e 130)
3- CONCEPÇÕES ATUAIS DE ORDEM DOUTRINÁRIA SOBRE A LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL DOS JUROS REAIS
a respeito dos juros, tivemos o seguinte pronunciamento: LIMITE CONSTITUCIONAL.Sobre este tema também revejo o posicionamento, visto que antes acompanhava a orientação do Egrégio Supremo Tribunal Federal.
A taxa anual máxima de juros, prevista no art. 192, § 3º, da Constituição Federal, deve ser observada independentemente da expedição de normatividade integradora, pois se cuida de norma constitucional de eficácia jurídica plena, aplicabilidade imediata, em que pese o respeitoso entendimento da Augusta Corte, guardiã maior do direito constitucional, que, entretanto, não tem efeito vinculante.
Prefiro o conceito singelo do direito civil, e justo, principalmente diante do teor do § 3º supra, aos complexos do direito econômico, de modo que considero juros reais toda e qualquer remuneração do mútuo. A correção monetária não é pena nem rendimento, ou modalidade de encargo, mas o próprio capital. De modo que não constitui verba remuneratória.
A comissão de permanência tem natureza mista. Segundo entendimento pretoriano predominante funciona como substitututiva da correção monetária, inadmitindo-se cumulação das duas verbas, a se inferir, desse raciocínio, que é composta de fator recompositivo do poder adquisitivo da moeda, corroído em virtude do processo inflacionário, e de fator remunetário, no que sobejar. A comissão de permanência, no mais, é tida como quantia compensatória pelo atraso no pagamento do débito vencido, consoante prevê a Res. BCB nº 1.129, de 15.05.86, itens I e II.
Logo, a soma dos juros pactuados a outras verbas remuneratórias, incluindo o que exceder à correção monetária na comissão de permanência, não pode superar a casa dos doze por cento ao ano, nos exatos termos da norma constitucional sub examine.
Tal dispositivo constitucional preceitua: "As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar" (grifei).
Ainda na RT supra, a seguinte ementa: "O limite constitucional dos juros, sendo auto-aplicável a norma do art. 192, § 3º, da CF, alcança todas as transações de realização de crédito bancário. Norma que não se restringe às relações envolvendo contratos de mútuo ou financiamento".
Segundo ensina, ademais disso, o Professor JOSÉ AFONSO DA SILVA, toda norma constitucional tem desde logo o efeito revogador, o que vale dizer que o ordenamento infraconstitucional preexistente que venha a colidir com a norma constitucional, de aplicabilidade imediata ou mediata, pouco importa, não encerra recepção pela Constituição, perdendo, consequentemente, a eficácia, a exemplo da legislação específica que permite às instituições financeiras a cobrança de juros acima do limite de 12% ao ano. Certo que o entendimento da Suprema Corte se funda na necessidade de a lei conceituar os juros reais, mas conforme discorri acima a própria norma constitucional estipula os elementos a inferi-los, o que desnecessitaria de regulamentação.
O Congresso Nacional, a quem incumbe a emissão da normatividade conceituadora de juros reais, necessária conforme a Suprema Corte, além do mais, está em mora, por força de mandado de injunção (MI-430/DF, DJ 18.08.95, pp. 24.893), competindo ao juiz, pois, no efetivo controle incidental da constitucionalidade de atos normativos, no caso inconstitucionalidade por omissão, dirimir concretamente o conflito de interesses posto-lhe a solução, com a edição, segundo sua cultura e consciência jurídicas, do conceito a viabilizar o direito do jurisdicionado. . "
40. Devemos outrossim, ressaltar o importante estudo doutrinário do Jurista JORGE ALCIBÍADES PERRONE DE OLIVEIRA DO TJRS :
Juros - a limitação de 12% ao ano está em vigor
Jorge Alcibíades Perrone de Oliveira
A partir do julgamento da ADIN nº4, pelo STF, pacificou-se nos tribunais superiores o entendimento de que a norma do art. 192, parágr. 3º da CF não é auto-aplicável e em conseqüência incabível a limitação das taxas de juros, enquanto não editada a lei complementar a que alude o "caput do mesmo artigo. Dessa decisão foi extraída a conclusão de que a matéria seria ainda regulada pela legislação anterior, ou seja, que a Lei 4595 atribuíra ao Conselho Monetário Nacional, via Banco Central, a tarefa de normatizar o tema, com o que ficavam as instituições financeiras fora da hipótese de incidência da Lei de Usura, que limita os juros pactuáveis a 12% ao ano.
