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A aplicação do princípio da fungibilidade recursal nos embargos de declaração

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Agenda 30/12/2007 às 00:00

3.QUESTÕES POLÊMICAS ACERCA DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

Geralmente, os embargos visam à complementação e ao aclaramento da decisão recorrida, tendo efeito integrativo apenas. Essas são as principais funções e os reais objetivos desse recurso. Entretanto, eles também podem vir a alterar o julgado, segundo podemos inferir pelo art. 463, caput e inciso II, do CPC. [189]

Como já vimos anteriormente, já houve legislações brasileiras que versavam sobre os embargos declaratórios, condicionando que não deveria haver mudança na decisão após o julgamento do referido recurso. Alguns exemplos são: O Regulamento nº 737, o Decreto nº 3.084 de 1898 e o Código de Processo da Bahia. Hoje em dia, porém, isso não acontece no CPC vigente e não há mais essa previsão expressa, havendo o raciocínio de que os embargos podem ocasionar mudança no julgado. [190]

Essa mudança, porém, é uma decorrência da finalidade real dos embargos de declaração de suprir os vícios do art. 535 do CPC, sendo uma conseqüência do provimento desse recurso. Ou seja, para a correção dos vícios é necessária a alteração final da decisão e essa alteração foi oriunda da reparação. [191]

É comum haver o efeito modificativo dos embargos nos casos de eliminação de omissão, sanação de contradição e erro manifesto na decisão (art. 897-A da CLT, que por analogia pode ser aplicado ao processo civil: art. 126, CPC). Esse último caso tem sido admitido em virtude do princípio da economia processual. Também tem sido admitido o efeito infringente quando há fato superveniente, como a transação (interpretação do art. 462, CPC). [192]

Esse posicionamento, porém, não é unânime, encontrando divergência, por exemplo, em relação ao entendimento de Vicente Miranda, para quem os embargos têm uma finalidade restrita, sendo que o legislador não deve ampliá-la sob pena de desvirtuar o recurso com sua equiparação a outras modalidades recursais. [193]

Entende o referido autor, que não deve ser aceita a possibilidade de alteração do julgado, pois embora essa hipótese seja válida para a economia processual, não pode prevalecer porque isso vai contra a regulamentação positiva deste recurso específico, sendo que para modificação de julgados estão previstos outros recursos e não os embargos de declaração. [194]

3.2.Efeito devolutivo

Como os embargos provocam uma nova manifestação do Judiciário acerca da matéria questionada, está presente o efeito devolutivo. [195]

Como já foi comentado anteriormente, o reexame da decisão impugnada visando à sua reforma ou modificação, pode ser feito pela mesma autoridade judiciária ou por outra hierarquicamente superior. [196]

Essa é uma questão polêmica, pois há doutrinadores, como Barbosa Moreira, Vicente Miranda, Ovídio Baptista e Dinamarco, que entendem que só há o efeito devolutivo com a reapreciação da questão por órgão hierarquicamente superior. O primeiro [197] e o segundo [198] autores dizem que os embargos não possuem efeito devolutivo e o terceiro [199] e o quarto [200] entendem que os embargos têm apenas efeito de retratação, por serem interpostos perante o julgador que proferiu a decisão impugnada.

Luis Roberto Demo explica que os embargos de declaração possuem um efeito devolutivo anômalo justamente por seu destinatário ser o juízo prolator da decisão impugnada. [201]

A posição que prevalece na doutrina, entretanto, é a de que já basta para garantir a presença do efeito devolutivo simplesmente o fato de haver a devolução da matéria ao Poder Judiciário, mesmo que essa devolução não seja a órgão hierarquicamente superior. [202]

Assim ensina Nelson Nery Jr.:

Para configurar-se o efeito devolutivo é suficiente que a matéria seja novamente devolvida ao órgão judicante para resolver os embargos. O fato de o órgão destinatário dos embargos ser o mesmo de onde proveio a decisão embargada não empece a existência do efeito devolutivo neste recurso. [203]

3.3.Efeito suspensivo

O efeito suspensivo, conforme já explicitado, ocorre quando a interposição de um recurso impede que a decisão impugnada produza desde logo seus efeitos, prolongando a ineficácia da sentença. [204]

Assim, esse efeito nada tem a ver com suspensão de prazo, mas sim com a eficácia da decisão embargada. [205]

Ressaltando novamente a idéia de Barbosa Moreira, a denominação "efeito suspensivo" não é a mais adequada, porque traz a idéia de que passa a haver a suspensão dos efeitos da decisão recorrida apenas com a interposição do recurso, como se antes da interposição os efeitos estivessem se manifestando normalmente. Contudo, não é isso que ocorre, porque mesmo antes de interposto o recurso, a decisão estava sujeita a ele, sendo portanto, ato ainda ineficaz, apenas prolongado com a interposição recursal. [206]

