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Crimes sexuais. Breves considerações sobre os artigos 213 a 226 do CP, de acordo com a Lei nº 12.015/2009

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Agenda 26/08/2009 às 00:00

8. Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável

Outra inovação da Lei 12.015/2009. Eis a redação:

Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável

Art. 218-B.  Submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone:

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos.

§ 1º  Se o crime é praticado com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.

§ 2º  Incorre nas mesmas penas:

I - quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos na situação descrita no caput deste artigo; 

II - o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifiquem as práticas referidas no caput deste artigo.

§ 3º  Na hipótese do inciso II do § 2º, constitui efeito obrigatório da condenação a cassação da licença de localização e de funcionamento do estabelecimento.

Cabe lembrar que a Lei nº 8.069/1990 (ECA) traz em seu bojo o seguinte crime:

Art. 244-A. Submeter criança ou adolescente, como tais definidos no caput do art. 2º desta Lei, à prostituição ou à exploração sexual:

Pena – reclusão de quatro a dez anos, e multa.

§ 1º. Incorrem nas mesmas penas o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifique a submissão de criança ou adolescente às práticas referidas no caput deste artigo.

§ 2º. Constitui efeito obrigatório da condenação a cassação da licença de localização e de funcionamento do estabelecimento.

O Código Penal (com as modificações produzidas pela Lei 12.015/2009), ao que vislumbramos, ampliou a conduta antes tipificada apenas pelo ECA em relação ao menor. Enquanto o ECA reprime apenas a conduta de submeter a pessoa menor de idade à prostituição ou à exploração sexual, o art. 218-B vai além, ao tipificar a conduta de submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone.

Resta, assim, sustentarmos que o art. 218-B do CP revogou tacitamente o art. 244-A do ECA, apesar da Lei Complementar nº 95/1998, em seu art. 9º, vedar a utilização desse tipo de técnica legislativa (revogação tácita) [38].

8.1 Objetos jurídico e material

O bem jurídico protegido no crime em estudo é, sob um aspecto amplo, a dignidade sexual da pessoa menor de 18 (dezoito) anos ou portadora de enfermidade ou deficiência mental. Sob um aspecto específico, tutela-se o desenvolvimento sexual do menor de idade e a inviolabilidade sexual do enfermo ou deficiente mental sem discernimento para prática de ato dessa espécie.

O objeto material é a pessoa, do sexo masculino ou feminino, menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática de ato de natureza sexual.

8.2 Sujeitos ativo e passivo

Qualquer pessoa pode praticar o delito ora comentado. Trata-se de crime comum.

Quanto ao sujeito passivo, somente pode ser vítima a pessoa (do sexo feminino ou masculino) menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato (prostituição ou outra forma de exploração sexual).

A pessoa já prostituída não pode ser vítima no tocante aos núcleos submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual; pela simples razão de tais núcleos se voltarem a impedir a inserção do menor de idade e do enfermo ou deficiente mental no mundo da prostituição ou de outra forma de exploração sexual.

Quanto aos núcleos impedir ou dificultar que abandone, certamente haverá a possibilidade da prostituta figurar como sujeito passivo.

No tocante ao núcleo facilitá-la (facilitar a prostituição ou outra forma de exploração sexual), acaso se trate de facilitar o ingresso de alguém na espécie de libertinagem proscrita, certamente não será possível figurar como vítima a pessoa já prostituída [39]. Quando a conduta do agente é de facilitar o exercício da prostituição por pessoa já prostituída (arranjando mais clientes, por exemplo), certamente que será possível figurar como vítima a prostituta [40].

Situação que pode acarretar dificuldades para definir se deve incidir o art. 218-B ou o art. 217-A (estupro de vulnerável) ocorrerá quando se tratar de favorecimento à prostituição de menor de catorze anos ou de portador de enfermidade ou deficiência mental sem o necessário discernimento para a prática de ato sexual. Imagine-se o caso de uma dona de bordel que atrai uma menor de treze anos à prostituição, vindo esta a manter relações sexuais, por exemplo, com vinte clientes na primeira noite de serviço, ocasião em que seu bordel é fechado pela polícia e descoberta toda a situação. Nesse caso, a proprietária do prostíbulo deveria responder como concorrente em vinte estupros de vulnerável ou deveria apenas responder pelo delito do art. 218-B?

