SUMÁRIO:INTRODUÇÃO . 1 - SITUAÇÃO ANTERIOR - ALTERAÇÃO JURISPRUDENCIAL – REGRA GERAL – VÍCIO DE CONSENTIMENTO NÃO SE PRESUME. 2 - ACUMULAÇÃO DE PROVENTOS DO INSS E REMUNERAÇÃO X DECISÃO DO STF NA ADI 1770. 3 - APOSENTADORIA PREVIDENCIÁRIA E VACÂNCIA. 4 - SERVIDOR PÚBLICO CELETISTA ESTÁVEL – FORMALIDADE DO ART. 500 DA CLT – PRESUNÇÃO DE VÍCIO DE VONTADE. 5 - SERVIDOR PÚBLICO CELETISTA – APLICABILIDADE DO LIMITE DE 70 ANOS DE IDADE.6 - PERCEPÇÃO DE COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA – PRESUNÇÃO DE INTERESSE DO TRABALHADOR NA RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO.7 - NOVO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL X VANTAGENS CRIADAS EM REGULAMENTO EMPRESARIAL NO REGIME ANTERIOR. CONCLUSÕES
INTRODUÇÃO
Em que pese já a partir de fins de 2006 se tenha sedimentado na jurisprudência o entendimento de que a aposentadoria espontânea previdenciária não extingue automaticamente o contrato de trabalho, remanesce debate sobre os desdobramentos da questão em algumas situações especiais, sobre as quais registraremos alguns breves comentários.
1 - SITUAÇÃO ANTERIOR - ALTERAÇÃO JURISPRUDENCIAL – REGRA GERAL – VÍCIO DE CONSENTIMENTO NÃO SE PRESUME
Com base no art. 453 da CLT [01], entendia-se que a aposentadoria previdenciária de um trabalhador coincidia com sua "aposentadoria" também para fins trabalhista, ou seja, que provocaria a automática rescisão do contrato de trabalho, rescisão esta não imputável ao empregador, portanto sem a incidência de aviso prévio nem multa de 40% do FGTS. Entretanto, a partir das decisões do Supremo Tribunal Federal prolatadas no julgamento das ADI’s 1.721 e 1.770, em que declarada a inconstitucionalidade dos parágrafos 1º e 2º do artigo 453 da CLT, houve guinada na jurisprudência trabalhista, como ilustra o cancelamento da OJ SDI1 177 [02] e posterior edição da OJ SDI1 361 [03], sedimentando-se que a aposentadoria espontânea não é causa de extinção do contrato de trabalho.
Assim, segundo o entendimento ora pacificado, pode o trabalhador continuar no mesmo emprego normalmente após sua jubilação previdenciária, a qual passou a ser juridicamente irrelevante em termos de efeitos propriamente trabalhistas.
Quando rescindido o contrato, seja simultaneamente com a concessão da aposentadoria previdenciária, seja tempos após, deve-se perquirir de quem partiu a iniciativa da ruptura contratual, presumindo-se, como regra geral, a dispensa imotivada, em razão do princípio da continuidade da relação de emprego, da mesma forma que ocorre com os rompimentos em geral, onde não envolvida a aposentadoria. Presume-se que a vontade do empregado era permanecer no emprego e que o desligamento "por aposentadoria" na realidade se tratou de dispensa imotivada, sendo devidas as pertinentes vantagens, como aviso prévio e multa de 40% sobre o FGTS de toda a contratualidade.
Impõe-se relembrar que tal presunção é relativa, e que não se pode chegar ao extremo de considerar devida a indenização rescisória em todos os casos, já que o desligamento do labor por ocasião da aposentadoria pode ser dar por vontade do próprio trabalhador, o que então equivale a um pedido de demissão.
Havendo pedido de demissão expresso ou outra manifestação de vontade equivalente, entretanto, não basta para infirmá-los uma alegação genérica de coação ou de outro vício de consentimento. Os vícios de consentimento não podem ser presumidos, afigurando-se imprescindível prova robusta de sua existência.
