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As inconstitucionalidades da PEC nº 260/2008.

Novas exigências em concursos para Magistratura e Ministério Público

Agenda 01/09/2008 às 00:00

Está em tramitação no Congresso a Proposta de Emenda Constitucional 260, de autoria do Deputado Décio Lima (PT-SC), exigindo, para ingresso nas Carreiras de Magistratura e Ministério Público, o preenchimento concomitante de dois requisitos: ter 10 anos de atividade advocatícia – leia-se exclusivamente a advocacia – e 35 anos de idade.

Observe os artigos da proposta:

"Art. 1º - O inciso I do art. 93 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 93… I- Ingresso na carreira, cujo cargo inicial será de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, idade mínima de trinta e cinco anos e, no mínimo, dez anos de efetivo exercício da advocacia, obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação;"

Art. 2º - O § 3º do art. 129 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação: "Art. 129… § 3º O ingresso na carreira do Ministério Público far-se-á mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em sua realização, exigindo-se do bacharel em direito idade mínima de trinta e cinco anos e, no mínimo, dez anos de efetivo exercício da advocacia, observando-se, nas nomeações, a ordem de classificação."

Art. 3º. Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação".

A mencionada PEC relata, em suas justificações, que a Emenda 45 foi limitada, pois não estabeleceu idade mínima para o ingresso no MP e na Magistratura, bem como ao deixou de exigir período maior de experiência para a escolha destes profissionais.

A proposta não se justifica. A uma, pelas premissas falsas que a amparam. A duas, pelas suas flagrantes inconstitucionalidades.

Senão, vejamos:


1) Idade mínima de 35 anos

O Deputado elenca como necessária a idade de 35 anos, pela experiência a ela inerente.

O artigo 14, § 3º, inciso IV, estabelece a idade mínima para alguns cargos eletivos, que são os seguintes:

-18 anos – Vereador

-21 anos – Deputado Federal, Deputado Estadual, Prefeito/Vice e Juiz de paz

-30 anos – Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal

-35 anos – Presidente e Vice-Presidente da República e Senador

Supondo-se que seja a PEC aprovada, haveria uma equiparação desarrazoada entre juízes e promotores e o Presidente da República e Senadores.

Veja-se o absurdo: o pretenso candidato de 30 anos de idade poderia ser Prefeito de uma grande capital, mas não poderia ser juiz. Vale dizer, seria chefe de um Poder e não poderia ser membro de outro.

Tal raciocínio ensejaria um necessário aumento da idade mínima para os cargos do Legislativo – o que certamente jamais será proposto.

É preciso ter 35 anos para analisar, interpretar e aplicar uma lei, mas é preciso somente 21 para elaborá-la, eis que Prefeitos podem remeter às Assembléias Legislativas projetos de lei de sua competência?

A premissa de que alguém com menos de 35 anos não tem a experiência necessária para ser Magistrado é deveras preconceituosa. Afirmou o Deputado que todos os atuais Juízes e Promotores menores de 35 anos de idade são incompetentes, apesar de aprovados no certame e já militantes da Magistratura e no exercício das funções institucionais do MP.

Longe da verdade. Para ser juiz ou promotor o candidato precisa percorrer um longo e tortuoso caminho, composto de várias fases: de prova escrita a prova oral, sendo ainda averiguada a sua vida pregressa. Enquanto isso, para ser Deputado ou Senador, não é preciso nada disso: basta prometer ao eleitorado.

Segundo determinação do STF, o candidato a cargo eletivo não precisa nem ter a reputação ilibada, caso ainda não haja condenação transitada em julgado, ao passo em que a mera existência de um procedimento administrativo na OAB ou na Administração Pública veda o acesso ao cargo.

Por fim, a comparação se faz necessária para os Magistrados oriundos do Quinto Constitucional: o indivíduo pode ser Desembargador com 30 anos de idade, mas não poderia ser Juiz de primeira instância com 34.

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2) Mínimo de 10 anos de efetivo exercício da advocacia

Presente está a inconstitucionalidade pela quebra do princípio da igualdade.

Procurador do Estado, Delegado de Polícia, serventuário da justiça ou Defensor Público não pode prestar concurso para o MP ou Magistratura?

O próprio Promotor não poderia prestar concurso para Juiz, eis que a função do parquet não é advocatícia, sendo-lhe vedada esta função por norma constitucional.

Da mesma forma, violado o princípio do livre acesso aos cargos públicos. Qual o advogado com 35 anos de idade e 10 de carreira, certamente já estabilizado e com boa carteira de clientes, irá querer abandonar tudo para ser Magistrado, e, a bem da verdade, começar uma nova carreira do zero, recebendo, provavelmente, remuneração menor do que na iniciativa privada?

Indago-me se não haveria algum interesse paralelo nesta proposta.

Os Tribunais deixarão de arrecadar uma vultosa quantia de taxa judiciária para inscrição nos certames; os cursos jurídicos, muitos deles notáveis centros de cultura, certamente fecharão, em sua grande maioria.

Somente afortunados ingressarão na Magistratura e no MP. Ou seja, aqueles que podem advogar uma causa por ano, pagar as anuidades da OAB e ficar em casa estudando. E afortunados não teriam interesse financeiro em ser membros do judiciário ou do MP, eis que, como se sabe, o brutal acúmulo de processos mal se remunera com os subsídios correspondentes. Muito surreal a hipótese.

A proposta contraria entendimento do CNJ, em sua Resolução nº 11, que interpreta o que é atividade jurídica com a sua clara razoabilidade: não só advogar, mas ministrar aulas, cursar pós-graduação, ser servidor público – tudo na área de direito, para bom entendedor.

A atividade advocatícia, como se sabe, é apenas uma espécie de atividade jurídica; impô-la, invariavelmente, ao bacharel em direito, é discriminar as outras atividades do Direito, pondo-as abaixo daquela, e esta abaixo da magistratura e da promotoria, porque seria dessa parte, pressuposto ou requisito.

Seria, como diz Calmon de Passos, quando ensina sobre direito material e processo, quinhão constituinte de um ser, para que ele seja.

Se vivemos num regime democrático, podemos, ao concluir o curso de Direito, escolher nosso caminho, seja ele o de serventuário, Delegado, Defensor Publico, professor acadêmico ou advogado.

Podemos até mesmo escolher jamais sermos Juízes ou Promotores. Mas isso num regime democrático.

Sobre o autor
Alexandre Alencar Brandão

advogado, pós-graduado em Direito Civil, Processo Civil e Direito do Trabalho e Direito Previdenciário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRANDÃO, Alexandre Alencar. As inconstitucionalidades da PEC nº 260/2008.: Novas exigências em concursos para Magistratura e Ministério Público. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1888, 1 set. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11671. Acesso em: 30 abr. 2024.

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Título original: "As inconstitucionalidades da PEC nº 260/2008".

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