3 Breve histórico SOBRE a revisão do Código Civil de 1916
Para orientar este breve histórico, utilizou-se roteiro histórico colhido de texto da Professora Doutora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, que relata ter o Código Civil [19] anterior contado com o cearense Clóvis Bevilaqua na sua elaboração, sendo revisado pelo baiano Ruy Barbosa; tendo sido longo o processo para que fosse convertido em lei. Afinal, apesar de apresentado em 1900, apenas logrou aprovação em 1916, entrando em vigor somente em 1917, quando ainda escrevia-se Brasil com "z" [20].
A autora lembra que o antigo Código vigorou por longos 86 (oitenta e seis) anos, quase nove décadas, necessitando passar por diversas alterações indispensáveis para que tentasse acompanhar a dinâmica da sociedade e conservar como aceitável a aplicabilidade das normas nele contidas. Até que se chegou a um determinado estágio em que isso não mais era possível.
Norma necessária para regular as relações das pessoas na sociedade e na família, assim como no que se refere aos seus negócios, suas propriedades e obrigações; e ainda capaz de estabelecer critérios e limites para essas relações, o Código Civil de 1916 apresentava visíveis sinais de saturação às já diversas reformas que lhe modificaram sucessivamente o texto, mas que, ainda assim, não conseguiam disfarçar a impossibilidade de fazê-lo acompanhar as metamorfoses sociais e culturais da realidade contemporânea.
Seguindo nesse compasso, viveu-se um delicado momento histórico, político, cultural e social quando, em 1969, o paulista Miguel Reale recebeu a missão de revisar o Código Civil de 1916. Afinal, tantas eram as necessidades de reformulação do já saturado texto original – com a inclusão de novas regras, supressão de outras tantas, atualização de linguagem, extirpação de preconceitos e introdução de novos conceitos de humanidade e igualdade de direitos –, que Reale somente consegue apresentar ao Governo o anteprojeto do novo Código em julho de 1972 e apenas em 1975 o Presidente Costa e Silva submeteu ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 634-D, para sua apreciação.
Apesar de inacreditável, é fato: sua longa tramitação no Congresso Nacional durou mais de 26 (vinte e seis) anos, contando com aproximadamente 300 (trezentas) emendas.
Transformado na Lei nº 10.406/02, finalmente foi aprovado no final de 2001 e sancionado em 10 de janeiro de 2002; e desde a primeira referência que à ele se fez que o denominou-se de "Novo Código Civil".
E mesmo o novo diploma civil tendo conseguido a expansão das formas de prevenção e de desfazimento de injustiças; da ampliação de vetos aos preconceitos e discriminações; e de ter exibido bons níveis de renovação, humanização e inclusão de novos conceitos – pelo que há que se reconhecer sua notável evolução – ainda assim não conseguiu abarcar todas as necessárias atualizações. Em parte porque, tantas que eram, algumas passaram sem serem observadas; e, em parte, também porque a velocidade da dinâmica evolutiva da sociedade é superior à que o Congresso Nacional consegue produzir as atualizações normativas, perdendo-se o sincronismo com o tempo real em que as necessidades se sucedem.
E, dentre as várias atualizações normativas que foram inobservadas, uma em especial é objeto do presente estudo: o veto estabelecido às pessoas com mais de 60 (sessenta) anos, proibidas legalmente de escolherem o regime de bens que adotarão ao se casar, constante do art. 1.641, II, do Código Civil vigente [21].
4 O casamento e os regimes de bens
Pretendendo o presente estudo tratar da limitação etária imposta aos sexagenários, tornando-os legalmente impedidos de escolher o regime de bens que adotarão ao se casar, faz-se necessário que se abra um espaço para que sejam feitas necessárias referências ao casamento e aos regimes de bens, cuidando das definições e considerações pertinentes ao tema.
4.1 O CASAMENTO
Negócio jurídico bilateral que é, dada a sua natureza contratual, o casamento é ato pessoal, social e solene que regula direitos e deveres mútuos.
