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A constitucionalidade da "lista suja" como instrumento de repressão ao trabalho em condições análogas à de escravo no Brasil

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Agenda 21/02/2008 às 00:00

6. CONCLUSÃO

Finalmente, chegamos à conclusão deste trabalho, que oportunamente traz a densificação dos pontos principais dos capítulos construídos.

1. Desde os anos 90, quando foi oficialmente reconhecida a presença de trabalho forçado e degradante no Brasil, algumas medidas vêm sendo tomadas visando à erradicação desse grave problema, merecendo destaque o Cadastro de Empregadores que tenham mantido trabalhadores em condições análogas à de escravo, instituído pela Portaria nº 540/2004 do Ministério do Trabalho e Emprego e também conhecido como "lista suja". Esse instrumento está respaldado, dentre outros dispositivos legais e principiológicos, pelos arts. 21, XXIV e 87, parágrafo único, I e II da CF e 913 da CLT.

2. A inclusão do nome dos infratores no Cadastro apenas é efetivada após decisão administrativa final referente ao auto de infração lavrado em procedimento fiscalizatório no qual tenham sido identificados trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravo. Nesse procedimento, há a estrita observância da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal administrativos.

3. O referido banco de dados é atualizado semestralmente pelo Ministério do Trabalho e Emprego, tendo ocorrido sua última atualização em 17.7.2007, quando passou a conter 192 infratores, entre pessoas físicas e jurídicas, não computados os casos de exclusão por força de decisão judicial. A atualização consiste na inclusão de nomes de empregadores cujos autos de infração não estejam mais sujeitos aos recursos na esfera administrativa e da exclusão daqueles que, ao longo de dois anos, sem reincidência, contados de sua inclusão no Cadastro, sanaram as irregularidades identificadas pela inspeção do trabalho e efetuaram o pagamento das multas resultantes da ação fiscal e dos eventuais débitos trabalhistas e previdenciários.

4. Em decorrência do caráter informativo da "lista suja", da qual têm ciência os órgãos públicos e a sociedade, atitudes importantes vêm sendo tomadas contra os que nela constam, como forma de reagir à prática da manutenção de trabalhadores em condição análoga à de escravo. Dentre elas, destacam-se: o afastamento dos supermercados e dos consumidores das mercadorias ou serviços que venham direta ou indiretamente dos produtores rurais autuados (o auto de infração é dotado de fé pública) e a restrição da concessão de créditos por bancos estatais e privados a pessoas físicas e jurídicas cujos nomes constem da "lista suja".

5. Muitos empregadores cujos nomes foram devidamente inseridos no Cadastro têm ajuizado ações judiciais, especialmente mandados de segurança ou ações ordinárias com pedido de antecipação de tutela, com objeções à inclusão de seus nomes, sustentando a inconstitucionalidade da medida, por afronta ao direito de propriedade (art. 5º, XXII, da CF); ao princípio da reserva legal e da legalidade (art. 5º, II e XXXIX, da CF); da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da CF); do devido processo legal e da ampla defesa e contraditório, acarretando ainda danos irreparáveis e agressivo constrangimento aos infratores, o que infelizmente já foi acolhido por alguns juízes.

6. A inserção dos nomes dos escravagistas na "lista suja" não ofende a principiologia constitucional, mas, pelo contrário, respeita e segue seus preceitos maiores, principalmente a dignidade humana e o valor social do trabalho, consagrando-se como instrumento eficaz no combate à chaga do trabalho escravo, que envergonha o Brasil e maltrata seus cidadãos.


REFERÊNCIAS

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BRITO FILHO, Claudio Monteiro de. "Trabalho com redução à condição análoga à de escravo: análise a partir do trabalho decente e de seu fundamento, a dignidade da pessoa humana". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: LTr, 2006.

CESÁRIO, João Humberto. "Breve estudo sobre o cadastro de empregadores que tenham mantido trabalhadores em condições análogas à de escravo (Lista Suja): aspectos processuais e materiais". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: LTr, 2006.

FAVA, Marcos Neves. Combate ao trabalho escravo: "lista suja" de empregadores e atuação da justiça do trabalho. Revista LTr, Vol. 69, nº 11, Novembro de 2005.

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FAVA, Marcos Neves. Lista do DEOPS, lista suja, lista de Schindler, lista da OAB-SP, in www.anamatra.org.br.

PEDROSO, Eliane. "Da negação ao reconhecimento da escravidão contemporânea". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: LTr, 2006.

SIMÓN, Sandra Lia; MELO, Luís Antonio Camargo de. "Produção, consumo e escravidão – restrições econômicas e fiscais. Lista suja, certificados e selos de garantia de respeito às leis ambientais trabalhistas". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: LTr, 2006.

