3. O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO EM FACE DO ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO
No Brasil, o ordenamento jurídico tem asseverado sua desaprovação à prática abusiva do assédio moral, não obstante se tratar de uma apreciação ainda tímida.
De outra ponta, todavia, compete afirmar que, apesar de incipiente no tema, o direito pátrio - desde já - não afasta da sua apreciação o assédio moral quando prevê, sob a ótica da Constituição Federal, do Código Civil e da Consolidação das Leis do Trabalho, meios de combate a essa forma de tortura psicológica contra o trabalhador.
3.1. A Constituição Federal e suas garantias contra o assédio moral
Quando a prática maliciosa do assédio moral se instala, o que se observa é o surgimento das mais variadas formas de aviltamento contra o obreiro.
Dentro desse contexto, dúvida não pode haver no sentido de que o assédio moral afronta a dignidade da pessoa humana, baluarte contido na Constituição Federativa do Brasil, no artigo 1°, inciso III.
Oportunamente, MORAES (2006, p. 48) evidencia que
A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.
E RUFINO (2006, p. 26) arremata que "a dignidade do trabalhador é uma característica inerente ao ser, de valor imensurável, não se resumindo à satisfação dos interesses capitalistas, como se o operário fosse uma coisa descartável, devendo ser valorizada e priorizada [...]".
A Carta Constitucional também afiança o direito à saúde. É o que se extrai do de seu artigo 6°, caput, referente aos direitos sociais.
Sobre esses direitos sociais, MORAES (2006, p. 479) menciona que
[...] são direitos fundamentais do homem, que se caracterizam como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria das condições de vida aos hipossuficientes [...].
Em verdade, a psicoviolência expõe o trabalhador a situações desumanas que vão minando sua saúde física e mental e entendimento diverso não pode haver quando se reconhece que, a partir da instalação desse procedimento malévolo, a vítima experimenta a visível degradação do seu corpo e da sua alma na forma de uma série de enfermidades.
De outra parte, a psicoviolência moral também afronta a Constituição Federal em seu no artigo 1°, inciso IV, eis que, na medida em que "coisifica" o trabalhador, desrespeita a concepção de prevalência dos valores sociais do trabalho sobre os interesses particulares do capital.
De acordo com RUFINO (2006, p. 26) "a dignidade do trabalhador é uma característica inerente ao ser, de valor imensurável, não se resumindo à satisfação dos interesses capitalistas, como se o operário fosse uma coisa descartável, devendo ser valorizada e priorizada [...]".
E, ainda, assegura a Carta Magna, no artigo 225 coadunado ao artigo 200, inciso VIII, o meio ambiente ecologicamente equilibrado do trabalho que, por sua vez, conforme a doutrina de DALLEGRAVE NETO (2005, p. 235), atribui "[...] ao empregador a obrigação de assegurar ao empregado um ambiente de trabalho sadio", o que, como já demonstrado, não se observa quando da instalação do terror psicológico.
Destarte, a Constituição Federal, desde logo, tangencia meios passíveis de se salvaguardar o trabalhador da conduta perversa e degradante intitulada assédio moral no ambiente onde desenvolve suas atividades.
3.2. O Código Civil e a reparação do dano causado pelo psicoterror no trabalho
Atos humilhantes como a repreensão em público ou por meio de circular interna, a divulgação de boatos maldosos, o rebaixamento injustificável de função, o empobrecimento das tarefas, as ameaças constantes de dispensa, a crítica grosseira ao desempenho das atividades, a segregação, a inação forçada, a imposição maliciosa de metas inatingíveis são exemplos de práticas intoleráveis e tão recorrentes num ambiente hostil permeado pela prática do assédio moral que violam o patrimônio ideal do obreiro e, sem sombra de dúvida, possibilitam o direito à indenização por dano moral.
Para RUFINO (2006, p. 95), "o assédio moral, como ilícito trabalhista, dá direito à indenização extrapatrimonial, por atingir interesses da personalidade, da liberdade e da dignidade da pessoa."