Em tal sentido tem decidido o TRT da 4ª Região, como exemplifica o seguinte aresto, onde confirmada sentença de nossa lavra:
0160400-16.2009.5.04.0202 (RO) - Redator: CARMEN GONZALEZ Data: 17/03/2011 Origem: 2ª Vara do Trabalho de Canoas
EMENTA: PARCELAS RESCISÓRIAS. PROVA INEQUÍVOCA DA AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO NO PEDIDO DO EMPREGADO DE DESLIGAMENTO DOS QUADROS DA EMPRESA. Em que pese a aposentadoria espontânea não constitua causa extintiva do contrato de trabalho, a prova dos autos demonstra a iniciativa do reclamante para o rompimento do contrato de trabalho e ausente qualquer vício na manifestação de sua vontade, circunstância que exime o empregador do pagamento de parcelas decorrentes da despedida imotivada.
2 - ACUMULAÇÃO DE PROVENTOS INSS E REMUNERAÇÃO X DECISÃO DO STF NA ADI 1770
Como já mencionado, o maior dissenso atual reside na aplicação do entendimento antes mencionado a algumas situações especiais.
É o caso do emprego público, para o qual parte respeitável da jurisprudência [04] tem aderido ao entendimento de que haveria óbice à continuidade da relação de emprego após a aposentadoria previdenciária em razão da vedação constitucional à acumulação de cargos ou empregos públicos e proventos de aposentadoria.
Tal, entretanto, não nos parece razoável.
Reza o art. 37, §10º da CRFB que:
§ 10. É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
A norma é expressa no sentido de que a vedação de acumulação de cargos ou empregos públicos com proventos de aposentadoria se aplica aos regimes de previdência especiais próprios dos entes públicos, previstos nos arts. 40, 42 e 142 da Carta Política. Não há qualquer menção ao art. 201 do mesmo Diploma, o qual consagra o regime geral de previdência social.
Trata-se do chamado silêncio eloqüente, através do qual o constituinte derivado deixou claro que não pretendia equiparar, para fins de tal vedação, os regimes próprios dos entes públicos e o regime geral, vinculado ao INSS. A vedação de acumulação de proventos de aposentadoria com a remuneração de cargo, emprego ou função pública se aplica aos casos em que o custeio de ambos decorra do tesouro dos próprios entes públicos empregadores, não alcançando as situações jurídicas em que a fonte de custeio dos proventos de aposentadoria decorre do regime geral de previdência social.
Em tal sentido tem reiteradamente decidido o TST, que entende que a OJ SDI-1 361 se aplica mesmo quando o empregador é a Administração Pública, não havendo falar em acumulo ilícito com proventos de aposentadoria decorrentes do regime geral de previdência social, como exemplificam os seguintes arestos:
-ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA. EMPREGADA PÚBLICA ESTÁVEL. APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. EFEITOS NO CONTRATO DE TRABALHO. Conforme a OJ n.º 361 da SDI-1 do TST, 'a aposentadoria espontânea não é causa de extinção do contrato de trabalho se o empregado permanece prestando serviços ao empregador após a jubilação'. Esse entendimento tem aplicação ainda que se trate de vínculo empregatício com a Administração Pública direta, pois não existe no ordenamento jurídico pátrio óbice à continuidade da prestação de serviços pelo empregado público aposentado pelo Regime Geral da Previdência Social. O § 10 do art. 37 da Constituição Federal veda apenas a cumulação da remuneração de cargo, emprego ou função pública com os proventos das aposentadorias decorrentes dos arts. 40, 42 ou 142 da Constituição Federal, ou seja, de regimes previdenciários especiais (servidores estatutários, magistrados, membros das polícias militares e corpos de bombeiros militares e membros das forças armadas). Recurso de revista conhecido e provido.- (RR - 5309/2007-678-09-00.2, Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, DEJT 28/8/2009)
RECURSO DE REVISTA - APOSENTADORIA ESPONTÂNEA - EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO - CONTINUIDADE DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - EMPRESA PÚBLICA - EFEITOS. O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que a aposentadoria espontânea não constitui causa de extinção do contrato de trabalho, a partir do qual esta Corte Superior se posicionou quanto à manutenção do vínculo empregatício após a aposentadoria, quando há a continuidade na prestação do serviços, hipótese dos autos. Acrescente-se que a vedação de acumulação de proventos de aposentadoria com a remuneração de cargo, emprego ou função pública de que cogitam os arts. 37, § 10, 40, 42 e 142 da Constituição Federal leva em consideração a unicidade das fontes dos proventos e da remuneração dos cargos, empregos ou funções públicas, mas não alcança as situações jurídicas em que a fonte de custeio dos proventos de aposentadoria decorre do regime geral da Previdência Social e a remuneração, dos cofres públicos. Precedentes do STF.
Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 76300-55.2007.5.10.0001, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 25/02/2011).
A discussão adquire contornos mais complexos, entretanto, ante os fundamentos da decisão do Pleno do STF no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.770-4-DF, (DJ 01/12/2006), relatada pelo Ministro Joaquim Barbosa, cuja ementa diz:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. READMISSÃO DE EMPREGADOS DE EMPRESAS PÚBLICAS E SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA. ACUMULAÇÃO DE PROVENTOS E VENCIMENTOS. EXTINÇÃO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO POR APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. NÃO-CONHECIMENTO. INCONSTITUCIONALIDADE. Lei 9.528/1997, que dá nova redação ao § 1º do art. 453 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT -, prevendo a possibilidade de readmissão de empregado de empresa pública e sociedade de economia mista aposentado espontaneamente. Art. 11 da mesma lei, que estabelece regra de transição. Não se conhece de ação direta de inconstitucionalidade na parte que impugna dispositivos cujos efeitos já se exauriram no tempo, no caso, o art. 11 e parágrafos. É inconstitucional o § 1º do art. 453 da CLT, com a redação dada pela Lei 9.528/1997, quer porque permite, como regra, a acumulação de proventos e vencimentos - vedada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal -, quer porque se funda na idéia de que a aposentadoria espontânea rompe o vínculo empregatício. Pedido não conhecido quanto ao art. 11, e parágrafos, da Lei nº 9.528/1997. Ação conhecida quanto ao § 1º do art. 453 da Consolidação das Leis do Trabalho, na redação dada pelo art. 3º da mesma Lei 9.528/1997, para declarar sua inconstitucionalidade.
São, pois, indicados como fundamentos para a declaração da inconstitucionalidade do § 1º do art. 453 da CLT, o fato de que sua redação permitiria "como regra, a acumulação de proventos e vencimentos - vedada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal", bem como "porque se funda na idéia de que a aposentadoria espontânea rompe o vínculo empregatício".
Existe aparente conflito intrínseco em tal decisão, uma vez que um de seus fundamentos, em princípio, excluiria a validade do outro e vice-versa. É que, caso se considere vedada a acumulação de proventos do INSS com vencimentos pagos pela Administração Pública, então seria juridicamente impossível o empregado público, após a jubilação, manter hígido seu contrato de trabalho, o qual estaria automaticamente rompido. Como decorrência lógica, não haveria como declarar inconstitucional o §1º em tela por se fundar "na idéia de que a aposentadoria espontânea rompe o vínculo empregatício", já que tal rompimento seria obrigatório, em tal hipótese interpretativa, a fim de evitar o acúmulo tido como vedado. O mesmo raciocínio também pode ser feito de forma inversa: se o Excelso Pretório declarou a inconstitucionalidade de tal norma justamente "porque se funda na idéia de que a aposentadoria espontânea rompe o vínculo empregatício", então não há como considerar que a continuidade de tal vínculo resultaria em situação de acúmulo ilícito.
Por outro lado, a decisão menciona "a acumulação de proventos e vencimentos - vedada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal", citando em tal sentido, como precedentes, o RE 163.204, RE 463.028, AI-AgR 484.756, ADI 1.328, RE 141.376, RE 197.699. Em qualquer de tais precedentes, entretanto não há sequer menção à acumulação de cargos e empregos públicos com proventos do INSS, mas tão-somente com proventos de regimes próprios dos servidores públicos estatutários.
Ademais, o acórdão da ADI 1770 menciona "que o entendimento do Tribunal foi confirmado com o advento da Emenda Constitucional nº 20, que taxativamente vedou o tipo de acumulação ora em questão ao acrescentar o § 10 ao art. 40 [rectius: art. 37] da Carta de 1988 ...". No entanto, como já mencionado acima, tal norma faz referência apenas aos arts. 40, 42 e 142 da CRFB, atinentes aos regimes próprios dos entes públicos, sendo evidentemente intencional a omissão do constituinte quanto ao regime geral de previdência social (art. 201) denotando que não pretendia que fosse incluído na vedação.
Tal análise se confirma pela dicção do próprio Ministro Joaquim Barbosa, relator na ADI 1.770, que indeferiu liminar na Reclamação 7733, entendendo que a decisão reclamada tem fundamento, ao destacar "a circunstância de o art. 37, § 10 da Constituição proibir a acumulação de proventos oriundos dos regimes previstos nos arts. 40, 42 e 142 com remuneração", enquanto que "o benefício previdenciário aplicável à interessada pautar-se-ia pela sistemática do art. 201 da Constituição":
Rcl 7733 MC / SP - SÃO PAULO - MEDIDA CAUTELAR NA RECLAMAÇÃO - Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA - DJe-084 DIVULG 07/05/2009 PUBLIC 08/05/2009 (...)
