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A Operação Acolhida e a universalização dos direitos humanos

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Quais os desafios para a universalização de direitos humanos como segurança, saúde e educação dos imigrantes na Operação Acolhida?

Resumo: Inaugurada em 2018, a Operação Acolhida representa uma iniciativa do governo brasileiro destinada a acolher e assistir os imigrantes venezuelanos que ingressam no Brasil em decorrência da crise política, econômica e humanitária enfrentada pela Venezuela. Nesse sentido, o objetivo do artigo é analisar a operação à luz dos direitos humanos, explorando suas características, desafios e oportunidades para universalizar esses direitos, incluindo a mensuração de seus resultados. Para tanto, através da pesquisa bibliográfica e da observação empírica foi verificado que, apesar dos esforços do governo brasileiro e de instituições parceiras, ainda existem desafios para a universalização dos direitos humanos na Operação Acolhida, como a garantia da segurança, da saúde e da educação dos imigrantes. Contudo, vislumbrou-se que a operação apresenta oportunidades para a promoção dos direitos humanos, como a integração dos imigrantes na sociedade brasileira. Ao fim, concluiu-se que a operação deve ser continuamente avaliada e aprimorada, de forma a garantir o pleno respeito aos direitos humanos dos imigrantes venezuelanos.


1. INTRODUÇÃO

Devido ao rápido declínio da estrutura econômica venezuelana, ocasionado por políticas públicas equivocadas durante o final do mandato de Hugo Chávez e nos governos socialistas subsequentes, especialmente durante a gestão do atual presidente Nicolás Maduro, a crise migratória na fronteira entre Brasil e Venezuela emerge como um dos principais desafios humanitários enfrentados pelo Brasil nos últimos anos.

Isto porque a falta de diversificação econômica, com a economia dependendo quase que exclusivamente da venda de petróleo, somada à queda do preço do barril no mercado internacional, fez o país vizinho mergulhar na maior crise política, econômica e social de sua história, gerando a maior inflação do mundo e uma taxa de desemprego crescente.

Esse cenário teve como consequência o impulsionamento da saída em massa de venezuelanos, principalmente para o Brasil, Peru e Colômbia, criando uma crise de refugiados que se espalhou por todo o continente sul-americano.

Buscando dirimir essa grave crise, o Brasil deu início a Operação Acolhida em 2018 com o objetivo de oferecer assistência humanitária e acolhimento aos migrantes e refugiados venezuelanos que chegam ao país em busca de proteção e condições melhores de vida.

Sucede-se que, em que pesem os esforços do governo brasileiro em oferecer assistência aos migrantes e refugiados, a Operação Acolhida tem sido alvo de discussões acerca da sua efetividade e impacto na universalização dos direitos humanos, demonstrando que ainda há desafios em relação à garantia dos direitos dessas pessoas, como acesso à educação, saúde, trabalho e moradia.

Diante disso, este trabalho tem como objetivo analisar a operação acolhida à luz dos direitos humanos, explorando suas características, desafios e oportunidades para universalizar esses direitos, incluindo a mensuração de seus resultados.

A importância deste trabalho reside na necessidade de compreender os desafios enfrentados pelos migrantes e refugiados venezuelanos no Brasil, bem como as ações do governo brasileiro para lidar com essa crise humanitária. Além disso, o trabalho pode contribuir para a formulação de políticas públicas mais efetivas em relação aos direitos humanos dos migrantes e refugiados.

Nesse sentido, a estrutura deste artigo científico é composta por cinco capítulos.

No primeiro, será apresentada uma revisão da literatura sobre os Direitos Humanos, abordando principalmente sobre os princípios e conceitos. No segundo, será feita uma contextualização da crise política na Venezuela, demonstrando quais foram os motivos pelo qual se instaurou a crise política e econômica na Venezuela e a consequente crise migratória na fronteira entre Venezuela e Brasil.

