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Novo tipo penal de estupro contra pessoa vulnerável

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Agenda 11/09/2009 às 00:00

No capítulo que se destinava a tipificar os crimes de sedução (infração já abolida, em 2005) e corrupção de menores, foi inserida a nova figura do "Estupro de Vulnerável" (art. 217-A).

1. INTRODUÇÃO – MUDANÇAS OPERADAS NO TÍTULO VI DO CP PELA LEI 12.015/09

As mudanças procedidas pela Lei 12.015, de 07 de agosto de 2009, no texto do Título VI, do CP, não se limitaram a dar nova redação aos dispositivos penais ali positivados. A primeira alteração diz respeito ao próprio Título, que passou a ser denominado de "Crimes contra a Dignidade Sexual". O conteúdo tipológico do Capítulo I foi objeto de completa reformulação, que implicou na eliminação do atentado violento ao pudor como tipo penal autônomo e a descrição das duas condutas no espaço normativo do art. 213, caput, do CP, sob a denominação de estupro. Tem-se agora um conceito unificado ou expandido de estupro, que abrange também a conduta sexual legalmente denominada de "outro ato libidinoso". Além disso, as formas qualificadas do estupro foram alocadas junto ao caput do art. 213, que é seguramente o espaço normativo mais adequado. Houve, também, a revogação expressa do art. 214.

No Capítulo II - que se destinava a tipificar os crimes de sedução (infração já abolida, em 2005) e corrupção de menores, foi inserida a nova figura do "Estupro de Vulnerável" (art. 217-A), que será objeto de estudo neste artigo.

Finalmente, cabe assinalar que o art. 4º da Lei 12.015/09, alterou a redação dos incisos V e VI, do art. 1º, da Lei 8.072/1990 – LCH. Neste último inciso, antes reservado à classificação do atentado violento ao pudor, o texto modificado classifica como hediondo o novo crime de "estupro de vulnerável", seja em sua forma simples ou nas formas típicas qualificadas (art. 217-A, caput, e §§ 1º, 2º, 3º e 4º).

Este trabalho ficará restrito ao exame do novo tipo penal denominado "estupro de vulnerável".


2. NOVA DENOMINAÇÃO JURÍDICA DO ESTUPRO COM PRESUNÇÃO DE VIOLÊNCIA

A violência ou a grave ameaça constitui elemento do tipo penal de estupro. É preciso que uma ou outra se manifeste para quebrar a resistência da vítima ao ato sexual ou lascivo deseja pelo estuprador. A hermenêutica doutrinária e judicial acerca do sentido do direito contido na norma que descreve o tipo penal de estupro é convergente para dizer que a violência ou a grave ameaça deve ser forte e séria o suficiente para vencer a recusa da vítima e constrangê-la ao ato sexual indesejado. Somente assim estarão reunidos os elementos típicos deste grave crime contra a liberdade sexual, agora em sua descrição típica expandida.

Como a liberdade sexual é considerada um bem jurídico disponível, o consentimento da vítima elimina a tipicidade da conduta. Isto demonstra a importância do grau de desenvolvimento psicossomático da vítima para que possa manifestar, com a capacidade física e psíquica suficiente e com base num razoável espaço de liberdade, a sua adesão ou a sua recusa ao ato sexual pretendido pelo parceiro. Não se pode desconhecer que esta é uma questão fundamental para se estabelecer o juízo de adequação típica do fato praticado e de culpabilidade no caso de crime de estupro.

A experiência demonstra que certas pessoas (crianças até uma certa idade) não possuem capacidade psíquica de entender o caráter lascivo para manifestar a sua livre anuência ao ato libidinoso a ser praticado e que outras (doentes mentais em geral) não possuem sequer condições de normalidade psíquica para querer e desejar livremente a prática de relação sexual com alguém. A experiência demonstra, também, que há pessoas incapazes fisicamente (seja a incapacidade momentânea ou permanente) de resistir a eventuais atentados a sua liberdade sexual.

