CONCLUSÃO
O feto encontra-se vivo no útero da mãe, desenvolvendo-se até seu nascimento, podendo nascer com vida, o que de fato acontece em significativo percentual. Nascendo viva, a criança se investe de todas as garantias inerentes à personalidade jurídica.
O período de vida extra-uterina do anencéfalo pode variar de horas a meses, assim como o desenvolvimento que irá apresentar. A breve duração da vida não justifica a antecipação da morte.
A anencefalia, por si, não causa a morte da gestante e nem diminui sua dignidade ou liberdade. A autonomia reprodutiva da mulher só diz respeito à liberdade que ela possui de decidir-se por uma gravidez, sendo que, depois de consumada esta, prevalece o direito à vida, igual para mãe e filho.
A antecipação do parto causa a morte do feto, concretizando-se o aborto, que não é terapêutico mas eugênico. A morte da criança é provocada pelo ato da interrupção da gestação e não pela deficiência encefálica, configurando-se, então, um crime contra a vida.
A antecipação do parto de anencéfalo é inconstitucional e não está prevista pelo Código Penal, que não pode ser interpretado "in malam partem".
A Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental não é o meio processual correto à pretensão da autora, que deseja a inclusão de nova hipótese normativa, e não possui condições de ser conhecida pelo Supremo Tribunal Federal.
Diante dos fatos, o aborto por anencefalia não deve ser legalizado e nem pode, visto carecer seriamente de fundamentação, principalmente ao confrontar-se com o direito primordial à vida que possuem todos os seres humanos, bem ou mal formados. Como bem ensina Dernival da Silva Brandão:
Criança doente necessita de cuidados médicos e não de ser eliminada. O diagnóstico pré-natal deve ser realizado enquanto possa servir ao bem da pessoa, e ser adequado à prevenção, ao diagnóstico e ao tratamento de enfermidades; e não para discriminar os portadores de genes patogênicos e defeitos congênitos. Senão aplicar-se-iam conhecimentos médicos não para tratar o doente, mas para eliminá-lo [...] Sempre há meios de tratar a gestante e, para isso, devem ser empregados todos os recursos atualmente disponíveis na proteção da vida de ambos: mãe e filho. Uma conduta médica atualizada, aliada à experiência clínica e ao progresso técnico científico levará, por certo, ao bom êxito a gravidez; e o insucesso, se houver, ficará restrito ao seu casualismo e à sua imprevisibilidade. Quando necessário, a gestante doente deve ser encaminhada para centro especializado em gestação de alto risco. O abortamento não é isento de riscos, e a experiência tem demonstrado que muitas vezes ele próprio é causa da morte para a gestante doente. (Apud MENEZES, 2004, p. 09).
O anencéfalo tem direito à vida, tanto no útero como fora dele. É absolutamente inadmissível que se autorize a retirada de seus órgãos, pois isso significaria retirar órgãos de uma pessoa viva, o que afronta totalmente a ética e a moral pública. Um país cuja legislação proíbe o aborto de anencéfalo, em respeito à sua vida, não deve, pelos mesmos motivos, permitir que seus órgãos sejam doados para transplante, ao contrário do que decidiu a Resolução nº 1.752 do Conselho Federal de Medicina, de 08/09/2004.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição Federal, Código Penal, Código de Processo Penal. Org. Luiz Flávio Gomes; obra coletiva de autoria da Editora Revista dos Tribunais. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. (RT-mini-códigos).
DINIZ, Débora; RIBEIRO, Diaulas Costa. Aborto por anomalia fetal. Brasília: Letras Livres, 2004.
MENEZES, Glauco Cidrack do Vale. Aborto eugênico: alguns aspectos jurídicos. Paralelo com os direitos fundamentais da vida, da liberdade e da autonomia da vontade privada e com os direitos da personalidade civil no novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 413, 24 ago. 2004. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/5622>. Acesso em: 22 fev. 2005.
NÉRI da Silveira é contra o aborto de anencéfalos. Jus Navigandi, Teresina, a 8, n. 413, ago. 2004. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/16602. Acesso em: 22 fev. 2005.
QUEIROZ, Eduardo Gomes de. Abortamento de feto anencefálico e a inexigibilidade de conduta diversa. A influência das circunstâncias concomitantes no comportamento humano. Jus Navigandi, Teresina, a. 10, n. 943, 1 fev. 2006. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/7770. Acesso em: 23 fev. 2006.
Notas
- Eugenia é a ciência que se ocupa do aperfeiçoamento físico e mental da raça humana.
- Excesso de líquido amniótico.
- Eutanásia é uma prática ilegal pela qual se abrevia a morte a um doente incurável, sob o pretexto de poupar-lhe mais sofrimentos.
- Glândula de secreção interna, de funções múltiplas, situada na base do cérebro.
- Anexo 06, p. 09.
- Anexo 08, p. 02.
- Anexo 06, p. 12.
- "Perguntas mais freqüentes sobre anencefalia". Disponível em: www.anencephalie-info.org.
- Anexo 06, p. 06.
- Id., p. 17.