Sintetizando em breves linhas a caracterização traçada brilhantemente por Sílvio de Salvo Venosa, tem-se que o casamento é pessoal, porque cabe tão somente aos nubentes manifestar sua vontade – mesmo que previamente, por meio de procuração; social, em função de que os nubentes se unirão para o estabelecimento de uma vida social em comum, partilhando direitos e deveres, atentos à assistência recíproca e constituindo a célula familiar – conservando a carga institucional e conservadora – com fins de produção e criação da prole; e o casamento será sempre solene, porque se apresenta dentro de um formalismo que somente é comparável ao exigido para o testamento, tanto que o casamento deve, além de ser registrado por escrito, também ser realizado em ato aberto ao público, garantindo-se a publicidade capaz de outorgar-lhe a garantia de validade [22].
Mas, como colocado por Venosa, o casamento também tem bem marcada a sua característica de instituição, com feição sociológica predominante sobre a jurídica; afinal, antes de se perceber jurídica, a relação é originariamente de cunho social, uma vez que o ato da união física e emocional entre homem e mulher surge simultaneamente à formação dos primeiros núcleos sociais e, portanto, precedem até mesmo seu conceito e a percepção da noção jurídica da relação [23].
O mesmo doutrinador ensina que, da mesma forma que o casamento, a união estável (também denominada de concubinato puro, por Maria Helena Diniz e alguns outros autores, por ela mesma relacionados [24]) gera igualmente efeitos jurídicos, pois que além de consistir num fato reconhecido socialmente – por ser de conhecimento público. Então, "o concubinato ou a união estável são fatos sociais e fatos jurídicos" [25].
Estas se referem às diferenças que Venosa apontou existirem entre o casamento e a união estável, quando aquele, diferentemente desta, "é um fato social e um negócio jurídico" [26]. E conclui que "a união estável é um fato do homem que, gerando efeitos jurídicos, transforma-se em fato jurídico" [27], independentemente de ter ou não sido firmado pacto escrito, como no casamento.
Em síntese, para ilustrar o entendimento, vale lembrar que fato social é qualquer forma de coerção sobre os indivíduos (p. ex.: regras jurídicas e morais, dogmas religiosos, sistemas financeiros, maneiras de agir, costumes etc); negócio jurídico é todo ato jurídico feito com manifestação da vontade do agente e, ao contrário do ato jurídico, depende da vontade expressa do agente, geralmente porque quer atingir um objetivo previsto em lei (p. ex.: contratos); e, por fim, repetindo o conceito de Venosa, o fato jurídico é "qualquer acontecimento que gera conseqüências jurídicas" (p. ex.: a união estável) [28].
Será, então, a convivência pública contínua e duradoura quem fará com que a união estável seja jurídica e socialmente reconhecida como entidade familiar legalmente equiparada ao casamento [29].
Como no casamento, na união estável existirá, indistintamente, a mútua cooperação em proporção que deve ser equivalente, quer no que se refira à assistência material, como moral, emocional e espiritual. Quando casam ou vivem em união estável duas pessoas compartilham suas vidas e convivem em comunhão de emoções, de objetivos, de espírito e, também, em muitos casos, de patrimônio. E está justamente na questão patrimonial a diferença das mais marcantes entre as duas formas de relação que se estabelece entre um homem e uma mulher.
Em ambas as relações, asseguram-se direitos e deveres mútuos; na união estável, estes se aplicam aos companheiros, enquanto no casamento estes se referem aos cônjuges. Vê-se, pois, que ainda que existam variações, estarão assegurados os direitos; mas alteram-se as designações conferidas aos entes celebrantes das relações.
Dessa forma, enquanto na união estável – exceto em existindo contrato prévio firmado entre os companheiros – considera-se unicamente o regime de comunhão parcial de bens, o qual irá reger as questões patrimoniais daquele casal [30]; no casamento, ao contrário, existe todo um rol de opções que aos futuros cônjuges é facultado escolher, desde que observadas algumas condições e restrições que a própria norma estabelece.
Apesar dessas condições e restrições terem sido idealizadas para proteção do indivíduo, muitas vezes são traduzidas como uma intromissão do Estado em questões que poderiam ficar ao encargo do próprio interessado, a despeito deste ser legalmente reconhecido como um ser dotado de capacidade civil pelo mesmo Código que retira sua possibilidade de escolha pelas opções oferecidas no texto legal ali expresso.