Ciclo de Debates: Direito Sindical e Relações do Trabalho, realizado pelo Tribunal Superior do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego e Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, em 25.8.2006. Segundo painel: LISTA SUJA, painelista: Procurador (PRT 10ª Região) Erlan José Peixoto do Prado, debatedores: Dr. Marcelo Gonçalves Campos (SIT/MTE) e Juiz (TRT 10ª Região) Francisco Luciano Azevedo Frota.

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https://www.mte.gov.br/legislacao/portarias/2004/p_20041015_540.asp

https://www.mte.gov.br/trab_escravo/lista_17_07.pdf

Pandelot, José Nilton. Trabalho escravo e sua raiz estatal, in www.anamatra.org.br.

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TRT 10ª Região, 01522-2005-811-10-00-6 RO, 1ª Turma, Juiz(a) Relator: Maria Regina Machado Guimarães, Juiz(a) Revisor: Oswaldo Florêncio Neme Junior, Julgado em: 04/10/2006, Publicado em: 13/10/2006. Disponível em: www.trt10.gov.br.

VIANA, Márcio Túlio. Trabalho escravo e "lista suja": um modo original de se remover uma mancha. Revista Ltr, Vol. 71, nº 8, agosto de 2007.


Notas

1 Juíza do Trabalho, titular da 4ª Vara de Santo André/SP.

2 Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: Ltr, 2006, pp.68-69.

3 Então Procuradora-Geral do Trabalho, eleita para o biênio 2003/2005, tendo sido reconduzida, permanecendo até 19.8.2007.

4 Subprocurador-Geral do Trabalho e Coordenador Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo do Ministério Público do Trabalho.

5 "Produção, consumo e escravidão – restrições econômicas e fiscais. Lista suja, certificados e selos de garantia de respeito às leis ambientais trabalhistas". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: Ltr, 2006, pp. 224.

6 "Produção, consumo e escravidão – restrições econômicas e fiscais. Lista suja, certificados e selos de garantia de respeito às leis ambientais trabalhistas". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: Ltr, 2006, pp. 225.

7 Procurador Regional do Trabalho.

8 "Trabalho com redução à condição análoga à de escravo: análise a partir do trabalho decente e de seu fundamento, a dignidade da pessoa humana". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: Ltr, 2006, p. 126.

9 FAVA, Marcos Neves. Lista do DEOPS, lista suja, lista de Schindler, lista da OAB-SP, in www.anamatra.org.br.

10 Juiz aposentado do TRT da 3ª Região, professor nas faculdades de Direito da UFMG e PUC-MG.

11 VIANA, Márcio Túlio. Trabalho escravo e "lista suja": um modo original de se remover uma mancha. Revista Ltr, Vol. 71, nº 8, agosto de 2007.

12 MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Disponível em: https://www.mte.gov.br/trab_escravo/cadastro_trab_escravo.asp. Acesso em: 2 ago. 07.

13 MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Disponível em: https://www.mte.gov.br/trab_escravo/cadastro_trab_escravo.asp. Acesso em: 4 ago. 07.

14 CESÁRIO, João Humberto (Juiz titular da Vara do Trabalho de São Félix do Araguaia-MT. Vice-presidente da AMATRA XXIII). "Breve estudo sobre o cadastro de empregadores que tenham mantido trabalhadores em condições análogas à de escravo (Lista Suja): aspectos processuais e materiais". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: Ltr, 2006, p. 167.

15 Ciclo de Debates: Direito Sindical e Relações do Trabalho, realizado pelo Tribunal Superior do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego e Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, em 25.8.2006. Segundo painel: LISTA SUJA, painelista: Procurador (PRT 10ª Região) Erlan José Peixoto do Prado, debatedores: Dr. Marcelo Gonçalves Campos (SIT/MTE) e Juiz (TRT 10ª Região) Francisco Luciano Azevedo Frota.

16 Idem

17 Ibidem

18 FAVA, Marcos Neves (Juiz do Trabalho Substituto na 2ª Região). Combate ao trabalho escravo: "lista suja" de empregadores e atuação da justiça do trabalho. Revista Ltr, Vol. 69, nº 11, Novembro de 2005.

19 Coordenadora Nacional do Projeto de Combate ao Trabalho Escravo no Brasil – OIT.

20 "A escravidão não abolida". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: Ltr, 2006, p. 85.

21 MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Disponível em: https://www.mte.gov.br/trab_escravo/default.asp. Acesso em: 4 ago. 07.