O CMN, em face do que dispunha o art. 4º da Lei 4595, tomara a expressão "limitar" taxas de juros, por "liberar", o que foi aceito pela Súmula 596 do STF, de 1.976. Tal entendimento guardava coerência com o sistema então vigente. É notório que a Carta outorgada de 1.969 dotara o Poder Executivo de poderes extraordinários, inclusive o de legislar pelo instrumento do Decreto-Lei e pelas delegações de poderes, como a referida na Lei 4595. É sabido que tal carta teve forte inspiração na Constituição "gaullista", da França de 1.968, em que a pretexto de combate ao terrorismo e ao comunismo, o Executivo daquele país, então representado pela figura carismática do General Charles de Gaulle, passou a editar leis, sendo reservado o poder legiferante da Assembléia Nacional apenas para determinadas matérias. Não se pode esquecer, porém, que sendo o sistema francês um misto de Presidencialismo, o Legislativo se integra ao Executivo, na constituição do Gabinete e na escolha do Primeiro Ministro. Aqui, no entanto, o que houve foi uma simples entrega do poder de legislar ao Executivo, situação, em essência, completamente diversa... Era, assim, coerente com os tempos então vividos pelo país pós-64, a concentração enorme de poderes nas mãos do Executivo.
Entretanto, a Carta de 1.988 resgatou o Estado Democrático de Direito, com o retorno - ou melhor a efetiva implantação - da independência dos poderes (que são do Povo), estabelecida a competência de cada um. Em várias áreas do Executivo nacional, especialmente na econômica, permaneceu, todavia, a idéia de que nada mudara. A Constituição, porém, alterara sobremaneira o quadro, a começar pelo art. 22, em seus incisos VI e VII estabelecendo que é da competência da União legislar sobre o sistema monetário e de medidas e política de crédito.
Prossegue o texto, atribuindo, no art. 48, inc. XIII exclusivamente ao Congresso Nacional a competência para dispor sobre a matéria financeira, cambial e monetária, instituições financeiras e suas operações. Por fim o art. 68, em seu parágrafo 1º, proíbe a delegação de atos de competência exclusiva do Congresso Nacional.
Vista a questão por este prisma é forçoso concluir que a Constituição Federal não recepcionou e nessa medida revogou toda a legislação anterior que permitia tais delegações. Entre elas, por óbvio, inclui-se aquela do art. 4º da Lei 4595. Ou seja, após a Constituição de 1.988, não tem mais o Conselho Monetário Nacional o poder de, por ato administrativo de caráter normativo, legislar sobre matéria de competência exclusiva do Congresso Nacional. Nem se argumente que Medidas Provisórias posteriores, algumas até convertidas em lei, poderiam ter outorgado tais poderes, porque padeceriam de vício flagrante de inconstitucionalidade.
Assim, após 1.988, caso pretendesse o Executivo - leia-se o Conselho Monetário Nacional - manter a liberação das taxas de juros, deveria ter usado o meio constitucional próprio: a remessa de projeto de lei ao Congresso Nacional, único poder competente para legislar a matéria. Não o tendo feito, fez com que restando revogada a autorização legislativa, ficassem sem efeito os atos administrativos anteriores do BACEN, que havia autorizado a liberação de taxas de juros. Sem efeito tais atos, volta a ter aplicação integral o disposto na Lei de Usura, que alterou o Código Civil liberal do início do século, que enseja a usura, abortada pelo Decreto 22.626/33, que limitou os juros pactuáveis a 12% ao ano.
