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Inicial de ação civil pública proposta contra a cobrança da assinatura básica

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Inicial de ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Estado do Mato Grosso do Sul em face da Anatel e de todas as operadoras de telefonia fixa e móvel daquele Estado, para a cessação da cobrança de assinatura básica e a devolução dos valores pagos nos últimos cinco anos.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA ____ª VARA DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPO GRANDE, MS:

            O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul - MPEMS, ora representado pelo Promotor de Justiça do Consumidor de Campo Grande, que ao final subscreve e que recebe intimações, pessoalmente, à Rua Pedro Celestino, nº 1.104, 4º andar, centro, nesta cidade capital e a

            Associação Brasileira da Cidadania e do Consumidor de Mato Grosso do Sul - ABCCON-MS, entidade civil de proteção e defesa do consumidor e da cidadania, pessoa jurídica de direito privado e de caráter público, sem fins lucrativos, integrante do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, conforme previsão contida no artigo 105 da Lei 8.078/90, com seu estatuto registrado no 4° Serviço Notarial e Registral de Títulos e Documentos e Pessoas Jurídicas sob o n° 229.583, do Livro A-10, Registro no Livro A – 45, sob o número de ordem 24.391, sediada na Casa do Consumidor, na Rua Pedro Celestino n° 1.104, 4° andar, centro, nesta capital, CEP n° 79.002-370, onde recebe intimações, por intermédio de seus Advogados que, ao final, subscrevem, com fundamento nos artigos 127, caput, e 129, III e IX, da Constituição Federal, somados aos artigos 1º, II; 2º; 3º; 5º, caput, 11, 12 e 21 da Lei nº 7.347, de 24.07.85, que disciplina a Ação Civil Pública; e aos artigos 81, parágrafo único e incisos; 82, I e IV; 83; 84, caput e parágrafos 3º e 4º; 90 e 91, todos do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078, de 11.09.90), e ancorados nos fatos apurados no Inquérito Civil nº 042/PJCCG/2001, doravante denominado apenas por "IC 42/01", e Procedimento Interno da ABCCON nº 02/2004, e de onde foram extraídos os documentos que instrui esta inicial, propõem, nesse respeitável Juízo, a presente


AÇÃO CIVIL PÚBLICA

COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA

            em face da:

            Anatel - Agência Nacional de Telecomunicações, pessoa jurídica de direito público, com sede no SAUS, Quadra 06, Blocos E e H, CEP 70.070-940, Brasília, DF; e da

            Brasil Telecom S.A., com sede na SEPS/EQ – 702/902 – Cj. B – Bloco B – Ed. General Alencastro, 2º andar – Brasília/DF, CEP 70390-025, inscrita no CNPJ/MF sob o nº CNPJ 76.535.764/0001-43,

            pelos motivos de fato e de Direito a seguir aduzidos:


I-DOS FATOS

            É fato publico e notório que a Brasil Telecom cobra dos consumidores, nas faturas mensais, independente de uso, desde que sua antecessora, a Telems, em 1987, passou a prestar o serviço público de telefonia neste Estado, uma tarifa denominada "tarifa básica" ou "tarifa de assinatura" ou ainda "tarifa de assinatura básica".

            Notificada a dar as explicações devidas, a empresa não negou a prática, mas, pelo contrário, justificou-a dizendo que a tarifa básica é o "valor de trato sucessivo (mensal) pago pelo assinante à prestadora durante toda a prestação do serviço, que assegura o direito de haver, em caráter individualizado e contínuo, em instalações de uso particular, a prestação do Serviço Telefônico Fixo Comutado – STFC". (f. 13-14 do CT nº 1406/524/2001 – doc. 3)

            Na mesma oportunidade, ela apresentou como suporte para a efetivação da prefalada cobrança o Contrato de Concessão do Serviço Telefônico Fixo Comutado – STFC Local, que, em seu Anexo 3, item 2.2, dispõe, verbis:

            "2 – Acesso ao Serviço Telefônico Fixo Comutado - STFC

            2.1. (...)

            2.2. Para a manutenção do direito de uso as Prestadoras estão autorizadas a cobrar tarifa de assinatura, segundo a tabela abaixo, conforme Portarias nºs 217 e 226 ambas de 03/04/97, do Ministro de Estado das Comunicações."

            Em veras, pelo contrato de concessão celebrado entre a Anatel e a ré, a assinatura residencial inclui uma franquia de 100 pulsos telefônicos, e a não residencial, de 90 pulsos, de maneira que o consumidor usando ou não o telefone, ou seja, utilizando-se ou não dos pulsos que lhe são franquiados, pagará necessariamente o valor da assinatura.

            Os Autores tomaram conhecimento, por meio da mídia e da ação civil pública interposta pelo IDEC, que a Anatel não só defende a manutenção da assinatura básica, mas também a justifica, como se constata pela leitura do teor do pronunciamento abaixo transcrito:

            "O conselheiro da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) José Leite Pereira Filho reafirmou hoje a posição da agência a favor da cobrança da assinatura básica na telefonia fixa.

            (...).

            "A Anatel considera que a assinatura básica é necessária porque existe uma prestação de serviço. Mesmo que não faça a ligação, o consumidor pode receber chamadas do mundo inteiro", disse o conselheiro da Anatel. "Existe um custo nisso que tem de ser coberto de alguma forma." (EDUARDO CUCOLO da Folha Online, em Brasília).

            Vale ressaltar, por oportuno, que, segundo a mesma fonte, "A assinatura básica da telefonia (entre R$ 30 e R$ 35, dependendo de cada Estado) corresponde hoje a 40% das receitas das empresas de telefonia local e representou R$ 13 bilhões no faturamento das teles no ano passado."

            Não contrariando o conhecimento geral, tanto a Brasil Telecom quanto a Anatel deixaram claro que a manutenção do serviço público de telefonia está sujeita ao pagamento da prefalada tarifa de assinatura ou tarifa básica que, como já dito, é cobrada independentemente de uso ou não.

            O pagamento da assinatura é, portanto, obrigatório para a disponibilização do serviço, mesmo que o consumidor não utilize essa quantia mínima de pulsos.

            Em relação de consumo, o quantum pago deve representar o justo valor de um serviço ou de um produto previamente solicitados pelo consumidor, sob pena de constituir a exigência de pagamento desproporcional em prática abusiva, por representar vantagem exagerada para o fornecedor e, portanto, enriquecimento sem causa.

            A cobrança em análise nem representa um serviço solicitado pelo consumidor nem constitui-se em um pagamento proporcional e justo pelo serviço utilizado, o que colabora para majorar, de forma inaceitável e indevida, o custo da tarifa telefônica que, conforme demonstra o IDEC em sua ação civil pública (doc. em anexo), tem inviabilizado o acesso de muitos cidadãos a este serviço, ofendendo, assim, não só os princípios da universalização do serviço e da modicidade das tarifas, como também o regime jurídico da cobrança por preços públicos.

            A combatida cobrança fere, outrossim, o Código de Defesa do Consumidor, posto que a Brasil Telecom – ao condicionar o uso da linha telefônica ao pagamento da tarifa relativa à utilização de cem pulsos mensais que, se não utilizados, acabam perdidos, sem qualquer compensação posterior – pratica a ilegalidade por todos conhecida como "venda casada" em limite quantitativo.

            Diante das abusividades acima registradas, haveria de se esperar da Anatel – na qualidade de agência reguladora e em razão do disposto nos artigos 5º, XXXII, 21, XI, 37, § 6º, 170, V, e 175, caput e incisos II e III, da Constituição Federal, no Código de Defesa do Consumidor e na Lei 9.472/97 que a criou – uma postura diferente, baseada na legalidade e moralidade, em defesa dos interesses e direitos dos consumidores.

            Dessa forma, não se pode esperar respeito à dignidade do consumidor por parte da Empresa Brasil Telecom, porque, sem limites, sem concorrência e sem controle regulatório, nem sequer a lógica do mercado impera. Assim, o serviço de telefonia é tratado como objeto de lucro desmesurado, como se não fosse um serviço público que deve atender a modicidade das tarifas e a universalidade de sua prestação. É como se a Brasil Telecom estivesse desobrigada de atender o princípio constitucional da função social do contrato e da propriedade.

            É evidente que, se houvesse uma concorrência sadia no ramo, a ré, como todas as congêneres, contentar-se-iam em conseguir o lucro que fosse possível e até abaixaria os preços para fazer frente à concorrência, o que traria o equilíbrio nas relações consumidor-fornecedor. Mas tal não ocorre hoje. Por conta da conivência do Governo federal e da ANATEL o que ocorre é a lei da selva. Com uma concorrência saudável, nenhuma empresa do ramo, com certeza, cobraria por serviço não prestado.

            É importante deixar assinalado aqui que a reação no Brasil, contra tal exploração, tem sido exemplar, conforme demonstram os documentos que instruem a presente. Entre as providências tomadas contra a combatida cobrança, encontram-se ações individuais e coletivas, com concessão de liminares; edição de lei proibindo a referida cobrança, como ocorreu no Distrito federal; "Campanha popular pela Internet contra a taxa de assinatura básica na telefonia fixa"; existência de projeto de lei, no Congresso Nacional (projeto 5476/01 de autoria do deputado Marcelo Teixeira - PMDB-CE), propondo o fim da cobrança de assinatura básica para telefones fixo e celular.

            De acordo com o site http://forum.acesso-gratis.com/forum/forum_posts.asp?TID=187, a predita proposta de lei reduz significativamente o custo mensal e modifica a Lei Geral de Telecomunicações, permitindo a cobrança pelas operadoras apenas de serviços efetivamente consumidos pelo usuário, vedando o faturamento com assinatura ou taxas semelhantes.

            A respeito, ainda, do projeto de lei 5476/01, vale ressaltar que:

            "as prestadoras de serviço de telefonia fixa cobrarão do assinante apenas os pulsos e minutos efetivamente utilizados.

            O autor argumenta que o elevado valor da assinatura dificulta o acesso do cidadão de baixa renda ao telefone, inviabilizando a universalização dos serviços preconizada pela Lei Geral de Telecomunicações. Marcelo Teixeira acredita que a proposição protege o cliente que efetua pequeno número de ligações – Noildo Miguel). (www.jlocal.com.br/noticias.php?pesquisa=226)

            Diante do alinhavado, percebe-se cristalinamente que a ré Brasil Telecom não está disposta a solucionar o problema, corrigindo as ilegalidades que vem cometendo, mesmo porque tem uma parceira forte nesta luta contra o consumidor, que é a ré ANATEL que lhe dá o suporte normativo para fazer as cobranças ilegais e indevidas.


II_DO DIREITO:

            Urge indigitar, de forma mais detalhada, todas as inconstitucionalidade e ilegalidades cometidas pela concessionária ré e a responsabilidade de cada uma delas em razão das lesões que ocasionaram aos consumidores, começando o estudo jurídico pela fixação (a) da aplicação do Código de Defesa do Consumidor no caso em exame; (b) da natureza jurídica dos serviços públicos e (c) de sua forma de remuneração.

            a-Da caracterização da relação de consumo e de quem é a responsabilidade pelas lesões causadas aos consumidores:

            Inquestionavelmente, a relação travada entre o usuário do serviço público de telefonia e a concessionária respectiva trata-se de relação de consumo, posto que presentes estão todos os elementos caracterizadores desta relação (consumidor, fornecedor e serviço, oferecido este mediante pagamento), motivo pelo qual a responsabilização dos fornecedores deste serviço perante o Código de Defesa do Consumidor é inafastável.