Parte da doutrina sinaliza ser mais adequado, nesse caso específico, enquadrar a agente vinte vezes, como concorrente, na prática do crime de estupro de vulnerável. Do mesmo modo ocorrerá em se tratando de vítima portadora de enfermidade ou deficiência mental sem o necessário discernimento para a prática de ato sexual. Por tal razão Guilherme de Souza Nucci (2009, p. 55) afirma: "O sujeito passivo, entretanto, é o menor de 18 anos e maior de 14 (afinal, qualquer exploração sexual do menor de 14 anos configura o estupro de vulnerável, ainda que na forma de participação) ou a pessoa enferma ou deficiente mental" [41].

Quanto aos enfermos ou deficientes mentais, Nucci (2009, p. 54) faz a seguinte diferenciação:

As pessoas enfermas ou deficientes mentais também se submetem à análise da vulnerabilidade absoluta ou relativa: a) enfermos e deficientes que não têm a menor compreensão e discernimento em relação ao ato sexual: vulnerabilidade absoluta (estupro de vulnerável); b) enfermos e deficientes que têm relativa compreensão e discernimento em relação ao ato sexual: vulnerabilidade relativa. Pode tipificar-se no art. 215, não havendo pagamento pelo ato, ou no art. 218-B, quando no cenário da prostituição.

Por essa linha de entendimento somente podem ser vítimas do delito previsto no art. 218-B os enfermos e deficientes mentais com relativa capacidade de discernimento em relação ao ato sexual. Acaso não haja qualquer capacidade de discernimento, o caso será de estupro de vulnerável (art. 217-A).

No caso específico de favorecimento à prostituição no qual o agente de certo modo continua monitorando a atividade da vítima (como ocorre no caso do exemplo dado anteriormente); concordamos plenamente que ele deva responder, em concurso com quem mantiver relações sexuais com o vulnerável, pelo crime de estupro de vulnerável quando se tratar de vítima menor de catorze anos ou com enfermidade/deficiência mental. Pensamos, ademais, deva também responder, nesse caso específico, pelo delito previsto no art. 218-B, em concurso.

Há casos de favorecimento à prostituição, todavia, nos quais o agente apenas induz a vítima a se prostituir e se afasta da atividade desta. Por exemplo: uma prostituta, em conversa com uma garota de trezes anos, convence (induz) a mesma a se prostituir. A adolescente, motivada pelas ideias implantadas em sua mente, inicia-se na atividade da prostituição por conta própria, sem qualquer acompanhamento por parte de quem lhe induziu. No exemplo dado, vislumbramos claramente a incidência do art. 218-B. Não podemos, contudo, imputar à agente o crime de estupro de vulnerável na condição de partícipe por conta das relações sexuais mantidas pela menor das quais ela (a agente) sequer teve conhecimento.

Não se pode esquecer, ademais, que é considerado partícipe aquele que induz, instiga ou auxilia o criminoso e não a vítima. No caso foi induzida a vítima para manter relações sexuais com uma quantidade indeterminada de clientes, estes até, no exemplo dado, desconhecidos da induzente, e envolvidos em situações igualmente desconhecidas. Não se pode, portanto, atribuir a ela a condição de partícipe (muito menos de coautora) em tais estupros de vulneráveis. Destarte, não é pertinente entender que após induzir a vítima a se prostituir, a agente, por esse simples fato, deva figurar como concorrente dos vários agentes que se relacionarão sexualmente com a menor, sob pena de se adotar uma forma de responsabilização objetiva.

No caso de enfermos e deficientes mentais, entendemos, com a devida vênia, não ser pertinente a conclusão de Nucci (vide linhas atrás) que para ser vítima do delito do art. 218-B este deve ter relativa capacidade de discernimento. Aliás, nada disso expressa o dispositivo, apenas referindo a falta de capacidade de discernimento (por nós entendida como total).

Assim, do mesmo modo como ocorre com o menores de catorze anos, pensamos haver a possibilidade do enfermo e deficiente mental sem qualquer capacidade de discernimento para atos sexuais ser vítima do crime do art. 218-B.

Ocorrendo situação na qual o sujeito ativo do favorecimento da prostituição também concorre para o estupro de vulnerável, entendemos ser o caso de concurso de crimes (a espécie de concurso deve ser definida de acordo com cada caso concreto), devendo o mesmo responder tanto pelo art. 218-B quanto pelo art. 217-A.

