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Requisição administrativa de medicamentos

(art. 15, XIII, da Lei n° 8.080/90 c/c art. 5º, XXV, da Constituição Federal de 1988)

Agenda 14/01/2009 às 00:00

Com a requisição administrativa, a Administração Pública conta com um meio eficiente e capaz de contornar a inconseqüente conduta de fabricantes e distribuidores de medicamentos.

Nos últimos anos, mais precisamente após a criação de um Órgão especializado na Regulação do Mercado de Medicamentos junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), a Administração Pública vem sofrendo dificuldades imensas para adquirir os medicamentos que necessita para tocar as respectivas ações de saúde.

Atualmente, é a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) quem tem a responsabilidade da "adoção, implementação e coordenação de atividades relativas à regulação econômica do mercado de medicamentos, voltados a promover a assistência farmacêutica à população, por meio de mecanismos que estimulem a oferta de medicamentos e a competitividade do setor", nos termos do art. 5º, da Lei n° 10.742/03:

"Art. 5º Fica criada a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos - CMED, do Conselho de Governo, que tem por objetivos a adoção, implementação e coordenação de atividades relativas à regulação econômica do mercado de medicamentos, voltados a promover a assistência farmacêutica à população, por meio de mecanismos que estimulem a oferta de medicamentos e a competitividade do setor."

Restringindo o tema, tem-se que a CMED estipula preços máximos para a quase totalidade dos medicamentos comercializados no Brasil, o quais devem ser observados nas compras pela Administração Pública, excetuando-se desse controle estatal os fármacos vendidos sem receituário médico e que possuem uma alta concorrência.

Alguns denominaram esse controle de preços pelo poder Público de "Desconto Forçado", tacharam-no de ilegal por falta de fundamento de validade em Lei, alegaram que interferia na autonomia de Estados e Municípios, pugnando pelo combate e anulação das medidas estatais.

Contrariamente a isso, o Superior Tribunal de Justiça, exercendo a sua primaz atribuição de órgão judicante interpretador da legislação infraconstitucional, fechou a questão, declarando competente a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) para os fins que lhe são afiançados pela Lei n° 10.742/03, veja os Acórdãos dos Mandados de Segurança n° 12730/DF e n° 11706/DF:

"ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – QUESTÕES PROCESSUAIS – INTERVENÇÃO ESTATAL NA ATIVIDADE ECONÔMICA – CÂMARA DE REGULAÇÃO DO MERCADO DE MEDICAMENTOS – CEMED – COEFICIENTE DE ADEQUAÇÃO DE PREÇO (CAP) – LEI 10.742/2003.

1. Legitimidade da associação autora, constituída há mais de ano e devidamente autorizada a agir por decisão da assembléia geral.

2. Inexistência de ofensa ao art. 20 do Código de Ética da OAB a justificar o envio, pelo STJ, de cópia dos autos àquela Autarquia, a quem compete a apuração da infração.

3. A Lei 10.472/2003 definiu as normas de regulação do setor farmacêutico, criando o CEMED – CÂMARA DE REGULAÇÃO DO MERCADO DE MEDICAMENTOS, órgão a quem compete estabelecer critérios de aferição dos preços dos produtos novos, antes de entrarem no mercado, havendo precedente desta Corte dando pela constitucionalidade da delegação de competência normativa (MS 11.706/DF).

4. A Resolução CEMED 04/2006 determinou a aplicação do CAP ao preço de diversos produtos (inclusive de alto custo), impondo limitações nos preços quando adquiridos por entes estatais.

5. Ato impugnado que encontra respaldo na Constituição Federal e na Lei Orgânica da Saúde - LOS (Lei 8.080/90), atendendo às diretrizes estabelecidas pela Lei 10.742/2003 relativamente à implementação da política de acesso a medicamentos pela população em geral.

