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Licitação: noções básicas sobre o processo administrativo que precede a contratação pública de obras, serviços, compras e alienações no Brasil

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Agenda 04/03/2011 às 10:02

9.INVALIDAÇÃO: REVOGAÇÃO E ANULAÇÃO

A invalidação do processo licitatório pode ocorrer através de sua revogação, por motivo de oportunidade ou de conveniência, assegurando-se o interesse público, ou mediante anulação, por ilegalidade observada durante qualquer etapa do processo, devendo, em qualquer hipótese, ser o ato devidamente fundamentado e garantindo-se sempre o contraditório e a ampla defesa, tudo na forma do art. 49 e §§ da LLCA.

A anulação de uma licitação tem natureza compulsória pois ocorre por ilegalidade no processo e opera efeitos ex tunc,retroagindo à edição do ato, que poderá ser da própria Administração ou do Poder Judiciário, este por provocação. O ato de anulação da licitação pode acontecer mesmo após a celebração do contrato (§ 2º do art. 49 da LLCA) e não gera direito a indenização, ressalvado o que o contratado porventura houver executado e/ou por outros prejuízos regularmente comprovados (§ 1º do art. 49 c/c art. 59 da LLCA), podendo daí concluir-se que a ilegalidade da licitação atinge também o contrato. Por outro lado, quem pode anular a licitação é a autoridade superior e nunca a comissão licitante.

Já a revogação é ato da Administração pública de natureza facultativa, ou seja, é ato discricionário, também da autoridade superior, por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, operando efeitos ex nunc (a partir do ato de revogação) e podendo gerar direito à indenização ao adjudicatário (licitante vencedor que teve a si adjudicado o objeto da licitação).

Preciosas as palavras de Ivan Barbosa Rigolin e outro quando, fazendo uma distinção entre os dois atos, observam que os mesmos - anulação e revogação - "são institutos jurídicos que cancelam de vez o certame, sempre que não são desfeitos judicialmente por provocação de algum interessado inconformado, que demonstre em juízo não ter existido causa legítima para aquele cancelamento, ou por desfazimento administrativo através de recurso (art. 109, I, c) que a Administração venha a prover. É que, como institutos que, quando utilizados, provocam às vezes graves efeitos sobre os licitantes, precisam, ainda mais que inúmeros outros atos componentes do procedimento licitatório, vir acompanhados de justificativa rigorosa, e com isso convincente, pela entidade que os utilizou, quer um, quer outro. Falam alto neste caso os princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade, a exigir a demonstração de que, com a anulação ou a revogação do procedimento, a entidade demonstre estar perseguindo o melhor interesse púbico, e não perseguindo licitantes (…)." [2006 pp. 438-439 – grifos originais]


10.RECURSOS ADMINISTRATIVOS E MEIOS DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL

São três os recursos administrativos aplicáveis ao processo de licitação, conforme disposto no art. 109 da LLCA: 1) recurso hierárquico, a ser apresentado no prazo de 5 (cinco) dias úteis a contar da intimação do ato ou da lavratura da ata, e que cabe nos casos de a) habilitação ou inabilitação do licitante, com efeito suspensivo, b) julgamento da proposta, com efeito suspensivo, c) anulação ou revogação da licitação, d) indeferimento, alteração ou cancelamento do registro cadastral, e) rescisão do contrato, a que se refere o inciso I do art. 79 da LLCA, e, f) aplicação das penas de advertência, suspensão temporária ou de multa; 2) representação, a ser interposta no prazo de 5 (cinco) dias úteis da intimação da decisão relacionada com o objeto da licitação ou do contrato, de que não caiba recurso hierárquico, e; 3) pedido de reconsideração de decisão de Ministro de Estado, ou Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso, na hipótese do § 4° do art. 87 desta Lei, a ser apresentado no prazo de 10 (dez) dias úteis da intimação do ato. Na modalidade de convite os prazos de representação e de pedido de reconsideração serão de 2 (dois) dias úteis.

Assim, vale repetir, em qualquer das hipóteses anteriormente citadas, uma vez interposto, o recurso será comunicado aos demais licitantes, que poderão impugná-lo no prazo de 5 (cinco) dias úteis, sendo que para convite esse prazo será de 2 (dois) dias úteis e, conforme disposto no § 4° do art. 109, "o recurso será dirigido à autoridade superior, por intermédio da que praticou o ato recorrido, a qual poderá reconsiderar sua decisão, no prazo de 5 (cinco) dias úteis, ou, nesse mesmo prazo, fazê-lo subir, devidamente informado, devendo, neste caso, a decisão ser proferida dentro do prazo de 5 (cinco) dias úteis, contado do recebimento do recurso, sob pena de responsabilidade".

Finalmente, conforme disposto no inciso III do art. 43 da LLCA, a licitação será processada e julgada observando-se, dentre outros requisitos, a "abertura dos envelopes contendo as propostas dos concorrentes habilitados, desde que transcorrido o prazo sem interposição de recurso, ou tenha havido desistência expressa, ou após o julgamento dos recursos interpostos".