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8.3 Tipo objetivo

Conforme já transcrito, a conduta básica tipificada consiste em: "Submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone".

Os núcleos são submeter, induzir, atrair, facilitar, impedir e dificultar; todos relacionados com a prostituição ou outra forma de exploração sexual.

Sinteticamente, podemos dar os seguintes significados aos núcleos:

Submeter: sujeitar;

Induzir: dar a ideia, convencer;

Atrair: seduzir, aliciar;

Facilitar: favorecer o acesso, proporcionar meios (conseguindo clientes para vítima, por exemplo);

Impedir: obstar totalmente, inviabilizar;

Dificultar: tornar mais oneroso, atrapalhar.

Segundo Nucci (2008, p. 246), a prostituição consiste na realização de ato sexual mediante paga, em caráter habitual; enquanto que a exploração sexual equivale a tirar proveito de ato sexual de outrem. Referido autor (NUCCI, 2008, p. 246) assim explica esse posicionamento:

Afinal, prostituir-se significa entregar-se à devassidão e à corrupção moral, relacionando-se sexualmente com alguém em troca de dinheiro ou outra vantagem. Cuida-se de conduta visivelmente habitual, que exige regularidade. Não se pode sustentar haver prostituição se, em uma única ocasião, alguém se relaciona sexualmente em troca de alguma recompensa. Por outro lado, a exploração sexual não exige esse caráter duradouro.

Defende o autor, contudo, que assim como na prostituição, também na exploração sexual a atividade libidinosa da vítima deve visar algum proveito, mesmo que esta vantagem seja visada apenas pela vítima e não pelo sujeito ativo do delito. Comentando o art. 244-A do ECA (cujas condutas foram abarcadas pelo art. 218-B do CP), assim se expressa (NUCCI, 2008, p. 247):

Embora a prostituição e a exploração sexual impliquem, naturalmente, em proveito pecuniário ou de outra ordem, o agente do delito previsto no art. 244-A não precisa ter essa finalidade. Exemplificando, alguém pode submeter um adolescente à prostituição por achar que é um meio de vida adequado, até por também exercer o agente a mesma atividade. Logo, não visa ao lucro, que fica com o menor, mas comete o delito do mesmo modo.

De nossa parte também entendemos que prostituição é uma espécie de exploração sexual, tendo esta última acepção mais ampla. Tanto na prostituição quanto na exploração sexual, contudo, é necessário haver o proveito econômico, seja para o sujeito ativo e para a vítima ou para um dos dois [42]; ambas tratam-se, portanto, de atividades inerentes ao comércio sexual, sendo que na prostituição é necessário o contato físico da prostituta com o cliente enquanto na exploração sexual não é este exigível.

Cleber Masson (2011, v. 3, p. 79) faz a seguinte diferenciação entre prostituição e exploração sexual:

Prostituição é o comércio sexual exercido com habitualidade. A reiteração do comércio sexual é imprescindível, ou seja, trata-se de atividade necessariamente habitual.

A prostituição pressupõe o contato físico (exemplos: conjunção carnal, sexo anal, sexo oral, masturbação etc.) entre as pessoas envolvidas na atividade sexual. Contudo, o art. 218-B do Código Penal alcança não somente o favorecimento da prostituição, mas também o favorecimento de qualquer outra forma de exploração sexual, a exemplo dos shows de striptease e de sexo explícito, e dos serviços de "disque sexo", os quais não dependem do envolvimento físico entre quem paga pelo prazer sexual e quem recebe a vantagem econômica.

O alcance da expressão "exploração sexual", segundo pensamos, ainda não foi suficientemente delineado pela doutrina, porém já possuímos alguns parâmetros para identificar a sua ocorrência, conforme já demonstrado anteriormente.

Destarte, a própria rubrica do art. 218-B nos dá uma pista segura para identificar a presença da exploração sexual incriminada. Primeiro, se verifica ser incriminado o comportamento da pessoa que favorece tal prática (atentar para os núcleos do tipo), figurando como vítima a pessoa explorada. Consoante já expomos, entendemos ser necessário, por interpretação analógica em face da prostituição, haver a pretensão de vantagem econômica para o explorador e para a vítima, somente para o explorador [43] ou somente para a vítima [44], em decorrência da atividade libidinosa. É imprescindível, destarte, que alguém obtenha (ou pelo menos pretenda obter) vantagem econômica com a prática sexual para ser reconhecida a exploração sexual prevista no art. 218-B.