Conforme assinalou Nelson Hungria, "não há despropósito algum em que se presuma a violência quando falte, na vítima, a capacidade de manifestação da vontade, ou, pelo menos, de consentir validamente" (1). Porisso, o legislador de 1940 havia estabelecido os casos de estupro e de atentado violento ao pudor, em que a violência ou a grave ameaça eram presumidas (art. 224 e suas alíneas, do CP). Este dispositivo, no entanto, foi revogado pela Lei 2.015/09, que alterou o texto codificado para criar um tipo penal próprio, com a denominação de "Estupro de Vulnerável".

2.2 Estupro contra Pessoa Vulnerável: Vítima Menor de 14 Anos

Com a rubrica de "Estupro de Vulnerável", o novo art. 217-A, caput, do CP, tem a seguinte descrição típica:

"Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos".

Esta é a primeira modalidade típica de estupro contra pessoa vulnerável. Com a alteração promovida pela Lei 12.015/09, a conjunção carnal ou qualquer ato libidinoso contra menor de 14 anos deixou de ser uma simples modalidade do tipo penal comum de estupro, para assumir a categoria de tipo penal com a marca da autonomia tipológica e denominação própria. A mudança, portanto, não se restringiu a um mero deslocamento do espaço normativo anteriormente ocupado (art. 224 e suas alíneas) para o espaço do novo art. 217-A, do CP. Agora, o ordenamento penal passou a ser integrado por mais esta infração penal – estupro contra pessoa vulnerável - cuja conduta se identifica, em sua parte fundamental, com aquela descrita no art. 213, caput, do CP. Mas, há diferenças evidentes.

A primeira, diz respeito à denominação. Temos um novo tipo penal com a rubrica de "Estupro de Vulnerável" e com descrição tipológica própria, em face do crime de estupro comum descrito no art. 213, do CP. A nosso ver, a expressão "Estupro de Vulnerável" utilizada na rubrica do tipo penal em exame não é das melhores. O adjetivo "vulnerável" foi utilizado com função substantiva para indicar o sujeito passivo desta modalidade de crime sexual mais grave, que na verdade será sempre uma pessoa fragilizada, incapacitada física ou mentalmente.

Teria sido melhor – em termos de técnica jurídica - que a lei tivesse nomeado expressamente, na rubrica do capítulo e do próprio artigo, o sujeito passivo das infrações penais ali tipificadas: "Pessoa Vulnerável". Tanto que o parágrafo único do art. 225, que trata da ação penal pública incondicionada, faz referência à "pessoa vulnerável" como vítima de um dos crimes aqui focalizados.

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Cabe ressaltar, ainda, que a categoria jurídica "pessoa vulnerável" é um novo conceito de Direito Penal e deve ser entendido, nos termos do art. 217-A, como toda a criança ou mesmo adolescente com menos de 14 anos de idade ou, também, como veremos adiante, qualquer pessoa incapacitada física ou mentalmente de resistir à investida estupradora do agente criminoso.

A segunda alteração diz respeito à carga punitiva – oito a quinze anos de reclusão – significativamente bem mais rigorosa do que as penas cominadas para o tipo básico de estupro comum. Tanto o patamar mínimo, quanto o máximo da sanção privativa de liberdade foram objeto de considerável aumento em relação ao tipo de estupro comum descrito no art. 213, caput, do CP. Antes da mudança procedida pela Lei 12.015/09, o estupro com violência presumida era punido com a mesma pena cominada para o tipo descrito no caput do art. 213 (6 a 10 anos de reclusão). Cabe ressaltar que, no caso das qualificadoras, a diferença em termos de rigor punitivo é ainda maior.

A dicção dada ao conteúdo do art. 217-A não se refere mais à presunção de violência ou de grave ameaça como elemento normativo do novo tipo penal. Para a realização objetiva desta nova infração penal, basta que o agente tenha conhecimento de que a vítima é menor de 14 anos de idade e decida com ela manter conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso. Formalmente, pode-se dizer que a incriminação da conduta não repousa mais na polêmica questão da violência presumida. Parece-nos que o que está a sustentar ética e politicamente esta norma repressiva é a idéia de proteção integral do ser humano ainda criança, cuja integridade sexual precisa ser penalmente garantida contra qualquer ato de natureza sexual.