6. Segurança denegada.

(MS 12730/DF, Rel. Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, Julgado em 27/06/2007, DJ 03/09/2007 p. 112)

"ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. MEDICAMENTOS. FIXAÇÃO DE PREÇOS. DELEGAÇÃO. CÂMARA DE REGULAÇÃO DO MERCADO DE MEDICAMENTOS-CMED. CONSTITUCIONALIDADE. CRITÉRIOS.

1. O artigo 7º da Lei nº 10.724/03 delega expressamente à Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos-CMED o estabelecimento dos critérios para a aferição dos preços dos produtos novos que venham a ser incluídos na lista de produtos comercializados pela empresa produtora de medicamentos.

2. Por seu turno, o artigo 4º desse diploma legal estabelece as linhas gerais para a CMED fixar os preços dos medicamentos. Não se vislumbra inconstitucionalidade na delegação à essa Câmara para a fixação dos preços, ante a complexidade da matéria.

3. Impetração contra ato administrativo que estabeleceu preço de medicamento em valor inferior àquele autorizado para concorrente.

4. Critérios do preço, sua composição química do produto e seu enquadramento pela ANVISA. Valores determinados com base no mercado internacional, espanhol, para um deles; italiano e francês, para outro.

5. Inexistência de vulneração aos princípios da isonomia, livre concorrência, razoabilidade e proporcionalidade.

6. Segurança denegada."

(MS 11706/DF, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, julgado em 08/11/2006, DJ 27/11/2006 p. 222)

Tais julgados do Superior Tribunal de Justiça foram festivamente recebidos pelos gestores do Sistema Único de Saúde (SUS), Ministro e Secretários Estaduais e Municipais de Saúde, conforme noticiado no Jornal do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), intitulado CONSENSUS, n° 29, editado e distribuído em julho de 2007. Isso porque a decisão judicial reafirma a medida de gestão tomada com vistas a reduzir gastos públicos e gerar um plus no acesso à assistência farmacêutica pelos usuários.

Os fabricantes e distribuidores de medicamentos [mal] acostumados com os lucros exorbitantes nas vendas aos entes públicos, viram-se alijados dos seus excessivos dividendos às custas do erário e em prejuízo da população assistida pelas unidades públicas de saúde.

Diante disso, orquestraram um silencioso, mas efetivo, boicote geral às licitações, ora ofertando preços superiores aos estimados e fixados pela CMED, ora não participando dos certames. O fato mais comum, era essa deserção dos procedimentos licitatórios.

Com esta conduta inadvertida de fabricantes e distribuidores, os estoques públicos de medicamentos passaram a sofrer um cadencial desabastecimento, aumentando o volume de demandas judiciais e deixando os gestores do Sistema Único de Saúde (SUS) à mercê de multas, prisões e demais cominações legais.

Além disso, os assistidos, em sua maioria pessoas carentes, acabavam por não receber os produtos essenciais às sua sobrevivência, ocasionando uma comoção social, agravamento nos quadros clínicos e risco iminente de morte.

Logicamente que tanto o Ministério Público Estadual (MPE), quanto o Federal (MPF), foram enredados pelas súplicas de pacientes desesperados pela falta de seus remédios.

Nessa situação, o que fazer para atender a necessidade urgente de pacientes SUS-dependentes, assistidos pelos Estados e Municípios, através da suas Secretarias da Saúde?

No Tocantins, fui incumbido pelo austero Secretário de Estado da Saúde, Dr. Eugênio Pacceli de Freitas Coelho, do encargo de encontrar uma solução emergente para o caso. Assim, foi proposta, pela Secretaria de Estado da Saúde (SESAU-TO), uma ampla discussão envolvendo este órgão e os Ministérios Públicos Estadual (MPE) e Federal (MPF).

Nessa discussão, sugeri o uso da requisição administrativa, fulcrada no art. 15, XIII, da Lei n° 8.080/90 c/c art. 5º, XXV, da Constituição Federal/88, pois as leis regentes das compras públicas não ofertavam meios compulsórios de aquisição dos medicamentos necessários à população SUS-dependente.

