10. Aumento de pena
A Lei 12.015/2009 não alterou o art. 226 do CP, que trata do aumento de pena nos crimes sexuais.
Permanece a seguinte redação:
Aumento de pena
Art. 226. A pena é aumentada:
I – de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas;
II – de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela.
O art. 226, I, prevê como majorante o concurso de duas ou mais pessoas para a prática do delito. Segundo se extrai do dispositivo, não é necessário que a execução material seja realizada por uma pluralidade de pessoas para incidir a causa de aumento, bastando unicamente o concurso de agentes, nos moldes previstos no art. 29 do CP. Daí Fernando Capez (2011, v. 3, p. 120) afirmar: "Para a incidência dessa causa de aumento de pena, os sujeitos podem atuar em coautoria ou participação".
A majorante prevista no inciso II leva em consideração a existência de relação de parentesco ou autoridade do sujeito ativo com a vítima. Quando o dispositivo utiliza expressões aparentemente relacionadas unicamente a pessoas do sexo masculino (tio, irmão, companheiro, preceptor [56] etc.), abarca também aquelas de sexo feminino (tia, irmã, companheira, preceptora etc.). Destarte, concordamos com Fernando Capez (2011, v. 3, p. 121) quando argumenta que:
Embora a lei mencione padrasto e madrasta separadamente, isso não significa exclusão de certas figuras não mencionadas como a esposa, companheira e tia. É que a lei utilizou a expressão "cônjuge" em vez de "marido", o que significa dizer que optou por termo mais abrangente. Não se trata de interpretação extensiva, mas de declarar o exato sentido da norma.
Segundo Rogério Sanches Cunha (2010, v. 3, p. 266), referindo-se ao art. 226, II, do CP: "A existência dessa causa de aumento afasta a possibilidade de aplicação das agravantes genéricas previstas no art. 61, II, e, f e g, do CP, sob pena de se incorrer em claro bis in idem". Por óbvio, se também qualquer das causas de aumento previstas no art. 226 funcionarem como elementares (por exemplo: art. 216-A do CP) ou qualificadoras do crime a ser imputado, impossibilita-se a majoração da pena sob pena de bis in idem.
Cabe analisar, ademais, a presença no inciso II da expressão genérica "por qualquer outro título tem autoridade sobre ela", permitindo interpretação analógica de modo a possibilitar a incidência da majorante em todo caso em que haja uma relação de autoridade entre o sujeito ativo e a vítima; conforme explica com brilhantismo Luiz Regis Prado (2008, v. 2, p. 682):
Há, por conseguinte, um permissivo legal à interpretação analógica e, assim, todo aquele que, de alguma forma, exerce autoridade de direito ou de fato sobre a vítima e pratica com ela algum delito sexual terá a pena majorada, podendo ser citados como exemplos o carcereiro, em relação ao recluso ou reclusa, ou o chefe de família em relação ao menor abandonado que foi por ele acolhido em sua casa.
Havendo concurso entre as causas de aumento previstas no inciso I com aquelas delineadas no inciso II, poderá o juiz optar por aplicar somente a causa com maior proporção de aumento, consoante autoriza o art. 68, parágrafo único, do CP [57].
Importante ressaltar que a Lei 12.015/2009, apesar de não alterar a redação do art. 226 do Código Penal (que alcança somente os crimes disciplinados nos arts. 213 a 218-B do CP), incluiu em citado Código o artigo 234-A [58], que prevê majorantes aplicáveis a todos os crimes disciplinados no Título VI da Parte Especial, aí também incluídos aqueles tipificados nos arts. 213 a 218-B do CP.
Por fim, vale lembrar que o artigo 9º da Lei nº 8.072/1990 (Lei de Crimes Hediondos) dispõe o seguinte: "As penas fixadas no art. 6º para os crimes capitulados nos arts. 157, § 3º, 158, § 2º, 159, caput e seus §§ 1º, 2º e 3º, 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único, 214 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único, todos do Código Penal, são acrescidas de metade, respeitado o limite superior de 30 (trinta) anos de reclusão, estando a vítima em qualquer das hipóteses referidas no art. 224 também do Código Penal". Desse modo, restando revogado o art. 224 do CP pela Lei nº 12.015/2009, afigura-se como óbvio que o artigo transcrito ficou totalmente prejudicado [59], não mais servindo para majorar a pena de quaisquer dos crimes nele referidos. Certamente o legislador não teve a intenção de beneficiar os autores de crimes hediondos com uma redução na reprimenda penal, porém por uma falta de cuidado acabou eliminando uma majorante importantíssima prevista na Lei 8.072/1990.
Cabe realçar, ainda, a possibilidade levantada por alguns doutrinadores de revisão de processos criminais nos quais foi aplicada a majorante prevista no art. 9º da Lei de Crimes Hediondos, diante da inovação mais benéfica para o réu trazida pela Lei nº 12.015/2009. Este o entendimento de Rogério Greco (2010, v. III, p. 481) [60]:
Assim, não podemos justificar a manutenção da aplicação das majorantes aos casos passados, sob o argumento de que ainda se encontram previstas no nosso ordenamento jurídico, não tendo sido, portanto, abolidas.