Tanto na prostituição quanto em outra forma de exploração sexual, segundo pensamos, deve haver o ânimo de habitualidade no tocante ao exercício de atividade, por parte da vítima, tendente a satisfazer o desejo sexual de um número indeterminado de pessoas (vide mais comentários quanto a este aspecto no item 8.5).

8.4 Tipo subjetivo

O delito em comento não exige elemento subjetivo do tipo específico (finalidade específica do agente), contentando-se com o dolo inerente à conduta. Não admite a modalidade culposa.

8.5 Consumação e tentativa

Na forma de submeter, induzir ou atrair à prostituição ou à outra forma de exploração sexual; entendemos não haver necessidade que a vítima mantenha alguma relação sexual para que o crime seja consumado, bastando que se coloque concretamente à disposição para tanto.Por exemplo: a pessoa induzida se coloca à disposição para atender clientes diversos em um prostíbulo; embora que não chegue a atender nenhum, consumada estará a infração penal [45]. Nesse andar também a posição de Rogério Greco (2010, v. III, p. 548):

Tem-se por consumado o crime tipificado no art. 218-B do Código Penal, por meio das condutas de subjugar, induzir ou atrair, quando a vítima, efetivamente, dá início ao comércio carnal, ou seja, às atividades características da prostituição, com a colocação de seu corpo à venda, mesmo que não tenha, ainda, praticado qualquer ato sexual com algum "cliente"; ou, ainda, de acordo com a redação típica, levada a efeito pela Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009, quando a vítima é, efetivamente, explorada sexualmente, mesmo sem praticar o comércio carnal.

Note-se que apesar dos conceitos de prostituição e de exploração sexual estarem atrelados à habitualidade da prática do comércio carnal, para o crime em comento se consumar (quanto aos núcleos submeter, induzir ou atrair) não é exigível a reiteração de atos libidinosos por parte da vítima, o importante é que ela se disponha a ingressar na libidinagem comercial constante, e realize ato concreto nesse sentido. Daí Cleber Masson (2011, v. 3, p. 82) afirmar que: "O crime é instantâneo, pois sua consumação ocorre em um momento determinado, sem continuidade no tempo. Exemplificativamente, o crime estará consumado a partir do momento em que uma adolescente, com 15 anos de idade, encontrar-se à disposição para programas sexuais em um bordel, mesmo que nenhum cliente com ela mantenha atividades sexuais".

Quanto à conduta de facilitar a prostituição ou exploração sexual, se entendida no sentido de favorecer o ingresso da vítima na libidinagem, consuma-se também quando ela se coloca concretamente à disposição para esse fim (mesmo raciocínio relativo aos núcleos submeter, induzir ou atrair) [46]. Entendida a facilitação sob o prisma de auxiliar a pessoa já dedicada ao comércio carnal, o delito se consuma "[...] com a prática, pelo agente, do comportamento que, de alguma forma, facilitou, concorreu para que a vítima praticasse a prostituição ou fosse, de qualquer outra forma, explorada sexualmente" (GRECO, 2010, v. III, p. 548).

No tocante à condutas de impedir ou dificultar que abandone a prostituição ou outra forma de exploração sexual, sentimos que a consumação se dá com o primeiro ato concreto que efetivamente obste ou torne mais difícil a pessoa prostituída ou explorada se livrar dessa situação; protraindo-se no tempo a consumação até cessar o impedimento ou dificuldade. Nesse aspecto os ensinamentos de Rogério Sanches Cunha (2010, v. 3, p. 263):

Já na modalidade de impedir ou dificultar o abandono da prostituição, o crime consuma-se no momento em que a vítima delibera por deixar a atividade e o agente obsta esse intento, protraindo a consumação durante todo o período de embaraço (crime permanente).

A tentativa é possível no tocante a todos os núcleos estudados, pois se trata de delito plurissubsistente. Esta é a posição dominante [47]. Guilherme de Souza Nucci (2009, p. 56) discorda, admitindo a tentativa somente nas formas de impedir e dificultar.