Por ora, procurou-se ater ao tratamento dos regimes de bens, deixando a questão da capacidade civil para momento oportuno.
4.2 OS REGIMES DE BENS
A regra, definida pelo art. 1.639 do Código Civil, é que aos futuros cônjuges estará assegurada a liberdade de escolha do regime de bens. Para tanto, lhes foi oferecido como opção os regimes de comunhão parcial, comunhão universal, participação final nos aqüestos e separação de bens [31].
Contudo, há exceções que rompem a predominância da regra. Encontram-se tais exceções devidamente previstas nos arts. 1.640 e 1.641 do Código Civil e, dentre elas, está o veto estabelecido às pessoas com mais de 60 (sessenta) anos de escolher o regime que lhes aprouver, que será o próximo tópico a ser abordado – tão logo sejam tecidos breves comentários sobre cada um dos regimes de bens do casamento [32].
4.2.1 O pacto antenupcial
Reunindo em poucas palavras a essência do já sintetizado por Silvio Rodrigues, pode-se dizer que o pacto antenupcial refere-se ao instituto da convenção que é celebrada pelas partes contraentes antes do casamento, mediante instrumento público, que trata do regime de bens que vigorará durante sua vida em comum. E dada a importância dos efeitos do pacto para os cônjuges e terceiros, a escritura pública deverá integrar a própria substância do ato [33].
O diploma civil, por sua vez, prevê que, a critério exclusivo dos nubentes e, independentemente do regime de bens que vier a ser adotado, poderá ser firmado o pacto, desde que observadas as normas e condições estabelecidas nos arts. 1.653 e seguintes do Código Civil.
Se os nubentes não celebrarem o pacto ou ocorrer a nulidade deste, prevalecerá o regime da comunhão parcial, ficando a eficácia do pacto submetida à efetiva realização do casamento, que irá operar como condição suspensiva. Deverá o pacto ser registrado no Cartório de Registro de Imóveis para ter validade e efeito erga omnes. E inexistindo registro no cartório competente, o pacto não se torna nulo, mas seus efeitos somente afetam os cônjuges e herdeiros [34].
Quando se referir a empresários, o pacto antenupcial deverá ser averbado no Cartório de Registros Públicos de Empresas Mercantis, em consonância ao previsto no art. 979, do Código Civil [35]. E somente diz respeito aos efeitos patrimoniais do casamento. É importante ser ressaltado, ainda, que para o pacto antenupcial ser reconhecido como válido, exige-se que a ele se suceda a celebração do matrimônio.
Por fim, o pacto antenupcial não é um contrato regulado pelo direito das obrigações, porque é de ordem institucional; afinal, a união civil celebrada entre o casal passa a ser regida por normas de ordem pública.
4.2.2 O regime de comunhão parcial de bens
Sobre o regime de comunhão parcial de bens, Silvio Rodrigues consegue produzir conceito que merece transcrição [36]:
Regime de comunhão parcial é aquele em que basicamente se excluem da comunhão os bens que os cônjuges possuem ao casar ou que venham a adquirir por causa anterior e alheia ao casamento, como as doações e sucessões; e em que entram na comunhão os bens adquiridos posteriormente, em regra, a título oneroso. Trata-se de um regime de separação quanto ao passado e de comunhão quanto ao futuro.
Regime de bens não previsto no Código de 1916, a comunhão parcial passou a ser o regime legal de bens, adotado sempre que inexistir convenção prévia entre os cônjuges; pois, conforme constante do art. 1.640 do Código Civil em vigor, sua adoção será automática na celebração das núpcias, mesmo que não seja externada tal escolha pelos nubentes, a qual é necessária apenas quando outro for o regime de sua preferência [37].
No regime de comunhão parcial de bens, previsto nos arts. 1.658 e seguintes, do Código Civil, todos os bens adquiridos durante a constância do casamento pertencem igualmente a cada um dos cônjuges, mantendo-se os bens adquiridos antes do casamento – ou então recebidos como herança, a qualquer tempo – como pertencentes somente ao seu proprietário original [38].