Desse fórum de debates, sempre motivados pela SESAU-TO, adveio a Recomendação Conjunta n° 01/2007, de 31 de agosto de 2007, emitida pelos Ministérios Públicos Estadual e Federal, com a participação efetiva e sempre cooperadora da ilustre Dr.ª Maria Roseli de Almeida Pery, Promotora de Justiça da Cidadania de Palmas, e do eminente Dr. Álvaro Lotufo Manzano, Procurador da República e Procurador Regional dos Direitos do Cidadão.

A Recomendação Conjunta n° 01/2007, estabelecia que o Secretário de Estado da Saúde do Tocantins requisitasse de indústrias e distribuidores os medicamentos "para atender à necessidade coletiva (de todos os pacientes que deles necessitam), cuja urgência e transitoriedade justificam-se pela imediata e inadiável necessidade de dispensação dos mesmos e o perigo iminente pelo risco de vida decorrente do não fornecimento dos medicamentos".

Com isso, passei, então, à análise jurídica acurada sobre o instituto da requisição administrativa, voltada para os gestores do Sistema Único de Saúde (SUS).

É sabido, que um dos deveres do Estado é a prestação de serviços em "saúde pública", mediante políticas públicas sociais e econômicas, realizando os serviços de saúde na forma do art. 196 e art. 197, da Constituição Federal/88:

"Art.196 A saúde é direito de todos e dever do estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação."

"Art.197 São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao poder público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado."

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Ao seu turno, é de conhecimento comum que o direito à vida, previsto genericamente no art. 5º, caput, da Constituição Federal/88, abrange tanto o direito de não ser morto, como também o direito de continuar vivo, com dignidade.

Tal desdobramento do direito à vida, caracterizado no direito a uma vida digna, é a garantia às necessidades básicas vitais do ser humano, inclusive no que tange a saúde, consistindo em fornecer à população tratamento de saúde e o correspondente fornecimento de remédios, quando destes necessitarem e forem prescritos pelo profissional competente.

Desta forma, de acordo com as normas constitucionais em comento, a saúde é um direito fundamental com status constitucional, devendo o Poder Público prover as condições indispensáveis para o seu pleno exercício.

Logo a aquisição de medicamentos para atendimento da população SUS-dependente, para tratamento de toda sorte de moléstias, inclusive as de natureza grave e, no mais das vezes, incuráveis, demandam altos recursos, pois, são produtos de elevadíssimos preços, os quais o paciente carente, ou até mesmo os mais abastados, não conseguem arcar.

Tratando-se de medicamentos dessa natureza, configurada está uma necessidade coletiva (atender todos os pacientes assistidos pelo Poder Público), urgente (risco de vidas dos pacientes SUS-dependentes) e transitória (os fabricantes e distribuidores podem voltar a atender e vender regularmente aos Entes Públicos pelos preços estipulados pela CMED), decorrente de situação de perigo iminente (risco à saúde e à vida dos doentes SUS-atendidos).

Diante destes elementos, a autoridade competente da esfera administrativa correspondente (Secretário Estadual e Municipal da Saúde, p.ex.) poderá requisitar bens e serviços (medicamentos), tanto de pessoas naturais como de jurídicas (laboratórios, distribuidores, fabricantes etc.), sendo-lhes assegurada justa indenização (preço fábrica ou preço máximo de venda ao governo, desonerado ou não de ICMS, conforme o caso).

Na confluência daqueles elementos e requisitos o ordenamento jurídico brasileiro autoriza a requisição administrativa.

Tal medida administrativa encontra guarida legal no art. 15, XIII, da Lei n° 8.080, de 19/09/1990, que dispõe:

"Art. 15. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios exercerão, em seu âmbito administrativo, as seguintes atribuições:

(...)