Embora seja um Decreto tem força de lei, até hoje, porque editado sob a sistemática resultante da Revolução de 30 e antes da reconstitucionalização do país em 1.934.
A Constituição de 1.988, em seu art. 192, parágrafo 3º, só fez repetir a limitação de 1.933. Diga-se de passagem que mesmo que venha a ser editada lei complementar não poderá esta, sob pena de inconstitucionalidade permitir taxas superiores... Se alguma dúvida havia quanto à revogação da legislação pretérita a própria CF, no Ato das Disposições Transitórias, em seu art. 25, encarregou-se de dirimi-la, revogando, expressamente, a partir de 180 dias da promulgação da Carta, todos os dispositivos legais que atribuam ou delegem a órgãos do Poder Executivo competência assinada pela Constituição ao Congresso Nacional.
Ante o evidente conflito é imperioso concluir pela revogação da legislação anterior. Essa conclusão em momento algum conflita com o decidido na ADIN nº4. Na ação direta discutia-se somente a auto-aplicabilidade do art. 192, parágrafo 3º. O ato questionado - um parecer do Consultor Geral da República aprovado pelo Presidente de então - fora exarado três dias após a promulgação da Carta, e, pois, dentro da possível vigência da legislação anterior, nos termos do art. 25 do ADCT.
Portanto, é necessário repensar a conclusão tirada da decisão do STF. Hoje afigura-se revogada toda a legislação que delegou esse enorme poder a um órgão do Executivo, poder esse que é exclusivo do Congresso Nacional. Está assim em pleno vigor a limitação das taxas de juros a 12% ao ano, prevista na Lei de Usura - Decreto 22.626/33.
Em termos constitucionais, mesmo tido como não auto-aplicável o dispositivo do art. 192, paragr. 3º da CF, isso não significava estivesse o Poder Executivo autorizado a normatizar em matéria financeira, visto perdera, por força do contido nos arts. 22, 48 e 68 da Carta de 88, a possibilidade de fazê-lo, já que do somatório dessas disposições é forçoso concluir que restou revogada a autorização legislativa constante do art. 4º, da Lei 4595.
Com isso, volta a incidir a limitação a 12% ao ano contida na chamada Lei de Usura - Dec. 22.626/33 - que nunca foi revogada e sim tida apenas como inaplicável às instituições financeiras, na interpretação do STF, consagrada na Súmula 596 de 1.976, coerente com o então vigente texto constitucional de natureza autoritária, mas hoje incompatível com a nova Carta.
O legislador constituinte, a fim de - explicar sua vontade, leia-se vontade da Nação que elegera os integrantes da assembléia nacional constituinte - reiterou no art. 25 do ADCT, que todos os atos de delegação ficavam revogados, em 180 dias.
No entanto, valendo-se de permissivo constante do citado art. 25, que permitia prorrogação por lei do aludido prazo, o Executivo apressou-se em editar uma pletora de Medidas Provisórias, convertidas em Lei, por um Congresso já sem poderes constituintes, nas quais pretendeu prorrogá-lo, ampliando, assim, seus poderes, em afronta ao texto principal da Constituição.
O périplo iniciou-se com a MP nº 45, de 31 de março de 1.989, que estendeu o prazo até 31 de abril de 1.990. Já a MP nº 100, de 24 de outubro de 1.989, alargou-o até a promulgação da lei complementar a que alude o caput do art. 192 da CF. Um mês depois, era sancionada a Lei 7.892, de 24 de novembro de 1.989, que voltava a restringir a prorrogação até 31 de maio de 1.990. No entanto, nova MP, a de nº 188, de 30 de maio de 1.990, convertida na Lei 8.056, de 28 de junho de 1.990, prorrogou-o, uma vez mais, para a data de 31 de dezembro de 1.990. A esta, seguiram-se duas outras - a Lei 8.127, de 21 de dezembro de 1.990, e a Lei 8.201, de 29 de junho de 1.991. Essa última, trazia prorrogação até 31 de dezembro de 1.991. Finalmente, em 30 de dezembro de 1.991, a Lei 8.392, de 30 de dezembro de 1.991, voltava a prorrogar o prazo "até a promulgação da lei complementar".