            Em razão da disposição contida no artigo 22 da referida lei protetiva, que exige do Poder Público uma prestação adequada, eficiente, segura e contínua dos serviços públicos e das previsões insertas nos artigos 7º, parágrafo único, e 25, § 1º, do CDC, não tem também como retirar a Anatel desta relação, mesmo porque, em razão do descumprimento das previsões insertas nos artigos 5º, XXXII, 21, XI, 170, V, e 175, caput e incisos II e III, da Constituição Federal e do artigo 5º da Lei de Telecomunicações, esta agência contribuiu concreta e substancialmente para que as lesões fossem perpetrada e se perpetuassem.

            Para reforçar a idéia da inafastabilidade da responsabilidade da Anatel, basta lembrar que o serviço público é regido, dentre outros, pelos princípios da universalidade do serviço e da modicidade das tarifas, cujo zelo pelo fiel cumprimento cabe a reguladora respectiva que, no caso em exame, é a Anatel que se manteve inerte.

            Assim sendo, as normas de ordem pública constantes do Código de Defesa e Proteção do Consumidor são totalmente aplicáveis à presente demanda que deve ser suportada pelas pessoas jurídicas que figuram no seu pólo passivo.

            b-Das espécies de serviço público e da forma de remuneração de cada um deles:

            Segundo Helly Lopes Meirelles, os serviços públicos se subdividem em dois grandes grupos. No primeiro grupo temos os serviços públicos prestados de forma abstrata, difusa, à toda coletividade, sem particularização ou individualização da prestação, são chamados "uti universi", de utilização ou utilidade universal. São eles, a educação, a saúde pública, a iluminação pública, a segurança pública, a limpeza pública, coleta de lixo, calçamento e outros. Estes serviços são indelegáveis, constituindo assim um monopólio do Estado, afinal serão remunerados por via necessariamente tributária. O tributo em questão será o imposto, que é genérico, sem qualquer vinculação à prestação de qualquer serviço público.

            No segundo grupo, estão os serviços "uti singuli" cuja prestação é especifica, mensurável, individual, ou seja, se apresenta de forma concreta ao usuário, o que gerará um direito subjetivo de prestação. A fruição destes serviços não será homogênea para todos os usuários, que poderão utilizá-los em intensidade diversa, de acordo com a necessidade de cada um. São serviços como energia elétrica, telefonia, gás, água encanada e transporte coletivo. Eles são específicos, que significa dizer que são prestados de uma forma autônoma, destacada e são também divisíveis, em que o uso efetivo ou potencial pode ser aferido individualmente. Estes serviços serão remunerados por taxas de serviços (que diferem das taxas de polícia) ou por também por tarifas (também chamadas de preços), já que este tipo de serviço público pode ser objeto de delegação.

            A remuneração por taxa dá-se quando o serviço público específico e divisível for prestado diretamente pelo Poder Público. Neste caso, estabelece-se uma relação tributária entre o Fisco – federal, estadual ou municipal – e o cidadão contribuinte.

            Já a remuneração por tarifa tem lugar quando o serviço público específico e divisível for prestado por empresas comerciais, em razão de delegação. Neste caso, estabelece-se uma relação de consumo entre o fornecedor e o usuário, com todas as implicações que daí decorre, como a necessidade de que este serviço seja prestado com obediência estrita aos princípios e normas de ordem pública constante no Código de Defesa do Consumidor.

            c- Da diferença jurídica entre taxa (tributo) e tarifa (preço público) e da verdadeira natureza jurídica da cobrança dos serviços públicos concedidos:

            Há diferença incontestável entre a taxa de serviço público (tributo) e a tarifa (preço público). Com efeito, não há como confundir uma com a outra espécie de remuneração e muito menos, como querem as rés, utilizarem parte das regras da taxa de serviço público (tributo) e parte das regras pertinentes à cobrança por preço público, quando este ou aquele favoreçam seus interesses capitalistas, formando, destarte, um "minotauro" jurídico com cabeça de tributo (taxa de serviço público) e corpo de preço público (guiado pelo regime jurídico de direito privado).

            Com este inusitado minotauro, a Brasil Telecom, em co-autoria com a Agência Reguladora de Telefonia, vem cobrando, ilegalmente, a chamada "tarifa de assinatura", por tão somente colocar à disposição do usuário o serviço telefônico, ferindo, assim, as regras que balizam os preços públicos, os tributos e os direitos básicos dos consumidores, como se verá adiante.

            Pois bem, o traço característico que distingue taxa e tarifa é a compulsoriedade ou não da prestação e da fruição do serviço.

            Como bem observa o eminente jurista Antônio Roque Carrazza, "há duas espécies de serviços públicos, uma de ‘fruição facultativa’ e outra de ‘fruição compulsória’", prevalecendo na doutrina e na jurisprudência a posição de que a única forma de se cobrar por um serviço público compulsório é a taxa, enquanto o serviço público facultativo, ou, como quer Carrazza, de fruição facultativa, deve ser cobrado por preço público ou tarifa.

            De tal arte, na lição de Hugo de Brito Machado, o traço marcante que diferencia o preço público e a taxa de serviço público é a oportunidade do consumidor optar pela não utilização do serviço público quando este for cobrado por tarifa, possibilidade esta que não seria possível quando a contraprestação do serviço público fosse feita por taxa de serviço público (de fruição compulsória).

            Para clarear a questão e solidificar seu ponto de vista, Hugo de Brito Machado exemplifica:

            "A título de exemplo, imaginemos a necessidade que se tem de energia elétrica. Se o ordenamento jurídico nos permite atender a essa necessidade com a instalação de um grupo gerador em nossa residência, ou estabelecimento industrial ou comercial, então a remuneração que o Estado nos cobra pelo fornecimento de energia é um preço público, pois não somos juridicamente obrigados a utilizar o serviço público para a satisfação de nossa necessidade. Embora nos seja mais conveniente a utilização do serviço público, do ponto de vista econômico ou por outra razão qualquer, do ponto de vista rigorosamente jurídico nada nos impede de, por outro meio, atender à necessidade de energia elétrica. A remuneração que pagamos pelo serviço de fornecimento de energia elétrica, portanto, não é compulsória." (Hugo de Brito Machado, Curso de Direito Tributário, 22ª. ed. São Paulo : Malheiros, 2003, p. 395).

            Na mesma esteira, está o ensinamento de Hely Lopes Meirlles:

            ‘dentre os preços os mais importantes são públicos ou tarifas, cobrados pela utilização do bens ou serviços públicos. As tarifas remuneratórias de serviços públicos distinguem-se das taxas porque não são compulsórias, mas cobradas somente dos usuários que os utilizam efetivamente, se e quando entenderem fazê-lo, ao passo que as taxas são devidas pelo contribuinte desde que o serviço, de utilização obrigatória, esteja à sua disposição".

            Insta anotar que o egrégio Supremo Tribunal Federal já se manifestou concludentemente acerca do tema, editando a Súmula 545, a qual tem a seguinte redação:

            "Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daquelas, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu."

            Importante aduzir, aqui e de pronto, que a compulsoriedade a que a doutrina e a jurisprudência se referem é destinada à fruição do serviço e não ao seu fornecimento, tendo em vista que, como é sabido, o serviço público é regido pelo princípio da continuidade e da indisponibilidade.

            Mister se faz também destacar que a cobrança por meio de taxa deve ficar adstrita ao regime jurídico constitucional tributário, o que alguns chamam de "Estatuto do Contribuinte", obedecendo, entre outros, os princípios da estrita legalidade, da anterioridade, do não confisco, da irretroatividade, sem olvidar igualmente os atributos conferidos a atuação Estatal de tributar, como o da imperatividade, compulsoriedade, etc.

            Como a taxa de serviço público é um tributo vinculado a uma atuação Estatal, será legalmente possível, não necessariamente justa, a cobrança ao contribuinte pela simples colocação do serviço à disposição dele. Entretanto, em se tratando de preços públicos, não se está tratando de contribuinte e sim de consumidores, nesse caso, o cidadão só poderá ser cobrado estritamente pelo que ele solicitou previamente e efetivamente consumiu.

            De tudo até aqui exposto, deve-se ressaltar três conclusões, por serem fundamentais para a solução da questão jurídica ora analisada.

            Primeira conclusão: os serviços públicos divisíveis, específicos e prestados, individualmente, pelas empresas concessionárias, em razão de solicitação prévia do consumidor, devem ser remunerados, na exata proporção em que foram usufruídos, mediante tarifa (e não por taxa).

            Segunda conclusão: o único serviço que, legalmente, pode ser cobrado, mediante taxa, pela simples disponibilização ao cidadão é o serviço público específico e divisível prestado diretamente pelo Estado, sem caráter comercial.

            Terceira conclusão: a telefonia, por ser um serviço público, específico, divisível e prestado, comercialmente, por empresas concessionárias, só pode ser remunerado mediante tarifa, mesmo porque constitui relação de consumo e não tributária.

            Estas conclusões são reforçadas pela leitura dos artigos 175, p. único, III, da Carta Magna, do artigo 9º, caput, da Lei nº 8.987/95, que está inserido justamente no Capítulo IV, denominado "Da Política Tarifária", e dos artigos 3º, XI, e 14, I, da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, que criou a Agência Nacional de Telecomunicações - Anatel, a seguir transcritos:

            1) Constituição Federal:

            "Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

            Parágrafo único. A lei disporá sobre: (...); III - política tarifária".

            2) Lei Geral de Concessão e Permissão de Serviços Públicos (Lei nº 8.987/95):

            "Art. 9º A tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão previstas nesta Lei, no edital e no contrato."

            3) Lei nº 9.427, de 26/12/96, que disciplina o regime das concessões de serviços públicos de telefonia:

            "Art. 83. (...).

            Parágrafo único. Concessão de serviço de telecomunicações é a delegação de sua prestação, mediante contrato, por prazo determinado, no regime público, sujeitando-se a concessionária aos riscos empresariais, remunerando-se pela cobrança de tarifas dos usuários ou por outras receitas alternativas e respondendo diretamente pelas suas obrigações e pelos prejuízos que causar."

            Em face do exposto, mister se faz concluir que a concessionária ré não pode continuar, com as bênçãos da Anatel, utilizando-se dos atributos dos tributos, na cobrança do serviço público de telefonia, quando lhe favoreçam, isto é, para cobrar por um serviço pela simples colocação a disposição do consumidor, escusando-se, porém, das obrigações que lhe seriam impostas na cobrança dos tributos, como é o caso do atendimento aos princípios da legalidade e da anterioridade, entre outros.

            Deve a concessionária ré decidir pela cobrança correta, deixando de lado sua vontade de criar um "meio termo" (o dito "minotauro jurídico") entre tributo e tarifa com o único intuito de aplacar sua sede voraz e insaciável de lucro fácil, valendo relembrar o ensinamento de que, "em se tratando de preços públicos, o cidadão só pode ser cobrado estritamente pelo que ele efetivamente consumiu". E não pode ser diferente, posto que o serviço de telefonia sendo, na classificação de Hely Lopes Meirelles, uti singuli, ele tem usuários determinados e é de utilização particular e mensurável para cada destinatário. Ora, não tem sentido o serviço ser mensurável (e efetivamente o é, mês-a-mês) e ser cobrado por quantia superior a medida alcançada.

            d-Da inexistência de normas autorizando a cobrança da "assinatura básica" mensal.