XIII: para atendimento de necessidades coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias, a autoridade competente da esfera administrativa correspondente poderá requisitar bens e serviços, tanto de pessoas naturais como de jurídicas, sendo-lhes assegurada justa indenização."

Trata-se de ato administrativo unilateral, auto-executório (pois independe da aquiescência do particular e da prévia intervenção do Poder Judiciário) e oneroso, sendo a indenização "a posteriori" consistente na utilização de bens ou de serviços particulares pela Administração, para atender a necessidades coletivas.

A Constituição da República de 1988 consagra essa faculdade ao poder público, como sendo uma das suas cláusulas pétreas, senão vejamos o art. 5º, XXV, da "Carta da Primavera":

"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;"

Destarte, encontra-se configurada a possibilidade legal e constitucional, para a expedição de REQUISIÇÃO ADMINISTRATIVA.

Vejamos, agora, como a doutrina pátria se posiciona!

Diógenes Gasparini (2006, págs. 748/749), preleciona:

"Em situação de urgência, ou não, e quase sempre sem caráter de definitividade, a Administração Pública, com ou sem indenização posterior, pode utilizar bens particulares, valendo-se de atos e medidas auto-executórias, cuja obtenção, pelos procedimentos comuns, porque demorados ou dependentes de vontade do particular, prejudicaria a eficiência administrativa. Pode ser definida com a utilização, quase sempre transitória e auto-executória, pela Administração Pública, de bens particulares, mediante determinação da autoridade competente, com ou sem indenização posterior, em razão ou não de perigo público.

Seu fundamento é o estado de necessidade pública. Tem, entre nós, dois fundamentos constitucionais. Um genérico, previsto no inciso III do art. 170 (função social da propriedade); outro, específico, fincando no inciso XXV do art. 5º, embora essa disposição pareça sempre exigir uma situação de urgência, de perigo público. Tal utilização, como ato ou medida auto-executória que é, independe de prévia autorização judicial."

Celso Antônio Bandeira de Mello (2001, pág. 750), ensina que:

"Requisição é o ato pelo qual o Estado, em proveito de um interesse público, constitui alguém, de modo unilateral e auto executório, na obrigação de prestar-lhe um serviço ou ceder-lhe transitoriamente o uso de uma coisa in natura, obrigando-se a indenizar os prejuízos que tal medida efetivamente acarretar ao obrigado.

A requisição funda-se no art. 5º, XXV, do Texto Constitucional brasileiro e a competência para legislar sobre ela assiste apenas a União, conforme art. 22, III, da Constituição."

Hely Lopes Meirelles (2007, pág. 629), conceitua:

"Requisição é a utilização coativa de bens ou serviços particulares pelo Poder Público por ato de execução imediata e direta da autoridade requisitante e indenização ulterior, para atendimento de necessidades coletivas urgentes e transitórias. O fundamento do instituto da requisição encontra-se no art. 5º, XXV, da CF, que autoriza o uso da propriedade particular, na iminência de perigo público, pelas autoridades competentes (civis ou militares).

Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2005, págs. 130/131), assevera que:

"A requisição administrativa pode apresentar-se sob diferentes modalidades, incidindo ora sobre bens, móveis ou imóveis, ora sobre serviços, identificando-se, às vezes, com a ocupação temporária e assemelhando-se, outras vezes, à desapropriação; é forma de limitação à propriedade privada e de intervenção estatal no domínio econômico; justifica-se em tempo de paz e de guerra.

(...)

Em qualquer das modalidades, a requisição caracteriza-se por ser procedimento unilateral e auto-executório, pois independe de aquiescência do particular e da prévia intervenção do Poder Judiciário; é em regra oneroso, sendo a indenização a posteriori. Mesmo em tempo de paz, só se justifica em caso de perigo público iminente."

José dos Santos Carvalho Filho (2006, pág. 639/640), doutrina que:

"Requisição é a modalidade de intervenção estatal através da qual o Estado utiliza bens móveis, imóveis e serviços particulares em situação de perigo público iminente.