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Na prática, o efeito suspensivo inicia-se com a publicação da sentença e perdura pelo menos até que termine o prazo para que o interessado ou a parte recorram. E caso recorram, o efeito suspensivo se prolongará até a publicação da decisão que julga o recurso interposto, o qual deverá possuir o referido efeito. [207]

Caso não haja impugnação de toda a decisão, o efeito suspensivo limitar-se-á à parte da decisão que foi impugnada, sendo que, se a outra parte não foi objeto de impugnação, poderá haver sua execução provisória. [208]

Conforme explica Luís Eduardo Simardi, a regra é de que os recursos apresentam efeito suspensivo, já que quando não deve haver esse efeito, há a discriminação expressa, como podemos observar no art. 497 do CPC, em relação ao recurso extraordinário, ao recurso especial e ao agravo de instrumento, os quais, inicialmente possuem apenas o efeito devolutivo. [209]

Assim, é significativa e bastante razoável a idéia do efeito suspensivo nos embargos declaratórios, até porque o vício contido na decisão judicial pode dificultar seu cumprimento e sua execução, daí a importância de primeiramente os vícios serem sanados. [210]

Então, a princípio, os embargos de declaração devem ser recebidos no efeito suspensivo, inclusive quando interpostos contra decisões interlocutórias. Quando, porém, estivermos diante de uma decisão proferida em vista da iminência do acontecimento de dano irreparável, em que foi deferida, por exemplo, a antecipação de tutela para evitar esse dano, não deve haver a regra do efeito suspensivo. Isso, é claro, se a decisão interlocutória não tiver vício que impeça sua compreensão, privilegiando assim a efetividade processual e evitando o dano à parte. [211]

3.4.Efeito interruptivo

O efeito interruptivo dos embargos declaratórios se refere à interrupção do prazo para a interposição de outros recursos, por qualquer das partes. (art. 538, CPC). [212]

Como já foi comentado anteriormente, no Código originário de 1973, a interposição dos embargos de declaração suspendiam o prazo para a interposição de outros recursos. Entretanto, com as várias dúvidas e a insegurança gerada pelo dispositivo sobre a suspensão, a reforma do Código de Processo Civil trouxe a alteração de "suspensão" para "interrupção" do prazo e com alcance a ambas as partes. [213]

Conforme ensina Bernardo Pimentel: "...os prazos para a interposição de outros recursos são reabertos integralmente após a intimação da decisão proferida nos embargos declaratórios." [214]

Os embargos, porém, só interrompem o prazo para interposição dos demais recursos quando forem conhecidos. Assim orienta o Verbete de Jurisprudência nº 13 da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região: "Os Embargos de declaração não devem ser conhecidos nas hipóteses de intempestividade, de irregularidade de representação ou quando a parte sequer alega omissão, contradição ou obscuridade. Em tais casos, não interrompem o prazo recursal, não sendo vinculativa a decisão originária que tenha concluído diversamente." [215]

Luís Eduardo Simardi manifesta entendimento diverso, explicando que a interrupção do prazo decorre apenas da interposição dos embargos e independe de serem acolhidos, a não ser que estejam intempestivos, pois se assim não fosse, estaria instaurada grande insegurança jurídica. [216]

A única exceção à interrupção do prazo ocorre quanto à interposição de embargos declaratórios contra sentença prolatada em ação nos Juizados Especiais Cíveis, pois nesse caso há apenas a suspensão do prazo para outros recursos (art. 50 da Lei nº 9.099/95). [217]

3.5.Contraditório

No direito processual civil, há o cumprimento da exigência constitucional do contraditório quando às partes é dado o conhecimento dos atos processuais, havendo a garantia da possibilidade de responderem aos atos desfavoráveis. [218]

Em relação ao recurso dos embargos declaratórios, porém, é bastante controvertido o posicionamento dos doutrinadores sobre a possibilidade do contraditório, ou seja, à intimação do recorrido para responder ao recurso. [219]

Cândido Rangel Dinamarco entende que: "Em termos práticos, o procedimento dos embargos declaratórios com fins infringentes deve incluir a oportunidade para que o embargado ofereça contra-razões, sob pena de nulidade." [220]

Assim, apenas no caso de haver a possibilidade de alteração no julgado será necessário o contraditório, pois estará sendo postulada uma decisão que pode tirar do embargado a condição de parte vencedora e tornar-lhe sucumbente. [221]

De acordo com esse entendimento temos o Verbete de Jurisprudência nº 11 da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, que orienta: "Apenas na hipótese em que seja possível emprestar efeito modificativo aos Embargos Declaratórios é que se abrirá oportunidade para a parte contrária se manifestar." [222]

O referido Verbete está de acordo com a Orientação Jurisprudencial nº 142 da Subseção de Dissídios Individuais - I do Tribunal Superior do Trabalho, que assim orienta: "Em 10.11.97, a SDI-Plena decidiu, por maioria, que é passível de nulidade decisão que acolhe embargos declaratórios com efeito modificativo sem oportunidade para a parte contrária se manifestar." [223]