8.6 Crime praticado objetivando vantagem econômica

Estabelece o § 1º do art. 218-B: "Se o crime é praticado com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa".

Extrai-se do dispositivo que nem todas as vezes o agente que favorece à prostituição ou outra forma de exploração sexual age com intuito mercenário. Pode, por exemplo, apenas querer ajudar a vítima a ganhar dinheiro se prostituindo; favorecendo (induzindo, por exemplo) o ingresso da mesma no comércio carnal. Mesmo assim responde normalmente pelo delito. Agora, se objetivar lucrar com a atividade da vítima, deve ao agente ser imputada, além da pena privativa de liberdade, a pena de multa.

8.7 Formas equiparadas

O § 2º do art. 218-B traz formas equiparadas, mas que têm dependência com o caput, conforme segue:

§ 2º  Incorre nas mesmas penas:

I - quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos na situação descrita no caput deste artigo; 

II - o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifiquem as práticas referidas no caput deste artigo.

O inciso I atribui a mesma pena do caput àquele que pratica ato libidinoso com alguém menor de dezoito e maior de catorze anos que está se prostituindo ou de qualquer forma submetido à exploração sexual. Referido dispositivo busca alcançar, por exemplo, o cliente de prostíbulo que mantém relação sexual com menor prostituta que tenha mais de catorze anos. Se a vítima tiver menos de catorze anos, a hipótese será de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP) [48].

Cabe pontuar que se a relação sexual ocorrer com menor que se prostitui por conta própria, não sendo esta vítima de favorecimento à prostituição, torna-se inviável a aplicação do dispositivo ora comentado; pois este depende da incidência do caput do art. 218-B, segundo expressamente determinado no § 2º, inciso I [49]. Desse modo, acabou se criando uma situação complexa sob o ponto de vista probatório, pois para enquadrar alguém nos termos do art. 218-B, § 2º, inciso I, será necessário provar ter havido uma outra conduta favorecendo a exploração sexual da vítima prevista no caput. Deixou o legislador, portanto, impune (injustamente, segundo pensamos) o cliente de prostituta menor quando não se conseguir provar ter a mesma enveredado na mercancia carnal por interferência de terceiros. Abre-se, ainda, espaço para esse cliente alegar, em algumas situações, não saber se a vítima estava ou não sendo explorada sexualmente.

Mesmo nos casos em que houver clareza da exploração sexual, ainda pode o cliente, se o caso concreto assim permitir, alegar erro de tipo no tocante à idade da vítima, considerando que relacionamento sexual pago com maior de dezoito anos não é crime.

Ainda quanto à idade da vítima, entende a doutrina dominante que ocorrendo a relação sexual na data do aniversário de 14 anos da mesma não é possível a incidência do art. 218-B, § 2º, inciso I, do CP, pois este fala em "maior" de 14 anos [50] (posição esta que não conta com a nossa concordância). Igualmente, não pode haver a incidência do art. 217-A (estupro de vulnerável), pois este exige vítima "menor" de 14 anos.

O inciso II do § 2º busca alcançar qualquer tipo de responsável por estabelecimento onde se dê a prostituição ou outro tipo de exploração sexual de vulnerável, conforme bem evidencia Nucci (2009, p. 59):

Cria-se a figura típica específica para o proprietário, gerente ou responsável pelo lugar onde se verifique a prostituição juvenil. Portanto, qualquer estabelecimento (motel, hotel, boate, danceteria, bar etc.) pode propiciar a aproximação do cliente e da pessoa prostituída com menos de 18 anos (enferma ou deficiente). Os responsáveis por tais locais ficam sujeitos à pena de reclusão, de quatro a dez anos, com multa, visto o intuito lucrativo dos locais, como regra.

Para haver a responsabilização referida, repise-se, faz-se necessária a ocorrência de favorecimento à prostituição ou outra forma de exploração sexual, prevista no caput do art. 218-B. Imprescindível também estar o agente ciente da exploração sexual da vítima.