Com isso, dirão os defensores da tese da "liberdade de juros" que não ocorreu, até o momento, a revogação preceituada pela Constituição Federal, pois houve manifestação legislativa em sentido contrário.
Penso que se trata de raciocínio por demais simplista porque deixa de apreciar um ponto a meu sentir de extrema importância - admitir que por sucessivas prorrogações, de forma absolutamente assistemática, seja possível deixar de cumprir preceito constitucional claro, é abrir perigoso precedente num estado que se diz democrático e de direito.
Atinge-se o estado democrático, porque, por discordância unicamente econômica, deixa-se de cumprir a Lei Maior, repita-se promulgada pela Assembléia Nacional Constituinte, investida de poderes pelo povo, titular de todo o poder, a quem o eleito simplesmente representa e não substitui, como às vezes parecem pensar os eleitos em geral neste país.
Não cabe aqui discutir se a questão das taxas de juros é matéria constitucional ou não. Até penso que, do ponto de vista estritamente de teoria constitucional tradicional, não o seja. Todavia, não se pode olvidar que pelo sistema, essa matéria, queiram ou não os seus detratores, foi inserida na Carta por quem tinha poderes de representação da vontade soberana do povo, e que, pois, deve ser cumprida.
Afronta-se também o estado de direito, porque torna-se letra morta a Constituição, no sistema de poderes por ela instituído, unicamente com fundamento em permissivo constante não da CF, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que por sua natureza obviamente não se pode sobrepor à própria Constituição.
O que a Nação assiste com essa pletora de Medidas Provisórias, convertidas em lei pelo beneplácito do Congresso Nacional, é a vontade consciente do Poder Executivo, das sucessivas equipes econômicas e do próprio Sistema Financeiro de não se submeter à determinação constitucional.
O Executivo, por sua área econômica, é o maior interessado em que não haja qualquer controle nas taxas de juros, que não aquele por ele próprio exercido, justamente, porque é o grande beneficiado dessa situação.
É o governo que insiste na manutenção das mais altas taxas de juros encontráveis no planeta, numa economia supostamente estável, porque com isso controla o lançamento de seus próprios papéis no "mercado". Propositadamente a palavra está entre aspas porque mercado mesmo supõe livre concorrência e não é isso que ocorre no Brasil, onde o governo fixa as taxas de juros de seus papéis e ao mesmo tempo busca com tais taxas, impostas ao sistema, atrair capitais estrangeiros, pelo atrativo que apresentam, se comparadas com as taxas existentes no verdadeiro mercado de valores externo. Busca, assim, de um lado financiar o seu notório déficit de caixa e por outro atender às necessidades dos chamados "planos econômicos", atualmente consubstanciadas em manter a "âncora cambial", que sustenta o denominado "Plano Real".
Sem ingressar em aspectos econômicos dessas medidas, o que preocupa aos operadores do Direito é que se faça sobrepor esses interesses ao próprio sistema instituído pela Constituição - o Estado Democrático de Direito - com a regrada partição dos poderes do Estado.
Norberto Bobbio, analisando as dificuldades de implantação de uma efetiva Democracia, num país que emergiu do totalitarismo (referia-se à Itália pós-fascismo), aponta que uma delas reside em que os defensores do conservadorismo costumam se valer de expedientes dessa natureza, para deixar de fazer cumprir os preceitos Constitucionais democráticos. Afirma que após a constituição de 1.948 esse fenômeno se evidenciou na prática italiana. A fim de contornar e evitar a aplicação de certos princípios determinados pela Nação, por seus representantes, os conservadores de toda ordem buscaram na necessidade de legislação ordinária complementar - cuja edição retardavam ao máximo, ou simplesmente impediam - a desculpa para a não implantação imediata como se impunha.