Mas, uma vez adotado o regime de comunhão parcial, não se comunicam os bens que cada cônjuge possuir ao casar e os que lhe sobrevierem, na constância do matrimônio, por doação ou sucessão; os adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges, em sub-rogação dos bens particulares; as obrigações anteriores ao casamento; as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo se reverterem em proveito do casal; os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge; as pensões, meio-soldos, montepios e outras rendas semelhantes; e, por fim, os bens cuja aquisição tiver por título uma causa anterior ao casamento [39].
E, ao contrário, comunicam-se os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso (p. ex.: troca, venda etc), ainda que só em nome de um dos cônjuges; os bens adquiridos por fato eventual (p. ex.: jogo, aposta, rifa, loteria etc), com ou sem concurso de trabalho ou despesa anterior; os adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges; as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge; os frutos dos bens comuns ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão dos adquiridos, por serem ganhos posteriores ao casamento; e os direitos do patrimônio do autor, excetuados os rendimentos resultantes de sua exploração, salvo pacto antenupcial em contrário.
4.2.3 O regime de comunhão universal de bens
Através do pacto antenupcial, os futuros cônjuges podem estipular que o regime de bens será o da comunhão universal – regulado pelos arts. 1.667 e seguintes do Código Civil – em função do qual todos os seus bens presentes ou futuros, adquiridos antes, durante ou depois do casamento, observadas as exceções expressas nos arts. 1.668 e 1.669 do mesmo diploma [40], tornam-se comuns e passam a constituir uma só massa, sendo estabelecida a impossibilidade de serem divididos os bens, passando cada cônjuge a ter o direito à metade ideal do patrimônio comum [41].
Assim, tomando por orientação rol apontado por Maria Helena Diniz [42], tem-se que são excluídos da comunhão – por terem efeitos personalíssimos ou pela sua própria natureza – os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar; os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizar-se a condição suspensiva; as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum; as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com cláusula de incomunicabilidade; os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; as pensões, meio-soldos, montepios, tenças [43] e outras rendas semelhantes; e os direitos patrimoniais de autor, conforme art. 39 da norma especial [44], excetuados os rendimentos resultantes de sua exploração, salvo pacto antenupcial em contrário.
No que se refere às dívidas anteriores às núpcias – as quais não se comunicam – responde só o devedor original, com os seus bens particulares ou com os bens que ele trouxe para a união. Apenas com a dissolução do casamento, a meação do devedor responderá pelos débitos que contraiu antes do casamento. Se o credor provar que as dívidas são fruto de despesas com os preparativos para o casamento (p. ex.: enxoval, compra de móveis, a festa etc) ou que reverteram em proveito do casal (como empréstimo para compra de imóvel para futura residência do casal; viagem de núpcias etc), fica caracterizada a comunicabilidade.
Antes de ser dissolvida a união matrimonial e procedida a partilha, não haverá meação; mas apenas metade ideal do patrimônio ativo e passivo – os bens e as dívidas comuns. Afinal, existe a comunicação do ativo e passivo comuns, vez que a comunhão universal de bens comporta-se como espécie de sociedade, contudo disciplinada por normas próprias e peculiares. Em função dessas regras, enquanto durar a sociedade conjugal nenhum dos cônjuges terá, efetivamente, a metade de nenhum dos bens; e tão pouco a propriedade exclusiva de bens discriminados, avaliados na metade do patrimônio do casal.
4.2.4 O regime de participação final nos aqüestos
Conforme apontado por Venosa, o regime da participação final nos aqüestos foi introduzido pelo atual Código Civil em substituição ao antigo regime dotal. Consiste numa forma especial de constituição de patrimônio, sendo este incomunicável durante a sociedade conjugal; contudo torna-se comum quando o casamento é dissolvido. Assim, cada um dos cônjuges passa a ser credor de metade do que o outro adquirir onerosamente na constância do matrimônio [45].