Desse modo, acaso flagrada, por exemplo, uma adolescente de quinze anos se prostituindo em uma casa livre para encontros libidinosos; não sendo o caso de vítima da conduta prevista no caput do art. 218-B torna-se impossível imputar ao responsável pelo estabelecimento a conduta prevista no art. 218-B, § 2º, inciso II, mesmo tendo ele ciência da idade e do exercício da prostituição por parte da menor. Isto se dá porque o art. 218-B, § 2º, inciso II, condiciona expressamente a sua incidência à ocorrência da conduta prevista no caput [51]. Nesse particular cabe-nos transcrever os seguintes ensinamentos de Guilherme de Souza Nucci (2009, p. 59):

Lembremos, no entanto, ser complexa e difícil a prova do dolo do agente dessa figura delitiva. É preciso demonstrar que o proprietário, gerente ou responsável tem conhecimento da submissão, indução, atração, facilitação, impedimento ou dificuldade ao abandono da prostituição do menor ou enfermo. Nem sempre essa situação é visível, pois há lugares de larga extensão, sem que o administrador tenha condições de controlar o que se passa no seu interior. A forma culposa não se presta ao delito (negligência, imprudência ou imperícia). O dolo eventual talvez seja o elemento subjetivo mais próximo à realidade do § 2º, II.

Realmente, o fato de o legislador condicionar a incidência do § 2º, inciso II, à ocorrência da conduta prevista no caput tornará muito difícil a sua aplicação. O melhor caminho seria ter previsto que o conhecimento da idade da vítima e do fato da mesma está se dedicando ao comércio carnal no local fosse suficiente para o enquadramento do responsável pelo estabelecimento (por exemplo: bastaria o proprietário de um motel permitir que prostituta menor de idade, maior de 14 e menor de 18 anos [52], atendesse clientes no seu estabelecimento para o mesmo ser responsabilizado penalmente; o que não ocorre na realidade atual, exceto se entendermos [53] que ele incorre, com este comportamento, na conduta de facilitar a prostituição, prevista no caput do art. 218-B).

8.8 Efeito obrigatório da condenação

O § 3º do art. 218-B estabelece como efeito necessário da condenação pelo crime previsto no § 2º, II, do mesmo artigo, a cassação da licença de localização e de funcionamento do estabelecimento onde tenha ocorrido exploração sexual. Conforme alerta Cleber Masson (2011, v. 3, p. 85): "Esse efeito da condenação, embora obrigatório, não é automático, razão pela qual deve ser motivadamente declarado na sentença".

9. AÇÃO PENAL NOS CRIMES PREVISTOS NOS ARTS. 213 a 218-B DO CP

No tocante à espécie de ação penal cabível nos crimes sexuais previstos nos artigos 213 a 218-B do CP assim prevê o mesmo Código, com as inovações introduzidas pela Lei 12.015/2009:

Ação penal

Art. 225.  Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.

Parágrafo único.  Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.

Como se sabe, o Capítulo I referido trata dos crimes contra a liberdade sexual (arts. 213 a 216-A do CP). O Capítulo II tipifica os crimes sexuais contra vulnerável (arts. 217-A a 218-B).

Pela simples leitura do art. 225 do CP se nota que, atualmente, a regra geral nos crimes em comento é da ação penal pública condicionada à representação. Quer dizer: a vítima deve autorizar o MP a ingressar com a denúncia visando a punição do sujeito ativo do crime.

Excepcionando a regra geral do caput, o parágrafo único do art. 225 estabelece que, se a vítima for menor de dezoito anos ou qualquer pessoa vulnerável, a ação penal será pública incondicionada, ou seja, o Ministério Público pode e deve agir de ofício. Essa expressão "vulnerável" abarca, além dos menores de idade (já referidos expressamente no dispositivo), deficientes e enfermos mentais sem o necessário discernimento para a prática de atos sexuais, além daqueles sem possibilidade de oferecer resistência por qualquer outra causa, referidos no art. 217-A do CP.

Entendemos, não obstante, que o conceito de vulnerabilidade não deve receber uma interpretação demasiadamente alargada de modo a prejudicar a manifestação de vontade da vítima que tenha o necessário discernimento para decidir pela não interposição da ação penal; exceto no caso de menores de idade, vez que, quando estes são vítimas, a lei impõe, peremptoriamente, que a ação penal deve ser pública incondicionada.

Veja-se, por exemplo, o caso de um homem público violentado sexualmente por outro homem quando se encontrava totalmente drogado. Nesse caso vislumbra-se claramente a incidência do art. 217-A, considerando a vulnerabilidade transitória da vítima (ausência de capacidade de resistência por efeito da droga).

