3 - REQUISITOS CONSTITUCIONAIS PARA A APROVAÇÃO DE SÚMULAS VINCULANTES
A Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004, introduziu no ordenamento jurídico brasileiro o instituto das súmulas vinculantes. A Constituição da República, promulgada em 1988, passou a vigorar acrescida do seguinte dispositivo:
Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
Assim, como se vê, o Supremo Tribunal Federal pode aprovar súmulas vinculantes de ofício ou por provocação, necessitando da decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional.
A partir da publicação na imprensa oficial, as súmulas terão efeito vinculante para o Poder Judiciário e para a Administração direta e indireta nas esferas federal, distrital, estadual e municipal.
4 - A APROVAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE Nº 5
A súmula vinculante nº 5 do Supremo Tribunal Federal foi aprovada no dia 07 de maio de 2008 com o seguinte enunciado:
A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição.
A decisão de aprovação dessa súmula vinculante foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) nº 434.059/DF, interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e pela União, contra decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que entendeu ser obrigatória a presença de advogado em processo administrativo disciplinar (PAD), conforme súmula nº 343 STJ.
A decisão de editar a nova súmula vinculante, aceita pelo relator do RE, ministro Gilmar Mendes, presidente do STF, e pelos demais ministros, foi tomada em função de sugestões dos ministros Joaquim Barbosa e Cezar Peluso sobre sua conveniência, diante da existência desta súmula nº 343 do STJ.
O Plenário baseou-se em três precedentes em que o STF assentou que a presença de advogado de defesa é dispensável. Trata-se do Agravo Regimental (AR) no RE 244027/SP, que teve como relatora a ministra Ellen Gracie; do AR em Agravo de Instrumento (AI) 207197/PR, relatado pelo ministro Octávio Gallotti (aposentado), e do Mandado de Segurança (MS) 24961/DF, relatado pelo ministro Carlos Velloso (aposentado).
5 - INEXISTÊNCIA DE REITERADAS DECISÕES PARA A APROVAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE Nº 5
No julgamento do RE - Recurso Extraordinário nº 434059-3/DF, no qual aprovou-se o enunciado da súmula vinculante nº 5, houve discussão dos Ministros sobre a existência de reiteradas decisões para aprovação dessa súmula. Confira-se, in verbis:
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - Senhor Presidente, devo ser coerente com o que veiculei inicialmente.
Vossa Excelência alude ao Verbete nº 5. Pela numeração, então, tem-se um verbete vinculante. Reafirmo, não posso desconhecer o que se contém na Constituição Federal, que submete a todos, inclusive ao Supremo, principalmente a ele como guarda da própria Constituição. A premissa para chegar o Supremo, no âmbito da competência que lhe está reservada pela Carta, à edição de um verbete vinculante, praticamente normativo, é que existam, conforme está em bom vernáculo, como está em bom português, reiterados pronunciamentos do próprio Supremo. E não há reiterados pronunciamentos sobre a matéria. Dir-se-á: a situação é excepcional. E afirmo: não vivenciamos um regime de exceção.
O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO – Há precedentes.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Não, sobre esse tema específico, penso que não há. Se houver, eu cedo.
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE E RELATOR) – Há precedentes.
O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO – Há pelo menos dois.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Presidente, a menos que me revelem precedentes específicos a versarem a desnecessidade de defesa técnica no processo administrativo, a menos que me revelem inclusive os números, pronunciar-me-ei de forma contrária à edição de verbete vinculante.
O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Há o MS 24.961/DF, o RE 244.277/RS, em agravo regimental.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Mas especificamente quanto ao processo administrativo?
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE E RELATOR) – Sim, quanto ao processo administrativo. Eu citei o RE – agravo regimental – nº 244.027 e citei o Mandado de Segurança nº 24.961
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Se há pronunciamentos, cessa a divergência. São específicos? Versam situação concreta relativa a processo administrativo e defesa técnica?
