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Fukushima (in)felizmente continua sendo a bola da vez...

Agenda 03/05/2011 às 16:36

Já tivemos a oportunidade de nos manifestar em artigo anterior acerca do sensacionalismo midiático no evento japonês [01]. Perpetua-se a indignação. Decorrido mais de três semanas do trágico evento da natureza que se abateu sob a cidade de Fukushima (11 de março passado) as ponderações da imprensa continuam a alarmar a população mundial, incluindo a brasileira.

Esta semana matérias veiculadas em vários meios de comunicação informaram que "o iodo radioativo [02] na água do mar, a 300 metros da usina, subiu para 4,4 mil vezes o teor aceitável no dia 31 (de março)" [03]. - inclusive revista Carta Capital de 06 de abril de 2011, fls. 19. Em 05 deste mesmo mês a imprensa fala em um aumento de fabulosos cinco milhões de vezes! Para o leitor leigo que índice assustador seria este?

Em que pese toda a tentativa de impingir medo e descrédito com a utilização da energia nuclear, como freio à alternatividade de produção elétrica, por exemplo, a crise levantada não consegue ser instaurada com efetividade. Por quê?

Porque segurança de instalação nuclear é impensável para o entendimento do homem médio. Os estudos em que se baseiam a proteção radiológica nestes ambientes, sequer podem ser comparados com quaisquer outras estruturas de engenharia, ainda que de grande porte, como acontecem em construções de pontes, viadutos ou estruturas faraônicas da arquitetura mundial. [04]

Onde, portanto, começa a realidade dos fatos e onde terminam as suposições levantadas pela mídia?

Por primeiro, há de se lembrar, que atualmente no Japão encontram-se autoridades e agências internacionais capacitadas para analisar todos os dados gerados pela energia nuclear deslocada pela região [05]; logo, informações de que não há mortos ou doentes em decorrência do vazamento de energia nuclear, efetivamente, não pode ser mentiroso ou camuflado.

Em função destas ordinárias avaliações, há nas colocações midiáticas uma apresentação de informações com responsabilidade?

Quer nos parecer que não.

Ilustremos. Aristóteles já tratava do assunto da responsabilidade há aproximadamente 500 anos a.C. Na época em que escreveu sobre a República entendia a necessidade do fator res-publica x virtù. Guardadas as proporções, épocas e principais vertentes do estudo avocado, desde a conscientização de a república aristotélica sempre houve a necessidade do imperativo absoluto da garantia, ou de que os "informadores" dentro de um estado republicano (democrático em nossos dias) devesse respeitar e preservar de maneira plena e integral os direitos fundamentais dos cidadãos. E o direito à informação verdadeira, como um deles, desde os mais remotos tempos, sempre foi evidenciado.

Claro que todos estes critérios sócio-jurídicos evoluíram com o decorrer do tempo, como é o caso da cidadania em suas diversas fases, partindo das idéias de Marshall e alcançando uma cidadania "forte", que luta por seus direitos. Em nossos dias, ciente estamos, de nossa realidade muito mais complexa. De qualquer maneira, como podemos contrapor dignamente veracidade e atuais informações veiculadas sobre o tema, cotejando-as com um direito consagrado constitucionalmente à informação? Onde fica a tal virtude aristotélica em nossos dias?

A virtude, como idéia maior de responsabilidade, talvez possa sim ser aplicada aos moradores idosos da região do acidente, que se negam a sair de suas residências pelo simples fato de acreditarem que se assim o fizerem estarão agindo contra a própria consciência nacional. Em seu íntimo, o afastamento da região ensejaria um descrédito no governo e na proteção que confere o atributo democrático ao regime nipônico. [06] Aristóteles haveria de se contentar com estes moradores!

Se em território japonês a manifestação do pensamento se reveste de intrínseco caráter de responsabilidade, a mídia ao redor do mundo continua esperando a oportunidade de informar degeneração humana [07]advinda do rompimento da estrutura física da usina nuclear japonesa.

Esta hipótese, é claro, sabemos ser bastante possível de acontecer, logicamente não nos escapa, não seriamos ingênuos a tal nível, mas os estudos dosimétricos efetuados pela AIEA vêm corroborando dia a dia com nossa postura de que a radiação está em um nível perigoso, mas não será capaz de causar problemas de saúde à população local nem a curto, médio ou longo prazo. [08]

Informações alarmantes à parte, o fato de serem encontrados alimentos com níveis de radiação alterados do outro lado do país também, não necessariamente, deve ser causa de alarme da população [09]. Isto porque tais níveis não ensejam, pelo menos até o momento, quaisquer problemas de saúde aos consumidores. Todos os níveis medidos até o momento, a par de elevados, não ensejam intervenção medicamentosa ou hospitalar alguma na população envolvida.