Vicente Miranda também entende que deve haver o contraditório, mas por motivo diverso. Ele explica que a decisão que julga os embargos pode trazer sérias conseqüências ao processo no momento em que sanar os vícios apontados, pois há a possibilidade de alguma modificação no julgado se o juiz for induzido a erro pelo embargante. [224]

Assim, de acordo com o referido doutrinador, a presença do recorrido poderá alertar o juiz em relação a tais circunstâncias e demonstrar, inclusive, a inadmissibilidade do recurso e sua improcedência, havendo, portanto, a necessidade e conveniência de haver o contraditório, devendo até mesmo ser obrigatória a participação da parte contrária. [225]

Sérgio Bermudes tem um entendimento oposto aos autores que defendem a respeito ao princípio do contraditório em relação aos embargos. Defende esse doutrinador que não há motivo de haver participação da parte contrária no julgamento dos embargos, já que eles se destinam apenas a um esclarecimento sobre a decisão embargada. [226]

Há também uma posição intermediária expressa por Antonio Carlos de Araújo Cintra, que entende que como a matéria decidida já foi objeto de contraditório, não é necessária outra audiência do embargado. Se a matéria objeto dos embargos ainda não foi debatida pelas partes, aí sim, é o caso de contraditório. [227]

Entretanto, o embargante não pode inovar com novos fatos, provas e alegações. Poderá apenas se referir ao que já foi discutido no processo, mas que não foi totalmente decidido pelo julgador que prolatou decisão viciada. As únicas questões que podem ser suscitadas pela primeira vez em sede de embargos são as questões de ordem pública, pois estas poderiam ser até mesmo conhecidas de ofício. Aí sim, deve haver o contraditório, até porque essa matéria não foi debatida anteriormente. [228]

Luís Eduardo Simardi concorda com o posicionamento de Araújo Cintra, esclarecendo que o mais importante é analisar se a matéria em questão já foi discutida em momento processual anterior ou não. Se não foi, deve haver o contraditório, mas apenas nesse caso. Ele explica ainda que o fato de poder haver efeito modificativo no julgado não traz a exigência do contraditório, porque esse efeito é conseqüência natural da correção dos vícios e nesse caso a matéria já foi debatida antes. [229]

3.6.Embargos prequestionadores

O prequestionamento é visto como obstáculo de difícil superação para dificultar a subida do volume excessivo de recursos de natureza extraordinária aos tribunais superiores, que sem esse requisito não são admitidos. [230]

Há três correntes que definem a expressão "prequestionamento". Alguns entendem que é o levantamento pelas partes da matéria federal ou constitucional antes do julgamento da decisão recorrida. Já outros entendem que não adianta apenas a matéria ter sido suscitada pelas partes, porque também precisa ter sido decidida pelo acórdão recorrido. Uma outra corrente, defende que a matéria, para ser considerada prequestionada, deve ter sido decidida, independente de ter sido debatida pelas partes. [231]

De acordo com a primeira corrente orienta a Súmula nº 297 do TST:

I. Diz-se prequestionada a matéria ou questão quando na decisão impugnada haja sido adotada, explicitamente, tese a respeito. II. Incumbe à parte interessada, desde que a matéria haja sido invocada no recurso principal, opor embargos declaratórios objetivando o pronunciamento sobre o tema, sob pena de preclusão. III. Considera-se prequestionada a questão jurídica invocada no recurso principal sobre a qual se omite o Tribunal de pronunciar tese, não obstante opostos embargos de declaração. [232]

A corrente dominante, porém, é a que defende que a matéria será tida como prequestionada quando for decidida no pronunciamento judicial, independente de ter sido ou não suscitada pela parte. [233]

Diante da omissão do juízo a quo em relação ao tema que se deseja submeter ao tribunal superior, a interposição de embargos declaratórios é instrumento importante. Assim dispõe a Súmula nº 356 do STF: "O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento." [234]

Há doutrinadores, como Rodolfo Mancuso, que consideram que os embargos prequestionadores não visam à correção de nenhum dos vícios do art. 535 do CPC, mas sim servem para prequestionar, sendo esse um motivo específico. [235]

Explica Luís Eduardo Simardi que é errado afirmar que os embargos prequestionadores não têm o objetivo de sanar os vícios contidos no art. 535 do CPC, pois sua interposição justifica-se pela omissão na decisão embargada.

Entretanto não basta a interposição dos embargos para haver o prequestionamento, já que o julgador pode ser provocado e não se manifestar sobre a matéria em questão. Conforme a Súmula nº 211 do STJ: "é inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo." [236]

Assim, se não for dado provimento aos embargos prequestionadores, os recursos de natureza extraordinária não devem ser conhecidos, porque não foi atendido o requisito do prequestionamento. [237]

Sobre a autora
Melina Silva Pinto

assistente de juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINTO, Melina Silva. A aplicação do princípio da fungibilidade recursal nos embargos de declaração. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1642, 30 dez. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10798. Acesso em: 19 dez. 2024.

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