Não há dúvida de que, ao abandonar a polêmica regra legal da presunção de violência, a atual fórmula incriminatória simplificou a questão. Mesmo assim, parece-nos que o fundamento desta incriminação de maior severidade e rigidez continua o mesmo: a premissa axiológica de que todo e qualquer ato sexual contra uma pessoa menor de idade – no caso, uma criança, ainda – atenta contra os bons costumes ou, como diz a nova rubrica do Título VI, do CP, "contra a dignidade sexual". Em consequência, a lei considera tal conduta sexual ou libidinosa como um ato sexual de evidente violência, que precisa ser reprimida de forma mais severa. (2)

Entende o Direito Penal que, durante a infância, período de vida fixado até determinada idade, a criança encontra-se num processo de formação, seja no plano biológico, seja no plano psicológico e moral. Dessa forma, se o agente mantém relação sexual ou pratica qualquer ato libidinoso com alguém menor de catorze anos, o bem jurídico penalmente protegido é considerado indisponível de pleno direito. (3)

O Estatuto da Criança e do Adolescente considera criança a pessoa até os 12 anos de idade, (4) mas CP estende a proteção penal integral, também, aos adolescentes menores de 14 anos. Pelo conteúdo formal da norma, a liberdade sexual destes seres ainda em formação é assegurada de modo absoluto e sem exceções.

Na jurisprudência e durante a vigência da regra contida no revogado art. 224 e suas alíneas, predominou o entendimento de que o consentimento da vítima não maior de 14 anos é irrelevante para afastar a presunção de inocência, cuja norma visa a proteger o menor até essa idade, considerando-o incapaz de consentir.

Confirmando essa assertiva, o Supremo Tribunal Federal entendeu que "a presunção de violência prevista no art. 224 do CP tem caráter absoluto". Em consequência, decretou que é firme sua orientação jurisprudencial "no sentido de que o eventual consentimento da ofendida, menor de 14 anos, para a conjunção carnal e mesmo sua experiência anterior não elidem a presunção de violência, para a caracterização do estupro". (5)

Tudo indica que, com o novo tipo penal, que dispensa formalmente qualquer indagação sobre a prática de violência ou grave ameaça, a jurisprudência dos tribunais superiores continuará respaldando firmemente essa mesma orientação jurisprudencial para manter a condenação dos que cometerem estupro contra menor de 14 anos.

2.3 Vitima Incapaz de Oferecer Resistência ao Ato Sexual ou Libidinoso Indesejado

O art. 217-A em exame prevê, ainda, mais duas formas típicas de estupro contra pessoa vulnerável, em que o crime de estupro pode ocorrer sem a necessidade de se demonstrar a presença do elemento normativo da violência ou da grave ameaça real. Estas duas modalidades típicas de estupro contra pessoa vulnerável estão assim descritas no § 1º, do dispositivo em referência:

"Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência".

A redação é, praticamente, a mesma contida nas alíneas a e b do revogado art. 224, do CP. A alteração limitou-se a substituir a antiga expressão "débil mental" por "deficiência mental", esta última mais consentânea com a atual linguagem médicopsiquiátrica. Mas, o sentido jurídicopenal continua o mesmo.

O texto do novo parágrafo omitiu-se, ainda, em prescrever expressamente – como fazia o texto da alínea b, do art. 224 - que o agente tenha conhecimento da circunstância de ser a vítima pessoa mentalmente doente. No entanto, é preciso ressaltar que o conhecimento da condição de enfermidade mental da vítima já integra o conceito de dolo e, porisso, não há necessidade de ser previsto de forma expressa no texto deste dispositivo incriminador.

A outra hipótese descrita no § 1º é a da vítima mentalmente capaz, mas que, "por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência". Seria o caso de vítima que apresente algum tipo de deficiência física, seja permanente ou momentânea. Como exemplo, podem ser mencionadas as hipóteses de vítima gravemente ferida, adoecida, anestesiada ou portadora de grave deficiência física permanente.

Cabe ressaltar que a presunção de vulnerabilidade da vítima nestas hipóteses legais é a regra geral e somente pode ser afastada em casos excepcionais, quando o agente desconhecer a condição de alienação mental da vítima ou a situação em que se encontre de não poder oferecer resistência. É o que veremos a seguir.