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Felizmente não somos voz única em meio aos acontecimentos atuais. Richard Wakeford, epidemiologista da universidade de Manchester assevera: As pessoas estão preocupadas com o que até o momento são níveis baixos de radioatividade, mas os problemas reais são lidar com o terremoto e o tsunami. Conforme nossa colocação em diversas oportunidades: o pânico gerado pela questão nuclear no Japão está desviando a atenção das autoridades de uma possível crise humanitária, que pode envolver as mais de 500 mil pessoas que estão vivendo em abrigos temporários, que enfrentam chuva, neve e temperaturas de abaixo de zero em ginásios lotados, templos e escolas públicas e que não possuem sistemas de aquecimento suficientes, conseqüentemente, continuam morrendo.

Por fim, ao contrário do que se possa parecer, em decorrência do lastimável incidente natural ocorrido, mantemo-nos firme em nossa postura acerca da utilização da energia nuclear no território brasileiro pelos inúmeros fatores apontados anteriormente, dentre eles, apresentamos, agora, um outro: - a segurança redobrada que se impõe quando de sua aplicação, seja a que título for. – Lembremo-nos: A energia nuclear tem um histórico invejável de segurança se comparada com as mortes de outros setores energéticos.


Notas

  1. Fukushima: a valoração midiática e a tragédia humana. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2831, 02 abr. 2011. <http:/jus.com.br/artigos/18815>.
  2. O isótopo 131 do iodo se degrada à metade em oito dias, pelo que o risco de afetar a vida marinha na região é pequeno, segundo a Agência de Segurança Nuclear. Apesar disso, está proibido pescar nas águas próximas à central.
  3. A amostra recolhida no mar perto da central nuclear na quarta-feira, 31/03/11, mostrou uma concentração de iodo-131 que ultrapassa 4.385 vezes o limite legal e, desde então, a Tepco (Tokyo Electric Power, empresa que gere a central de Fukushima) deixou de divulgar resultados, depois de detectar erros nos seus programas de medição.
  4. Os materiais de construção utilizados na construção de estruturas de proteção de reatores nucleares são de primeira qualidade, os métodos construtivos, especialmente cuidados e os projetos estruturais utilizam coeficientes de segurança muito acima da média. Além disso, as medidas de segurança passiva e ativa presentes numa central nuclear e respectivos sistemas críticos têm um grau de redundância superior a qualquer estrutura feita pelo homem.
  5. No caso da central de Fukushima foi precisamente a alimentação dos sistemas de arrefecimento de emergência que falhou. Devido ao sismo e ao impacto do Tsunami, os geradores auxiliares deixaram de funcionar, provocando a interrupção do funcionamento das bombas e a conseqüente parada da circulação de água no interior das tubulações de arrefecimento de alguns reatores. Isto conduziu ao aquecimento progressivo dos núcleos e aumento da pressão no interior. As várias explosões ocorridas resultaram desse aumento de pressão.
  6. As autoridades elevaram o balanço oficial de vítimas do sismo para mais de onze mil mortos, há, ainda, milhares de desaparecidos que sequer podem ser contabilizados.
  7. Além dos nove moradores, cuja contaminação já foi confirmada, há cerca de 60 pessoas que poderiam ter sido contaminadas enquanto esperavam o helicóptero no campo esportivo de uma escola em Futaba (Fukushima). Em nenhum deles há risco de morte.
  8. A AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) recomendou ao Japão que amplie a retirada de moradores da região próxima à usina. O diretor do Departamento de Segurança Nuclear da AIEA, Denis Flory, afirmou ontem que as análises feitas na região de Iitate mostram excesso de radioatividade numa área localizada a 40 quilômetros da Usina Nuclear de Fukushima, no nordeste do Japão.
  9. O governo japonês proibiu a venda de leite e dois tipos de verduras produzidos nas quatro prefeituras (estados) próximas à central de Fukushima, devido a um nível alto de radioatividade. Apesar de descartada qualquer contaminação em tais níveis os critérios de segurança e prudência são exigidos.
Sobre o autor
Efren Fernandez Pousa Junior

Mestrando em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, pós-graduado em Direito Penal pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo, pós-graduado em Direito Processual Civil pelo Centro Universitário Salesiano, Bacharel em Direito, Bacharel e Licenciado em Física Pura. Advogado inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil. Membro da Instituição Educacional "Núcleo Diretriz de Estudos da Filosofia" . Técnico em Edificações formado pela Escola Técnica Federal de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

POUSA JUNIOR, Efren Fernandez. Fukushima (in)felizmente continua sendo a bola da vez.... Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2862, 3 mai. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19030. Acesso em: 23 nov. 2024.

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