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE E RELATOR) – Sim, do Ministro Octávio Galloti, da Ministra Ellen e do Ministro Carlos Velloso.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Muito bem, a única ponderação que fiz foi no sentido de se observar a autorização constitucional. E se, no caso, a exigência constitucional está atendida, concordo plenamente. Devemos marchar, devemos racionalizar os trabalhos com a edição de verbete vinculante.
Como se passa a demonstrar, a afirmação do Ministro Marco Aurélio era procedente. Não havia no Supremo Tribunal Federal reiteradas decisões dizendo que era dispensável a defesa técnica por advogado, especificamente, nos processos administrativos disciplinares.
Os precedentes que serviram de base para a aprovação da súmula vinculante nº 5 não são necessariamente processos administrativos disciplinares. O Mandado de Segurança nº 24.961/DF trata de tomada de contas, não constituindo processo administrativo disciplinar; o agravo de instrumento nº 207.197/PR refere-se a contencioso administrativo fiscal. Apenas o agravo regimental nº 244.027/SP trata de punição a policial militar (desligamento do curso de formação de oficiais).
Considerando que a súmula vinculante nº 5 refere-se, especificamente, a processo administrativo disciplinar e, ainda, considerando que o artigo 103-A da Constituição exige reiteradas decisões sobre matéria constitucional, o que pressupõe várias decisões no mesmo sentido em processos administrativos disciplinares, conclui-se que o Supremo Tribunal Federal infringiu o artigo 103-A da Lei Maior e precipitou-se ao aprovar a súmula vinculante nº 5, haja vista que não houve decisões reiteradas no sentido de que é dispensável a defesa técnica por advogado nos processos administrativos disciplinares.
6 - JULGAMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 434.059/DF
O julgamento desse recurso extraordinário deu origem ao enunciado da súmula vinculante nº 5 do Supremo Tribunal Federal.
O Ministro Gilmar Mendes (Relator) sustentou no seu voto que:
Ora, se devidamente garantido o direito (I) à informação, (II) à manifestação e (III) à consideração dos argumentos manifestados, a ampla defesa foi exercida em sua plenitude, inexistindo ofensa ao art. 5º, LV, da Constituição Federal.
Por si só, a ausência de advogado constituído ou de defensor dativo com habilitação não importa nulidade de processo administrativo disciplinar, como já decidiu este STF:
'EMENTA: Agravo regimental a que se nega provimento, porquanto não trouxe o agravante argumentos suficientes a infirmar os precedentes citados na decisão impugnada, no sentido de que, uma vez dada a oportunidade ao agravante de se defender, inclusive de oferecer pedido de reconsideração, descabe falar em ofensa aos princípios da ampla defesa e do contraditório no fato de se considerar dispensável, no processo administrativo, a presença de advogado, cuja atuação, no âmbito judicial, é obrigatória.' (RE-Agr. 244.07, 1ª T., Rel. Ellen Gacie, DJ 28.06.2002)
(…)
Ressalte-se que mesmo em determinados processos judiciais – como no habeas corpus, na revisão criminal, em causas da Justiça Trabalhista e dos Juizados Especiais – esta Corte assentou a possibilidade de dispensa da presença de advogado. A propósito, destaquem-se ADI nº 3.168/DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 02.08.2007; ADI nº 1.127/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ acórdão Min. Ricardo Lewandowski, DJ 26.05.2006 e ADI nº 1.539/DF, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 05.12.2003. Este último precedente possui a seguinte ementa:
'DO ADVOGADO. POSSIBILIDADE. 1. Juizado Especial. Lei 9099/95, artigo 9º. Faculdade conferida à parte para demandar ou defender-se pessoalmente em juízo, sem assistência de advogado. Ofensa à Constituição Federal. Inexistência. Não é absoluta a assistência do profissional da advocacia em juízo, podendo a lei prever situações em que é prescindível a indicação de advogado, dados os princípios da oralidade e da informalidade adotados pela norma para tornar mais célere e menos oneroso o acesso à justiça. Precedentes. 2. Lei 9099/95. Fixação da competência dos juizados especiais civis tendo como parâmetro o valor dado à causa. Razoabilidade da lei, que possibilita o acesso do cidadão ao judiciário de forma simples, rápida e efetiva, sem maiores despesas e entraves burocráticos. Ação julgada improcedente.' (ADI nº 1.539/UF, Rel. Min. Mauricio Corrêa, DJ 05.12.2003)
Nesses pronunciamentos, o Tribunal reafirmou que a disposição do art. 133 da CF não é absoluta, tendo em vista que a própria Carta Maior confere o direito de postular em juízo a outras pessoas.
