IV – Da possibilidade e da necessidade da liminar
A liminar pleiteada é providência salutar para a proteção do ordenamento jurídico como sistema, especialmente quando se trata de fazer cessar conduta lesiva ao ambiente (obrigação de não fazer) ou impelir que o agente poluidor ou degradante faça algo para recompor ou restaurar o ecossistema ofendido (obrigação de fazer).
Na obra Teoria e Prática da Ação Civil Pública, Saraiva, 1987, São Paulo, p. 29, dos autores ANTONIO LOPES NETO e JOSÉ MARIA ZUCHERATTO, consta:
"Se é certo que a liminar não deve ser prodigalizada pelo Judiciário, para não entravar a atividade normal, também não deve ser negada quando se verifiquem os seus pressupostos legais, para não se tornar inútil o pronunciamento final, a favor do autor".
Os requisitos autorizadores da concessão da liminar encontram-se presentes, saltando aos olhos.
O fumus boni iuris vem repetidamente e de forma incontrastável estampado nas disposições constitucionais e infraconstitucionais transcritas, bem como na suficiente robustez dos elementos de prova colhidos durante o inquérito civil, tais como a confissão ao Réu e a constatação de que está extinta a espécie aroeira naquela área, além do nítido desinteresse do Réu em providenciar a reparação do ambiente.
O periculum in mora vem configurado na intolerância de se manter latente uma situação de fato que a cada dia se torna mais gravosa e indesejada ao ambiente por reafirmar a degradação anterior e não se ter perspectiva de que o Réu dê início, voluntariamente, à reparação, o que perpetuará a situação indesejada pela norma.
V – Das obrigações de fazer e não fazer e a imposição das multas liminar e diária
O art. 11, da Lei n. 7.347/85, prescreve:
"Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de requerimento do autor".
A inversão de prioridades demonstrada com a conduta do Réu é de todo reprovável, pois amesquinha os direitos e as garantias de uma universalidade de cidadãos, contrariando a Política Nacional do Meio Ambiente e os princípios constitucionais respectivos, especialmente quando, burlando a lei, sorrateiramente aufere vantagem em detrimento do ambiente.
Impõe-se, initio litis, portanto, que o Réu seja compelido, entre outras, a apresentar um Projeto de Recuperação de Área Degradada – PRAD, um Projeto de Instituição de Reserva Legal e um Projeto de Conservação de Área de Preservação Permanente, visando a reparação de forma ordenada e científica.
Muitas vezes – e esta é uma delas – um comportamento ilegítimo, ilegal e irregular somente tem seu iter interrompido com a imposição de uma outra sanção.
O objeto desta ação civil pública é a proteção do ambiente na área de propriedade do Réu, Fazenda Nossa Senhora Aparecida, com área de 877ha, situada em Maracaju-MS, fazendo cessar atividades nocivas ao ambiente (obrigação de não fazer), além de impor ao Réu a apresentação projetos que sirvam para a breve reparação do ambiente ofendido (obrigação de fazer) podendo o Juiz impor o cumprimento sob pena de execução específica ou de cominação de multa diária ou multa liminar, com adequação que melhor servir ao caso concreto.
Ferramenta que busca dar real eficácia à prestação jurisdicional a cominação soleira de multa liminar é admissível no bojo de qualquer ação que trate de interesses difusos e coletivos, inteligência do art. 21, da Lei n. 7.347/85.
HUGO NIGRO MAZZILLI, a respeito do tema, assevera (ob. cit., p. 343):
"Esse tratamento processual mais minudente trazido pelo Código do Consumidor é de aplicação subsidiária na defesa de quaisquer interesses difusos e coletivos, e não apenas daqueles relacionados com a defesa do consumidor".
A multa diária é aquela que é fixada na sentença, para forçar o cumprimento do comando da prestação jurisdicional.
Já a multa liminar, prevista nos art. § 2º, do art. 12, da Lei da Ação Civil Pública e no §§ 3º e 4º, do art. 84, do Código de Defesa do Consumidor, é aquela fixada initio litis que, embora somente exigível após o trânsito em julgado da decisão que julgar procedente o pedido, já será devida desde o momento do descumprimento da cominação liminar (ob. cit., p. 436 e segs.).