Nessa oportunidade, relevância possui a doutrina de SILVA (2003, p. 200) ao afirmar que
A vida humana não é apenas um conjunto de elementos materiais. Integram-na, outrossim, valores imateriais, como os morais. [...] A moral individual sintetiza a honra da pessoa, o bom nome, a boa fama, a reputação que integram a vida humana como dimensão imaterial. Ela e seus componentes são atributos sem os quais a pessoa fica reduzida a uma condição animal de pequena significação.
O assédio moral, inquestionavelmente, promove uma mácula aos direitos essenciais do trabalhador, pois que, de acordo com DALLEGRAVE NETO (2005, p.234) "[...] ofende o seu direito de personalidade, máxime sua honra e intimidade."
A esse respeito, a doutrina de PONTES DE MIRANDA, citado por SOUZA, (2002, p. 48) clarifica que a honra "é a soma da dignidade pessoal (sentimento e consciência de ser digno) com a estima e consideração moral dos outros".
E, no que se refere à imagem, SOUZA leciona que
Hoje, sob o aspecto jurídico, o termo ganha profundidade e extensão, na medida em que se compreende como sendo a imagem da pessoa física ou jurídica não só o seu semblante, no aspecto físico (imagem retrato),mas também a imagem que as outras pessoas têm daquele ser (imagem atributo), vale dizer, aquela imagem que alguém faz de outrem quanto aos seus valores éticos-morais. (2002, p. 84)
Sobre o dano moral, GAGLIANO e PAMPLONA FILHO (2006, p. 55) informam que
[...] consiste na lesão de direitos cujo conteúdo não é pecuniário nem comercialmente redutível a dinheiro. Em outras palavras, podemos afirmar que o dano moral é aquele que lesiona a esfera personalíssima da pessoa (seus direitos de personalidade) violando, por exemplo, sua intimidade, vida privada, honra e imagem, bens jurídicos tutelados constitucionalmente.
De outra parte, também há de se reconhecer a ocorrência de prejuízos de ordem material, na medida em que, diante do quadro de miséria humana experimentado, o assediado poderá ter de arcar, conforme MENEZES (2002), com "[...] gravames de ordem econômica (perda do emprego, despesas com médicos, psicólogos [...]"
Em verdade, o dano moral e material possuem, num primeiro plano, aporte na própria Constituição Federal que estatui, em seu artigo 5°, inciso X:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
Por sua vez, o Código Civil traz arrimo protetivo em face desses prejuízos quando estabelece:
Artigo 186 Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Artigo 187 Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
A responsabilidade civil tem seu nascedouro no brocardo latino neminem laedere, isto é, "a ninguém é dado causar prejuízo a outrem".
Note-se que, para a configuração da responsabilidade civil, necessário é que exista ato ilícito, dano e nexo de causalidade. São os seus pressupostos.
No caso do assédio moral, esses elementos se mostram presentes porque a conduta dolosa e mal-intencionada do agente, sem dúvida, gera no assediado algum prejuízo – quer de ordem moral, quer material - tornando-se, dessa maneira, admissível a reparação civil como compensação do dano à vítima, bem como punição do ofensor e desestímulo social da conduta lesiva.
DINIZ (2002, p. 34) ensina que
A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.
Destarte, infere-se que, hodiernamente, respondem pelo ilícito tanto o agente, quanto quem por ele responda, como é o caso do empregador ou comitente.
Tratam-se, as duas possibilidades, dos institutos da responsabilidade civil subjetiva e da responsabilidade civil objetiva, respectivamente.
Sobre a responsabilidade civil objetiva, prescreve o Novo Código Civil, em seu artigo 932, inciso III que "são também responsáveis pela reparação civil, o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele."
Outrossim, estabelece o artigo 942, parágrafo único, do mesmo Diploma Civilista que "são solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932."