            Estudo feito pelo Ministério Público paulista, na inicial da Ação Civil Pública nº 000.04.073695-4 (cópia em anexo), proposta, na 5ª Vara Cível de São Paulo, pelo Dr. Gilberto Nonaka, Promotor de Justiça do Consumidor, demonstra que inexiste norma autorizadora da cobrança de taxa de assinatura básica.

            Eis como o promotor de justiça paulista expôs a questão:

            "A Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997 (LEI GERAL DE TELECOMUNICAÇÕES), criou a "Agência Nacional de Telecomunicações" (art. 8º), que foi regulamentada pelo Decreto Federal nº 2.338, de 07 de outubro de 1997.

            O Conselho Diretor da ANATEL, por sua vez, aprovou a Resolução nº 85, de 30 de dezembro de 1998, que em seu art. 3º, inc. XXI, define tarifa ou preço de assinatura como sendo "valor de trato sucessivo pago pelo assinante à prestadora, durante toda a prestação do serviço, nos termos do contrato de prestação de serviço, dando-lhe direito à fruição contínua do serviço".

            Em complementação ao referido dispositivo, encontramos a Portaria nº 216, de 18 de setembro de 1991, da Secretaria Nacional de Comunicações, estabelecendo os métodos de tarifação de chamadas locais, a saber:

            "1. SEM MEDIÇÃO – caso em que a cobrança pelo uso do serviço local se restringe apenas à assinatura mensal, independentemente do número e duração das chamadas efetuadas.

            2. MEDIÇÃO SIMPLES – consistindo na aplicação de uma unidade de tarifação por chamada estabelecida, qualquer que seja o seu tempo de duração.

            3. MEDIÇÃO POR TEMPO (MULTIMEDIÇÃO) PELO MÉTODO KARLSSON ACRESCIDO DE 240 SEGUNDOS DE CADÊNCIA – consistindo na aplicação de uma unidade de tarifação por chamada estabelecida e de unidades adicionais a cada 240 segundos, ocorrendo a primeira adicional ao acaso com relação ao início da chamada".

            Assim sendo, fácil de se concluir, com base no art. 3º, inc. XXI, da Resolução ANATEL nº 85/1998, combinado com a Portaria nº 216/1991, que apenas no caso de ser utilizado o método de tarifação SEM MEDIÇÃO (em que a cobrança pelo uso do serviço local se restringe apenas à assinatura mensal, independente do número e duração das chamadas efetuadas) é que seria possível a cobrança pela "assinatura básica".

            Ocorre que a empresa ré só se utiliza da MEDIÇÃO SIMPLES e da MULTIMEDIÇÃO (tanto que na "assinatura mensal" estariam incluídos apenas 100 pulsos).

            Logo, a demandada não poderia cobrar qualquer valor a título de "assinatura básica" mensal.

            De outro lado, nota-se que do "Contrato de concessão do serviço telefônico fixo comutado local", celebrado entre a ANATEL e a empresa ré, constou, como direito do usuário, o seguinte:

            "Cláusula 14.1. (...) XIII – ver observados os termos do Contrato de Assinatura pelo qual tiver sido contratado o serviço" (fls. 101).

            Como anotado no tópico anterior, o contrato de adesão da empresa ré, que é celebrado com os consumidores, não estabelece a cobrança de qualquer valor a título de "assinatura básica" mensal.

            É mais uma demonstração de que tal cobrança se mostra como sendo abusiva e ilegal."

            e-Da violação às normas de ordem pública e de interesse social insertas no Código de Defesa do Consumidor:

            A Anatel, ao dar sustentáculo jurídico para a objurgada cobrança, e a Brasil Telecom, ao cobrar por serviços não prestados, sob a alcunha de "tarifa de assinatura", além de todas as violações legais e constitucionais já expostas acima, violam também direitos básicos do consumidor dispostos na Lei federal nº. 8.078/90, mais conhecida como Código de Defesa do Consumidor.

            Com efeito, o referido código, por meio de seu artigo 39, inciso I, veda o condicionamento do fornecimento de produto e serviço a limites quantitativos:

            "Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

            I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos".

            Ao condicionar o fornecimento do serviço de telefonia a um consumo mínimo (100 pulsos para usuários residenciais e 90 para os comerciais), a Brasil Telecom impõe aos consumidores-usuários uma venda casada, em limite quantitativo, da pior espécie, posto que, no caso da "assinatura mensal", o consumidor é obrigado a consumir o que a empresa quer, e, se assim não o fizer, pagará pela quantia que lhe é imposta unilateral e arbitrariamente.

            Nas vendas casadas normais, o consumidor é coagido a aceitar o produto ou o serviço no limite quantitativo imposto, mas leva o produto ou recebe o serviço. No caso imposto pela ré não, ao consumidor é imposto um gasto mínimo que, ainda que não o faça, mesmo assim, terá, obrigatoriamente, que pagar por ele, sob pena, de não o fazendo, de rescisão unilateral do contrato.

            Ora, se o fornecedor está proibido, conforme se verá em seguida, a prestar serviço sem a solicitação prévia do consumidor, sob pena de não poder cobrar pelo serviço prestado nestas condições, como pode a ré cobrar por serviço que sequer foi prestado?

            A respeito da questão, a lição de Antônio Herman de Vasconcelos e Benjamin é a seguinte:

            "O fornecedor não pode obrigar o consumidor a adquirir quantidade maior que as suas necessidades. Assim, se o consumidor quer adquirir uma lata de óleo, não é lícito ao fornecedor condicionar a venda à aquisição de duas outras unidades. A solução também é aplicável aos brindes, promoções e bens com desconto. O consumidor sempre tem o direito de, em desejando, recusar a aquisição quantitativamente casada, desde que pague o preço normal do produto ou serviço, isto é, sem desconto".

            Neste diapasão legal e doutrinário, a imposição realizada pela Brasil Telecom caracteriza-se como prática abusiva, uma vez que não existe justa causa para a mesma.

            Por outro lado, o consumidor, como já mencionado, só poderá receber os produtos e serviços previamente solicitados, sob pena de não estar obrigado a pagar por eles. No caso, a Brasil Telecom lhe envia um pacote de 100 pulsos, como condição mínima para lhe disponibilizar o serviço.

            Tal prática também é vedada pelo referido artigo 39, em seu inciso III c/c seu p. único, in verbis:

            "Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

            III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço".

            Como a disponibilidade dos 100 pulsos foram colocados à disposição do consumidor sem sua solicitação prévia, não há obrigação de pagamento, como se vê pela leitura do parágrafo único do artigo 39 do CDC, verbis:

            "Parágrafo único. Os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento."

            A prática levada a efeito pelas rés constitui, ainda, prática abusiva, nos precisos termos do mesmo artigo 39, inciso V, "exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva".

            Sem dúvida, é manifestamente excessiva, além de ser ilegal e imoral, a vantagem auferida pela concessionária ao cobrar a dita "tarifa de assinatura", vez que impõe ao consumidor a obrigação de um consumo mensal mínimo e se o consumidor, por necessidade ou outra razão qualquer, optar por economizar em seu consumo de telefone, reduzindo-o aquém desse mínimo, será absurdamente penalizado, com pagamento de consumo que não efetuou, acrescido do risco de perder o direito de uso do serviço de telefonia, por inadimplência.

            Para não deixar dúvida a respeito do interesse da coletividade de não tolerar tal prática, o legislador ordinário fez ainda constar no Código Consumerista os seguintes dispositivos a respeito do assunto:

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            Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

            V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

            (...).

            Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

            (...);

            IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade".

            Em complementação a estas disposições, o mesmo artigo 51, por meio de seu parágrafo único, explica o que vem a ser vantagem exagerada, nos seguintes termos:

            "§ 1º. Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:

            I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;

            II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou o equilíbrio contratual;

            III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso."

            No caso em análise, todas as hipóteses ensejadoras da vantagem exagerada estão presentes, mormente as esculpidas nos incisos I e II, dado que os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence a tarifa são sumariamente ofendidos, bem como as rés restringem os direitos inerentes à natureza do contrato, cobrando como taxa o que é estabelecido, legal e contratualmente, como tarifa, o que lhes permite exigir do cidadão o que ele efetivamente não consumiu.

            Ao exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva, as rés acabam por ofender outros princípios constitucionais e legais, igualmente abrangidos pelo Código de Defesa do Consumidor em razão do que dispõe seu artigo 7º, como os princípios que regem a ordem econômica e a modicidade das tarifas.

            Sem dúvida, a cobrança de serviço não oferecido ao consumidor, por meio da combatida "tarifa de assinatura" permite às concessionárias de telefonia aumentarem arbitrariamente seus lucros, o que não deve ser o meio pelo qual se deve buscar a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

            Comentando a previsão legal sobre a proibição do aumento arbitrário dos lucros, Nelson Nery Júnior, nos comentários ao Código de Defesa do Consumidor da Editora Forense Universitária, f. 521, leciona:

            "A onerosidade excessiva pode propiciar o enriquecimento sem causa, razão pela qual ofende o princípio da equivalência contratual, princípio esse instituído como base das relações jurídicas de consumo (art. 4º, nº III, e art. 6º nº II, CDC) É aferível de acordo com circunstâncias concretas que não puderam ser previstas pelas partes quando da conclusão do contrato."

            A solução encontrada pelo Código de Defesa do Consumidor para tal questão, como previsto no seu artigo 6º, é a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam este tipo de prestações desproporcionais.

            Avançando um pouco mais, há de se dizer que o aumento arbitrário dos lucros, pela elevação excessiva, por meios transversos, dos preços, que não encontra justificativa no consumo praticado, é infração prevista na Lei nº 8.884/94, que dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica:

            "Art. 20. Constituem infrações de ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados: (...)

            III- aumentar arbitrariamente os lucros;"

            "Art. 21. As seguintes condutas, além de outras, na medida em que configurem hipótese prevista no art. 20 e seus incisos, caracterizam infração da ordem econômica:

            XXIV – Impor preços excessivos, ou aumentar sem justa causa o preço do bem ou serviço.

            Parágrafo único. Na caracterização da imposição dos preços excessivos ou do aumento injustificado de preços, além de outras circunstâncias econômicas e mercadológicas relevantes, considerar-se-á:

            O preço do produto ou serviço, ou sua elevação, não justificado pelo comportamento do custo dos respectivos insumos, ou pela introdução de melhoria de qualidade."

            Cabe ainda ressaltar que toda prestação de serviço público pressupõe a verificação de alguns requisitos essenciais, que decorrem do interesse coletivo que o cerca. O serviço público, ainda que prestado em regime de concessão, corresponde à satisfação de uma necessidade básica da sociedade, de forma que, para que seja oferecido de forma adequada, deve apresentar todos os pressupostos exigidos pela lei de concessão e permissão de serviços públicos, Lei n.º 8.987/95, que dispõe:

            "Art. 6.º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.

            § 1.º. Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade de tarifas."

            Como se vê, uma das características do serviço adequado é a modicidade das tarifas, que possibilita a utilização do serviço público, de forma universal, como deve garantir a Anatel, e não de uma maneira restrita, o que foge a sua natureza. Onerá-las com tal excessividade significa ir contra a própria definição de serviço público e impedir o acesso ao mesmo, em razão de majorações desmedida e cobrança de valores indevidos.