É o mesmo fenômeno que aqui ocorre atualmente, a exigir do aplicador da lei uma interpretação mais atual e consentânea com a realidade. Cada vez mais nota-se que o intérprete deve se afastar das meras interpretações literais ou gramaticais, que, em geral, não levam à verdadeira vontade da lei, que é a que deve prevalecer sobre a própria vontade do legislador.
Exige-se hoje a busca da chamada interpretação sistemática do direito, ou seja os preceitos interpretados não isoladamente, mas integrados dentro de todo sistema que constitui o ordenamento jurídico do país.
É o que sustentam os modernos doutrinadores acerca da interpretação do Direito e em especial da (s) Constituição (ões). O jurista alemão Rudolf Smend, citado no Brasil por Paulo Bonavides, aponta a necessidade de um método integrativo de interpretação da Constituição, ou seja interpretá-la como um todo no seu sentido profundo, significando que se deve apreciar criticamente o conteúdo da Lei Maior, globalmente, em seus aspectos teológicos e materiais, e não mais meramente formais, como propugnava a Escola Positivista de interpretação do Direito.
A esse método se acrescentou o chamado "método de concretização", de Ehmke, Konrad Hesse e Theodor Viehweg, que busca orientações, pontos-de-vista ou critérios-chave, a serem adotados conforme a norma e o problema a ser objeto de concretização.
Unindo os dois métodos, o jurista gaúcho Juarez Freitas conceitua Sistema Jurídico como "uma rede axiológica e hierarquizada de princípios, de normas e de valores de ordem suprema, cuja função é a de, evitando ou superando antinomias axiológicas, dar cumprimento aos objetivos fundamentais do estado de direito". É o mesmo autor quem sustenta, com toda propriedade, que o intérprete deve se concentrar na busca da unidade do sistema, pela sua adequação valorativa, tendo em vista os princípios superiores que têm como objeto fundamentá-lo.
Considerando, assim, a Constituição como um todo, composto de princípios fundamentais, entre os quais avultam o da Separação dos Poderes e acima de tudo o da supremacia da própria Constituição, é forçoso concluir que não encontram respaldo no texto constitucional essas tentativas de simplesmente, deixar de cumprir o que se contém na Lei Maior, legitimamente promulgada pelos representantes do povo, este sim titular de todo poder, como se sabe.
Portanto, à luz dessa interpretação sistêmica da Constituição, é imperioso concluir-se pela revogação das delegações legislativas ao Executivo, estando, assim, em plena vigência a limitação das taxas de juros imposta pela lei de usura.
41. Portanto, encerramos este tópico com o recente estudo do SUBPROCURADOR DO MUNICÍPIO DE FOZ DO IGUAÇU FABIANO MACEDO DA COSTA BARROS a respeito dos juros e das questões financeiras:
Na maioria dos casos há excesso na execução pela ilimitação da cobrança de juros, a qual deveria respeitar o limite de 12% contido no artigo 192 § 3º da Constituição Federal, combinado com o artigo 1.062 e 1.262, ambos do Código Civil. Em comentário ao artigo 1.262 da lei civil citado, a autora Maria Helena Diniz, na obras Código Civil Anotado, ed. Saraiva, p. 775, esclarece:
O mútuo feneratício ou oneroso é permitido no nosso direito, uma vez que a lei possibilita que, por cláusula expressa, se fixem juros ao empréstimo de dinheiro ou de outras coisas fungíveis, desde que não ultrapassem a taxa de 12% ao ano, sob pena de serem restituídos por meio de condictio indebiti Dec. N. 22.626/33, artigos 1, 2 e 13, Lei n. 1.521/51, art. 2; RT, 504:198, 478:132, 474:118, 473:117 e 197:530; RF, 139:563). Está vedada a capitalização dos juros pela Lei de Usura (Dec. n. 22.626/33, súmula 121 do STF; Lex 16:171; RT 495:181; RTJ, 79:734, 72:916, 77:966, 79:620)."