3. Erro Inevitável do Agente e Relatividade da Regra Geral da Presunção de Vulnerabilidade

Durante a vigência do agora revogado art. 224 e suas alíneas, muito se discutiu sobre o caráter absoluto ou relativo da regra da presunção de violência. Apesar de o sentido literal desse dispositivo apontar para a hipótese de uma regra absoluta, a doutrina sempre entendeu que, em casos excepcionais, a presunção ali prescrita podia ser afastada diante de eventual erro inevitável em que incidiu o agente.

A verdade é que um processo interpretativo baseado na compreensão lógica, sistêmica e teleológica da norma em exame, levava à conclusão de que, nos casos em que o sujeito passivo possui idade próxima aos 14 anos e compleição física precocemente desenvolvida, o agente poderia incidir em erro de tipo. Em consequência, a presunção de violência ou de grave ameaça deveria ser relativizada, sempre que, em face da circunstância do caso concreto, o agente não tivesse como saber o real estado de menoridade da vítima.

Desde os primeiros momentos de vigência do CP de 1940, Magalhães Noronha havia escrito que a idéia de uma presunção absoluta de violência é inadmissível, porque se puníssemos "sempre o agente que tivesse contato carnal com um menor, estaríamos consagrando a responsabilidade objetiva, coisa, entretanto, que nossa lei repudia" (6). Esse entendimento era, também, perfilhado pelos demais autores da doutrina penal brasileira.

Nelson Hungria - principal integrante da Comissão Revisora - dizia que a redação original do art. 224, do Projeto do CP de 1940, continha cláusula expressa em favor da natureza absoluta da presunção de violência ou de grave ameaça. No entanto, essa proposição havia sido deliberadamente rejeitada e isto constituia um forte argumento em favor da relatividade da disposição legal em exame. (7) Tratava-se, por isso, de uma presunção relativa que deveria ceder diante da prova de um inevitável erro do agente quanto à efetiva menoridade da vítima.

Agora, o direito mudou e a situação jurídica é outra. Mas, apenas formalmente. Não se pode falar mais de "presunção de violência ou grave ameaça". No entanto, cremos que estamos diante de uma categoria jurídica já conhecida da seara penal: a mesma presunção de innocentia consilii, que agora pode ser denominada de presunção de vulnerabilidade, em face da prática de atos sexuais de qualquer natureza. Para o novo Direito Penal, em matéria de crimes contra a dignidade sexual, a pessoa menor de 14 anos é considerada hipossuficiente, completamente frágil e vulnerável e, portanto, incapaz de consentir validamente para a realização – seja como sujeito ativo ou passivo - de qualquer ato sexual ou libidinoso. Sua liberdade sexual, portanto, é legalmente considerada indisponível.

Se isto é verdadeiro, a exemplo da violência presumida, a nosso ver a presunção de vulnerabilidade do menor de 14 anos pode, também, ser afastada diante da prova inequívoca de que a vítima de estupro possui experiência da prática sexual e apresenta comportamento incompatível com a regra de proteção jurídica pré-constituída. Esta é uma questão delicada, mas cremos que, em casos especiais, é possível admitir-se a exceção à regra geral, desde que essa condição de experiência sexual do sujeito passivo venha a constituir um fator determinante para o agente incidir em erro de tipo.

É evidente que o menor precocemente amadurecido nas coisas do sexo, seja qual for o motivo que o conduziu a essa lamentável condição, não deixa de merecer a proteção especial do direito. Mas, pode perder o seu estado de inocência e de ingenuidade, ou seja, de "pessoa vulnerável", que é o fundamento éticojurídico do princípio da proteção integral. Principalmente, se aparentar idade superior e complexão física precocemente desenvolvida.

Nesses casos, a inexistência de violência real ou grave ameaça, pode eliminar a tipicidade da conduta de manter relação sexual ou qualquer ato libidinoso com menor de catorze anos de idade. Embora seja triste admitir, nas hipóteses de atos sexuais mantidos com menores de catorze anos já iniciados na prática do coito anal ou vaginal, da felação ou de outros atos libidinosos, a presunção de pessoa vulnerável quanto à integridade sexual pode ser afastada e com ela a existência do crime de estupro contra pessoa vulnerável.

Cabe ressaltar que o afastamento da presunção de vulnerabilidade do menor de 14 anos, em face de ações estupradoras, somente será admissível se as circunstâncias conduzirem o agente a um inevitável erro sobre a menoridade da vítima.