            Ora, nos últimos anos a população vem perdendo o poder de compra de forma assustadora, enquanto que o faturamento da Brasil Telecom tem aumentado estratosfericamente, o que deve exigir do Poder Público um cuidado bem maior ao conceder aumentos de tarifas às empresas multinacionais prestadoras de serviço público, evitando todas as majorações indevidas de preços, principalmente de forma inconstitucionais e ilegais, como a que ora ocorre.

            Para perceber a arrecadação bilionária da concessionária ré, basta prestar atenção na quantidade e qualidade das publicidades por ela feitas e os meios de comunicação para a feitura destas publicidades.

            Retornando ao Códex protetivo, há que se observar, ainda, que o inciso IV do artigo 51 supra transcrito menciona o princípio da boa-fé que deve ser bem compreendido.

            O princípio da boa-fé, no Código de Defesa do Consumidor, em conformidade com a doutrina contratualista mundial, deve ser entendido de forma objetiva, isto é, os contratantes devem sempre agir em consonância com a razoabilidade e a proporcionalidade (CDC/6º, V) de forma que o fornecedor não se enriqueça ilicitamente nem o consumidor seja onerado excessivamente, posto que este é a parte vulnerável nas relações de consumo e, por essa razão, possui a proteção da legislação consumerista. Tanto é assim que o código protetivo prevê, em seu artigo 39, IV, como agravante, o abuso, por parte do fornecedor, da fraqueza do consumidor, em vista seu conhecimento e sua condição social, por decorrência do sobredito princípio da vulnerabilidade, nos seguintes termos:

            "Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

            (...)

            IV – prevalecer da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços".

            Salienta-se, outrossim, que a conduta das rés fere também o princípio da liberdade de escolha do consumidor que tem o direito de escolher, livremente, pelo menos a quantidade do produto e do serviço que irá adquirir e usar, já que a escolha do fornecedor é, no presente caso, muito restrita, em razão da pouca concorrência no setor.

            Vale lembrar aqui o que, sobre a obrigação das agências viabilizar a concorrência em sua área de atuação, ensina ANA MARIA NUSDEO:

            "

A conclusão decorrente de uma análise sistemática das leis dos setores de energia elétrica, telecomunicações e de exploração de petróleo, em cotejo com a disciplina legal de proteção à concorrência, permite afirmar que as agências detêm o dever funcional para promover a concorrência, zelando para que os sistemas de atribuição de concessões, autorizações e permissões levem em conta a necessidade de que os mercados envolvidos funcionem em competição" (p. 183 – Agências Reguladoras e Concorrência" Ana Maria de Oliveira Nusdeo in Direito Administrativo Econômico – Coord. Carlos Ari Sundfeld)

            A Anatel, ao permitir a cobrança de "tarifa de assinatura", medida ensejadora de enriquecimento indevido e violação dos direitos básicos dos consumidores, não cumpre seu dever de reprimir o abuso do poder econômico e de promover a defesa do consumidor e a livre concorrência capaz de baixar preços e assegurar tarifas módicas.

            Quanto ao direito básico de escolha do consumidor, a Lei 8.078/90 dispõe:

            "Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

            II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações".

            Os incisos I e III e o parágrafo único do artigo 39 do CDC, já transcritos anteriormente, reforçam, de maneira bastante prática e efetiva, o direito de liberdade de escolha do consumidor. É dessa liberdade de escolha que Hugo de Brito Machado, quando ensina que "não somos juridicamente obrigados a utilizar o serviço público em se tratando de preços públicos".

            Infelizmente, as ofensas à lei protetiva ainda não param por aí. A conduta das rés ofende também o princípio da informação.

            A Brasil Telecom faz parecer ao consumidor que, ao pagar pela assinatura, "ganha" 100 ou 90 pulsos, de acordo com sua categoria. Ocorre que o valor pago pela assinatura remunera, na verdade, os pulsos que o consumidor fica obrigado a adquirir. Sendo assim, princípio da informação é desrespeitado, na medida em que o assinante recebe uma informação inverídica acerca da tarifa paga a título de assinatura.

            Por outro lado, de nada adianta o Código de Proteção e Defesa do Consumidor estabelecer a obrigação da "informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço", em seu artigo 6º, III, e proibir a informação e publicidade enganosas se o consumidor não pudesse optar pela quantidade que escolheu e pagar exata e tão somente por esta quantidade.

            Assim, as rés, agindo como agem, ofendem direitos fundamentais dos consumidores, fazem publicidade, informação e promessas enganosas e impõem métodos e práticas comerciais coercitivos, abusivos e desleais, com ofensa também aos dispostos nos artigos 6º, IV, e 51, XV, do CDC.

            Ao impor uma dívida indevida e fazer a cobrança dela por meios vexatórios, isto é, sob a ameaça de retirar o direito de o consumidor usar do serviço essencial de telefonia, os representantes da Brasil Telecom estão cometendo o crime previsto no artigo 71 da Lei 8.078/90, assim tipificado:

            "Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas, incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer:

            Pena - Detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano e multa."

            Mister se faz acrescentar que a ré, fazendo esta cobrança ao consumidor, impõe suas metas de lucratividade excessivas com ofensa aos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, previstos no artigo 3º da Constituição Federal, mormente o de "construir uma sociedade livre, justa e solidária" (inciso I), bem como desconsidera um dos fundamentos dessa mesma República, qual seja, o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, contemplado, também, no artigo 4º do CDC, abaixo transcrito:

            Art. 4º. A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, (...)."

            Dignidade para o cidadão-consumidor brasileiro é poder honrar seus compromissos, é ter garantido tarifa módicas, é poder contar com os serviços essenciais de forma contínua, e é, em fim, poder consumir e ser cobrado apenas pelo que consumiu.

            A dignidade do consumidor é ferida quando é obrigado a pagar por serviço que não lhe foi prestado; quando se vê coagido a aceitar revisões tarifárias que visam a tão somente garantir lucros usurários para as concessionárias de serviços públicos.

            Não se pode quebrar o contrato social estabelecido com o cidadão, a telefonia é um serviço de suma importância na vida hodierna. Assim, a concessão não tem o condão de transformar em privado o que é originariamente de todos. Dessa forma, o acesso a este serviço é um princípio a ser respeitado. Ao impor tarifa por aquilo que o consumidor não utiliza a Brasil Telecom fere a Constituição, além de enriquecer-se sem causa e estimular o desperdício (atentado contra o princípio do uso racional do serviço público). Atitudes como esta, quando oriundas de uma concessionária de serviços públicos e de uma agência reguladora paga pelo dinheiro do povo que ela ajuda a lesar, constitui-se em um absurdo inaceitável, pois nem ao empresário comum é admissível tal postura, posto que vai de encontro com a função social da propriedade expressa no artigo 170, inciso III, da Constituição Federal.

            Diante de tamanhas e tão graves lesões, só resta ao Ministério Público, à Sociedade, representada aqui pela ABCCON, e ao Poder Judiciário declararem – como o fez Nelson Hungria, ao comentar a Lei de Economia Popular (Lei 1.521/51) – guerra aos dardanários, profiteurs e burlões que desconhecem que direito algum pode ser exercido em contraste com o princípio da solidariedade social.

            Assevera o grande jurisconsulto:

            "As ávidas concentrações capitalistas, o arbítrio dos interesses individuais coligados, a opressão econômica, a artificial desnormalização dos preços, os lucros onzenários, o indevido enriquecimento de alguns em prejuízo do maior número, as arapucas para a captação do dinheiro do povo, as cláusulas leoninas nas vendas a prestações, o viciamento dos pesos e medidas, e, em geral, as burlas empregadas em detrimento da bolsa popular já não poderão vingar impunemente".

            f- Da conseqüência em se ofender o Código de Defesa do Consumidor, fazendo-se cobranças indevidas:

            A conseqüência para quem recebe valores indevidos dos consumidores, em razão de cobranças abusivas, é a de ser obrigado a devolvê-los em dobro e devidamente corrigido e acrescido dos juros legais, conforme previsão contida no artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, verbis:

            "Art. 42. (...).

            Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável".

            A penalidade constante na norma acima transcrita é plenamente justificável, enquanto tem um caracter preventivo, já que busca desestimular o fornecedor de exigir vantagem indevida, em detrimento do consumidor.

            Assim sendo, a presente demanda busca também, por óbvio, a condenação da Brasil Telecom na devolução dos valores cobrados e recebidos abusiva e indevidamente.

            g-Teses das Concessionárias e da agência reguladora:

            As empresas concessionárias de telefonia e a Anatel apresentam três teses para defender e justificar a cobrança da assinatura básica. Ora dizem que ela é para manter o sistema funcionando, ora afirmam que ela objetiva a expansão do sistema, para cumprimento das metas de qualidade, ora sustentam que ela serve para fazer frente a custo não coberto, qual seja, o relativo a recebimento de "chamadas do mundo inteiro".

            As responsabilidades constantes nestas teses dizem respeito tão somente às concessionárias, que devem fazer frente às suas obrigações, com os valores que, legalmente, receberem dos usuários. Não podem os consumidores serem obrigados a cumprir contrato que não fizeram nem assumirem responsabilidade pela má gestão empresarial.

            Assim, o Judiciário só concordará com a referida cobrança, se lhe for demonstrado que ela é legal e justa.

            Por este motivo, deve-se dar uma especial atenção, neste momento, à decisão que logo abaixo se menciona (doc. anexo), porque a improcedência nela contida deu-se exatamente em razão de que o magistrado entendeu que a cobrança de tarifa básica tem supedâneo no artigo 83 da Lei de Telecomunicações.

            Eis como ele expressou seu entendimento:

            "A Lei nº 9.472/97, em seu artigo 83, menciona que o serviço de telefonia será prestado mediante concessão e, seu parágrafo único, autoriza a cobrança de tarifas dos usuários do serviço a título de restituição pela efetiva prestação do serviço".

            Essa justificativa, entretanto, não tem suporte fático, lógico e jurídico para prosperar, pelos motivos que serão a seguir expostos. Antes, porém, faz-se necessário transcrever o sobredito artigo 83, para a devida análise:

            "Art. 83. A exploração do serviço no regime público dependerá de prévia outorga, pela Agência, mediante concessão, implicando esta o direito de uso das radiofreqüências necessárias, conforme regulamentação.

            Parágrafo único. Concessão de serviço de telecomunicações é a delegação de sua prestação, mediante contrato, por prazo determinado, no regime público, sujeitando-se a concessionária aos riscos empresariais, REMUNERANDO-SE PELA COBRANÇA DE TARIFAS DOS USUÁRIOS ou por outras receitas alternativas e respondendo diretamente pelas suas obrigações e pelos prejuízos que causar." (fonte: www.planalto.gov.br)

            Os equívocos constantes na justificativa do referido magistrado são as seguintes:

            1) o parágrafo único do artigo 83 da Lei nº 9.472/97, em momento alguma, menciona a expressão "pela efetiva prestação do serviço". A respeito da forma de remuneração do serviço de telefonia, por tarifa, o dispositivo de lei citado apenas dispõe: "remunerando-se pela cobrança de TARIFAS dos usuários";

            2) mesmo que o predito parágrafo único tivesse disposto que a tarifa era destinada a fazer frente à "efetiva prestação do serviço", isto jamais poderia ser entendido como autorização legal para se exigir o pagamento pela mera disponibilidade do serviço, porque as interpretações não devem ser feitas isoladamente, mas de acordo com o direito com um todo. A palavra "tarifa" ou "preço público", por si só já explica a questão, uma vez que ela remunera um serviço efetivamente utilizado e na proporção em que o foi, em virtude de uma solicitação prévia do consumidor, vedada a venda casada. O que remunera pelo serviço meramente colocado à disposição do cidadão é a taxa, que é tributo e não preço público.