22 CESÁRIO, João Humberto. "Breve estudo sobre o cadastro de empregadores que tenham mantido trabalhadores em condições análogas à de escravo (Lista Suja): aspectos processuais e materiais". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: Ltr, 2006, p. 179.

23 FAVA, Marcos Neves. Combate ao trabalho escravo: "lista suja" de empregadores e atuação da justiça do trabalho. Revista Ltr, Vol. 69, nº 11, Novembro de 2005.

24 Idem.

25 Pandelot, José Nilton. Trabalho escravo e sua raiz estatal, in www.anamatra.org.br.

26 CESÁRIO, João Humberto. "Breve estudo sobre o cadastro de empregadores que tenham mantido trabalhadores em condições análogas à de escravo (Lista Suja): aspectos processuais e materiais". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: Ltr, 2006, p. 178.

27 Vide item 2.

28 CESÁRIO, João Humberto. "Breve estudo sobre o cadastro de empregadores que tenham mantido trabalhadores em condições análogas à de escravo (Lista Suja): aspectos processuais e materiais". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: Ltr, 2006, p. 183.

29 CESÁRIO, João Humberto. "Breve estudo sobre o cadastro de empregadores que tenham mantido trabalhadores em condições análogas à de escravo (Lista Suja): aspectos processuais e materiais". Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. Velloso, Gabriel; Fava, Marcos Neves, coordenadores. São Paulo: Ltr, 2006, p. 179/180.

30 TRT 10ª Região, 00443-2005-007-10-00-3 RO, 3ª Turma, Juiz(a) Relator: Luiz Henrique Marques da Rocha , Juiz(a) Revisor: Ribamar Lima Junior , Juiz(a) Redator: Ribamar Lima Junior , Julgado em: 19/07/2006 , Publicado em: 15/09/2006. Disponível em: www.trt10.gov.br. Acesso em: 8 ago.07.

31 TRT 10ª Região, 01522-2005-811-10-00-6 RO, 1ª Turma, Juiz(a) Relator: Maria Regina Machado Guimarães, Juiz(a) Revisor: Oswaldo Florêncio Neme Junior, Julgado em: 04/10/2006, Publicado em: 13/10/2006. Disponível em: www.trt10.gov.br. Acesso em: 8 ago.07.


ANEXO

O MINISTRO DE ESTADO DO TRABALHO E EMPREGO, no uso da atribuição que lhe confere o art. 87, parágrafo único, inciso II, e tendo em vista o disposto no art. 186, incisos III e IV, da Constituição, resolve:

Art. 1º Criar, no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE, o Cadastro de Empregadores que tenham mantido trabalhadores em condições análogas à de escravo.

Art. 2º A inclusão do nome do infrator no Cadastro ocorrerá após decisão administrativa final relativa ao auto de infração lavrado em decorrência de ação fiscal em que tenha havido a identificação de trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravo.

Art. 3º O MTE atualizará, semestralmente, o Cadastro a que se refere o art. 1º e dele dará conhecimento aos seguintes órgãos:

I - Ministério do Meio Ambiente;

II - Ministério do Desenvolvimento Agrário;

III - Ministério da Integração Nacional;

IV - Ministério da Fazenda;

V - Ministério Público do Trabalho;

VI - Ministério Público Federal;

VII - Secretaria Especial de Direitos Humanos; e

VIII - Banco Central do Brasil.

Parágrafo único. Poderão ser solicitados pelos órgãos de que tratam os incisos I a VIII deste artigo, informações complementares ou cópias de documentos relacionados à ação fiscal que deu origem a inclusão do infrator no Cadastro.

Art. 4º A Fiscalização do Trabalho monitorará pelo período de dois anos após a inclusão do nome do infrator no Cadastro para verificação da regularidade das condições de trabalho, devendo, após esse período, caso não haja reincidência, proceder a exclusão do referido nome do Cadastro.

§ 1º A exclusão do nome do infrator do Cadastro ficará condicionada ao pagamento das multas resultantes da ação fiscal, bem como, da comprovação da quitação de eventuais débitos trabalhistas e previdenciários.

§ 2º A exclusão do nome do infrator do Cadastro será comunicada aos órgãos de que tratam os incisos I a VIII do art. 3º.

Art. 5º Revoga-se a Portaria MTE nº 1.234, de 17 de novembro de 2003.

Art. 6º Esta Portaria entra vigor na data de sua publicação.

RICARDO BERZOINI

Sobre a autora
Melina Silva Pinto

assistente de juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINTO, Melina Silva. A constitucionalidade da "lista suja" como instrumento de repressão ao trabalho em condições análogas à de escravo no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1695, 21 fev. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10970. Acesso em: 16 nov. 2024.

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