Firmadas as premissas conceituais, no terceiro capítulo, será discutido a Operação Acolhida, baseando na sua história, objetivos, estratégias e instituições participantes. No quarto capítulo, será feito uma análise da Operação Acolhida à luz dos Direitos Humanos, avaliando os resultados desta Operação e discutindo sobre os desafios e oportunidades da universalização dos Direitos Humanos neste caso. E, por fim, serão apresentadas as considerações finais.

Espera-se que este trabalho contribua para a compreensão da relação entre a Operação Acolhida e a universalização dos Direitos Humanos, assim como para a formulação de políticas públicas mais efetivas em relação aos migrantes e refugiados venezuelanos no Brasil.


2. DIREITOS HUMANOS: CONCEITOS E PRINCÍPIOS

2.1. Conceitos e princípios dos direitos humanos

Os Direitos Humanos são um conjunto de normas, princípios e valores que visam proteger a dignidade humana e garantir a igualdade e a liberdade dos indivíduos, independentemente de sua raça, etnia, religião, orientação sexual, gênero, condição social, entre outras características. A ideia de dignidade humana está no centro dos Direitos Humanos, uma vez que todas as pessoas devem ser tratadas com respeito e consideração, independentemente de sua posição social ou econômica.

Intrinsecamente ligados aos Direitos Humanos, os valores e normas são fatores fundamentais para que seja possível estabelecer relações, sejam elas políticas, econômicas ou sociais, possibilitando a vida em sociedade.

Os valores são características baseadas em crenças morais e éticas ligadas ao modo do ser humano se comportar em sociedade. São essas características que definem a forma de relacionamento entre as pessoas e o meio ambiente.

Assim, temos como conceito de norma:

uma norma ou princípio que orienta o comportamento humano em uma determinada sociedade ou grupo social, estabelecendo padrões de conduta e definindo o que é permitido, obrigatório ou proibido em determinadas circunstâncias. As normas podem ser formais, quando são expressas em leis, regulamentos, códigos ou outras fontes jurídicas, ou informais, quando são transmitidas por tradição, costume, hábito ou convenção.1

A dignidade humana é um conceito fundamental para os Direitos Humanos e é reconhecida internacionalmente como tal. Em sua DUDH (Declaração Universal de Direitos Humanos) de 1948, a ONU (Organização das Nações Unidas) afirmou que: "todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”2. Isso significa que todas as pessoas têm o direito de serem tratadas com respeito e igualdade, e que nenhuma pessoa deve ser submetida a tratamento desumano, cruel ou degradante.

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Na medida em que a sociedade foi se desenvolvendo, ao longo dos anos, a humanidade foi construindo suas próprias regras de convivência e seus valores, tornando as relações humanas sustentáveis e ordenadas. Isto posto, foram aos poucos sendo criados os diversos conceitos e princípios dos Direitos Humanos.

Os direitos humanos são “aqueles direitos fundamentais que o homem possui pelo fato de ser homem, por sua natureza humana, pela dignidade que a ela é inerente”3.

O entendimento de Maria Victória Benevides coincide com a visão predominante acerca dos direitos humanos, os quais são reconhecidos como direitos universais, inerentes à dignidade de todo ser humano, sem distinção de raça, gênero, classe social, religião, etnia ou cidadania. Tais direitos são considerados naturais e, portanto, devem ser garantidos pelos poderes públicos, independentemente de seu reconhecimento formal pela legislação, por serem superiores à própria lei. Nessa perspectiva, os direitos humanos constituem um valor universal, ético e moral que deve ser respeitado e protegido em todas as circunstâncias4.

Desta forma pode-se explicar que essa pluralidade de conceitos ocorre por conta da diversidade de perspectivas a partir das quais eles são analisados5.

Com base nessa diversidade de conceitos, conseguimos extrair os princípios, que são nada mais que as principais características desse ramo do direito tão importante para a vida em sociedade. Todos os Direitos Humanos são históricos, indivisíveis, interdependentes, inalienáveis e universais. Esse último, devido sua importância para o estudo, trataremos em um subcapítulo próprio.

