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Perda, extravio ou consumo de armas portáteis e munições por membros das Forças Armadas e das Polícias Militares.

Agenda 14/01/2023 às 23:58

Praças e oficiais que extraviam armamento portátil e/ou munições confiadas para uso individual se enquadram no crime próprio do art. 265 do Código Penal Militar?

Introdução

O Código Penal Militar se caracteriza como um exemplo de norma especial, basicamente por duas características principais:

Dentre os chamados crimes propriamente militares 3, ou seja, os crimes isoladamente previstos pela referida normativa, destaca-se aquele talhado no art. 265, que trata de fatos relativos apenas ao desaparecimento, extravio e consumo de combustível, armamento, munição e peças de equipamento destinados a navio e aeronave ou, ainda, engenho de guerra motomecanizado.

O presente estudo se refere às modalidades de condutas culposas que incidiram nos fatos narrados no caput o artigo 265 do Código Penal Militar.

Contemporaneamente, observa-se a aplicação dos referidos dispositivos pelas Justiças Militares Federal e Estadual para penalizar praças e oficiais que, por conduta dolosa ou negligente, imprudente ou, ainda, imperita, extraviam armamento portátil e/ou suas munições que lhe foram confiadas para uso individual.

A seguir, será analisado o fenômeno em questão, que envolve o emprego, pela Justiça Militar brasileira, do tipo penal previsto no art. 265, do Código Penal Militar, para processar e, mormente, penalizar os membros de carreiras militares federais e estaduais pelo desaparecimento ou extravio de armas portáteis e/ou de suas munições.

Tem, ainda, a finalidade de demonstrar, que, à luz da exegese estrita de acordo com a teoria hermenêutica do direito penal, o referido dispositivo legal não deve ser aplicado a casos de desaparecimento, consumo ou extravio de armamento portátil ou das respectivas munições, haja vista que sua objetividade jurídica não comporta os objetos acima indicados.


Da impossibilidade de subsumir a conduta de extraviar ou de fazer desaparecer armamento portátil e/ou de suas munições ao artigo 265, do Código Penal Militar

Da interpretação restritiva da norma penalizadora

Há muito tempo, particularmente após o advento da Era Moderna com o seu profundo perfil humanista, a ciência jurídica determinou que o intérprete, ao analisar a conduta hipotética descrita em uma norma penalizadora, deverá proceder de maneira a produzir um juízo (hipotético ou concreto) sob bases restritivas.

Ao reler a obra fundamental de Cesare BECCARIA, encontrar-se-á o fundamento pelo qual, em se tratando de normas incriminadoras ou penalizadoras em geral, deve, o juiz, proceder à interpretação restritiva da norma com a finalidade de evitar, com o ato hermenêutico realizado sobre o caso concreto, a indevida substituição da atividade do legislador, que, de maneira geral e abstrata, dedicou a determinado ordenamento jurídico as bases para a atividade exegética4.

A tradição, que encontra lastro na doutrina iluminista de MONTESQUIEU, ainda reverbera no ordenamento jurídico brasileiro, como se verifica, ademais, no caput do art. 2º, da Constituição Federal, poderá ser verificada em leitura ao relevante manual de metodologia jurídica de Friedrich von SAVIGNY, para o qual a ausência ou o silêncio da lei em relação a determinada figura criminosa5 não permitirá o emprego, pelo intérprete, do mecanismo da analogia para, à revelia do legislador, ampliar a possibilidade de o Estado-Juiz punir a conduta humana. Somente ao legislador, conclui o referido jurisconsulto, caberá o aperfeiçoamento da lei6.