Quanto aos meios de impugnação judicial, considera o já citado Ivan Barbosa Rigolin e outro que "é amplo o horizonte das possíveis ações judiciais em matéria de licitação. Todo e qualquer ato, comportamento, procedimento, decisão, procedido em certame licitatório, está sujeito a apreciação judicial. Trata-se da própria impositividade, à Administração, da garantia dada ao cidadão (ao licitante, portanto) pelo inciso XXXV do art. 5º da Constituição: 'a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito'. Julgando-se prejudicado por qualquer cometimento por parte da entidade, o licitante terá sempre abertas as portas da Justiça na defesa de seu direito, ainda que apenas ameaçado. E várias são as ações para estas hipóteses cabíveis, conforme de resto já se iterou." [2006 pp. 453]

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Pode-se relacionar as seguintes ações judiciais cabíveis durante o processo de licitação: 1) mandado de segurança - é o remédio constitucional previsto no art. 5º, LXIX da CF/88, destinado a proteger direito líquido e certo, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder público, sendo regulado pela Lei nº 12.016, de 07.08.2009 (disciplina o mandado de segurança individual e coletivo e dá outras providências), e considerado a mais comum das ações, interposta na defesa de direito líquido e certo de qualquer interessado, independente de ser licitante ou não (por exemplo, alguém que não pode participar devido às exigências abusivas do edital); o prazo para impetração é de 120 dias contados do conhecimento oficial do ato a ser impugnado; esse prazo é decadencial, não sendo admitido interrupção e nem suspensão; em regra contém medidas liminares, suspensivas. 2) ação cautelar inominada - utilizada em menor grau, seguida de ação ordinária, "sendo esta última, em geral, anulatória de ato jurídico". 3) ação ordinária - é a menos adequada e menos utilizada como recurso judicial em licitação face à lentidão da ação.


11.RESPONSABILIDADE DO AGENTE PÚBLICO NA LICITAÇÃO

No que concerne à responsabilidade do agente público por ação ou omissão relativa ao processo licitatório, dispõem a respeito os arts. 82 a 99 da Lei n° 8.666/93. De fato, o artigo 82 prescreve expressamente que "os agentes administrativos que praticarem atos em desacordo com os preceitos desta Lei ou visando a frustrar os objetivos da licitação sujeitam-se às sanções previstas nesta Lei e nos regulamentos próprios, sem prejuízo das responsabilidades civil e criminal que seu ato ensejar". Assim, a LLCA regula todo a matéria penal no que diz respeito aos crimes de responsabilidade da Administração pública no processo de licitação.

Além de sujeitos a sanções penais, ficam os agentes públicos sujeitos, também, à perda do cargo, emprego, função ou mandato eletivo e, caso o agente seja ocupante de cargo em comissão ou de função de confiança, a pena será acrescida de um terço.


12.ARBITRAGEM EM LICITAÇÃO

O uso da arbitragem no Direito público brasileiro como meio de solucionar conflitos nos contratos firmados entre a Administração pública e os particulares foi motivo de polêmicas, ainda em certos aspectos não totalmente superadas. Essa inovação foi trazida pela Lei nº 11.079, de 30.12.2004, que institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da Administração pública, prevendo expressamente a possibilidade de eleição do juízo arbitral como forma de solução dos conflitos nos contratos de PPPs, conforme disposto no inciso III do art. 11, in verbis:

Art. 11. O instrumento convocatório conterá minuta do contrato, indicará expressamente a submissão da licitação às normas desta Lei e observará, no que couber, os §§ 3° e 4° do art. 15, os arts. 18, 19 e 21 da Lei n° 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, podendo ainda prever: […]. III – o emprego dos mecanismos privados de resolução de disputas, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996, para dirimir conflitos decorrentes ou relacionados ao contrato.

Posteriormente, a Lei n° 11.196, de 21.11.2005, que trata do Regime Especial de Tributação para a Plataforma de Exportação de Serviços de Tecnologia da Informação – Repe modifica, através do art. 120, a Lei n° 8.987/95 (lei das concessões e permissões de servico público) introduzindo-lhe o art. 23-A, in verbis:

Art. 120. A Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, passa a vigorar acrescida dos arts. 18-A, 23-A e 28-A: […]. "Art. 23-A. O contrato de concessão poderá prever o emprego de mecanismos privados para resolução de disputas decorrentes ou relacionadas ao contrato, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996." […].

Vale ressaltar as preciosas palavras de Adilson Abreu Dallari que, antes mesmo da edição desses novos dispositivos legais, já comentava que o legislador federal deveria observar a questão da arbitragem, "que poderia constituir-se em um significativo elemento de desafogo do Poder Judiciário e, ao mesmo tempo, proporcionar soluções rápidas aos intermináveis conflitos em matéria de licitações e contratos". Adiante aduz ainda o referido autor que "a imediata e definitiva solução das pendências interessa a todas as partes, até ao perdedor, ainda que este seja o Poder Público, pois o impasse, a indecisão e o atravancamento das obras e serviços são evidentemente prejudiciais ao interesse público. Objeta-se, entretanto, que a arbitragem seria inaplicável às questões de litígios na área do direito público, em face do princípio da indisponibilidade dos interesses públicos. Entendemos que essa objeção não procede, pois, havendo previsão legal, o agente público competente estaria habilitado a optar pela arbitragem exatamente para defender o interesse público, do qual não estaria dispondo". [2006, p. 16]

O assunto, como já referido, ainda não é pacífico, mas pode-se dizer que a corrente majoritária pronuncia-se hoje a favor da possibilidade de utilização do instituto da arbritagem na solução de conflitos decorrentes de contratos administrativos.

Sobre a autora
Lucia Luz Meyer

Advogada, Procuradora Jurídica aposentada, Especialista em Direito Economico e em Direito Administrativo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MEYER, Lucia Luz. Licitação: noções básicas sobre o processo administrativo que precede a contratação pública de obras, serviços, compras e alienações no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2802, 4 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18616. Acesso em: 22 nov. 2024.

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