Flávia Piovesan defende que a historicidade dos direitos humanos:

não são um dado, mas um construído, uma invenção humana, em constante processo de construção e reconstrução. Enquanto reivindicações morais, os direitos humanos são fruto de um espaço simbólico de luta e ação social, na busca por dignidade humana, o que compõe um construído axiológico emancipatório.6

Com base nisso, o princípio da historicidade justifica a pluralidade de conceitos sobre o que são os Direitos Humanos. Este princípio defende que os Direitos Humanos não foram concebidos como um conjunto de normas imutáveis e atemporais, mas sim, como um processo histórico e evolutivo. São normas que se desenvolveram ao longo do tempo em resposta às mudanças sociais, culturais, políticas e econômicas em diferentes épocas e lugares7.

Desta forma, temos que os Direitos Humanos são dinâmicos, e que devem ser constantemente reavaliados e atualizados para atender às necessidades e demandas de uma sociedade em constante mudança.

Na sequência, outro importante princípio é o princípio da indivisibilidade, pois enfatiza a interdependência e a interconexão entre os diversos direitos e liberdades humanas. Segundo Flávia Piosevan a nossa Carta Magna adota a “concepção contemporânea de direitos humanos, pela qual eles são concebidos como unidade indivisível, interdependente e inter-relacionada, na qual os valores da igualdade e liberdade se conjugam e se completam”8.

Ainda sobre a questão da indivisibilidade dos direitos humanos, a DUDH de 1948 já afirmava que “todos os direitos e liberdades nela enunciados são igualmente garantidos, sem qualquer distinção de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza”9.

Outro princípio marcante do Direitos Humanos é a interdependência. Esse princípio destaca que todos os direitos humanos estão inter-relacionados e são interdependentes, ou seja, a realização de um direito pode depender da realização de outros direitos.

Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância, “A realização de um direito muitas vezes depende, no todo ou em parte, da realização de outros. Por exemplo, a realização do direito à saúde pode depender da realização do direito à educação ou do direito à informação”10. Sendo assim, se uma criança não tiver acesso à educação, pode ser mais difícil garantir que ela tenha acesso a informações e serviços de saúde.

Já o princípio da inalienabilidade estabelece que esses direitos não podem ser transferidos ou cedidos a outras pessoas ou entidades, pois são inerentes à dignidade humana. Em outras palavras, os direitos humanos são intransferíveis e não podem ser renunciados, vendidos ou violados em qualquer circunstância.

Para Flávia Piovesan, com a evolução dos direitos humanos, esses direitos não puderam mais ser concebidos como uma espécie de generosidade dos Estados, mas passaram a ser inerentes e inalienáveis11.

No entanto, entre os diversos princípios que permeiam os direitos humanos, destaca-se, para este estudo, o princípio da universalização, porquanto esse princípio reafirma que os direitos humanos são universais e devem ser assegurados a todas as pessoas, sem exceção.

Isso implica a cognição de que tais direitos são aplicáveis a todos os seres humanos, independentemente de sua nacionalidade, raça, gênero, religião, orientação sexual ou qualquer outra característica.

O renomado autor Pérez Luño destaca que o universalismo é um princípio fundamental dos direitos humanos, sendo a ideia de sua universalidade uma premissa básica. Ele ressalta que os direitos humanos são uma construção histórica, com base em duas correntes ideológicas: o iusnaturalismo racionalista e o contratualismo12.

O iusnaturalismo racionalista é uma concepção filosófica que defende a existência de uma ordem natural que regula as relações entre os seres humanos e que serve de base para a criação das leis e normas jurídicas. Essa ordem natural é considerada superior às leis criadas pelos seres humanos e, portanto, serve como critério para avaliar a justiça ou injustiça de uma lei ou ação política.