Dentre os autores brasileiros, reverbera a doutrina acima referida, por exemplo, na obra de Carlos MAXIMILIANO. O eminente jurisconsulto gaúcho assevera que a interpretação do texto legal deve ser restritiva ou estrita quando se tratar de leis excepcionais, fiscais e punitivas7. MAXIMILIANO, também, recorda que a referida regra de hermenêutica e de aplicação do direito encontra exemplo no Codex Juris Canonici, em seu c. 19, para o qual: Leges quoe poenam stauunt, aut liberum jurium exercitium coartctant, aut exceptionem a lege continent, strictoe subsunt interpretationi: “as leis que estatuem pena, ou coartam o livre exercício de direitos, ou contêm exceção a preceito geral, estão sujeitas a exegese estrita”8.

Walter CAMPAZ, cita e concorda com MAXIMILIANO, ao se referir à lição deste sobre as normas do Código Italiano de 1865, que, por sua vez, restringiam a interpretação de normas penalizadoras e de normas que limitavam a liberdade de exercício de direitos9.

Antonio Luís Chaves Camargo, por fim, assevera que, fundada no princípio da legalidade, a exegese lei penal deverá ser restritiva10.


Da não incidência dos artigos 265 e 266, do Código Penal Militar aos casos que envolvem perda, extravio ou consumo de armas portáteis ou munições

No que toca ao elemento objetivo do tipo, o armamento portátil de uso individual (a pistola, o revólver, a espingarda, a carabina, etc.) e suas munições, pertencentes às Forças Armadas do Brasil ou às Polícias Militares estaduais ou distrital, não possuem a natureza jurídica de armamento para os fins dos artigos 265 e 266, do Código Penal Militar pátrio.

Conforme se verifica na leitura do dispositivo contido no artigo 265 do referido diploma legal, o objeto material do delito é o combustível, o armamento, a munição, ou peças de equipamento destinados a permitir a operação de navio ou de aeronave ou de engenho de guerra motomecanizado.

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Por si só, a clara e objetiva redação do dispositivo em comento permite a conclusão de que os insumos acima indicados, para que seja considerado existente o fato típico, deverão restar relacionados ao emprego naval, aéreo ou de engenho de guerra motomecanizado, excluindo-se, portanto, o combustível, o armamento, a munição, ou peças de equipamento que não sejam empregados em tais veículos.

No bojo do referido dispositivo legal, somente se reconhece como objeto material do crime e, portanto, bem juridicamente tutelado pela norma penal “combustível, armamento, munição, peças de equipamento” vinculado a “navio ou de aeronave ou de engenho de guerra motomecanizado”, perfazendo que os bens móveis acima indicados somente poderão ser compreendidos como objeto do crime em destaque se relacionados ao patrimônio das Forças Armadas11.

O sistema de operacionalidade jurídica da exegese estrita determina, como observado, que o tipo penal seja analisado em sua integralidade, com o fim de se evitar que o intérprete, em sua atividade, substitua o legislador e que possa extrair o sentido correto da lei colocada.

Assim, os requisitos objetivos insertos no tipo penal do art. 265, CPM, devem ser analisados em conjunto para que se possa extrair, inicialmente, sua dimensão, sua extensão e sua aplicabilidade diante de fatos observados no mundo fenomênico. Portanto, os requisitos combustível, armamento, munição, peças de equipamento devem ser compreendidas como exclusivamente relacionadas a navio ou de aeronave ou de engenho de guerra motomecanizado.

Portanto, o bem jurídico protegido pelo referido dispositivo legal são os itens acima destacados diretamente relacionados e considerados essenciais para o perfeito uso dos navios, aeronaves e engenhos motomecanizados de guerra.