            Como bem diz Hugo de Brito Machado, conforme já transcrito acima: "não somos juridicamente obrigados a utilizar o serviço público. Se assim o é, como poderíamos ser obrigados a pagar por um serviço que não usamos? Se houvesse lógica nas posições em contrário, a permissão da cobrança pela mera disponibilidade, daria o direito de as concessionárias de telecomunicações cobrarem o valor referente a assinatura básica de qualquer cidadão independentemente de contrato, posto que o serviço estaria a disposição de todos, inclusive por meio dos telefones públicos (orelhões), mas isso, do ponto de vista consumerista é um absurdo. Prevalecendo tal regra, pode-se rasgar o CDC e esquecer a cidadania, sendo a Constituição Federal um nada.

            3) com este entendimento, o magistrado está jogando o risco do negócio para o consumidor, enquanto que o próprio dispositivo legal citado por ele determina, expressamente, que tal risco é da empresa concessionária e não do consumidor; e

            4) sendo aplicável o Código de Defesa do Consumidor, como bem entendeu o magistrado, ao indeferir o pedido de inclusão da Anatel no pólo passivo, a questão deve ser discutida com base nas normas e princípios nele previstos. Assim sendo, não há espaço para se fazer quaisquer cobrança do consumidor a não ser com base nos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade, da boa-fé objetiva, da informação e da transparência.

            Antes de encerrar este tópico, há se dar uma atenção especial à terceira tese citada acima, isto é, aquela segundo a qual a cobrança da tarifa de assinatura serve para fazer frente aos custos relativos ao recebimento de "chamadas internacionais".

            A respeito desta tese, defendida que foi pelo Conselheiro da Anatel, há que se opor três argumentos básicos e irrefutáveis:

            Primeiro, até hoje nem as concessionárias nem a Anatel demonstraram a efetiva existência de custo não cobertos em relação às ligações internacionais, bem como não demonstraram – para se saber se o valor da cobrança é justo – em que consiste e qual é o valor de tal custo.

            Segundo, a grande maioria dos brasileiros, mormente os de baixa rendas, nem faz nem recebe ligações do estrangeiro. Assim, mesmo que houvesse os referidos custos e se soubesse qual o seu valor, eles não poderiam recair sobre todos os usuários, indistintamente, porque a maioria deles, como dito, em razão de sua condição social e econômica, não se beneficia de tal serviço e porque o serviço de telefonia é remunerado por tarifa, devendo, portanto, em razão desse tipo de cobrança, ser específico e divisível. A cobrança, de forma indiscriminada, vem prejudicar, como dito pelo autor do projeto de lei nº 5476/01, a universalização do serviço.

            Terceiro, quem deve pagar pelas ligações feitas é quem as faz e não quem as recebe, sendo certo que, em razão do que já foi dito anteriormente a respeito da divisibilidade e especificidade do serviço, este pagamento deve corresponder exatamente ao serviço, individualizado, que foi usufruído por cada consumidor.

            Em razão das teses levantadas pelas rés, no sentido de que a assinatura básica é para: a) manter o sistema funcionando, b) fazer a expansão do sistema, c) fazer frente a custos não cobertos, como o recebimento de "chamadas do mundo inteiro", há de se exigir da Anatel, que dá suporte contratual a esta prática e que fiscaliza o serviço, qualidade de agência reguladora, a apresentação de elementos fáticos, técnicos e jurídicos que dêem sustento as teses apresentadas. Assim, há que se exigir que ela preste, com comprovação documental e contabilmente, algumas informações e esclarecimentos, em nível nacional e estadual (MS), nos últimos 5 anos, tais como:

            1.Informar qual é o faturamento bruto e líquido da Brasil Telecom, mês a mês, nos últimos 5 anos, no Brasil e no Estado de Mato Grosso do Sul;

            2.qual é o lucro líquido mensal da concessionária ré, em nível nacional e no Estado de Mato Grosso do Sul e de onde vem tais lucros;

            3.de onde vem o lucro da empresa, da tarifa básica ou dos pulsos excedentes?

            4.qual a despesa despendida, mensalmente, pela Brasil Telecom, em nível nacional e neste Estado, para manter o sistema funcionando;

            5.assim, quais os tipos de manutenção é dada a uma linha telefônica; de quanto em quanto tempo cada uma destas manutenções é feita; qual é o custo que a Brasil Telecom tem com cada uma destas manutenções; e quanto a concessionária ré gasta, mensalmente, no Brasil e em MS, para manter uma linha telefônica funcionando;

            6.qual é a vida útil de uma linha telefônica;

            7.qual é o quadro diretor da Brasil Telecom, iniciando pela Presidência, em nível nacional e estadual (MS) e o quanto cada um recebe, incluindo aí todas as mordomias e vantagens pagas com o dinheiro arrecadado dos usuários;

            8.quais seriam os serviço que ficariam descobertos caso a assinatura básica não fosse paga, comprovando, documental e contabilmente, que sem o pagamento da tarifa correspondente à assinatura básica o sistema não funcionaria;

            9.quando um usuário faz uma ligação, o que está incluso na cobrança feita;

            10.quais os serviços adicionais prestados pela Brasil Telecom;

            11.qual é o percentual de usuários que, no Brasil e em MS, se utilizam mensalmente de pulsos em número inferior ao fixado para a franquia?

            12.quantas pessoas devem pagar a franquia para que o sistema se mantenha funcionando, já considerando aí os valores arrecadados com os serviços adicionais;

            13.o valor arrecadado com o percentual de usuários que pagam valores superior à franquia já não é o suficiente para se fazer frente aos gastos que o sistema tem para manter-se funcionando e gerar lucro para as empresas concessionárias, somados, é claro, também os valores arrecadados com os serviços adicionais;

            14.qual é o número de usuários que a Brasil Telecom possui hoje no Brasil e em Mato Grosso do Sul. Especifique, ano a ano, a evolução, quanto ao número de pessoas que tem ingressado no sistema de telefonia fixa, nos últimos 5 anos;

            15.esclareça-se se – em razão do aumento da entrada, mensal, de consumidores no sistema; da majoração, anual, das tarifas telefônicas; da quantidade de consumidores que já utilizam pulsos em número superior ao fixado para a franquia; e do crescimento dos serviços adicionais oferecidos – já não estariam garantidos os recursos necessários para manutenção e expansão dos sistema, sem a cobrança, obrigatória, da assinatura básica;

            16.informar se, aumentando ou diminuindo o número de consumidor pagante, a necessidade da cobrança para manter o sistema é o mesmo, por quê?

            17.de quem é a obrigação e o interesse econômico de se fazer a expansão do sistema;

            18.na telefonia, como funciona a lei do mercado? Considerando que nas outras áreas de comércio, o empresário deve primeiro ganhar o dinheiro para depois expandir seu comércio, tirando os valores de expansão de seus lucros e de suas reservas ou até mesmo fazendo eventual empréstimo para tanto, para lucrar mais no futuro;

            19.se uma das justificativas que se dá para se fazer o aumento das tarifas e para se levar a cabo as revisões tarifárias é justamente a de se fazer frente a expansão do sistema, então por que se cobrar por um serviço não prestado ao usuário?

            20.a Anatel exige que algum percentual de lucro da empresa seja colocado na manutenção e na expansão do sistema, como ocorre nas demais área da atividade econômica? Em caso positivo, qual é o percentual exigido?

            21.do valor cobrado a título de assinatura básica, qual o percentual que serve para a manutenção do sistema; qual o percentual que objetiva a expansão do sistema; e qual é o percentual referente ao lucro da empresa?

            22.qual é o número de linhas telefônicas colocadas à disposição do consumidor atualmente pela Brasil Telecom no Brasil e no Mato Grosso do Sul? Destas, quantas estão ociosas?

            23.existe demanda reprimida em MS? qual é o percentual desta demanda e qual é a previsão para se corrigir eventual deficiência?

            24.em MS, especialmente em Campo Grande, com a instalação de mais de 40.000 linhas telefônicas pelo PCT – programa comunitário de telefonia, não foi resolvido o déficit de linhas telefônicas?

            25.a partir da rede física já existente no Estado de Mato Grosso do Sul, qual a potencialidade de expansão de terminais por meio de software, em razão da nova tecnologia existente?

            26.nos telefones pré-pagos e na promoção "pula-pula" da Brasil Telecom, como se mantém e se expande o sistema, já que aí não é cobrado uma assinatura básica, mas unicamente o que o consumidor efetivamente usa, acrescido que na referida promoção o consumidor ganha um mês gratuito, alternadamente?

            27.no que se funda o sistema (tecnologia) utilizado pela Brasil Telecom; por que ele é tão caro; e se existe um sistema mais moderno que pode ser mantido por uma menor manutenção?

            28.existem empresas e tipos de serviço telefônico que não necessitam do pagamento de assinatura básica? E por que isso ocorreria?

            As informações solicitadas, por serem por amostragem, referem-se aos últimos 12 meses e devem estar documentalmente comprovadas.

            Embora as rés possam, ao contestar a ação civil pública que ora se propõe, engendrar outras teses mais mirabolantes do que as apresentadas acima, o que se deve ressaltar, neste momento, é que elas só serão bem apreciadas se o forem sob a égide do Código de Defesa do Consumidor e só terão procedência se advierem de cobrança por serviço efetivamente prestado e respeitados os princípios de modicidade e proporcionalidade das tarifas.

            h-Da política tarifária das empresas concessionárias de serviços públicos:

            Em primeiro lugar, há que se esclarecer que os contratos de concessões de serviços públicos, inexoravelmente, devem ser precedidos de licitação, por força do que reza o artigo 175 da Carta Magna.

            Sendo assim, quanto ao valor inicial a ser cobrado, a título de preço público, irá ser fixado pela proposta vencedora da licitação e não, como se poderia supor, mediante uma análise perfunctória, imposta unilateralmente pelo Poder concedente ou pela concessionária.

            Não é outra a conclusão que se chega da análise da lei que dispõe sobre o regime de concessão e permissão de serviço público, Lei n.º 8.987/95, a saber:

            "Art. 9º. A tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão previstas nesta Lei, no edital e no contrato.

            § 1º - A tarifa não será subordinada à legislação específica anterior e somente nos casos expressamente previstas em lei, sua cobrança poderá ser condicionada à exigência de serviço público alternativo e gratuito para o usuário."

            Como se pode observar, o que a concessionária ré quer impor aos consumidores é a cobrança de um serviço público que não foi usado e muito menos requerido pelo usuário e, sendo gastos de manutenção, devem ficar a cargo da própria empresa fornecedora.

            Ademais, a razão de ser de tal cobrança de "tarifa básica" é puramente a ganância de quem explora, sob a forma de quase total monopólio, os serviços de telefonia no Estado de Mato Grosso do Sul, com clientes e lucros certos.

            Com efeito, a própria Constituição e a lei que rege a atividade das concessionárias asseguram-lhes exclusivamente o chamado equilíbrio econômico-financeiro que é a impossibilidade delas tomarem prejuízos por qualquer infortúnio que sobrevenha ao contrato administrativo.