Segundo essa corrente, os direitos humanos não são criados pelo Estado ou pela sociedade, mas são anteriores a eles e decorrem da natureza humana. O iusnaturalismo racional defende que todos os seres humanos possuem direitos inalienáveis e universais, como a vida, a liberdade, a igualdade e a propriedade. Esses direitos são considerados naturais, porque não dependem da vontade do Estado ou da sociedade, mas são inerentes à própria condição humana.

Já o contratualismo, estabeleceu a ideia de que o poder político deve ser legitimado a partir do consentimento dos indivíduos e que estes possuem direitos inalienáveis e anteriores ao Estado, não podendo, desta forma, ser objeto do arbítrio dos governantes.

Nesse contexto, a universalização dos direitos humanos passa a ser entendida como uma demanda ética e moral de respeito à dignidade humana, que deve ser protegida independentemente da condição social, econômica, política, cultural ou étnica das pessoas. Essa visão se alinha com a noção de que os direitos humanos devem ser protegidos em todo o mundo, conforme afirma a DUDH: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”13.

Com o passar do tempo, após a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o princípio da universalização dos direitos humanos foi constantemente reafirmado em diversos tratados e declarações.

O Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos estabelece, em concordância com a Declaração Universal dos Direitos Humanos que “todos as pessoas são iguais perante a lei e têm direito à igual proteção da lei, sem discriminação alguma”14.

Também, a Proclamação de Teerã, emitida na 1ª Conferência Mundial de Direitos Humanos da ONU, corroborou com a DUDH, afirmando que:

É indispensável que a comunidade internacional cumpra sua obrigação solene de fomentar e incentivar o respeito aos direitos humanos e as liberdades fundamentais para todos, sem distinção nenhuma por motivos de raça, cor, sexo, idioma ou opiniões políticas ou de qualquer outra espécie15.

Depois disso na 2ª Conferência Mundial de Direitos Humanos da ONU, realizada em Viena, decidiu de maneira simples e objetiva que: “todos os direitos humanos são universais”16.

No Brasil, o princípio da universalização dos direitos humanos é garantido pela Constituição Federal de 1988, que em seu artigo 5º estabelece que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza" e que "todos são titulares de direitos e liberdades fundamentais"17.

Além disso, a Constituição estabelece a obrigação do Estado de garantir a proteção e promoção dos direitos humanos, bem como a responsabilidade de todos os indivíduos na defesa desses direitos.

Por conta desse importante princípio e da garantia prevista na Carta Magna, todos, inclusive os imigrantes, fazem jus à proteção dos direitos fundamentais garantidos pelos diversos tratados e declarações já citadas, independentemente de sua nacionalidade ou condição migratória, possibilitando o acesso à saúde, educação, trabalho, liberdade de expressão e religião.


3. A CRISE POLÍTICA NA VENEZUELA E O FLUXO MIGRATÓRIO PARA O BRASIL

Durante os anos 90, ocorreu a ascensão de Hugo Cháves como político e integrante do Movimento Bolivariano Revolucionário 200 (MBR 200), grupo paramilitar, que em 1992 organizou uma tentativa fracassa de golpe contra a presidência do país culminando na prisão de Cháves e outros participantes.

Após a anistia em 1994, Cháves decide construir sua carreira política, sendo eleito Presidente da Venezuela em 1998, onde permaneceu por 14 anos, conseguindo a reeleição nos anos de 2000, 2006 e 2012. Com um governo baseado em ações socialistas e populistas, defendeu a necessidade da promoção de justiça social por meio do principal produto da economia do país, o petróleo.

O governo chavista foi acusado de contribuir de maneira significativa para o enfraquecimento da democracia na Venezuela, sendo uma das ações o aparelhamento do Tribunal Supremo de Justiça, Alta Corte do país, aumentando o número de juízes de 20 para 32 e nomeando 12 deles, fiéis defensores do seu modo de governo.

Concomitante, Cháves aumentou o controle do Estado sobre a economia, nacionalizando várias empresas, incluindo petrolíferas e siderúrgicas, aumentando de maneira expressiva a corrupção e a dependência da economia em relação ao petróleo. Também, restringiu a liberdade de imprensa, perseguindo jornalistas opositores e fechando canais de rádio e televisão que se opunham ao governo. Além dessas, o governo promoveu reformas na Constituição que foram utilizadas para a sua perpetuação no poder.