Depois de passado o ocorrido, porém, citado homem público deixa de ser vulnerável, podendo perfeitamente decidir se deseja ou não a instauração da ação penal, pois esta pode ser muito mais gravosa para ele do que simplesmente esquecer a violência sexual sofrida. É neste norte que expressamos a presente opinião de que, em sendo o caso de pessoas maiores de idade violentadas sexualmente, e uma vez afastada a causa de vulnerabilidade, têm elas o direito de optar ou não pela instauração da persecução penal, devendo ser às mesmas aplicada a regra geral da ação penal pública condicionada à representação. Desde já alertamos, contudo, que o ponto ora enfrentado não tem sido abordado pelos nossos grandes penalistas; de modo que a opinião ora manifestada consiste em um posicionamento pessoal.

Note-se que diante da nova legislação não mais subsiste, pelo menos no tocante aos fatos ocorridos em sua vigência, ação penal privada para crimes sexuais (exceto aquela subsidiária à pública).

Relativamente ao delito de estupro (art. 213 do CP), quando praticado em detrimento de maiores de dezoito anos, muita celeuma ainda subsiste quanto à espécie de ação penal pertinente, pois a Súmula 608 do STF, aprovada em 1984, porém até agora ainda não cancelada expressamente, assim versa: "No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada". A violência real referida diz respeito àquela praticada mediante emprego de força física contra a vítima.

Rogério Greco (2010, v. III, p. 557) defende que a Súmula em referência não foi prejudicada pelas alterações na regulação dos crimes sexuais operadas pela Lei 12.015/2009, conforme segue:

Com a devida venia, não vislumbramos qualquer incompatibilidade entre as novas disposições legais e a Súmula nº 608 do STF. Caso, efetivamente, assim entenda a nossa Corte Superior, deverá levar a efeito o cancelamento da referida Súmula, extirpando, de uma vez por todas, a discussão.

[…] Dessa forma, a violência empregada na prática do estupro, que culminou por produzir a lesão corporal de natureza grave ou a morte, nos termos da orientação constante na mencionada Súmula, definiria a natureza da ação penal, que seria, portanto, considerada como pública incondicionada.

A posição transcrita, contudo, não é a predominante na doutrina. Destarte, entende a maioria [54] não haver possibilidade de interpretação contrária ao art. 225 do CP, o qual diz claramente ser a ação penal pública condicionada à representação nos casos em exame. Desse modo, mesmo em se tratando de estupro com violência real, seja em sua forma simples ou qualificada por lesão de natureza grave/gravíssima ou pela morte da vítima, em se tratando de vítima não vulnerável, deve prevalecer a regra geral (ação penal pública condicionada à representação).

Essa realidade pode levar a injustiças no caso de morte da vítima, conforme salienta Cleber Masson (2011, v. 3, p. 31):

A opção legislativa leva a uma situação inusitada. Na hipótese de estupro qualificado pela morte, o direito de representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. É o que se extrai do art. 24, § 1º, do Código de Processo Penal.

Questiona-se: E se a vítima não possuir ligação matrimonial ou de parentesco com ninguém, ou então se, existindo tais legitimados, forem eles os responsáveis pelo estupro? A falha do legislador conduz à impunidade do criminoso. Mas esse equívoco legislativo não pode afastar a regra imposta pelo art. 225, caput, do Código Penal.

No tocante à presente polêmica, o Procurador-Geral da República ingressou no STF com a ADI nº 4.301 [55], buscando o reconhecimento da inconstitucionalidade do art. 225 do CP, sem redução de texto, para fins de ser considerada pública incondicionada a ação penal no caso de estupro com resultado morte ou lesão corporal grave/gravíssima. Segundo Rogério Sanches Cunha, na ADI referida:

Três foram os fundamentos invocados: 1º) ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana; 2º) ofensa ao princípio da [proibição da] proteção deficiente (que nada mais significa que um dos aspectos do princípio da proporcionalidade); 3º) a possível extinção da punibilidade em massa nos processos em andamento (de estupro com resultado morte ou lesão corporal grave), porque passariam a exigir manifestação da vítima (sob pena de decadência).