A atuação precipitada dos Bancos em executar as dívidas, dá-se porque interpreta erroneamente o contido no inciso IX do art. 4º da Lei de Reforma Bancária, ou sejam limitar a taxa de juros aplicada ao mercado financeiro não se entende como autorizar o Conselho Monetário Nacional a fixar qualquer taxa, mas sim, ordenar obediência a um limite, que é o previsto na Lei de Usura. Existe a cobrança de juros sobre juros pelo Exequente, os chamados juros capitalizados permitidos às cédulas industrial e comercial por força de lei específica, vedada a cobrança de juros capitalizados em relação aos demais títulos.
SÚMULA Nº 121 : É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada A norma constitucional, além do mais, é de eficácia plena, de aplicação imediata, ou seja, aquelas que receberam do legislador constituinte normatividade suficiente para incidirem de imediato, não estando a depender de complemento legislativo para a sua aplicação.
Além de que, estaria a disposição de qualquer cidadão via Mandado de Injunção (CF, art. 5º, LXXI), ou será que algum julgador ou intérprete da lei espera que a Lei Complementar que regule tal dispositivo venha a permitir ou dispor a taxa de juros como 15% ou qualquer outro valor que não o contido na Constituição Federal? A Lei Complementar de forma alguma poderá a vir contrariar a norma constitucional, que já estabeleceu um limite, sendo este inafastável por força de qualquer outro meio legislativo, excetuando-se a Emenda à Constituição.
Mesmo o STF já tendo recentemente decidido, pela inaplicabilidade imediata do dispositivo constitucional, em nosso humilde entendimento, acreditamos na dinâmica do direito e que, caso não acreditemos na auto aplicabilidade, teremos que admitir que a força de lei é superior a força da norma constitucional, o que caracterizaria subversão na hierarquia das normas.
Em nome da função social do magistrado e na coragem do ser humano justo, que podem interceder em favor dos populares e consumidores em geral, equilibrando todo o sistema, pois modernamente, o interesse que deve prevalecer é a proteção à coletividade e não a proteção dos interesses de Instituições Financeiras que há muito sorvem o comerciante e a família brasileira.
A balança da deusa da justiça deve ser equilibrada, para fazer com que cessem os abusos da cobrança de juros bancários, pois, todos nós temos como rendimento, sob a responsabilidade das mesmas Instituições Financeiras, sob as barbas do Governo, responsável em limitar os índices de juros, juros muito menores se comparados aos que nos são cobrados por serviço prestado pelas mesmas, ceifando o poder de deliberação do mutuário e ferindo o princípio da bilateralidade contratual o que desequilibra os contratos e o mercado de uma forma geral.
4- POSICIONAMENTO PELA PROCEDÊNCIA DOS MINISTROS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA ADIN 4-7 DF SOBRE A LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL DOS JUROS REAIS
"Tenho para mim que o § 3º do artigo 192 tem em si mesmo elementos bastantes para imperar desde logo e independente de lei complementar, até porque esta, querendo ou não o legislador, não poderá deixar de ter como juro máximo 12% ao ano, incluídas nessa taxa que, aliás, não é nova entre nós, toda e qualquer comissão ou tipo de remuneração direta ou indiretamente referida à concessão do crédito. Isto porque, como é sabido, como a chamada lei de usura prescrevesse como limite máximo a taxa de juros de 12%, instituições financeiras, sob a pressão do fenômeno inflacionário, passaram a cobrar outras taxas sob rótulos distintos.
Ora o parag. 3 do Artigo 192 ao dizer que os juros reais não excederão a taxa de 12 % ao ano e que a eles não se somarão comissões de nenhuma natureza, direta ou indiretamente, relacionadas com a concessão do crédito, disse tudo que era necessário para a sua cabal e imediata aplicação, independente de lei ordinária ou complementar.
Vale dizer que, limitando a Constituição a taxa de juros reais em 12% ao ano, não podem eles ser cobrados à taxa de 12 % ao mês, seja qual for o entendimento que se dê à norma do parag. 3 do art. 192, programática, de eficácia plena.