Tal posicionamento encontra lastro, ainda, na doutrina de Cícero COIMBRA e de Marcello STREIFINGER, segundo a qual:

Combustível é substância utilizada para a realização de combustão em motores com o objetivo de gerar, de forma direta ou indireta, propulsão e movimento de veículos, embarcações ou aeronaves. Armamento é instrumento ou mecanismo preparado para proporcionar vantagem em ataque ou defesa em uma luta, batalha ou guerra, na atualidade caracterizada pelo lançamento, por expansão de gases, por exemplo, de projétil. Munições trata-se de petrechos necessários a um exército ou para a defesa de uma praça de guerra com a utilização de armamento que os acionam, em geral compostos por elementos como cápsula, projétil, carga de projeção e espoleta; na atualidade, as munições podem compor mecanismos autossuficientes de defesa, sem a necessidade de utilização de armamento, podendo ser acionadas diretamente pelo usuário, a exemplo de munições químicas, explosivas, fumígenas etc. Peças de equipamento de navio ou de aeronave ou de engenho de guerra motomecanizado são quaisquer componentes dessas estruturas, essenciais para seu funcionamento, ou seja, sem as quais os equipamentos não podem ser utilizados de acordo com sua destinação12.

Revela-se, assim, portanto, que o emprego corrente do referido dispositivo legal para penalizar militares federais e/ou estaduais e distritais pela desparecimento ou extravio doloso ou culposo de armamento portátil e de suas respectivas munições cometidas à carga pessoal, vale dizer, aquelas que não são vinculadas a navios, aeronaves ou engenhos de guerra motomecanizados, extrapola os limites legais do tipo penal, fazendo com que a Autoridade Judicial desenvolva atividade legislativa e não a interpretação e a aplicação da lei ao caso concreto, que é sua função precípua.

Nesse ponto, a doutrina de Cícero COIMBRA e de Marcello STREIFINGER é ainda mais incisiva:

Situação comum, especialmente nas Polícias Militares, é o extravio de armamento (revólveres e pistolas) e suas munições, que pertencem ao Estado e que foram confiadas como carga ao Militar. Em geral, os extravios se dão por culpa (especialmente a negligência), e, em nossa opinião, deveriam ser considerados apenas ilícito civil e disciplinar, e não ilícito penal militar – frise-se que, como veremos abaixo, este crime pode ser cometido a título de culpa. A interpretação da inexistência de crime na possibilidade apresentada, além de afeiçoar-se a uma visão calcada na mínima intervenção penal, ganha corpo se entendermos a necessidade de verificar um paralelismo nos objetos materiais, tomando-se como parâmetro a expressão típica engenho de guerra, que indica a necessidade de que os objetos tenham fim bélico. Nossa visão, para manter a coerência, deve ser sustentada inclusive na comparação de tais objetos com o combustível, que deve também guardar paralelismo, ou seja, o combustível em discussão não pode ser o empregado em viaturas, embarcações e aeronaves comuns, mas apenas o empregado em veículos, embarcações ou aeronaves de guerra. O mesmo se diga das peças de aeronave e de navio, que devem, a exemplo dos engenhos, ser destinadas à atividade beligerante13.

Assim, conforme o ministério acima colacionado, deve-se proceder à interpretação restritiva, ou estrita, segundo a qual os elementos objetivos são compreendidos de acordo com o sentido integral do dispositivo em análise, excluindo-se a hipótese de aplicar o art. 265 e 266, do Código Penal Militar, ao militar que extravia, consome ou perde armamento portátil e suas respectivas munições.


Conclusões

O Código Penal Militar se caracteriza como um exemplo de norma especial pelo fato de que a análise dos seus dispositivos foi cometida pela Constituição Federal a um ramo especializado da Justiça brasileira, notadamente às Justiça Militar da União e dos Estados, nos termos dos artigos 122 e 125, do Texto Magno e pelo fato de que a referida legislação prescreve os chamados crimes militares próprios, figuras jurídicas penais que somente se aplicam aos funcionários públicos militares e civis nos termos dos seus artigos 9º, 11, 12, 13 e 14.

Após o advento da Era Moderna, com o seu profundo perfil humanista, o intérprete da lei penal, ao analisar a conduta hipotética descrita em uma norma penalizadora, deverá proceder de maneira a produzir um juízo (hipotético ou concreto) sob bases restritivas, evitando-se, assim, em se substituir ao legislador em sua atividade criativa.