Para DALLEGRAVE NETO (2005, p. 237-8),
Quando o assediante for a própria pessoa do empregador, indubitável que ele será o responsável direto pela reparação dos danos infligidos à vítima, recaindo na regra da responsabilidade civil subjetiva, vez que presentes os elementos dano, ato ilícito e nexo causal [...] Se o assediante for um empregado investido de cargo hierarquicamente superior ao da vítima e, nessas circunstâncias, constrange-a de forma reiterada [...] causa-lhe inevitável dano moral. Com efeito, o empregador será responsabilizado por ato praticado por seu preposto (assediante) consoante dispõe o art. 932, III, do Novo Código Civil [...] a responsabilidade do empregador por ato de seu empregado perante terceiro é sempre objetiva, seja pela presunção juris et de jure de culpa in eligendo e in vigilando, conforme dicção da Súmula n. 341 do STF, seja pelo que preconiza o art. 933 do novo Código Civil que responsabiliza o empregador "ainda que não haja culpa de sua parte".
Todavia, cumpre salientar que, em tal hipótese, o ordenamento jurídico faculta ao empregador utilizar-se do instituto da denunciação à lide ou pleitear ação regressiva em face do assediante, conforme regramento trazido pelo Código Civil e pelo Código de Processo Civil, os quais se transcrevem respectivamente:
Artigo 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz.
Artigo 70 A denunciação da lide é obrigatória:
[...]
III àquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda.
A respeito, GUEDES vaticina que
Abriu também o Código a possibilidade do direito de regresso daquele que ressarciu o dano causado por outrem. Assim, ao empregador preservou-se o direito de ajuizar ação de regresso para se reembolsar do prejuízo que pagou por danos praticados por seus empregados e prepostos. (2005, p. 119).
Logo, infere-se que o Código Civil pode, por intermédio da previsão de reparação dos danos moral e material, propiciar a punição do malfeitor, amenizar o prejuízo suportado pelo obreiro assediado e, ainda, desestimular a conduta no seio da sociedade.
3.3. A Consolidação das Leis do Trabalho: a proteção ao trabalhador assediado
A Consolidação das Leis do Trabalho, promulgada em 1° de maio de 1943, igualmente, pode ser apontada como Diploma Legal a tratar genericamente da prática abusiva definida como assédio moral.
Trata-se da possibilidade de rescisão indireta por parte do empregado em razão de ato culposo do empregador, encartada no artigo 483 do Diploma Consolidado, in verbis:
O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;
c) correr perigo manifesto de mal considerável;
d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.
§ 1º - O empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou rescindir o contrato, quando tiver de desempenhar obrigações legais, incompatíveis com a continuação do serviço.
§ 2º - No caso de morte do empregador constituído em empresa individual, é facultado ao empregado rescindir o contrato de trabalho.
§ 3º - Nas hipóteses das letras "d" e "g", poderá o empregado pleitear a rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas indenizações, permanecendo ou não no serviço até final decisão do processo.
Nos dizeres de NASCIMENTO (2005, p. 784) a dispensa indireta "... é a rescisão do contrato de trabalho pelo empregado, tendo em vista justa causa praticada pelo empregador".
Note-se que, nesse caso, as verbas oriundas do término do contrato de trabalho, em que pese a iniciativa de extinção ter partido do empregado, são de responsabilidade do empregador, eis que o obreiro certamente não deu causa ao seu pedido de dispensa.
Na visão de DALLEGRAVE NETO (2005, p. 236-7),
[...] o assédio praticado pelo empregador, além de caracterizar descumprimento de obrigação contratual, afeta a honra do empregado, autorizando-o a deixar o emprego para postular em juízo a rescisão indireta do contrato, com esteio no art. 483, alíneas ‘d’ e ‘e’, da CLT.
Já para BARROS (2008), os comportamentos que envolvem o assédio moral,
[...] poderão ser enquadrados em várias alíneas do artigo 483 da CLT (como rigor excessivo, perigo manifesto de mal considerável, descumprimento de obrigações legais e contratuais, serviços superiores às forças do trabalhador, ofensa à honra e boa fama).
Em verdade, o episódio do terror psicológico, no mais das vezes, resta permeado de condutas que obrigam o trabalhador a executar tarefas superiores às suas forças e, também, alheias ao contrato de trabalho. É o que ocorre, por exemplo, quando o assediador, sendo hierarquicamente superior, ordena ao empregado que cumpra metas inatingíveis ou quando a este é determinado desempenhar tarefas inúteis, banais, aquém da sua capacidade intelectual com flagrante desvio de função.