Anteriormente, a requisição era instituto que só tinha aplicação em situação de guerra ou de movimentos graves de origem política. Hoje, ingressou no Direito Administrativo, servindo para fins militares e civis. Há, portanto, dois tipos de requisições: a requisição civil e a requisição militar.

O administrador público não é livre para requisitar bens e serviços. Para que possa fazê-lo, é necessário que esteja presente situação de perigo público iminente, vale dizer, aquele perigo que não somente coloque em risco a coletividade como também que esteja prestes a se consumar ou a expandir de forma irremediável se alguma medida não for adotada."

Nestes termos, os atos de REQUISIÇÃO ADMINISTRATIVA de medicamentos, nos casos de recusa expressa (fornecedor participa da licitação, mas oferta preços superiores aos fixados pela CMED) ou tácita (ausência de licitantes), encontram-se abraçados por todos os requisitos legais e constitucionais, pois resta configurada uma necessidade coletiva, urgente e transitória, decorrente de situação de perigo iminente.

Caracterizada a situação autorizadora da requisição administrativa, há que se estabelecer critérios para a escolha da empresa a ser requisitada.

Muitas vezes, o medicamento requisitado é fabricado por um único laboratório, ocasião em que é despicienda a discussão sobre o fato da impossibilidade de compra se dar em razão de deserção ou fracasso da licitação, pois em situações normais de aquisição, a Administração Pública vale-se do art. 25, I, da Lei n° 8.666/93, inexigindo a licitação e comprando diretamente do único produtor:

"Art. 25.  É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes;"

Havendo mais de um fabricante e tendo sido fracassado o procedimento licitatório (desclassificação das propostas por oferta de preço superior ao estimado e fixado pela CMED), embora todos os laboratórios que produzem e todas as empresas distribuidoras tenham apresentado resistência "tácita" à intenção de compra do Poder Público, a requisição administrativa deve se dar em desfavor de quem se opôs "direta e expressamente" à vender na forma e preços determinados pela CMED, ou seja, do licitante que concorreu no procedimento licitatório malfadado.

Dentre estes licitantes que se opuseram "direta e expressamente" à alienar os medicamentos almejados e necessários ao Ente Estatal, há que ser observado a regra geral que determina a seleção da proposta mais vantajosa (inteligência do art. 3º, caput c/c art. 26, § único, III, da Lei n° 8.666/93), devendo se optar pelo fabricante ou distribuidor que contar com o menor preço nas listagens fixadas pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED).

Nos casos de deserção do certame (ausência de propostas ou de interessados), a Administração Pública dever seguir o mesmo iter do parágrafo antecedente, requisitando do fabricante ou distribuidor que apresentar o menor preço fixado pela CMED.

Depois de se resolver em desfavor de quem se emitirá a requisição administrativa, é o momento de se deliberar sobre os critérios para a definição do valor da justa indenização e de quando ela deverá ser saldada.

O art. 15, XIII, da Lei n° 8.080/90, assegura a justa indenização ao requisitado, a fim de evitar o enriquecimento ilícito e sem justa causa, que é vedado pelo ordenamento brasileiro, ex vi art. 884, do Código Civil:

"Art.884: Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários."

Para se chegar ao preço do produto é necessário observar se os medicamentos requisitados encontram-se ou não:

(a) elencados em Convênios do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), para fins de cálculo ou desoneração do "ICMS"; e

(b) enquadrados na normas da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), para aplicação do Preço Máximo de Venda ao Governo (PMVG) ou apenas do Preço Fábrica (PF).

Não convém aqui dissertar sobre Preço Máximo de Venda ao Governo (PMVG) ou Preço Fábrica (PF), desonerados ou não de ICMS, vez que não é o objeto central deste artigo.