Consta previsto nos arts. 1.672 e seguintes do Código Civil [46], referindo-se a regime que não se confunde com o da comunhão parcial de bens, pois a administração dos bens adquiridos antes e durante o casamento caberá a cada cônjuge, que poderá alienar livremente os bens móveis; mas se esses bens forem imóveis, somente poderá fazê-lo mediante autorização do outro – excetuando-se a situação prevista no art. 1.656 [47], que se refere a pacto antenupcial que venha a adotar a participação final nos aqüestos, mas desde que os bens sejam particulares.
Cada cônjuge arcará com as próprias dívidas, salvo se provar que as reverteram para proveito comum. A apuração é feita quando da dissolução da sociedade conjugal e serão excluídos os bens particulares, os adquiridos através de doação, legado ou herança e as dívidas relativas a esses bens. Porém os frutos dos bens particulares se comunicam. Trata-se de regime misto, já que na vigência do casamento aplicam-se normas semelhantes ao do regime da separação de bens e, quando da sua dissolução, são aplicadas as regras que se assemelham ao regime da comunhão parcial [48].
4.2.5 O regime de separação de bens
O regime de separação de bens, constante dos arts. 1.687 e 1.688 do Código Civil [49], consiste naquele em que cada um dos cônjuges preserva com exclusividade o domínio, posse e administração de seus bens presentes e futuros, como também a responsabilidade pelos débitos anteriores e posteriores à celebração da união. E não apenas os bens que cada um dos consortes possuía ao se casar não se comunicam, pois também os adquiridos por meio de recursos próprios durante do casamento, existindo uma total separação entre os patrimônios dos dois cônjuges [50].
Enfim, esse regime não interfere no patrimônio ativo dos cônjuges; como também seu passivo é devidamente separado, inexistindo comunicação entre os débitos assumidos antes ou durante o casamento, por eles respondendo apenas quem os contraiu. E, conforme salientado por Venosa, a "característica desse regime é a completa distinção de patrimônios dos dois cônjuges, não se comunicando os frutos e aquisições e permanecendo cada qual na propriedade, posse e administração de seus bens" [51].
4.2.5.1 O regime obrigatório de separação de bens
Ao contrário do que ocorre nos outros regimes, onde é livre a faculdade dos cônjuges pela sua escolha, existe a imposição legal da adoção do regime da separação de bens para determinadas circunstâncias, conforme especificado no art. 1.641, do Código Civil [52].
Assim, submetem-se a essa restrição legal tanto as pessoas que contraírem núpcias com a inobservância das cláusulas suspensivas para a celebração do casamento [53]; como também todos os que dependem, para casar, de autorização judicial [54]; e, finalmente, a pessoa maior de 60 (sessenta) anos, restrição específica sobre a qual focou-se o presente estudo e sobre a qual tratar-se-á em seguida.
Mas não se poderia concluir este tópico antes de se fazer um especial destaque para questão de relevante importância quando o Código vigente ainda era o de 1916: se o casamento de pessoa sexagenária fosse precedido de união estável, desde que iniciada em data anterior a 28 de julho de 1977 e que houvesse perdurado por mais de 10 (dez) anos ou do qual tivesse frutificado em filhos, não se aplicaria a regra vigente do art. 1.641, II do Código Civil – à época, art. 258, parágrafo único, II, do Código de 1916 – e poderiam os nubentes escolher livremente o regime matrimonial de bens, tudo de acordo com o art. 45 da Lei nº 6.515/77 [55].
Ocorre que esta vem a ser uma condição inaplicável, nos dias atuais. E por motivos óbvios. Afinal, qual indivíduo, já sexagenário em época anterior a 1977, que tendo se enquadrado às condições acima, ainda estaria vivo atualmente, no gozo pleno de suas capacidades físicas e mentais, para reivindicar tal direito? E acaso houvesse, contaria com mais de 90 (noventa) anos, pelo que certamente seria questionado sobre seu interesse em argüir o direito à livre escolha do regime de bens. Ou seja, se é questionado o direito de escolha dos que contam com exatos 60 (sessenta) anos de idade; imagine-se o quanto não se questionaria daqueles que já tivessem ultrapassado a barreira dos 90 (noventa) anos?