Fundamentada no princípio da legalidade, a exegese lei penal deverá ser restritiva.

Diante da interpretação restritiva, compreendida, ademais, como forma de se preservar a liberdade do cidadão em face do arbítrio do Estado e como salvaguarda do sistema da harmoniosa separação dos Poderes, não se deve compreender como incidentes os artigos 265 e 266, do Código Penal Militar, aos casos que envolvem perda, extravio ou consumo de armas portáteis ou de suas respectivas munições.

Conforme se verifica na leitura do dispositivo contido no artigo 265 do referido diploma legal, o objeto material do delito é o combustível, o armamento, a munição, ou peças de equipamento destinados a permitir a operação de navio ou de aeronave ou de engenho de guerra motomecanizado.

Portanto, o bem jurídico protegido pelo referido dispositivo legal são os itens acima destacados diretamente relacionados e considerados essenciais para o perfeito uso dos navios, aeronaves e engenhos motomecanizados de guerra.


Bibliografia

BECCARIA, Cesare: Dos delitos e das penas. 5.ed. São Paulo. Revista dos Tribunais. 2011.

CAMARGO, ANTÔNIO LUÍS CHAVES: Tipo penal e linguagem. Rio de Janeiro. Forense. 1982.

CAMPAZ, Walter: Direito, interpretação, aplicação e integração. São Paulo. Juarez de Oliveira. 2001.

MAXIMILIANO, Carlos: Hermenêutica e aplicação do direito. 19.ed. Rio de Janeiro. Forense. 2003.

STREIFINGER, Marcello e COIMBRA, Cícero: Manual de direito penal militar. 4.ed. São Paulo. Saraiva. 2014.

VON SAVIGNY, Friedrich: Metodologia jurídica. Campinas. Edicamp. 2001.


Notas

  1. Nesse sentido, a doutrina de Streifinger e de Coimbra: A especialidade do Direito Penal Castrense, tradicionalmente, evidencia--se pelo órgão especial que o aplica: as Justiças Militares. Nessa linha, desponta Mirabete afirmando que a distinção entre Direito Penal comum e Direito Penal especial “só pode ser assinalada tendo em vista o órgão encarregado de aplicar o Direito objetivo comum ou especial” (Neves, Cícero Robson Coimbra: Manual de direito penal militar / Cícero Robson Coimbra Neves, Marcello Streifinger. – 4. ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 29).