Por conta disso, foi se criando uma forte divisão no país. Por meio de suas ações populistas e regulação da mídia, o governo de Cháves conquistou uma massa de apoiadores, entretanto, também criou uma radical oposição que culminou em uma tentativa, também fracassada, de golpe em 2002.

Não se consegue determinar uma data exata de quando se inicia a crise, mas sabe-se que seu início foi no ano de 2013, após a morte de Hugo Cháves, quando o país passou a ser governado pelo seu vice, Nicolás Maduro, sendo vencedor das eleições feitas no mesmo ano.

Na economia, um dos principais motivos para a crise na Venezuela foi a desvalorização internacional do preço do petróleo, que ocorreu principalmente devido à desaceleração do crescimento econômico da China e da Europa, que são grandes consumidores desse óleo. Além disso, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo, da qual a Venezuela é membro, decidiu não reduzir a produção de petróleo, o que impactou negativamente a economia venezuelana. Essa decisão resultou em uma oferta excessiva de petróleo no mercado mundial, ocasionando uma queda ainda maior nos preços.

Em junho de 2014, o barril de petróleo custava U$ 115,00, acumulando uma perda de 60%, em janeiro de 2015 estava sendo negociado U$ 46,59. Com a queda no preço da commoditie, a Venezuela se viu entrando em uma das maiores crises econômicas já vista no mundo, uma vez que 95% das receitas de exportação e mais de 50% do Produto Interno Bruto do país advinha da produção petroleira18.

Aliado com a queda no preço da commoditie, durante o governo de Nicolás Maduro, observa-se a má gestão econômica generalizada, devido a adoção de políticas econômicas insustentáveis, como a impressão de dinheiro para financiar os elevados gastos públicos, ocasionando uma hiperinflação, que no ano de 2018 chegou a incríveis patamares de 130.060% ao ano19.

Além disso, a fixação de preços máximos, expropriação de empresas e controles cambiais, geraram desestímulo à produção e ao investimento, agravou ainda mais a escassez.

Deveras, tudo isso afeta a população de diversas maneiras, ocasionando a escassez de produtos básicos de subsistência, alimentos, medicamentos, produtos de higiene e até mesmo, em um dos países com as maiores reservas de petróleo do mundo, combustível.

Por conta dessa crise política, a imigração de venezuelanos para o Brasil vem sendo intensificada nos últimos anos, estimando-se que mais de 6 milhões de venezuelanos tenham deixado o país nos últimos anos. Este fluxo migratório, se igualou ao número de pessoas que se deslocaram fugindo da guerra na Ucrânia e superou à da Síria20.

De acordo com o Relatório do Subcomitê Federal para recepção, identificação e triagem dos imigrantes, entre janeiro de 2017 e fevereiro de 2023, o Brasil acolheu cerca de 853.566 venezuelanos que entraram no país, principalmente pelo estado de Roraima21.

O fluxo migratório é o movimento de pessoas de um lugar para outro, geralmente com o objetivo de se estabelecer em um novo país ou região que pode ser motivado por uma variedade de fatores, incluindo busca por melhores oportunidades de trabalho, educação, condições econômicas, conflitos políticos ou sociais, desastres naturais, entre outros.

Ao longo da história, o fluxo migratório foi responsável por uma série de mudanças culturais e demográficas em todo o mundo, sendo uma fonte de força e inovação em muitos países, mas também tem sido a causa de tensões e conflitos.

A imigração por motivos políticos ocorre quando as pessoas são forçadas a deixar seus países de origem devido à perseguição política, conflitos armados, violações dos direitos humanos, discriminação étnica ou religiosa, entre outras causas.