Da mesma maneira, o rigor excessivo dispensado exclusivamente ao assediado pode ser visto com bastante freqüência.
Nem se fale no perigo manifesto de mal considerável que o terror psicológico no trabalho propicia quando se reconhece que, a partir dele, pode-se levar o trabalhador às mais variadas doenças e até a morte.
O fenômeno, outrossim, por sua própria natureza, encontra-se abalizado por insultos e demais atos lesivos à honra e boa-fama do trabalhador, podendo alcançar, até mesmo, um grau mais avançado de abusividade e culminar na ofensa física.
Além disso, de sua parte, comum é o empregador utilizar-se do descumprimento das suas obrigações contratuais como forma de desestímulo ao empregado em permanecer ali desenvolvendo suas atividades laborativas, como quando recusa a entrega dos equipamentos de segurança necessários à execução das atividades desempenhadas pelo obreiro ou quando atrasa, propositadamente, o pagamento do salário, fonte de sobrevivência do trabalhador.
Com efeito, o psicoterror no trabalho enseja tamanho quadro de incompatibilidade com a continuação do serviço que obriga o trabalhador a buscar a extinção do contrato de trabalho por razões alheias a sua vontade.
Não obstante, GUEDES alerta que
A proteção da dignidade do trabalhador brasileiro também se encontra encartada na CLT, que dispõe sobre as hipóteses de justa causa do empregador (art. 483, alíneas de "a" a "g"), mas é insuficiente. Concedeu-se ao empregado a possibilidade de resistência, diante do abuso de poder do empregador, ou o poder de rescindir o contrato e receber a indenização. A norma celetista não cuida de outra coisa senão de direitos fundamentais dos trabalhadores, neles incluindo direitos prestacionais, alínea "g". Diante do atual contexto de desemprego estrutural, soa ingênua a norma que pretende igualar empregado e empregador na faculdade de romper o contrato por justa causa. Por outro lado, o jus resistentiae do empregado brasileiro inexiste, mormente, se inexistem garantias de emprego. (2005, p. 121).
Logo, a rescisão indireta do contrato de trabalho prevista na Consolidação das Leis do Trabalho, em que pese permitir alguma igualdade entre empregado e empregador e, ainda, algum poder de resistência, por parte daquele, aos atos abusivos praticados por este último, não consegue - com efetividade - dar verdadeira guarida ao trabalhador, pois, na realidade, poucos são os que podem desfazer-se das atividades desenvolvidas sem a angústia de "se" irão conseguir uma recolocação no mercado de trabalho assombrado pela supressão de tantos postos de serviço.
Há, de outro vértice, a importância de se ressaltar que, tendo em vista o quadro de desventura suportado, a vítima poderá ser amparada pela infortunística laboral.
Sedimentando esse entendimento, MENEZES (2002) assevera que "[...] alguns já inserem o assédio moral nas doenças profissionais, com todas as conseqüências que isso pode acarretar: afastamento do empregado; contagem para tempo de serviço; estabilidade no emprego, etc."
Porém, outra vez, GUEDES (2005, p. 30) denuncia que
[...] resistir dentro de um ambiente inteiramente hostil, para não abrir mão da garantia no emprego implica ter de decidir entre dois aspectos irrenunciáveis da dignidade da pessoa humana: a saúde do corpo e da mente e o direito ao emprego, única fonte de sobrevivência.
Logo, infere-se que a Consolidação das Leis do Trabalho possui a pretensão de proporcionar ao obreiro algum amparo em face do terror psicológico, todavia, compete afirmar que a sua força normativa tem sido muito mitigada nessa moderna conjuntura estrutural em que o ser humano é posto como meio e não como fim no processo produtivo.
3.4. A problemática da prova judicial do assédio moral
Eis a maior dificuldade a envolver, atualmente, o tema: a prova judicial do assédio moral.
Quando existem bilhetes, mensagens eletrônicas ou testemunhas que se comprometam a comprovar as alegações trazidas pela vítima do assédio moral, há que se reconhecer que não existem grandes dificuldades ao ônus de provar. Contudo, essa não é a realidade na maioria dos tribunais.