            Vale dizer, nada que aconteça externa ou internamente afeta os lucros da concessionária que são sempre certos e garantidos, se, por exemplo, surja, após a celebração do contrato entre concessionária e Poder Concedente, tributo que majore as despesas da concessionária, esta poderá requerer (o que ocorre em 100% dos casos) um aumento tarifário para restabelecer o chamado equilíbrio econômico-financeiro.

            Ora, como se pode compulsar nesse breve esboço supra transcrito, a concessionária Brasil Telecom já está demasiadamente assegurada quanto à sua lucratividade, não necessitando, destarte, onerar o consumidor com mais esse encargo de pagar pelo que não consumiu.

            i-Da função da Anatel, como agência reguladora, e da sua insatisfatória atuação no cumprimento de sua missão constitucional, legal e social:

            Cabe aqui detalhar as funções, os poderes e as responsabilidades da Anatel, bem como as ilegalidades por ela cometidas.

            As agências reguladoras são autarquias federais revestidas de um regime especial, criada com a finalidade de fiscalizar e regular os serviços públicos delegados, aplicando as penalidades cabíveis nas concessionárias que violarem a lei e/ou o contrato.

            Justificando a necessidade de um órgão sério, competente e ágil para fazer a regulação dos serviços públicos essenciais, Arnoldo Wald e Luiza Rangel de Moraes, na Revista de Informação Legislativa nº141, ensinam:

            "Delegando a prestação de serviço de sua competência à empresa privada, incumbe ao poder concedente, por intermédio dos órgãos que compõem a sua estrutura administrativa, zelar pelo controle da qualidade do serviço e da sua regularidade, mediante mecanismos fiscalizatórios, além de assegurar aos usuários o atendimento a seus direitos ao serviço adequado e uma tarifa módica."

            Para bem cumprir suas funções, as agências reguladoras (dentre elas a Anatel) tiveram ampliada sua autonomia administrativa e financeira, já conferida a todas as autarquias, outrossim, lhe é concedida uma atribuição que as outras autarquias não possuem, qual seja, o Poder Regulamentar.

            Na medida que cresce o poder das agências de expedirem normas com força de lei, deve também aumentar sua responsabilidade e cuidado em não violar direitos e garantias já consagrados em leis superiores, mormente na Carta Magna. Nessa mesma proporção, deve crescer o poder do Judiciário para fazer o controle da constitucionalidade e da legalidade dessas normas regulamentares, podendo, inclusive, avançar no controle das atribuições discricionárias dessas agências.

            Os doutrinadores que aceitam a atividade legiferante das agências só o fazem na medida em que estas normas atendam os princípios programáticos insertos na Constituição Federal e na medida que se permita o avanço do controle Judicial a respeito da legalidade e constitucionalidade de referidas normas.

            No entanto, como já demonstrado anteriormente, a Anatel – Agência Nacional de Telecomunicações, criada pela Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997 (art. 8º) e regulamentada pelo Decreto Federal nº 2.338, de 07 de outubro de 1997, ao permitir a cobrança da tarifa de assinatura, ofendeu vários dispositivos da Lei Superior, como é caso do artigo 175 da Constituição Federal que prevê expressamente a forma de cobrança dos serviços públicos prestados pela concessionária por via do preço público.

            Ao assim proceder, violou ela várias normas programáticas constitucionais que já foram anteriormente referidas, valendo relembrar aqui a da obrigatoriedade da Anatel de garantir a universalidade do serviço de telefonia e estabelecer tarifas módicas para o consumidor-usuário, obrigação esta que a referida agência não tem cumprido.

            Definitivamente, não é universal um serviço do qual, por conta do preço exorbitante, estão excluídos muitos cidadãos, bem como não é módica a tarifa que recai sobre serviço não prestado e cujo valor dos pulsos da chamada "franquia" é maior do que o valor dos pulsos ditos "excedentes", como bem demonstrou o IDEC em sua ação civil pública (doc. em anexo).

            Há, outrossim, confronto direto da postura da Anatel com a legislação infraconstitucional, principalmente em relação à Lei 8.987/95 que, em seus artigos 9º usque 13, dispõe sobre a política tarifária em direção diametralmente oposta a tomada pela agência.

            A ofensa maior, entretanto, levada a cabo pela Anatel foi, sem dúvida, contra o Código de Defesa do Consumidor e, por conseqüência, contra os direitos básicos dos usuários, que ela está obrigada a defender por disposição legal e regulamentar.

            Com efeito dispõe o artigo 5º da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997 – Lei de Telecomunicações, que rege sua atuação:

            "Art. 5º Na disciplina das relações econômicas no setor de telecomunicações observar-se-ão, em especial, os princípios constitucionais da soberania nacional, função social da propriedade, liberdade de iniciativa, livre concorrência, defesa do consumidor, redução das desigualdades regionais e sociais, repressão ao abuso do poder econômico e continuidade do serviço prestado no regime público ."

            Com maior clareza, ainda, prescreve o Decreto Federal nº 2.338/97, regulamentador da Lei de Telecomunicações como sendo atribuição da Anatel:

            a) Adotar medidas necessárias para o atendimento do interesse público (art. 16, caput);

            b) Atuar na defesa e proteção dos direitos dos usuários, reprimindo as infrações e compondo ou arbitrando conflitos de interesses (art. 16, inc. XIX); e

            c) Articular sua atuação com a do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, organizado pelo Decreto nº 2.181, de 20 de março de 1997, visando à eficácia da proteção e defesa do consumidor dos serviços de telecomunicações, observado o disposto nas Leis nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 e nº 9.472, de 1997 (artigo 19).

            Vê-se claramente que, legalmente, a defesa do consumidor é papel prioritário da Anatel, principalmente porque o parágrafo único do artigo 19 do sobredito decreto estabelece "A competência da Agência prevalecerá sobre a de outras entidades ou órgãos destinados à defesa dos interesses e direitos do consumidor, que atuarão de modo supletivo, cabendo-lhe com exclusividade a aplicação das sanções do art. 56, incisos VI, VII, IX, X e XI da Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990.

            Ora, se assim o é, o trabalho da Anatel na defesa do usuário deveria ser exemplar, no sentido de que o Estado defendesse, "efetivamente", o consumidor, inclusive e principalmente, com ações diretas, como previsto no artigo 4º, inciso II, "a", da Lei 8.078/90. Infelizmente, como já visto e é do conhecimento de todos, não é isso que ocorre.

            Estudos elaborados pelo Governo Federal e transcrito pelo IDEC na inicial de sua ação civil pública (doc. em anexo) apontam falhas da Agência no cumprimento de sua função de fiscalização e de proteção do consumidor.

            Eis a manifestação do IDEC:

            "Do relatório elaborado pela Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados, intitulado "Análise crítica do desempenho da Anatel entre 1998 e 2001", depreende-se que a atuação da Agência é insipiente na proteção do consumidor de serviços de telecomunicações:

            (...)

            Efeitos da falta de fiscalização

            Uma última consideração importante refere-se às atividades de homologação de produtos, de auditoria e de apuração de infrações, que serão detalhadas mais adiante: a Anatel vem apresentando, ainda, desempenho insuficiente nessas atividades, resultando em um quadro de risco para a agência, em três aspectos: primeiramente, a falta de fiscalização leva a agência a depender dos fatos fornecidos pelas operadoras, sem que haja uma apreciação da metodologia de coleta e tratamento dos mesmos, o que pode redundar em um quadro distorcido do setor, que venha induzir um comportamento viezado do regulador; em segundo lugar, a auditoria insuficiente reduz o conhecimento da agência sobre as operadoras e a realidade de mercado, agravando o problema de assimetria de informação anteriormente mencionado, o que será sentido, principalmente, nas negociações relativas à renovação dos contratos de concessão em 2005, redundando em menores ganhos sociais e para o consumidor; finalmente, as atividades de homologação são importantes para que a agência mantenha um conhecimento tecnológico do mercado e evite a adoção de tecnologia que possa ser usada por uma incumbida para deter controle absoluto de recursos exclusivos, dificultando o seu compartilhamento, e para que se evite uma babel tecnológica no caso das "espelhinhos".

            (...)

            DESEMPENHO DA ANATEL QUANTO À DEFESA DO CONSUMIDOR

            Intermediação de conflitos entre consumidores e operadoras

            Trata-se de uma obrigação que a Anatel acumula com o sistema de defesa do consumidor hoje vigente.

            Dentro de um enfoque de eficiência econômica, a postura recomendável para a Anatel, ao atuar como mediadora nos conflitos entre operadoras e usuários, é assumir posição de defesa do consumidor. Tal atitude é, igualmente, a mais adequada diante da legislação do consumidor hoje vigente, que se fundamenta nos princípios do reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo, da prestação da assistência jurídica gratuita ao consumidor e da facilitação de sua defesa, da inversão do ônus da prova e da admissão de ação coletiva dos consumidores. Cabe à Anatel, portanto, estruturar um procedimento em que o consumidor tenha acesso fácil e rápido ao órgão, conte com assessoramento jurídico qualificado para formular e fundamentar o seu pleito e obtenha resultados de forma eficaz.

            Assim, uma adequada abordagem do órgão regulador quanto a essas atribuições incluiria as seguintes práticas:

            Postura de defesa do consumidor, incorporando os preceitos da legislação vigente;

            Facilidade de acesso e apresentação de reclamações e de acompanhamento da solução, em especial aos consumidores de baixa renda;

            Celeridade na resposta e acompanhamento contínuo do processo, até a sua solução definitiva;

            "Feedback" às demais áreas da Anatel, em especial para realimentar o acompanhamento de indicadores, a revisão de contratos e a fiscalização de execução de serviços;

            Acompanhamento diferenciado das situações que propiciem a caracterização de direito coletivo ou difuso.

            Resultados quanto à defesa do consumidor

            A Anatel tem apresentado desempenho pouco satisfatório no que diz respeito à defesa do consumidor.

            (...)

            Resultados quanto à fiscalização dos serviços

            Quanto à fiscalização, será importante averiguar se a Anatel vem executando a atividade, encontra-se equipada para tal, se o faz dentro de margens adequadas de custo-benefício e se a sua ação é de alguma forma afetada por metas de arrecadação de multas ou pela captura pelos interessados.

            Será importante, também, averiguar quantas auditorias preventivas foram realizadas, que elementos foram examinados e que informações foram repassadas ao público. Tais indicadores não estão, em muitos casos, disponíveis, mas a análise de algumas informações veiculadas pela Anatel oferece um quadro preocupante.

            A Anatel abriu, em 2000, um número elevado de processos administrativos por descumprimento de obrigações (PADO), totalizando cerca de 14.900 procedimentos. Destes, a maior parte referiu-se a serviços de radioemissão e apenas 1.459, ou seja, cerca de 10%, referiram-se aos serviços de telefonia, a maior parte aplicado por descumprimento das metas de qualidade. Desse total, 5 foram arquivados, 384 estão em andamento, 530 resultaram em advertências e 540 em multas. Destes, apenas 60 resultaram em fiscalização direta, realizada em campo.

            (...)

            Pode-se especular, enfim, sobre eventuais interesses de natureza política a determinar esse viés, relacionado à captura do regulador por setores regulados (radiodifusão comercial ou operadoras de telefonia). Trata-se de uma linha que mereceria pesquisa adicional, mas cuja complexidade escapa ao presente trabalho.

            (...)

CONCLUSÃO

            (...)