(…)
Portanto, ao divergir deste entendimento, violou o STJ os arts. 5º, LV, e 133 da Constituição Federal.
Assim, conheço e dou provimento aos recursos extraordinários para indeferir a segurança. Sem honorários (Súmula 512 – STF).
Os outros Ministros acompanharam o voto do Relator e seus argumentos serão analisados no tópico seguinte.
7 - ANÁLISE CRÍTICA DOS PRINCIPAIS ARGUMENTOS FAVORÁVEIS À APROVAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE Nº 5 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Esses argumentos são os fundamentos insertos nos votos dos Ministros do Supremo Tribunal Federal que participaram do julgamento do Recurso Extraordinário nº 434.059/DF, no dia 07 de maio de 2008. Esse julgamento deu origem ao enunciado da súmula vinculante nº 5.
Pelos estudos realizados até agora, pode-se concluir que garantir ao servidor processado administrativamente o direito de informação, de manifestação e de ver seus argumentos considerados, como constou no voto do Ministro Gilmar Mendes, sem que esteja sendo defendido tecnicamente por advogado, é garantir apenas formalmente o direito à ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
Não há, desse modo, plenitude de defesa, mas, tão somente, garantia formal de um direito fundamental assegurado na Constituição. Há, in casu, flagrante violação do devido processo legal em sentido formal.
Realmente, em determinados processos judiciais como no habeas corpus, na revisão criminal, nas causas da Justiça do Trabalho e dos Juizados Especiais, dispensa-se a presença de advogado. Com o jus postulandi garante-se o acesso ao Poder Judiciário, mas não, necessariamente, à efetiva justiça.
Não obstante, a comparação entre processo administrativo disciplinar e processos judiciais que dispensam a presença de advogado, não é recomendável.
Há uma peculiaridade no processo administrativo disciplinar não verificada no habeas corpus, na revisão criminal, nas causas da Justiça do Trabalho e dos Juizados Especiais. A diferença é que no processo administrativo disciplinar a autoridade que o instaura é a mesma que o julgará.
A Administração Pública não tem a imparcialidade do Poder Judiciário para julgar o processo, considerando que ela própria instaura e indica os membros que comporão a comissão sindicante ou processante. A Administração, ainda, investiga, instrui e, finalmente, julga o servidor processado, sendo imprescindível a presença de advogado desde o início do procedimento para que não ocorram eventuais abusos e violações aos direitos do servidor, garantindo-se, efetivamente, a ampla defesa preconizada pelo inciso LV, do artigo 5º, da Carta Magna.
O Ministro Ricardo Lewandowski chegou a sustentar em seu voto que a doutrina e a jurisprudência entendem que a defesa técnica integra efetivamente o devido processo legal, no entanto, diz que: "trata-se de uma faculdade que deve ser colocada à disposição do acusado, daquele que responde a processo judicial ou administrativo."
Há que se ponderar, que num país como o Brasil, com tanta desigualdade social, não são todos os servidores que podem exercer essa faculdade de se defender efetivamente num processo administrativo disciplinar. Para o servidor pobre não há faculdade; por faltar-lhe recursos, simplesmente, não pode exercer o seu direito fundamental à ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes.
O Ministro Carlos Britto disse que a presença obrigatória do advogado se faz no processo judicial, porque a Seção III do Capítulo IV, sobre as Funções Essenciais à Justiça deixa claro que o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo que Justiça no Capítulo IV, significa função jurisdicional.
Esse esforço hermenêutico para dispensar a defesa técnica no processo administrativo disciplinar restringe, sobremaneira, o direito fundamental à ampla defesa insculpido nos incisos LIV e LV, do artigo 5º, da Carta Magna, que não faz distinção entre processos judiciais, legislativos e administrativos.