Como se sabe, o terror psicológico, quase sempre, não é uma agressão direta, tampouco aberta. Ao contrário, o assediador tenta agir a portas fechadas, sem deixar vestígios. Preferindo a comunicação não-verbal, a sua agressão consiste, amiúde, num olhar carregado de ódio, em maliciosos suspiros, em atitudes capazes de demonstrar indiferença àquilo que o assediado faz ou diz. Nos episódios de assédio moral, o que se nota é um ataque sutil e velado, quase imperceptível.
Diante disso, o que se reconhece é que a prova plena dessa violência contra o trabalhador se mostra de extrema dificuldade.
Mutatis mutandis, o Tribunal Regional do Trabalho – 2ª Região, no Acórdão n° 20010503530, manifestou que "exigir prova cabal e ocular para vislumbrar o assédio sexual é simplesmente impossibilitar a prova em Juízo, e assim contribuir para que ilicitude de tanta gravidade continue ocorrendo."
DALLEGRAVE NETO (2005, p. 242) ressalta que
A prova judicial da prática do assédio sexual e moral é de extrema dificuldade para a vítima, posto que, na maioria das vezes, o assediante, em manifesta conduta pusilânime, "age às portas fechadas". Mediante essa situação, o meio mais eficaz e disponível à vítima, geralmente, é a gravação das conversas que caracterizam o assédio, devendo o julgador admiti-la sem maiores receios. E nem se cogite da invalidade da prova porque obtida "por meios ilícitos" (art. 5°, LVI, CF), pois do contrário, o direito da assediada ficaria eternamente prejudicado por falta de prova. Quando se está diante de uma colisão de direitos fundamentais, o critério de preferência e sacrifício deve ocorrer à luz do princípio da proporcionalidade.
Outrossim, BARROS (2008), tecendo comentários sobre sua atuação no Recurso Ordinário nº 1262/02, junto ao Tribunal Regional do Trabalho - 3ª Região, no qual vislumbrou um caso de assédio moral com realização de gravação pela vítima, sem o conhecimento das demais pessoas presentes no ambiente de trabalho, assevera que
No nosso entendimento, essa circunstância não caracteriza a prova como obtida de forma ilegal, já que não se trata de interceptação de conversa alheia ou, mesmo, de divulgação de conversa privada. Todas as partes da gravação que interessam ao caso são aquelas em que a reclamante, autora das gravações, aparece como um dos interlocutores e tudo o que foi gravado, conforme já se disse, foi dito em público (no local de trabalho), e não em conversa reservada entre a reclamante e quaisquer das demais pessoas ali envolvidas. Por isso, não se vislumbra afronta à inviolabilidade da vida privada ou da intimidade de quem quer que seja [...]. No caso, a reclamante, indubitavelmente, estava lançando mão do seu direito de defesa, com os meios legítimos de que dispunha, isto é, registrando as palavras ofensivas que lhe foram dirigidas no seu ambiente de trabalho, ou seja, em local público, ciente da dificuldade que teria de se desincumbir do encargo probatório das ofensas sofridas. Seria contra-senso querer alçá-las, agora, à categoria de conversas privadas, para o fim de afastar a prova.
De outra parte, tendo em vista as peculiaridades que envolvem a prática do assédio moral, hodiernamente, raia a possibilidade de uma inversão do ônus probatório, de maneira que, conforme BARROS (2008, p. 32-3),
[...] incumbe à vítima apresentar indícios que levem a uma razoável suspeita, aparência ou presunção da figura em exame e o demandado assume o ônus de demonstrar que sua conduta foi razoável, isto é, não atentou contra qualquer direito fundamental.
Assim, certo é que, sabiamente, os tribunais têm admitido, como instrumento probatório, as gravações secretas efetuadas pelo obreiro, afastando a alegação de que obtidas por meios ilícitos, pois, se trata praticamente do único meio capaz de garantir ao trabalhador a demonstração da lesão sofrida nos casos de assédio moral.
Da mesma forma, repousa inconteste que, medidas de brandura quanto à prova judicial do assédio moral são de inegável importância, pois que, caso contrário, o obreiro - vulnerável que é – jamais alcançaria a concretizada tutela em face de forma tão inerme de violência contra o ser humano.