            Há também problemas de qualidade nos serviços de várias operadoras, seja em termos de indicadores técnicos, com um número elevado de ligações não completadas ou interrompidas, especialmente no período noturno, seja em termos de atendimento (erros de cobrança, dificuldade de acesso ao operador etc.). Em parte tais problemas estão associados à rápida expansão da base instalada, mas em parte decorre também de estratégias de custos das operadoras, que demandam um maior acompanhamento ao órgão regulador. Há um descompasso entre a melhoria de índices informada pelas operadoras e o elevado nível de reclamação dos usuários.

            Nesse caso, a Anatel vem tendo um comportamento pouco satisfatório, pois embora o número de reclamações dos usuários seja elevado, as atividades de fiscalização e auditoria não estão voltadas para os serviços que originam maior número de reclamações: ainda que o STFC tenha sido objeto de cerca de 78.000 reclamações junto aos Procons das capitais de estado no ano 2000, apenas 1.459 procedimentos de apuração de ocorrências foram conduzidos no serviço, a maior parte indireta, menos de 0,2% do total de procedimentos efetuados nos serviços de radiodifusão, com cerca de 13.000 procedimentos de apuração e 190.000 vistorias. A ineficácia da Anatel na defesa do consumidor é refletida pelo baixo índice de solução tempestiva das reclamações e pelas constantes críticas emitidas pelos organismos de proteção ao consumidor.

            Da leitura dos trechos acima transcritos, resta claro que a Anatel tem atuação insatisfatória na defesa do consumidor e na fiscalização da prestação dos serviços de telecomunicações, em especial o Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC). Tal constatação corrobora o alegado na presente demanda quanto à conduta da Agência, no que tange à permissão da cobrança de tarifa que é flagrantemente ilegal."

            Como visto, a Anatel não se tem mostrado a eficiência que dela se haveria de esperar, cabendo, portanto, ao Poder público ficar atento às palavras de Ana Maria de Oliveira Nusdeo que adverte:

            "No entanto, a transferência de poderes exclusivos às agências é uma alternativa perigosa, tomando-se em consideração o risco de sua captura pelos interesses regulados, à medida que o contato reiterado com os agentes econômicos atuantes no setor tende a produzir uma identificação entre os interesses dessas empresas e os dos funcionários das agências."

            Por tudo o exposto neste subitem, conclui-se que Anatel tem falhado no exercício da função para a qual foi criada, causando lesão patrimonial ao consumidor, o que justifica a busca de socorro perante o Poder Judiciário para fazer o devido controle de legalidade dos seus atos e para a responsabilizá-la pelas lesões causadas.

            A-Da legitimidade ativa do Ministério Público e da ABCCON:

            Os interesses aqui tratados são de três espécies: difuso, coletivo e individual homogêneo, para cuja defesa o Ministério Público está legalmente

            Como leciona o eminente Prof. Nelson Nery, a modalidade dos interesses coletivos lato sensu deve ser observado não isoladamente, mas sim em contraste com os pedidos aduzidos, assim, quando se requer que a Brasil Telecom devolva os valores cobrados indevidamente a título de tarifa de assinatura trata-se de interesses individuais homogêneos, tendo em vista que os sujeitos lesados são plenamente determináveis, o objeto da ação é divisível (valor que deva ser restituído) e a relação é de origem comum (artigo 81, parágrafo único, III, do Código de Defesa do Consumidor).

            Assim, quando se pede, nesta demanda, que seja determinada a restituição, com supedâneo no artigo 42, p. único, do CDC, de todos os valores cobrados indevidamente e pagos, tem-se o direito individual homogêneos.

            Quando se pleiteia a proibição da ilegal cobrança doravante, tem-se interesse coletivo, para os consumidores que já estão no sistema (objeto indivisível, grupo, classe ou categoria de pessoas determinadas ligada entre si por uma relação jurídica base – artigo 81, parágrafo único, II, do CDC).

            Com relação a futuros consumidores que potencialmente possam vir a ser inseridos no sistema e lesados pela cobrança ilegal, trata-se de interesses difusos, pois, há sujeitos indetermináveis ligados por uma circunstância de fato e com objeto indivisível ex vi do artigo 81, parágrafo único, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor.

            Sendo assim, por força do que dispõe o artigo 1º, II, cominados com os artigos 5º e 21 da Lei 7.347/85 e artigos 1º, 82, inciso I, 90, 91 e 117 da Lei 8.078/90 e dos artigos 5º, XXXII, 127, caput, e 129, III e IX, da Constituição Federal, o Ministério Público é parte legítima para a defesa dos direitos aqui tratados, mormente porque os direitos individuais homogêneos lesados evidencia a relevância social, não só pela essencialidade do serviço de telefonia, mas também pela magnitude da lesão, verdadeiramente de massa.

            Por outro lado, a cobrança indevida, sem o amparo legal e contra legem, ofende o sistema jurídico vigente do qual o Ministério Público é o seu fiscal, o que também o legitima para agir neste caso.

            Em relação à Anatel, a legitimidade do Ministério Público Estadual fica mais clara ainda, posto que a lesão causada por esta agência é mais grave e abrangente ainda, posto que abrange todos os consumidores de todo o território nacional.

            Tal posição é firmada pelo STJ, que, por meio do Ministro José Arnaldo da Fonseca, quer ver ampliada a participação do Ministério Público nas ações coletivas que é tanto benéfica à sociedade quanto ao Poder Judiciário.

            Eis como se posiciona o referido Ministro, na qualidade de relator, no RESP 413.986/PR:

            "O exercício das ações coletivas pelo Ministério Público DEVE SER ADMITIDO COM LARGUEZA. Em verdade a ação coletiva, ao tempo em que propicia solução uniforme para todos os envolvidos no problema, livra o Poder Judiciário da maior praga que o aflige, a repetição de processos idênticos". (STJ - RESP 413.986/PR – rel. Min. José Arnaldo da Fonseca).

            A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO CONSUMIDOR E DA CIDADANIA DO ESTADO DE MS – ABCCON, nos termos dos artigos 82, IV, e 91 do Código de Defesa do Consumidor e do artigo 5º Lei da Ação Civil Pública, está igualmente legitimada para propor ação civil pública para defender os consumidores lesados pelas rés, uma vez que ela preenche os requisitos legais exigidos, a saber: a pré-constituição e a pertinência temática.

            Com efeito, a ABCCON, consoante disposto em seu Estatuto (doc. anexo), tem como um dos seus fins institucional a defesa dos consumidores em juízo.

            Com relação à pré-constituição, resta preenchido também este requisito pois a associação autora já conta com mais de um ano de efetiva constituição, conforme comprovam os documentos em anexo.

            B- Da possibilidade de se estabelecer litisconsórcio entre Ministério Público e a ABCCON, esta na qualidade de entidade civil de defesa do consumidor:

            Quanto à possibilidade do litisconsorte facultativo entre o Ministério Público e a ABCCON, deve-se dizer que é induvidosa.

            A regra geral estampada no Código de Processo Civil confirma tal posicionamento:

            "Art. 46. Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando:

            I – entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide;

            II – os direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito". (CPC)

            No caso sub examine, há comunhão de direitos e de obrigações relativamente à lide, concernente às atribuições do Ministérios Público do Estado de Mato Grosso do Sul e da ABCCON, uma vez que incumbe àquele a defesa dos consumidores lesados no Estado de Mato Grosso do Sul e a esta incumbe, em qualquer juízo ou tribunal, a defesa dos mesmos consumidores, todavia, em âmbito nacional e estadual.

            Não se pode esquecer que ao Ministério Público, seja qual for a esfera de sua atribuição, compete a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, por mandamento constitucional, artigo 127, caput. Destarte, aí está a comunhão de obrigações a que se refere o artigo 46, I, do CPC.

            Como se não bastasse a Lei nº 7.347/85 dispõe sobre a possibilidade de litisconsórcio entre o Ministério Público e os demais legitimados, a saber:

            "Art. 5º. (...)

            § 2º. Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos deste artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das partes."

            Como pode o MPE agir na Justiça federal como litisconsorte do MPF, não há porque negar-lhe a possibilidade de agir em litisconsorte com outro co-legitimado que pode atuar junto à Justiça federal, como é o caso das associações de defesa do consumidor, mesmo porque, o Código do Consumidor, em seu artigo 94 possibilita que qualquer interessado pode se habilitar no processo como litisconsorte do autor original da ação civil coletiva proposta, independentemente onde for proposta a ação respectiva, se na Justiça federal ou estadual.

            Foi com base neste entendimento que o Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul propôs, sem qualquer oposição, a ação civil pública, na Justiça federal, em litisconsórcio com o Conselho Regional de Farmácia, para defenderem consumidores lesados pela Unimed.

            A possibilidade de litisconsórcio do Ministério Público com associação civil, na lição de Hugo Nigro Mazzilli, é salutar, haja vista que:

            "A se entender o contrário, bastaria que o segundo co-legitimado propusesse em separado outra ação civil pública ou coletiva, com pedido mais abrangente ou conexo, e isso provocaria a reunião de processos, devendo ambos ser tratados como litisconsortes. Nesse passo, menos imperfeita foi a redação dada na Lei n. 7.853/89, ao tratar do problema: ‘Fica facultado aos demais legitimados ativos habilitarem-se como litisconsortes nas ações propostas por qualquer deles’". (Hugo Nigro Mazzilli – ‘A defesa dos interesses difusos em juízo", 14 ed., São Paulo, Saraiva, 2002, p. 295)

            Há de se deixar claro que, no presente caso, não haverá qualquer prejuízo nem demérito para a atuação do Ministério Público federal, posto que este agirá, obrigatoriamente, no processo, como fiscal da lei.

            Sendo assim, constata-se ser plenamente cabível o litisconsórcio entre Ministério Público e a ABCCON, mormente quando a associação co-autora preenche, conforme já visto, todos os requisitos legais, estando, portanto, os litisconsortes ativos regularmente constituídos e aptos a defenderem os consumidores, por meio da presente demanda.

            C.Da fixação da competência da Subseção Judicial de Mato Grosso Do Sul:

            No que diz respeito à fixação do foro competente para a presente ação, disciplina o artigo 109, I, da Constituição Federal:

            "Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

            I – as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho".

            No caso em apreço, há, como já demonstrado, evidente responsabilidade da Anatel, entidade autárquica federal, visto que dá suporte contratual e fático às cobranças ilegais levadas a cabo pela Brasil Telecom e pelas demais concessionárias do país.

            Dentre as seções judiciárias da Justiça Federal, é competente, em relação à Anatel, no presente caso, uma das varas da Subseção Judiciária de Campo Grande, MS, conforme previsão legal contida no artigo 2º da Lei de Ação Civil Pública (Lei 7.347/85), nos artigos 6º, VIII, e 103, I, II e III, do Código de Defesa do Consumidor e nos artigos 46, 103, 105 e 106 do Código de Processo Civil, in verbis:

            1) Lei 7.347/85 (LACP):

            "Art. 2º. As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa."

            2) Lei 8.078/90 (CDC):

            "Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

            VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, (...);

            (...).

            Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

            I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81;

            II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;

            III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81."

            3) Lei 5.869/73 (CPC):

            "Art. 46. Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando:

            III - entre as causas houver conexão pelo objeto ou pela causa de pedir;

            Art. 103. Reputam-se conexas duas ou mais ações, quando Ihes for comum o objeto ou a causa de pedir.

            Art. 105. Havendo conexão ou continência, o juiz, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, pode ordenar a reunião de ações propostas em separado, a fim de que sejam decididas simultaneamente.