Por óbvio, as pessoas que sofrem com essas situações geralmente têm seus direitos fundamentais violados, incluindo o direito à vida, à liberdade e à integridade física e psicológica. Portanto, a imigração política é uma forma de buscar proteção em outro país que possua condições mais favoráveis, como um governo mais democrático, uma sociedade mais inclusiva e um sistema jurídico mais respeitoso aos direitos humanos.

O Artigo 1º da Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados, define o refugiado como uma pessoa que:

2) Que, em conseqüência dos acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 e temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país, ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha sua residência habitual em conseqüência de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele.22

Alguns anos depois, a Declaração de Cartagena foi responsável por ampliar a definição de refugiado, dizendo que os refugiados são:

as pessoas que tenham fugido dos seus países porque sua vida, segurança ou liberdade tenham sido ameaçadas pela violência generalizada, a agressão estrangeira, os conflitos internos, a violação maciça dos direitos humanos ou outras circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública.23

Já no Brasil, o ordenamento jurídico pátrio dispõe sobre a problemática em dois dispositivos normativos, a Constituição Federal de 1988 e a Lei nº 9.474/97, que define os mecanismos para a implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951. Nesta última, a definição de refugiado converge com a às ditas acima, conceituando como:

Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que: I - Devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país; II - Não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior; III - Devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.24

Desta forma, em busca do reconhecimento de refúgio, o fluxo migratório da Venezuela para o Brasil apresenta características únicas e complexas.

Primeiramente, destaca-se que a maioria dos imigrantes são jovens e do sexo masculino, todavia, é importante destacar que a presença de mulheres, crianças e idosos é significativa e deve ser considerada, uma vez que esses grupos possuem necessidades específicas que precisam ser atendidas.

Devido ao alto grau de vulnerabilidade desses imigrantes e à concentração do fluxo migratório no estado de Roraima, surgem diversos desafios para a Operação Acolhida, pois o estado é o menor e mais novo do Brasil e não possui grande experiência em fluxos migratórios, o que dificulta a efetiva inserção dos imigrantes.

Noutro ponto, destaca-se que grande parte dos imigrantes escolhe a fronteira seca entre Pacaraima e Santa Elena de Uairén, na Venezuela para a entrada no Brasil, tornando Pacaraima a principal porta de entrada dos imigrantes venezuelanos para o Brasil. Todavia, a cidade tem uma população estimada de 20.108 habitantes25.

Dessa forma, esses imigrantes são frequentemente confrontados com condições precárias e perigosas durante a jornada imigratória, optando por vezes a caminhar por cerca de 15 km, distância entre as duas cidades, enfrentando riscos de segurança e saúde, transformando uma pequena viagem em uma caminhada que pode durar vários dias.

Sobre os autores
Jamil Pereira de Santana

Mestre em Direito, Governança e Políticas Públicas pela UNIFACS - Universidade Salvador | Laureate International Universities. Possui pós-graduações em Direito Público (Constitucional, Administrativo e Tributário) pelo Centro Universitário Estácio e em Licitações e Contratos Administrativos pela Universidade Pitágoras Unopar Anhanguera. Atualmente cursa especialização em Direito Societário e Governança Corporativa pela Legale Educacional. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Estácio da Bahia. É 1 Tenente R2 do Exército Brasileiro e membro ativo na Comissão Nacional de Direito Militar da ABA (Associação Brasileira de Advogados), além de integrar a Comissão Especial de Apoio aos Professores da OAB/BA. Compõe o Conselho Editorial da Revista Direitos Humanos Fundamentais da UNIFIEO e da Editora Mente Aberta. Atua como Professor de Direito Administrativo na Múltipla Difusão do Conhecimento, onde também coordena o curso preparatório para a 2 fase do Exame da OAB em Direito Administrativo. Advogado contratado pelas Obras Sociais Irmã Dulce, com experiência em Direito Administrativo e Militar.

Victor de Alencar Amorim

Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Estácio da Bahia; 1° Tenente do Exército Brasileiro; Especialista em Direito Militar e Assessor Jurídico do 19° Batalhão de Caçadores

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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