[...] Dessa forma, uma vez revogado expressamente o art. 224 do Código Penal, deixando de existir, portanto, o artigo a que remetia o art. 9º da Lei nº 8.072/90, aqueles que foram condenados, e que ainda não cumpriram suas penas, terão direito a revisão criminal, decotando-se o aumento de metade que lhes fora aplicado pelo decreto condenatório.
Uma vez consolidado o posicionamento transcrito, importante notar que caberá ao Judiciário rever não somente processos de crimes sexuais para fins de excluir o aumento de pena de 50% (metade); pois também caberá revisão em processos referentes a crimes de natureza diversa, considerando o alcance mais abrangente do art. 9º da Lei nº 8.072/1990.
11. Crimes sexuais previstos no estatuto da criança e do adolescente
Como a Lei 12.015/2009 incluiu no CP um capítulo específico para tratar sobre crimes sexuais contra vulnerável (Capítulo II, do Título VI, da Parte Especial – arts. 217-A a 218-B); considerando-se, ainda, ser a pouca idade da vítima (menor de 14 anos ou menor de 18 anos, dependendo do caso) um dos fatores determinantes da vulnerabilidade; entendemos pertinente ressaltar a existência de vários crimes de conotação sexual previstos na Lei 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA) pertinentes a vítimas menores de idade.
Eis os crimes sexuais previstos no ECA:
Art. 240. Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente: (Redação dada pela Lei nº 11.829, de 2008)
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 11.829, de 2008)
§ 1º Incorre nas mesmas penas quem agencia, facilita, recruta, coage, ou de qualquer modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas referidas no caput deste artigo, ou ainda quem com esses contracena. (Redação dada pela Lei nº 11.829, de 2008)
§ 2º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o agente comete o crime: (Redação dada pela Lei nº 11.829, de 2008)
I – no exercício de cargo ou função pública ou a pretexto de exercê-la; (Redação dada pela Lei nº 11.829, de 2008)
II – prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade; ou (Redação dada pela Lei nº 11.829, de 2008)
III – prevalecendo-se de relações de parentesco consangüíneo ou afim até o terceiro grau, ou por adoção, de tutor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de quem, a qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela, ou com seu consentimento. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
Art. 241. Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: (Redação dada pela Lei nº 11.829, de 2008)
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 11.829, de 2008)
Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
§ 1º Nas mesmas penas incorre quem: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
I – assegura os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo; (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
II – assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo.(Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
§ 2º As condutas tipificadas nos incisos I e II do § 1º deste artigo são puníveis quando o responsável legal pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
§ 1º A pena é diminuída de 1 (um) a 2/3 (dois terços) se de pequena quantidade o material a que se refere o caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
§ 2º Não há crime se a posse ou o armazenamento tem a finalidade de comunicar às autoridades competentes a ocorrência das condutas descritas nos arts. 240, 241, 241-A e 241-C desta Lei, quando a comunicação for feita por: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
I – agente público no exercício de suas funções; (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
II – membro de entidade, legalmente constituída, que inclua, entre suas finalidades institucionais, o recebimento, o processamento e o encaminhamento de notícia dos crimes referidos neste parágrafo; (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
III – representante legal e funcionários responsáveis de provedor de acesso ou serviço prestado por meio de rede de computadores, até o recebimento do material relativo à notícia feita à autoridade policial, ao Ministério Público ou ao Poder Judiciário. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
§ 3º As pessoas referidas no § 2º deste artigo deverão manter sob sigilo o material ilícito referido. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
Art. 241-C. Simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, disponibiliza, distribui, publica ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o material produzido na forma do caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
Art. 241-D. Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
I – facilita ou induz o acesso à criança de material contendo cena de sexo explícito ou pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso; (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
II – pratica as condutas descritas no caputdeste artigo com o fim de induzir criança a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
O art. 241-E do ECA esclarece o seguinte:
Art. 241-E. Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão "cena de sexo explícito ou pornográfica" compreende qualquer situação que envolva criança ou adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
Cabe enfatizar, ademais, que a Lei em referência também possui a seguinte previsão referente à exploração sexual infanto-juvenil:
Art. 244-A. Submeter criança ou adolescente, como tais definidos no caput do art. 2º desta Lei, à prostituição ou à exploração sexual: (Incluído pela Lei nº 9.975, de 23.6.2000)
Pena - reclusão de quatro a dez anos, e multa.
§ 1º Incorrem nas mesmas penas o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifique a submissão de criança ou adolescente às práticas referidas no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 9.975, de 23.6.2000)
§ 2º Constitui efeito obrigatório da condenação a cassação da licença de localização e de funcionamento do estabelecimento. (Incluído pela Lei nº 9.975, de 23.6.2000)
Ocorre, contudo, que o art. 218-B (inserido no CP pela Lei nº 12.015/2009) revogou tacitamente citado dispositivo legal, segundo tem entendido a doutrina predominante.