Continua o Ministro Carlos Britto:
O Ministro Ricardo Lewandowski, também na linha do voto de Vossa Excelência, comentou para mim, com proficiência, o conteúdo do devido processo legal que se lê no inciso LV do art. 5º, que não incorpora nos processos administrativos a defesa técnica, a obrigatoriedade da defesa técnica por advogado.
A tese contrária implicaria mais do que a ampla defesa, e sim uma amplíssima defesa, ou seja, uma defesa transbordante.
Perfeito. Então, no caso, o Estatuto dos Servidores Públicos se houve bem quando possibilitou, sem dúvida, a defesa de motu próprio ou autodefesa alternativamente com a nomeação de procurador.
Eu me preocupo também com uma consequência prática da decisão em sentido contrário à nossa. É que todas as vezes que em processo administrativo o servidor processado não optasse pela nomeação de procurador, a administração pública seria obrigada a remeter o caso para a defensoria pública e esta se veria, sem dúvida, numa situação de assoberbamento, digamos assim porque não só defenderia os necessitados, que é o seu dever precípuo, a sua função específica, como também defenderia todos os servidores públicos processados que não optassem pela nomeação de procurador nos autos.
Com todo respeito, não é isso que diz o inciso LV do artigo 5º da Carta Magna. Também, não há no ordenamento jurídico nacional, referência a excesso de defesa, amplíssima defesa ou defesa transbordante. O que existe é defesa insuficiente e isto ocorre quando não se garante defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar.
A defesa, como preceitua a Constituição, deve ser ampla com os meios e recursos a ela inerentes, quer seja no processo judicial ou no administrativo. Há que se garantir a máxima efetividade possível aos direitos fundamentais, privilegiando os princípios pro homine e, também, o princípio da proibição do retrocesso social.
Também, a falta de estrutura do Estado em prestar assistência jurídica aos necessitados não pode ser alegada como justificativa para negar o direito fundamental à ampla defesa aos acusados em geral e aos servidores que respondem a processos administrativos disciplinares. A Constituição é clara a esse respeito quando preceitua no inciso LXXIV, do artigo 5º que: "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos."
O Ministro Cezar Peluso fez constar no seu voto o seguinte:
O que a Constituição, no inciso LV, assegura é o contraditório, que se traduz na garantia da possibilidade de uma intervenção eficaz e tempestiva, sobretudo, hoje, explicada a título de colaboração na formação do ato-total da decisão. Isto é, quem se vê na condição de acusado, na condição de réu ou em condição análoga, é convidado a participar do processo para colaborar com o processo, que é de formação da decisão. Daí, a justificação consequente da garantia da coisa julgada, que pode ser oposta exatamente à pessoa instada, ou, pelo menos, chamada a participar de uma decisão que se revestirá dessa imutabilidade e autoridade próprias da res iudicata.
Ora, a oportunidade, como tal, é concedida no processo administrativo. E, não apenas no processo administrativo, mas em todos os processos, e é admitida a título de ônus, não a título de obrigação. Portanto, é comportamento único e necessário para a obtenção de certa vantagem. O interessado o exercerá ou não, segundo suas conveniências pessoais. Por isso, nunca, jamais se cogitou da nulidade eventual de processo civil em que o réu seja revel, de revelia absoluta. Ele é citado, não comparece, porque não lhe convém comparecer, porque não quer, mas nem por isso o processo é nulo por suposta ofensa ao princípio do contraditório.
Ora, esta possibilidade ou esta oportunidade de intervenção só não existe em concreto no procedimento administrativo – conforme também revelou a Ministra Cármem Lúcia – em duas hipóteses: naquela em que o servidor se encontre em lugar incerto e, portanto, não tenha ciência senão ficta do processo – e, por que se trata de ficção, é preciso que, de algum modo, essa possibilidade se atualize mediante a nomeação de um defensor ou de destinação do processo à Defensoria Pública -, ou no caso em que o servidor não tenha condições de contratar patrono para defendê-lo. Neste caso, ele pode invocar outra garantia constitucional, que é aquela pela qual o estado se obriga a prestar assistência jurídica integral e gratuita – integral no sentido de que apanha também a esfera administrativa.