  2. Célio Lobão, aproveitando os postulados, dentre outros, de Romeu de Campos Barros, entende que “classificar o Direito Penal especial em função do órgão judiciário encarregado de aplicar o direito objetivo, demonstra evidente confusão entre Direito Penal especial e Direito Processual Penal especial”. Assevera, ainda, após notável argumentação, que “o Direito Penal Militar é especial em razão do bem jurídico tutelado, isto é, as instituições militares, no aspecto particular da disciplina, da hierarquia, do serviço e do dever militar, acrescido da condição de militar dos sujeitos do delito”. E conclui adiante, com base nessa premissa, que apenas os crimes propriamente militares merecem o título de delitos de Direito Penal especial, sendo os crimes impropriamente militares, cometidos por militares ou por civis, delitos comuns, cuja competência de julgamento foi atribuída às Justiças Militares pelo legislador ordinário. Assim, nas lições do caro mestre, os crimes de homicídio (art. 205 do CPM), lesão corporal (art. 209 do CPM) etc. não fariam parte do Direito Penal especial, mas do Direito Penal comum, ainda que a competência de julgamento desses delitos seja da Justiça Castrense. Sem embargo, assentimos na premissa exposta pelo professor, qual seja a de que a especialidade do Direito Penal Militar decorre do caráter sui generis do bem jurídico por ele tutelado. Entretanto, parece-nos equivocado o entendimento de que somente os crimes propriamente militares possuem essa especialidade, justamente em razão da abordagem feita acerca do bem jurídico-penal militar. Em outros termos, mesmo que em um homicídio praticado por militar contra militar haja a violação primeira da vida, há igualmente uma tutela específica, da instituição militar, caracterizada pela regularidade do desempenho de suas missões. Tome-se, e. g., a destruição de uma aeronave hostil, nos termos do § 2º do art. 303 do Código Brasileiro de Aeronáutica, e imagine-se, contando com a fertilidade do pensamento, ser ela tripulada por militares federais. Tal ação militar constituirá um simples fato típico de homicídio, sem nada de especial, ou efetivo abate a ser apreciado, em todas as circunstâncias, por um órgão especial que terá também uma compreensão especial do fato? Há casos mais gritantes de crimes impropriamente militares em que a especialidade, pela tutela da regularidade da instituição, é inequívoca, como o caso do delito de violência contra sentinela (art. 158 do CPM). Ainda que possa ser perpetrado por qualquer pessoa, o tipo penal visa à integridade da instituição, em forma de preservação da autorida­de e da integridade física da sentinela, aspecto externo da regularidade. Em conclusão, preferimos, partindo da mesma premissa, entender que o Direito Penal Militar é especial em razão do objeto de sua tutela jurídica: sempre a regularidade das instituições militares, seja de forma direta, imediata, seja de forma indireta ou mediata. Abarcaríamos, dessarte, como crimes integrantes desse Direito Penal especial, todos aqueles capitulados no Código Penal Militar, mesmo que impro­priamente militares (Neves, Cícero Robson Coimbra: Manual de direito penal militar / Cícero Robson Coimbra Neves, Marcello Streifinger. – 4. ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 29).

  3. ... voltando ao caso do Direito Penal Militar brasileiro, são crimes militares aqueles enumerados pela lei, que estudaremos no decorrer desta obra e, posteriormente, pela Parte Especial. Tal critério, adotado desde a Constituição de 1946, evidencia-se na atual Carta Magna pelo disposto nos arts. 124 e 125, § 4º. A lei penal militar, todavia, vale-se de conceituações arrimadas nos critérios enumerados para eleger pontualmente os crimes militares. Dessarte, ao entender como crime militar o fato tipificado nas duas legislações penais (comum ou militar), simplesmente por ter sido praticado por militar em situação de atividade contra militar na mesma situação, conforme enumera a alínea a do inciso II do art. 9º do CPM, o legislador orientou-se por uma concepção ratione personae (ou ratione materiae, na visão de Esmeraldino Bandeira), ao mesmo tempo que na alínea d do mesmo inciso assumiu a postura do critério ratione temporis, já que tornou militar o crime praticado por militar da ativa contra civil, reformado ou militar da reserva, durante o período de manobra ou exercício (Neves, Cícero Robson Coimbra: Manual de direito penal militar / Cícero Robson Coimbra Neves, Marcello Streifinger. – 4. ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 41).

  4. ... os juízes dos crimes não podem ter o direito de interpretar as leis penais, pela razão mesma de que não são legisladores. Os juízes não receberam as leis como uma tradição doméstica, ou como um testamento dos nossos antepassados, que aos seu descendentes deixaria apenas a missão de obedecer. Recebem-nas da sociedade viva, ou do soberano, que é representante dessa sociedade, como depositário legítimo do resultado atual da vontade de todos (in: Dos delitos e das penas. 5.ed. São Paulo. Revista dos Tribunais. 2011).

  5. Infere, nesse ponto, Carlos MAXIMILIANO, que: como a exegese extensiva só se proíbe acerca de dispositivos que cominem pena ou agravam a criminalidade, segue-se que a forma rigorosa de interpretar concernente às normas penais não persiste relativamente ao Processo. Aplicam-se às prescrições de Direito Adjetivo as regras comuns de Hermenêutica, nem sequer o recurso à analogia é vedado. Entretanto, tal preceito não é absoluto: quando se tratar de exceções às regras gerais, bem como de limitações à liberdade individual, ao exercício dos direitos ou a interesses juridicamente protegidos, texto considerar-se-á taxativo, será compreendido no sentido rigoroso, estrito. Assim, sucederá, por exemplo, quanto às prescrições que autorizem a prisão preventiva, o sequestro dos bens do indiciado, ou restrições ao direito de defesa (In: Hermenêutica e aplicação do direito. 19.ed. Rio de Janeiro. Forense. 2003, p. 269).