Querendo ou não querendo o legislador ele não poderá autorizar a cobrança de qualquer remuneração seja a que título for, direta ou indiretamente ligada à concessão de crédito, além do juro, juro este que será de até 12% e em caso algum superior a essa taxa."
(Voto do Ministro Paulo Brossard, ADI 004-DF; RTJ 147/830 -- grifo nosso)
43. Mesmo posicionamento foi o importante MINISTRO CARLOS VELLOSO a respeito da limitação dos juros:
MINISTRO CARLOS VELLOSO
"O § 3º do artigo 192 da Constituição, Senhor Presidente, contém, sem dúvida, uma vedação. E contém, de outro lado, um direito ou, noutras palavras, ele confere também um direito, um direito aos que operam no mercado financeiro. Em trabalho doutrinário que escreveu sobre a taxa de juros do § 3º do artigo 192 da Constituição, lecionou o Desembargador Régis Fernandes de Oliveira:
´Percebe-se, claramente, que a norma constitucional gerou um direito exercitável no círculo do sistema financeiro, criador de uma limitação. Está ela plenamente delimitada no corpo da norma constitucional, independentemente de qualquer lei ou norma jurídica posterior. As normas constitucionais são, de regra, auto-aplicáveis, vale dizer, são de eficácia plena e aplicabilidade imediata. Já foi o tempo em que predominava a doutrina no sentido de que seriam excepcionais as normas constitucionais que seriam, pôr si mesmas, executórias.
Nós sabemos, Sr. Presidente, que as taxas de juros que estão sendo praticadas, hoje, no Brasil, são taxas que nenhum empresário é capaz de suportar. Nós sabemos que o fenômeno que se denomina, pitorescamente, de ciranda financeira, é que é a tônica, hoje, do mercado financeiro, engordando os lucros dos que emprestam dinheiro e empobrecendo a força do trabalho e do capital produtivo.
Tudo isso eu devo considerar e considero, Sr. Presidente, quando sou chamado, como juiz da Corte Constitucional, a dizer o que é a Constituição. Também esses elementos , Sr. Presidente, levam-se interpretando o parag. 3 do Artigo 192 da Constituição de 1988, a emprestar-lhe aplicabilidade e eficácia plena. Bem se vê que as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze pôr cento ao ano... Segue a redação após o ponto-e-vírgula estabelecendo que o descumprimento do preceito será estabelecido em lei (ordinária, porque definidora de infração penal).
O desfrute de tal limitação constitucional àqueles que lidam no mercado financeiro (qualquer do povo) é imediato, a limitação aos que operam no sistema emprestando dinheiro é imediata. Do direito de um nasce a obrigação do outro. A relação jurídica intersubjetiva que se instaura gera a perspectiva do imediato desfrute da limitação imposta.´ (Régis Fernandes de Oliveira. Taxa de Juros, inédito.)
Contém, já falamos, o citado § 3º do artigo 192 da Constituição uma vedação: ´as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze pôr cento ao ano´. Porque ela é uma norma proibitória ou vedatória, ela é de eficácia plena e aplicabilidade imediata, ou é ela uma norma auto-aplicável.
E porque confere ela, também, um direito aos que operam no mercado financeiro, também pôr isso a citada norma é de eficácia plena. Não me refiro, evidentemente, à segunda parte do § 3º do artigo 192, que sujeita a cobrança acima do limite a sanções penais, porque esse dispositivo não precisa ser trazido ao debate.As normas constitucionais são, de regra, auto-aplicáveis, vale dizer, são de eficácia plena e aplicabilidade imediata. Já foi o tempo em que predominava a doutrina no sentido de que seriam excepcionais as normas constitucionais que seriam, pôr si mesmas, executórias.
Leciona José Afonso da Silva que ´hoje prevalece entendimento diverso. A orientação doutrinária moderna e no sentido de reconhecer eficácia plena e aplicabilidade imediata à maioria das normas constitucionais, mesmo a grande parte daquelas de caráter sócio-ideológicas, as quais até bem recentemente não passavam de princípios programáticos. Torna-se cada vez mais concreta a outorga dos direitos e garantias sociais das constituições.´ (José Afonso da Silva, obra citada, página 76).Nem poderia ser de outra forma.