Vê-se, pois, que a situação hostilizada nesta demanda civil pública tem caráter de urgência, necessitando de que V. Exª. adote a multa liminar a título de acautelar o cumprimento das decisões.
Do Pedido
Diante do exposto, requer o Ministério Público Estadual:
1.seja deferida liminar, sem audição da parte contrária, para que seja o Réu obrigado a fazer a apresentação a este Juízo, no prazo de 90 (noventa) dias, sob pena de multa liminar de R$200,00 (duzentos reais) por dia de atraso, um Projeto de Recuperação de Área Degradada – PRAD, um Projeto de Instituição de Reserva Legal e um Projeto de Conservação de Área de Preservação Permanente na Fazenda Nossa Senhora Aparecida que contenham: a) localização exata de cada uma das respectivas áreas em mapa da área total da propriedade, devendo ser o trabalho realizado por profissional habilitado legalmente, com Anotação de Responsabilidade Técnica, atendendo-se as exigências do Relatório de Vistoria que instruiu o Inquérito Civil, especialmente na inclusão de árvores da espécie aroeira, (Myracrodruon urundeva) em número suficiente para a área da propriedade, vindo memoriais descritivos da área total e da área de reserva legal; b) planejamento para que as áreas de preservação permanente e de reserva legal sejam interligadas entre si com cobertura vegetal adequada para a região, visando possibilitar uma integração ambiental entre elas e proteção da fauna; c) para o caso das áreas de preservação permanente e reserva legal já estarem interligadas de modo suficiente, medidas que evitem a degradação e mitiguem sua degradação e fomentem seu desenvolvimento gradual; d) a matrícula atualizada do imóvel para a verificação de atendimento formal às normas ambientais; e) na elaboração dos projetos referência às normas legais ambientais para cada uma das propostas reparadoras e conservacionistas;
2.seja deferida liminar, sem audição da parte contrária, para que sejam suspensas todas as atividades que envolvam extração de produto vegetal e produto mineral, com ou sem fins lucrativos, para utilização na própria propriedade ou não, até julgamento final desta demanda, sob pena de pagamento de multa liminar de R$1.000,00 (mil reais) por ocorrência, nos termos do art. 14, inc. IV, da Lei n. 6.938/81;
3.sejam comunicados do deferimento das liminares, com o envio de cópias, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e o IBAMA, requerendo destes órgãos informações sobre procedimentos administrativos arquivados e em andamento que envolvam o Réu ou a Fazenda Nossa Senhora Aparecida, em Maracaju-MS, solicitando a remessa de cópias integrais a estes autos;
4.seja comunicada a Polícia Militar Ambiental, através do Destacamento situado em Jardim-MS, do deferimento das liminares, requisitando seja realizada fiscalização na Fazenda Nossa Senhora Aparecida, de propriedade do Réu, informando a este Juízo, através de relatório, qualquer nova interferência ilegítima;
5.seja determinada a citação do Réu, com a autorização expressa do art. 172, § 2º, do Código de Processo Civil;
6.ao final, seja julgado procedente o pedido para obrigar o Réu a reparar o dano ambiental causado na Fazenda Nossa Senhora Aparecida, apresentando e executando os projetos referido no item 1, especialmente repovoando esta área de indivíduos da espécie aroeira (Myracrodruon urundeva) em número suficiente para reverter a extinção, no prazo de 60 (dias), sob pena de multa diária no valor de R$1.000,00 (mil reais) por dia de atraso.
Protesta o Ministério Público Estadual pela produção de todos os meios de prova em direito admitidos, especialmente o depoimento pessoal do Réu, a testemunhal, a pericial, a juntada de documentos, a juntada de fotografias, fitas de vídeo etc.
Para efeitos fiscais, dá-se à causa o valor de R$1.000,00 (mil reais).
Pede Deferimento
Maracaju-MS, 25 de junho de 2001
ALEXANDRE LIMA RASLAN
promotor de justiça
Rol de testemunhas:
1.Cb PM Jorge Luiz Galeano;
2.Sd PM Roque Hilton G. Padilha;
3.Sd PM Ivan Carlos Rodrigues;
4.Eng. Agrônomo Laércio Arruda.