  6. No direito penal, rege a seguinte norma: uma ação é um delito desde que a legislação a declare punível. Do ponto de vista do juiz, praticamente, a punibilidade é causal. Se a lei permanecer em silêncio a respeito da punibilidade de uma ação particular, não é possível falar em punibilidade. Para ela, a ação não é um delito. Por isso, em nenhum caso pode existir uma determinação por analogia. (...) Certamente, somente será possível um aperfeiçoamento da lei através do legislador, mas nunca através do juiz (in: Metodologia Jurídica. Campinas. Edicamp. 2001, p. 45-6).

  7. In: Hermenêutica e aplicação do direito. 19.ed. Rio de Janeiro. Forense. 2003, p. 167 e 267-9.

  8. In: Hermenêutica e aplicação do direito. 19.ed. Rio de Janeiro. Forense. 2003, p. 267.

  9. É relevante, assim, discorrer, o quanto possível, sobre as hipóteses nas quais deve incidir a interpretação restritiva. E a primeira diz respeito às leis penais. Citando o preceito estrangeiro, elevado ao nível de princípio, Carlos Maximiliano faz referência ao preceito do Código Italiano de 1865, segundo o qual “as leis penais e as que restringem o livre exercício dos direitos, ou formam exceções a regras gerais ou outras leis, não se estendem além dos casos e tempos que especificam”. Exceções, ainda no sentir do mesmo e insuperável mestre, são as disposições de caráter punitivo, quando não se referem a delitos, porém cominam multa, indenização, perda temporária ou definitiva de cargo, incapacidade, privação de direitos ou regalias, nulidades, rescisão, decadência ou revogação. São, ainda, de interpretação estrita as normas que limitam a liberdade, tomada a palavra em qualquer das suas acepções (in: Direito, interpretação, aplicação e integração. São Paulo. Juarez de Oliveira. 2001, p. 28).

  10. In: Tipo penal e linguagem. Rio de Janeiro. Forense. 1982, p. 85.

  11. Aqui também, em face da elementar engenho de guerra motomecanizado, deve-se buscar um paralelismo com as demais elementares, de sorte que, restritivamente, os armamentos, as munições etc., devem estar sob administração militar, e apenas das Forças Armadas (guerra), excluindo-se seus similares relativos às Forças Auxiliares (STREIFINGER, Marcello e COIMBRA, Cícero: Manual de direito penal Militar. 4.ed. São Paulo. Saraiva. 2014, p. 653).

  12. STREIFINGER, Marcello e COIMBRA, Cícero: Manual de direito penal Militar. 4.ed. São Paulo. Saraiva. 2014, p. 653.

  13. STREIFINGER, Marcello e COIMBRA, Cícero: Manual de direito penal Militar. 4.ed. São Paulo. Saraiva. 2014, p. 653.

Sobre o autor
Ricardo Cesar Franco

Defensor Público do Estado de São Paulo, nível IV, que atua perante o E. Tribunal de Justiça Militar de São Paulo. Pós-graduado em Direito Processual Coletivo. Mestre em Filosofia do Direito pela PUC/SP. Professor de Filosofia do Direito Penal e de Direito Processual Penal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FRANCO, Ricardo Cesar. Perda, extravio ou consumo de armas portáteis e munições por membros das Forças Armadas e das Polícias Militares.: Inaplicabilidade dos arts. 265 e 266 do Código Penal Militar. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7136, 14 jan. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/102016. Acesso em: 22 dez. 2024.

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