Por fim, relembre-se que antes da vigência da Lei 12.015/2009, as regras inerentes à ação penal no caso de estupro eram muito diferentes (a regra geral era da ação penal privada, havendo algumas exceções). Daí cabe averiguar se o novo regramento deve ser aplicado aos fatos ocorridos antes de sua vigência.

Deparando-se com essa situação, assim se posiciona Fernando Capez (2011, v. 3, p. 119):

Com isso, indaga-se: poderá a norma retroagir para alcançar fatos praticados antes de sua entrada em vigor e cuja ação penal era de iniciativa privada? Por força de o aludido diploma legal ter ampliado o poder punitivo estatal, ao privar o acusado dos institutos benéficos inerentes à ação penal privada, que davam causa à extinção da punibilidade, não há dúvida de que estamos diante de uma novatio legis in pejus, não podendo, portanto, retroagir para atingir fatos praticados antes de sua entrada em vigor.

Em sentido semelhante, e de forma mais detalhada Rogério Sanches Cunha (2010, v. 3, p. 264) apresenta os seguintes ensinamentos:

Entendemos, com o devido respeito, que a ação penal, para os casos praticados antes da vigência da nova lei, deve continuar sendo privada (queixa-crime) […]. A mudança da titularidade da ação penal é matéria de processo penal, mas conta com reflexos penais imediatos. Daí a imperiosa necessidade de tais normas (processuais, mas com reflexos penais diretos) seguirem a mesma orientação jurídica das normas penais. Quando a inovação é desfavorável ao réu, não retroage.

Aplicamos o mesmo raciocínio para os casos em que a ação pública condicionada passou a ser incondicionada.

Nas hipóteses de ação pública incondicionada que passaram para a regra (condicionada), entendemos que a análise exige separar duas situações:

a) se a inicial (denúncia) já foi ofertada, trata-se de ato jurídico perfeito, não sendo alcançado pela mudança. Não nos parece correto o entendimento de que a vítima deve ser chamada para manifestar seu interesse em ver prosseguir o processo. […];

b) se a incoativa ainda não foi oferecida, deve o MP aguardar oportuna representação da vítima ou o decurso do prazo decadencial, cujo termo inicial, para os fatos pretéritos, é o da vigência da novel Lei.

Ante o exposto, verifica-se que a alteração operada pelo art. 225 do CP terá grande repercussão (e já está tendo) nas ações penais pertinentes a crimes sexuais ocorridos antes da vigência da Lei nº 12.015/2009; considerando restar reconhecido pela doutrina majoritária a não aplicação dessa nova regulação sobre ação penal a fatos pretéritos. Já se percebe o acolhimento desse raciocínio também na jurisprudência (STJ, 5ª Turma, REsp 1227746/RS, rel. Min. GILSON DIPP, j. 02/08/2011, DJe 17/08/2011).

Nesse mesmo julgado referido, ao contrário do posicionamento esposado por Rogério Sanches Cunha (vide transcrição linhas atrás); inclina-se a Quinta Turma do STJ à exigência de representação da vítima nos casos de ação penal em andamento antes considerada pública incondicionada e que passou a ser condicionada à representação, consoante se vê nos seguintes trechos:

III. Se a lei nova se apresenta mais favorável ao réu nos casos de estupro qualificado, o mesmo deve ocorrer com as hipóteses de violência real, isto é, para as ações penais públicas incondicionadas nos termos da Súmula 608/STF, segundo a qual, "no crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada". Tais ações penais deveriam ser suspensas para que as vítimas manifestassem desejo de representar contra o réu.

[…]

VIII. Ainda que se entendesse pela ocorrência de violência real, proceder-se-ia à nova contagem do prazo decadencial de 6 (seis) meses para a representação da ofendida, que passaria a fluir da data da entrada em vigor da lei nova, isto é, em 10/08/2009, estando alcançado, de qualquer modo, pelos efeitos da decadência.

Considerando a polêmica que desperta o assunto em foco, resta aguardarmos outros julgados para termos uma noção mais precisa de qual será o entendimento consagrado na jurisprudência.

Sobre o autor
Gecivaldo Vasconcelos Ferreira

Delegado de Polícia Federal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA, Gecivaldo Vasconcelos. Crimes sexuais. Breves considerações sobre os artigos 213 a 226 do CP, de acordo com a Lei nº 12.015/2009. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2247, 26 ago. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13392. Acesso em: 16 nov. 2024.

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