Esta tem sido a posição – evidentemente bastante cautelosa - do STF ao admitir, em casos muito especiais em que a vítima apresente aparência de jovem maior de 14 anos, a exceção à então regra da presunção de violência. Assim, ficou estabelecido que "não se configura o crime de estupro se a suposta vítima, embora menor de 14 anos, aparenta idade superior, possui comportamento promíscuo e admite não haver sido constrangida a manter relações sexuais com o acusado, tendo-o feito por livre e espontânea vontade". (8) Em outra oportunidade, ficou prescrito que a "jurisprudência do Tribunal reconhece a atipicidade do fato delituoso quando se demonstra que a ofendida aparenta ter idade superior a 14 anos". (9)

Essa orientação jurisprudencial do STF parece ter ficado consolidada com a decisão que reconheceu a constitucionalidade da regra contida na alínea a do então vigente art. 224, do CP, considerando-a como simples "afirmação da incapacidade absoluta da menor de 14 anos para consentir na prática sexual". Em consequência, a Suprema Corte admitiu a possibilidade de exclusão dessa violência presumida, por erro inevitável do agente. (10 )

A nosso ver, a orientação jurisprudencial do STF insere-se perfeitamente no âmbito da descrição típica positivada no novo art. 217-A, do CP. Assim deve ser reconhecida a validade da norma que estabelece a incapacidade absoluta do menor de 14 anos para consentir na prática de ato sexual ou libidinoso, mas é também possível reconhecer o afastamento desta regra, nos casos excepcionais de erro inevitável.


4. Formas Típicas Qualificadas de Estupro Contra Pessoa Vulnerável

Assim como ocorre em relação ao crime de estupro em sua forma comum e simples, também o estupro contra pessoa vulnerável conhece suas duas formas qualificadas pelo resultado. Estão previstas nos parágrafos 3º e 4º, do art. 217-A, sob exame, com a seguinte dicção:

§ 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.

§ 4º Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos."

São as mesmas circunstâncias qualificadoras do tipo penal comum. Porisso, os comentários feitos acima valem para as duas hipóteses em tela. Cabe apenas lembrar que, no caso de estupro contra menor de 14 anos, a presunção de vulnerabilidade dispensa a demonstração da violência que possa causar lesão corporal leve na pessoa da vítima.

No entanto, se ocorrer lesão corporal grave ou morte da vítima – circunstância que deve ser devidamente demonstrada – teremos a ocorrência de um tipo penal de estupro contra pessoa vulnerável qualificado pelo resultado, sancionado com penas bem mais rigorosas: 10 a 20 anos, para o caso de estupro com lesão corporal grave e de 12 a 30 anos de reclusão, no caso de morte da vítima.

Em relação às penas previstas no revogado art. 224, do CP, houve um aumento expressivo dos marcos punitivos. No regime do direito anterior, as penas cominadas para as formas qualificadas cometidas contra vítimas incapazes ou sob proteção penal especial, eram as mesmas previstas para o caso de sujeito passivo com capacidade plena de resistir à investida sexual ou libidinosa indesejada. (11) Aliás, também as penas cominadas para as formas simples de estupro (e do então crime de atentado violento ao pudor) eram as mesmas, tanto para o crime praticado com violência real quanto com violência ficta.

Quanto a este significativo aumento da reprimenda, possivelmente, o legislador levou em consideração o profundo sentimento de repulsa popular em face de crimes sexuais praticados com extrema violência e requintes de barbarismo contra crianças e adolescentes até 14 anos de idade.

Sobre os autores
João José Leal

Promotor de Justiça aposentado. Ex-Procurador-Geral de Justiça de Santa Catarina. Professor de Direito Penal aposentado.

Rodrigo José Leal

Professor de Direito Penal da Universidade Regional de Blumenau - FURB e na Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Doutor em Direito pela Universidade de Alicante/Espanha. Mestre em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Fundação Universidade Regional de Blumenau - FURB. Graduado pela Furb.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEAL, João José; LEAL, Rodrigo José. Novo tipo penal de estupro contra pessoa vulnerável. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2263, 11 set. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13480. Acesso em: 23 dez. 2024.

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