Ainda ressaltando o juízo eminentemente liminar, observo que a decisão reclamada invoca com fundamento a circunstância de o art. 37, § 10 da Constituição proibir a acumulação de proventos oriundos dos regimes previstos nos arts. 40, 42 e 142 com remuneração. Em situação diversa, o benefício previdenciário aplicável à interessada pautar-se-ia pela sistemática do art. 201 da Constituição, como se lê no seguinte trecho da sentença reclamada: "Não ocorre o alegado óbice à cumulação de proventos e salário, pois o § 10 do art. 37 remete expressamente às aposentadorias previstas nos artigos 40, 42 e 142, da Constituição Federal, que não se confundem com o benefício previdenciário do Regime Geral de Previdência Social, fixado no art. 201." (Fls. 139). Assim, e sem prejuízo de exame mais aprofundado por ocasião do julgamento de mérito, ainda não está plenamente caracterizada a identidade entre o precedente indicado e a situação retratada na decisão reclamada.
O entendimento de que não é vedada a acumulação de emprego público com proventos do INSS, pois, é harmônico com a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a exemplo dos julgados acima. No mesmo sentido é ainda o acórdão prolatado no RE 387269, julgado em 04/11/2004, além de diversos julgamentos monocráticos prolatados em Reclamações, estes últimos bem recentes, indicando que mesmo após a ADI 1770, predomina tal entendimento no Supremo. Exemplificamos abaixo.
O Ministro Ricardo Lewandowski tem decidido na mesma senda, como nas Reclamações 8.246 e 7.982, esta última parcialmente transcrita:
Com efeito, dispõe ao art. 37, § 10, da Constituição que 'é vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração' (grifei). Ora, o benefício previdenciário percebido pelos interessados está embasado no art. 201, § 7º, do Texto Constitucional, o que afasta a cumulação vedada. Esse entendimento está em conformidade com a jurisprudência desta Casa, conforme se observa do julgamento do RE 387.269/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, em que consignou: 'O Município confere à norma apontada como infringida, ou seja, ao § 10 do artigo 37 da Constituição Federal, alcance que o dispositivo não tem. Como consta em bom vernáculo no texto constitucional, 'é vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração". Vale dizer que, consoante bem decidiu o Tribunal de origem, a glosa diz respeito à acumulação de proventos decorrentes da aposentadoria como servidor público, considerado o regime específico e remuneração do novo cargo. A recorrida aposentou-se pelo regime geral de previdência social, não havendo, assim, a impossibilidade de assumir o novo cargo. Pouco importa que haja sido servidora do Município. À luz do texto constitucional, cumpre perquirir a fonte dos proventos, que, iniludivelmente, não está nos cofres públicos. Isso posto, nego provimento ao agravo regimental (art. 21, § 1º, do RISTF). (Reclamação 7982 AgR, julgado em 29/7/2009, relator Ministro Ricardo Lewandowski)
Também o Ministro Ayres Britto julga no mesmo sentido, registrando que tal entendimento coincide com aquele fixado pelo Supremo Tribunal no julgamento da ADI 1.721, de sua relatoria:
Rcl 9034 MC / SP - SÃO PAULO - MEDIDA CAUTELAR NA RECLAMAÇÃO - Relator(a): Min. CARLOS BRITTO - DJe-184 PUBLIC 30/09/2009 (...).
5. No caso, não tenho como presentes os requisitos necessários à concessão da medida liminar. É que, neste juízo provisório, concluo que, na ADI 1.770, este Supremo Tribunal Federal nada decidiu sobre a possibilidade de acumulação de proventos do regime geral de previdência social com salários pagos pelo empregador público. (...)
7. Bem vistas as coisas, o Relator não se posicionou sobre a possibilidade de acumulação do benefício de aposentadoria pago pelo regime geral de previdência social (art. 202 da CF) com a remuneração do emprego público. E não o fez porque a
inconstitucionalidade do § 1º do art. 453 da CLT estaria na premissa, ínsita ao dispositivo legal, de que a aposentadoria espontânea dos empregados públicos rompe automaticamente seus vínculos empregatícios. Tanto é assim que os Ministros Joaquim Barbosa (ele próprio o Relator da ADI 1.770) e Ricardo Lewandowski indeferiram medidas liminares, respectivamente, nas Rcl’s 7.733 e 8.246, in verbis: (...)