Entretanto, é necessário consignar que o Preço Fábrica (PF) é o teto máximo para preços de medicamento comprado pelo Ente Público, consoante dispõe a Orientação Interpretativa n° 02, da CMED, veja:

"Preço Fabricante é o teto de preço pelo qual um laboratório ou distribuidor de medicamentos pode comercializar no mercado brasileiro um medicamento que produz; considerando que a Lei nº 10.742, de 6 de outubro de 2003, que define normas de regulação para o setor farmacêutico e cria a CMED é aplicada às empresas produtoras de medicamentos, bem como às farmácias e drogarias, aos representantes, às DISTRIBUIDORAS DE MEDICAMENTOS e a quaisquer pessoas jurídicas de direito público ou privado que, de alguma maneira, atuem no setor farmacêutico.

Em qualquer operação de venda efetivada pelas empresas produtoras de medicamentos ou pelas distribuidoras, destinada tanto ao setor público como ao setor privado, deverá ser respeitado, para venda, o limite do Preço Fabricante, uma vez que o Preço Máximo ao Consumidor é o preço máximo permitido na venda de um medicamento no varejo, podendo ser praticado somente pelas farmácias e drogarias.

Assim, o Preço Máximo ao Consumidor é o preço a ser praticado pelo comércio varejista, ou seja, farmácias e drogarias; e o Preço Fábrica é o teto de preço pelo qual um laboratório ou distribuidor de medicamentos pode comercializar no mercado brasileiro um medicamento, já incorrendo em todos os custos de comercialização, quando o laboratório realiza a comercialização diretamente ao setor varejista; ou concede um desconto em seu preço para que a empresa distribuidora possa cobrir seus custos advindos da distribuição do medicamento ao setor varejista e também pratique o Preço Fábrica."

Não se pode olvidar que, tratando-se de indenização, as medidas tendentes à efetivação do pagamento (tais como, emissão de nota de empenho, liquidação e etc.), apenas, e somente, podem ser tomadas após o recebimento dos medicamentos pela autoridade requisitante.

Isso porque, dentre outros motivos, é defeso ao gestor público efetivar pagamentos antecipadamente (art. 62 e art. 63, da Lei n° 4.320/64).

É importante salientar que a conduta de fabricantes e distribuidores, no sentido de negar-se, tácita ou expressamente, a fornecer produtos terapêuticos, como medicamentos, deixando os Órgãos de gestão do SUS desabastecidos e carentes de remédios imprescindíveis aos pacientes e usuários assistidos, em tese, configura crime contra a economia popular, capitulado no art. 2º, I, da Lei n° 1.521/51:

"

Art. 2º. São crimes desta natureza:

I - recusar individualmente em estabelecimento comercial a prestação de serviços essenciais à subsistência; sonegar mercadoria ou recusar vendê-la a quem esteja em condições de comprar a pronto pagamento;

(...)

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, de dois mil a cinqüenta mil cruzeiros.

Parágrafo único. Na configuração dos crimes previstos nesta Lei, bem como na de qualquer outro de defesa da economia popular, sua guarda e seu emprego considerar-se-ão como de primeira necessidade ou necessários ao consumo do povo, os gêneros, artigos, mercadorias e qualquer outra espécie de coisas ou bens indispensáveis à subsistência do indivíduo em condições higiênicas e ao exercício normal de suas atividades. Estão compreendidos nesta definição os artigos destinados à alimentação, ao vestuário e à iluminação, os terapêuticos ou sanitários, o combustível, a habitação e os materiais de construção."

Por outro lado, a referida conduta, em tese, também se constitui em infração sanitária nos termos do art. 10, XXXIX, da Lei n° 6.437/77,

"

Art . 10 - São infrações sanitárias:

(...)