A única exceção a essa distinção, que pressupõe exatamente a diferença entre oportunidade de defesa como o contraditório e defesa técnica, que é outra coisa, é o processo criminal, porque nele – também o eminente advogado-geral da União já demonstrou – está em jogo um direito indisponível, que seria objeto de teórica renúncia, se não fosse assegurada ao réu defesa técnica efetiva.
Os argumentos do Ministro Cezar Peluso demonstram que realmente não há diferenças entre os processos judiciais e administrativos que justifiquem a exigência de defesa técnica por advogado só naqueles. O voto do Ministro, considerando os fundamentos utilizados, poderia ter sido noutro sentido, qual seja, a obrigatoriedade de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar.
O Ministro está correto quando equipara os processos judiciais aos administrativos, pois é exatamente isso que faz o inciso LV, do artigo 5º, do nosso Estatuto Político. A única ressalva a ser feita, data venia, é que esse dispositivo Constitucional assegura, além do contraditório, também, a ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes. Ao assegurar a ampla defesa, que se realiza por meio do contraditório, está a Constituição assegurando também a defesa técnica que, conforme já mencionado alhures, só pode ser levada a efeito por advogado.
Quando o servidor é "convidado" a participar do processo administrativo disciplinar, como ensina o eminente Ministro, ele, efetivamente, não é obrigado a se defender, assim como ocorre no processo civil. Não obstante, caso não apresente defesa, a autoridade instauradora do processo administrativo disciplinar deverá designar defensor dativo para apresentar defesa ao servidor revel.
A respeito do tema, a Lei Federal nº 8.112/90 diz, expressamente, que:
Art. 164. Considerar-se-á revel o indiciado que, regularmente citado, não apresentar defesa no prazo legal.
§ 1º A revelia será declarada, por termo, nos autos do processo e devolverá o prazo para a defesa.
§ 2º Para defender o indiciado revel, a autoridade instauradora do processo designará um servidor como defensor dativo, que deverá ser ocupante de cargo efetivo superior ou de mesmo nível, ou ter nível de escolaridade igual ou superior ao do indiciado.
O § 2º supracitado, não garante uma defesa qualificada, haja vista que não assegura a ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes, nos termos exigidos pela Constituição. É possível v.g. que um gari seja defendido por outro gari, que um veterinário seja defendido por outro. Esses profissionais, sem dúvida, não possuem conhecimentos técnicos jurídicos que viabilizem uma defesa ampla, qualificada.
Considerando essas possibilidades de defesa, pro forma, o § 2º, do artigo 164, da Lei Federal nº 8.112/90 precisa ser interpretado conforme a Constituição, como sugerido alhures.
Assim, só é possível o exercício do contraditório tempestivo e eficaz como menciona o Ministro Peluso, por quem possua conhecimentos técnicos jurídicos ou não os tendo, contrate profissional habilitado que os tenha.
O próprio Ministro Cezar Peluso admite em seu voto que o servidor pode invocar a garantia constitucional da assistência jurídica integral e gratuita e afirma, ainda, para não deixar dúvida, que essa assistência apanha também a esfera administrativa.
Eis, os principais argumentos lançados quando do julgamento do recurso extraordinário 434.059/DF que culminou na edição do enunciado da súmula vinculante nº 5, que tem a seguinte redação: "A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição."
Como se vê, a própria súmula vinculante nº 5 exige que haja defesa técnica no processo administrativo disciplinar.
Porém, a defesa técnica, nos termos da Súmula Vinculante nº 5, não precisa ser feita por advogado, o que é, data venia, um contrassenso e faz com que os argumentos dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, lançados no recurso extraordinário nº 434.059/DF, sejam contraditórios, levando-se em conta o que preceituam os incisos LIV e LV, do artigo 5º, da Constituição da República Federativa do Brasil.