9. Cuida-se, por fim, de entendimento que coincide com aquele fixado por este nosso Supremo Tribunal no julgamento da ADI 1.721, de minha relatoria: "4. O direito à aposentadoria previdenciária, uma vez objetivamente constituído, se dá no âmago de uma relação jurídica entre o segurado do Sistema Geral de Previdência e o Instituto Nacional de Seguro Social. Às expensas, portanto, de um sistema atuarial-financeiro que é gerido por esse Instituto mesmo, e não às custas desse ou daquele empregador" (grifei).
10. Ante o exposto, indefiro a liminar, sem prejuízo de uma mais detida análise quando do julgamento do mérito.
Adotando a mesma ótica, o Ministro Gilmar Mendes:
Rcl 8484 / SC - SANTA CATARINA - RECLAMAÇÃO - Relator(a): Min. GILMAR MENDES - Julgamento: 06/12/2010 Publicação - DJe-243 DIVULG 13/12/2010 PUBLIC 14/12/2010
DECISÃO: Trata-se de reclamação constitucional, com pedido de medida liminar, ajuizada pela Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (CASAN) contra ato da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região que, ao decidir pela aplicação de multa de 40%, além de aviso prévio indenizado e seus reflexos, teria descumprido a decisão do Supremo Tribunal Federal proferida na ADI 1.770, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 1.12.2006, cuja ementa dispõe: (...) A decisão reclamada concluiu que a aposentadoria espontânea do empregado, ainda que o empregador seja sociedade de economia mista ou empresa pública, não encerra, por si só, o vínculo laboral.Essa decisão está de acordo com a orientação firmada nesta Corte tanto na ADI 1.770, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 1.12.2006, como na ADI 1.721, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ayres Britto, DJe 29.6.2007. (...) Ante o exposto, nego seguimento à reclamação, ficando prejudicado o pedido de medida liminar (art. 21, § 1º, RISTF). (...)
A Ministra Carmen Lúcia, em que pese, por questões processuais, tenha indeferido liminar onde pretendida a reintegração do trabalhador junto ao Município de Manduri, tratou de registrar seu posicionamento quanto ao mérito de forma similar:
RECLAMAÇÃO. CUMULAÇÃO DE PROVENTOS DE APOSENTADORIA E REMUNERAÇÃO. ALEGADO DESCUMPRIMENTO DO QUE DECIDIDO NAS AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE NS. 1.721/DF E 1.770/DF. AUSÊNCIA DE IDENTIDADE MATERIAL. USO DA RECLAMAÇÃO COMO SUCEDÂNEO DE RECURSO. RECLAMAÇÃO À QUAL SE NEGA SEGUIMENTO. (...)
4. O direito à aposentadoria previdenciária, uma vez objetivamente constituído, se dá no âmago de uma relação jurídica entre o segurado do Sistema Geral de Previdência e o Instituto Nacional de Seguro Social. Às expensas, portanto, de um sistema atuarial-financeiro que é gerido por esse Instituto mesmo, e não às custas desse ou daquele empregador.
5. O Ordenamento Constitucional não autoriza o legislador ordinário a criar modalidade de rompimento automático do vínculo de emprego, em desfavor do trabalhador, na situação em que este apenas exercita o seu direito de aposentadoria espontânea, sem cometer deslize algum.
6. A mera concessão da aposentadoria voluntária ao trabalhador não tem por efeito extinguir, instantânea e automaticamente, o seu vínculo de emprego. (...)
(Rcl 10971 / SP - SÃO PAULO – RECLAMAÇÃO - Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA - Julgamento: 29/11/2010)
Em decorrência, parece-nos inafastável o entendimento de que a aposentadoria espontânea concedida pelo INSS a servidor celetista ou empregado público não importa em extinção automática do contrato de emprego, não havendo falar em acumulação vedada, já que no §10º do art. 37 da CRFB foi propositalmente omitida referência ao art. 201 da Carta, denotando que o constituinte não pretendeu que o regime geral de previdência social integrasse a proibição, estando no mesmo sentido a jurisprudência dominante do Tribunal Superior do Trabalho e do próprio Supremo Tribunal Federal.