XXXIX - interromper, suspender ou reduzir, sem justa causa, a produção ou distribuição de medicamentos de tarja vermelha, de uso continuado ou essencial à saúde do indivíduo, ou de tarja preta, provocando o desabastecimento do mercado:

pena - advertência, interdição total ou parcial do estabelecimento, cancelamento do registro do produto, cancelamento de autorização para funcionamento da empresa, cancelamento do alvará de licenciamento do estabelecimento e/ou multa;"

Cumpre observar que o Tribunal de Contas da União, no julgamento do Processo n° 017.168/2007-5, relatado pelo Ministro Valmir Campelo, prolatou o venerando Acórdão 1437/2007 (publicado no Diário Oficial da União de 27 de julho de 2007, pág. 94), determinando que situações, como as vertidas neste artigo, sejam comunicadas à Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) e aos Ministérios Públicos Federal (MPF) e Estadual (MPE), veja item 9.2, da parte dispositiva do Acórdão 1437/2007-TCU:

"9.2. determinar ao Ministério da Saúde que dê ampla divulgação junto aos órgãos e entidades federais que fazem aquisições de medicamentos para atendimento da população, bem como junto às secretarias estaduais e municipais de saúde, acerca do teor das Resoluções da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos - CMED nºs 2/2004 e 4/2006, bem como da Orientação Interpretativa nº 02/2006, da mesma Câmara, com vistas a alertar os gestores estaduais e municipais que, em caso de não observância das resoluções pelos fornecedores de medicamentos quando de compras efetuadas pelo setor público, deverá o gestor comunicar o fato à CMED e ao Ministério Público Federal e Estadual, sob pena de responsabilização por aquisição antieconômica e pela devolução dos recursos pagos acima do teto estabelecido pelos normativos da CMED, mediante instauração de tomada da contas especial;" (negrito nosso)

Além dos órgãos citados pelo Tribunal de Contas da União, no Acórdão 1437/2007, é necessária a comunicação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), para apuração da infração sanitária cometida, em tese, pelas empresas requisitadas.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a requisição administrativa a Administração Pública conta com um meio eficiente e capaz de contornar a inconseqüente conduta de fabricantes e distribuidores de medicamentos, abastecendo seus estoques dos fármacos imprescindíveis à manutenção da vida e saúde dos usuários SUS-dependentes.

Entrementes, como todo ato diverso do procedimento licitatório, a requisição administrativa deve ser rigidamente caracterizada e racionalmente utilizada, sob pena de inversão da ordem legal, fazendo da exceção a regra geral.

Por certo que essa ação administrativa terá um efeito pedagógico imediato, porquanto as indústrias e distribuidoras não terão a mesma expectativa de recebimento da contraprestação (justa indenização), segurança esta que têm quando entabulam contratos com observância da regras licitatórias.

Isso porque, o contrato contém cláusula de pagamento, na qual é estipulado o prazo máximo para quitação do débito. Fato este que, contrario sensu, não ocorre com a indenização, ficando aos sabores da disponibilidade orçamentária e financeira do órgão devedor.

Então, como medida extrema, a requisição administrativa cumpre sua finalidade, em excelsa homenagem ao princípio basilar da supremacia do interesse público sobre o privado, fazendo frente às ardis manobras dos fabricantes e distribuidores de medicamentos para não observarem as normas emanadas da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED).


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 13ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MS 11706/DF, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, julgado em 08/11/2006, DJ 27/11/2006 p. 222.

_______. MS 12730/DF, Rel. Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, Julgado em 27/06/2007, DJ 03/09/2007 p. 112.

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Processo n° 017.168/2007-5. Acórdão 1437/2007. Rel. Ministro Valmir Campelo. julgado em 25/07/2007, DJ 27/07/2007 p. 94.

Sobre o autor
Pabllo Vinícius Félix de Araújo

Advogado, Diretor Jurídico Substituto e Coordenador de Contratos e Fundos da Secretaria de Estado da Saúde do Tocantins

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Pabllo Vinícius Félix. Requisição administrativa de medicamentos: (art. 15, XIII, da Lei n° 8.080/90 c/c art. 5º, XXV, da Constituição Federal de 1988). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2023, 14 jan. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12198. Acesso em: 22 nov. 2024.

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