É que o legislador constituinte não depende do legislador ordinário. Este é que depende daquele. Então, o que deve o intérprete fazer, diante de um texto constitucional de duvidosa auto-aplicabilidade, é verificar se lhe é possível, mediante os processos de integração, integrar a norma à ordem jurídica. Esses métodos ou processos de integração são conhecidos: a analogia, que consiste na aplicação a um caso não previsto pôr norma jurídica uma norma prevista para hipótese distinta, porém semelhante à hipótese não contemplada; o costume; os princípios gerais de direito e o juízo de eqüidade, que se distingue da jurisdição de eqüidade.
De outro lado, pode ocorrer que uma norma constitucional se refira a instituto de conceito jurídico indeterminado. Isto tornaria inaplicável a norma constitucional? Não.
É que a norma dependeria, apenas, de ´interpretação capaz de precisar e concretizar o sentido de conceitos jurídicos indeterminados´, interpretação que daria à norma ´sentido operante, atuante´, ensina o professor e Desembargador José Carlos Barbosa Moreira, com sua peculiar acuidade jurídica (José Carlos Barbosa Moreira, Mandado de Injunção, in Estudos Jurídicos, Rio, 1991, página 41).É o caso da ´taxa de juros reais´ inscrita no § 3º do artigo 192 da Constituição, que tem conceito jurídico indeterminado e que, pôr isso mesmo, deve o juiz concretizar-lhe o conceito, que isto constitui característica da função jurisdicional.
Busco, novamente, a lição de José Carlos Barbosa Moreira a dizer que ´todo conceito jurídico indeterminado é suscetível de concretização pelo juiz, como é o conceito de boa-fé, como é o conceito de bons costumes, como é o conceito de ordem pública e tantos outros com os quais estamos habituados a lidar em nossa tarefa cotidiana´ (José Carlos Barbosa Moreira, obra e local citados).Não seria procedente, portanto, o segundo argumento dos que entendem que o § 3º do artigo 192 não é auto-aplicável: a locução ´taxa de juros reais´não teria sido definida juridicamente, o que impediria a imediata aplicação da norma limitadora dos juros."
Tudo isso eu devo considerar e considero, Sr. Presidente, quando sou chamado, como juiz da Corte Constitucional, a dizer o que é a Constituição. Também esses elementos , Sr. Presidente, levam-se interpretando o parag. 3 do Artigo 192 da Constituição de 1988, a emprestar-lhe aplicabilidade e eficácia plena.
(Voto do Ministro Carlos Velloso, ADI 004-DF; RTJ 147/816-817 -- grifo nosso)
44. Importante ainda o importante posicionamento jurídico do MINISTRO MARCO AURÉLIO MELLO:
MINISTRO MARCO AURÉLIO MELLO
"Verifica-se, com efeitos, que a historicidade legislativa do dogma da limitação dos juros reais enaltece a sua auto-aplicabilidade imediata, imprimindo-lhe a natureza silf executing rule. Ao estabelecer a vedação da cobrança de taxas de juros reais além do limite de 12% nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, a Constituição Brasileira disse tudo o que deveria ser dito:
Determinou, em frase tão abrangente quando distrituido de ressalvas , que tudo o que sobejar ao índice inflacionário e aos tributos incidentes nas operações de financiamento e de mútuo de dinheiro constitui juros reais"(Consultor da República RUY CARLOS DE BARROS MONTEIRO in Juros - Autoaplicabilidade)
"As taxas de juros que estão sendo praticadas, hoje, no Brasil são taxas que nenhum empresário é capaz de suportar. Nos sabemos que o fenômeno que se denomina, de ciranda financeira, é que é a tônica, hoje do mercado financeiro engordando os lucros dos que emprestam dinheiro e empobrecendo a força do trabalho e do capital produtivo".
(Ministro do Supremo Tribunal Federal MARCO AURÉLIO MELLO in Juros e Constituição).