            Art. 106. Correndo em separado ações conexas perante juízes que têm a mesma competência territorial, considera-se prevento aquele que despachou em primeiro lugar." (CPC)

            Poder-se-ia dizer que, em razão do disposto no artigo 93, II, do CDC, a ação em relação à Anatel, por versar sobre dano de âmbito nacional, deveria ter sido interposta no Distrito Federal. Mas tal posição não é a melhor, conforme a lúcida e correta interpretação dada a este dispositivo legal pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, verbis:

            "A análise perfunctória da redação do inciso II do prefalado art. 93 do CDC poderia levar o aplicador da lei a interpretá-la como se existentes duas situações distintas, ou seja, quando o dano for ‘regional’, o foro competente é o da capital do Estado; quando for ‘nacional’, é o do Distrito Federal. Mas a leitura mais atenta do dispositivo desautoriza tal exegese, como se verá adiante. Primeiramente, se quisesse realmente o legislador criar três critérios de fixação de competência, tê-los-ia inserido em incisos distintos. Ao revés, optou por dividir o art. 93 em apenas dois, ou seja, um (art. 93, I) para os danos de âmbito local (foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano) e outro (art. 93, II) para os danos de âmbito regional ou nacional (foro da Capital do Estado ou no Distrito Federal). Isto significa que o inciso II, para duas situações distintas (danos regionais e danos nacionais), deu solução idêntica, qual seja, ‘foro da Capital do Estado’, tendo apenas se referido ao Distrito Federal em face de sua natureza sui generis de cidade-estado. Obviamente, em se tratando de dano nacional, todas as capitais do país, e o Distrito Federal, seriam, em tese, competentes para o aforamento da presente ação, sendo de se aplicar o critério da prevenção em caso de eventual conflito, ficando prevento aquele que primeiro despachar".

            A mesma Egrégia Câmara, ao tratar de matéria idêntica, assim decidiu:

            "O mencionado inciso II do art. 93 refere-se, laconicamente, ao foro da capital do Estado ou do Distrito Federal, sem adiantar qualquer critério distintivo. Cabe, portanto, ao intérprete buscá-lo. A referência destacada a Distrito Federal no inciso II deveu-se a um rigor técnico do legislador. É que o Distrito Federal, elevado pela Carta de 1988 à condição de ente estadual autônomo, integrante da Federação (art. 18), aproxima-se mas não se equipara ao Estado-membro. Com efeito, embora nele existam os três Poderes - inclusive o Judiciário que falta aos Municípios - sua autonomia é mais restrita que a dos Estados, notadamente por sofrer a interferência da União em áreas diversas (...). Na feliz síntese de Hely Lopes Meirelles, o Distrito Federal é um Estado-membro anômalo". Por esta razão, o legislador terá achado conveniente a menção expressa, e tecnicamente mais precisa, a Distrito Federal, a demonstrar que ele não se confunde com o Estado. Mas o Poder Judiciário do Distrito Federal, embora formalmente organizado e mantido pela União (art. 21, XIII), tem o mesmo status do Poder Judiciário Estadual, não integrando o sistema da Justiça Federal, quer comum, quer especializada. Alguém poderá cogitar que, em caso de interesse regional, a competência seria do foro da Capital do Estado e, em caso de interesse nacional, seria do foro do Distrito Federal. Mas também essa interpretação não se sustenta. É que o dispositivo menciona primeiro: Capital do Estado e âmbito nacional e depois Distrito Federal e âmbito regional. De modo que o critério da respectividade levaria à incongruência de que as ações de âmbito nacional devem ser propostas no foro da Capital do Estado e as de âmbito regional no foro do Distrito Federal. E isso não faria sentido".

            Já em relação à Brasil Telecom – concessionária que faz a cobrança da ilegal "assinatura básica" em todo o Estado de Mato Grosso do Sul e que, por conseqüência, lesa o direito dos consumidores aqui residentes – a competência de uma das varas da Subseção Judiciária de Campo Grande, MS, tem respaldo no artigo 105 combinado com o artigo 103, ambos do Código de Processo Civil, já transcritos acima.

            Nada melhor para encerrar este subitem do que transcrever as conclusões tiradas por Maria Fátima Vaquero Ramalho Leyser, Promotora de Justiça em São Paulo, no Artigo de sua lavra denominado "Competência nas Ações Coletivas", consistente em uma tese defendida e aprovada no II Congresso do Ministério Público da Região Nordeste, realizado na cidade de Fortaleza-CE, no período de 8 a 12 de dezembro de 1996:

            "3. Conclusões:

            01. Ressalvada a competência da Justiça Federal, a competência objetiva em razão da matéria é atribuída à justiça local (Justiça dos Estados ou do Distrito Federal).

            02. Quando o dano for de âmbito local, a competência é do local onde ocorreu ou deva ocorrer o dano.

            03. Quando o dano for de âmbito regional ou nacional, o foro competente será o da capital do Estado ou do Distrito Federal.

            04. Em se tratando de interesses difusos ou coletivos propriamente ditos, cujo dano é de âmbito local, a sentença de procedência fará coisa julgada erga omnes (art. 103, inciso I do Código de Defesa do Consumidor) em todo o território nacional.

            05. Em se tratando de interesses individuais homogêneos, cujo dano é de âmbito local, a sentença de procedência fará coisa julgada erga omnes somente para beneficiar aqueles titulares de interesses e direitos individuais homogêneos, ou seus sucessores (art. 103, inciso III do Código de Defesa do Consumidor), não surtindo efeitos em todo o país.

            06. Em se tratando de interesses difusos, coletivos propriamente ditos ou individuais homogêneos, cujo dano é de âmbito regional ou nacional e a ação foi proposta, em primeiro lugar, na capital do Estado do Ceará, este juízo torna-se prevento e a sentença de procedência fará coisa julgada erga omnes (art. 103, inciso I do Código de Defesa do Consumidor) em todo o território nacional." (grifos ausentes no original)

            D- Da necessidade da medida liminar e da necessidade da fixação da multa liminar em montante capaz de desestimular o descumprimento da ordem judicial:

            Cabe frisar, doravante, a necessidade da concessão da medida liminar consistente na obrigação de não fazer por parte da ré Brasil Telecom que deverá, de pronto, abster-se de fazer a cobrança da dita "tarifa mínima", bem como na obrigação de fazer por parte da Anatel que deverá: a) determinar, administrativamente, a todas as concessionárias de telefonia do país que suspendam, imediatamente, as cobranças ilegais feitas a título de assinatura básica; e b) em caso de descumprimento da predita proibição administrativa, por parte de alguma das concessionárias, tomar, no prazo de 24 horas, as medidas administrativas e judiciais necessárias para que a referida decisão administrativa seja cumprida.

            Dispõe o artigo 12 da Lei de Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) que "Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo".

            Reforçando e ampliando esta previsão legal, prevê o parágrafo 3º do artigo 84 da Lei 8.078/90 que:

            "Art. 84. (...).

            § 3º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.

            Como se não bastasse, o § 5º deste mesmo artigo 84 dispõe:

            Para a tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias, tais como busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra, impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial", sem necessidade, inclusive, de pedido específico da parte."

            No presente caso, é indubitável a necessidade de se tomar, de pronto, medida para evitar que as rés continuem lesionando os direitos básicos dos consumidores, como restou demonstrado na presente exordial, mesmo porque presentes estão os requisitos autorizadores de concessão de medida liminar, quais sejam: o fumus boni iuris e o periculum in mora.

            A relevância do direito já foi devidamente comprovada acima.

            Não resta dúvida de que o cumprimento da Constituição e das leis, em um Estado Democrático de Direito, é sempre relevante.

            Quanto ao periculum in mora, deve-se mencionar que a conduta das rés, causadoras da presente ação, já vem se prolongando por mais de uma década, o que demonstra que a mesma conduta lesionadora dos interesses dos consumidores permanecerá, caso o Poder Judiciário não se apresse em impedi-lo.

            Há de se atentar, também, para o fato de que o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação aos consumidores deriva também da posição de vulnerabilidade dos mesmos e do fato que poderão, de uma hora para outra, ter suspenso o fornecimento do serviço de telefonia, por não conseguirem pagar valores ilegalmente impostos.

            A oposição a tais atos tem que se tornar concreta e imediata, através de uma medida inequívoca e eficaz do Poder Judiciário, mesmo porque a atuação judicial deve ser primordialmente preventiva, uma vez que a prevenção é princípio informador do Código de Defesa do Consumidor, como se nota pela leitura dos os dispostos no artigo 6º, incisos VI, VII, VIII e X do Código de Defesa do Consumidor.

            Sendo assim, é inadmissível permitir que a ré continue demonstrando seu desdém à legislação em vigor, em inaceitável repulsa ao ordenamento jurídico pátrio, bem como é inaceitável permitir que as lesões aos consumidores persistam até decisão final de mérito da demanda, deixando-os sofrer, até lá, todo tipo de danos econômicos e morais, mormente quando se sabe que os danos, principalmente os morais, são irreparáveis, merecendo, portanto, que sejam cessados de imediato.

            Outrossim, quanto à necessidade de fixação e ao valor da multa liminar, a Lei 8.078/09, em seu artigo 84, § 4º, com o objetivo de assegurar que a liminar concedida seja efetivamente cumprida, atribui ao juiz a possibilidade de impor multa liminar ao réu, de ofício ou a requerimento da parte:

            "Art. 84 (...)

            § 4º. O juiz poderá, na hipótese do § 3.º ou na sentença, impor multa diária ao réu, independente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento do preceito."

            Há que se atentar para o caráter coercitivo da multa liminar, uma vez que deve ter o efeito de inibir que o réu continue a se comportar contrariamente à lei ou a praticar os atos nocivos pela lei proibidos.

            Sendo assim, o valor da multa liminar deve considerar as condições financeiras das rés, para que cumpra sua função de coagi-las a cumprir as determinações judiciais, anotando-se, por oportuno, que a Brasil Telecom é useira e vezeira em descumprir determinação judicial, tanto é verdade que existe uma condenação judicial contra ela, em ação civil pública proposta pelo MPE-MS, transitada em julgado há 3 anos, onde existe multa diária fixada no montante de R$ 100.000,00, até hoje não cumprida.

            A respeito do tema, leciona o eminente Prof. Rodolfo de Camargo Mancuso:

            "Daí a importância da dosagem na fixação da multa, fazendo com que ela constranja o devedor a cumprir o julgado". ("Ação Civil Pública em defesa do meio ambiente, patrimônio público e dos consumidores", 3ª edição, f. 147).

            Sendo a ré Brasil Telecom empresa de grande poder econômico que explora, sob o regime de concessão, os serviços de telefonia fixa e móvel em todo o Estado de Mato Grosso do Sul, há de ser fixada uma multa liminar em valor que seja condizente com sua realidade econômica, de modo que a desestimule de descumprir a ordem a ser emanada desse Juízo.

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Sobre os autores
Amilton Plácido da Rosa

Procurador de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul.

Michelle Dibo Nacer Hindo

Graduada em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Pós- graduada em MBA Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) em convênio com o instituto Agricon (Campo Grande). Servidora do TJMS. Professora de Prática Jurídica Cível.

Mônica Felix Andrade Nascimento

advogada em Belo Horizonte

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROSA, Amilton Plácido ; HINDO, Michelle Dibo Nacer et al. Inicial de ação civil pública proposta contra a cobrança da assinatura básica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 899, 19 dez. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16652. Acesso em: 22 dez. 2024.

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