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Ação direta de in/constitucionalidade dos tratados e acordos internacionais

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Apresentam-se os sistemas de controle de constitucionalidade de normas decorrentes da inserção de institutos jurídicos provenientes dos tratados e acordos internacionais.

RESUMO: Pretende-se com este trabalho apresentar os sistemas de controle de constitucionalidade de normas decorrentes da inserção de institutos jurídicos provenientes dos tratados e acordos internacionais em vista a ordem jurídica interna, delineada pela Constituição brasileira. Almeja-se, pois, esboçar de modo mais específico o controle de constitucionalidade por meio da Ação Direta atentando-se, no entanto, para o princípio hierárquico que os tratados e acordos internacionais ocupam na pirâmide jurídica brasileira, assim como, indicar os pontos de sustentação do controle de constitucionalidade, visando edificar um posicionamento consistente sobre o tema, aí considerando o pensamento doutrinário e jurisprudencial prevalecente.

Palavras-chaves: ação, tratado internacional, controle de constitucionalidade.


1. Introdução

Inicialmente insta destacar que as ações declaratórias de in/constitucionalidade se revelam como verdadeiro instrumento de controle de constitucionalidade em vista à produção de leis, decretos e atos outros, legislativos ou administrativos emanados do Poder Público. Assim considerados, os tratados e acordos internacionais se revestem de conteúdo jurídico capaz de afetar os preceitos e princípios constitucionalmente assegurados, e como tal se submetem ao controle de constitucionalidade por meio de ação direta, em razão da supremacia da Constituição brasileira.

Dada a supremacia da Constituição federal, toda autoridade só nela encontra fundamento e só ela confere poderes e competências governamentais em qualquer de suas esferas, de modo que nenhuma dos seus Poderes constituídos são soberanos, porque todos são limitados, expressa ou implicitamente, pelas normas positivadas da lei fundamental. Assim, as autoridades constituídas exercem suas atribuições nos termos e limites estabelecidos na Carta Política, sobretudo, por se tratar de Constituição rígida, como é a lei fundamental e suprema do Estado brasileiro.

Com isto, o princípio da supremacia requer que todas as instituições jurídicas se conformem com os princípios e preceitos da Constituição, cuja conformidade, "não se satisfaz apenas com a atuação positiva de acordo com a constituição. Exige mais, pois omitir a aplicação de normas constitucionais, quando a Constituição assim a determina, também constitui conduta inconstitucional" [01].

Destarte, todas as normas que integram o ordenamento jurídico brasileiro só serão válidas se se conformarem com as normas da Constituição Federal.

Para dar sustentação a essa garantia, a Constituição Federal, reconhece em seu artigo 102, I, a, e III, a, b, e c, e artigo 103 e seus parágrafos 1º a 3º, as inconstitucionalidades por ação e omissão [02].

Desse modo, a ação direta de inconstitucionalidade por omissão importa no reconhecimento judicial do estado de inércia do Poder Público, conferindo ao Supremo Tribunal Federal, unicamente, o poder de cientificar o legislador inadimplente, para que este adote as medidas necessárias à concretização do texto constitucional. Não assiste ao Supremo Tribunal Federal, contudo, em face dos próprios limites fixados pela Carta Política em termos de inconstitucionalidade por omissão, a prerrogativa de expedir provimentos normativos com o objetivo de suprir a inatividade do órgão legislativo inadimplente.

De outra parte, a ação de inconstitucionalidade por ação decorre da produção de atos legislativos ou administrativos que contrariem normas ou princípios da constituição.

Segundo José Afonso da Silva [03] (2010:47), o fundamento dessa inconstitucionalidade está no fato de que

do princípio da supremacia da constituição resulta o da compatibilidade vertical das normas da ordenação jurídica de um país, no sentido de que as normas de grau inferior somente valerão se forem compatíveis com as normas de grau superior, que é a Constituição. As que não forem compatíveis com ela são inválidas, pois a incompatibilidade vertical resolve-se em favor das normas de grau mais elevado, que funcionam como fundamento de validade das inferiores.

O objeto desta modalidade de ação decorre da produção de atos legislativos ou administrativos que contrariem normas ou princípios da Constituição. O fundamento da inconstitucionalidade está no fato de que do princípio da supremacia constitucional resulta o da compatibilidade vertical das normas da ordenação jurídica de um país, no sentido de que as normas de grau inferior somente valerão se forem compatíveis com as normas de grau superior, que é a Constituição. As que não forem compatíveis com ela são inválidas, pois a incompatibilidade vertical resolve-se em favor das normas de grau mais elevado, que funcionam como fundamento de validade das inferiores. [04]

Cabe destacar que a incompatibilidade vertical de normas inferiores com a constituição é o que, tecnicamente, se chama de inconstitucionalidade das leis ou dos atos do Poder Público, e que se manifesta sob os aspectos: i) formal, quando tais normas são provenientes de autoridades incompetentes ou em desacordo com formalidades ou procedimentos estabelecidos pela Constituição; ii) material, quando o conteúdo das leis ou atos contraria preceito ou princípio da Constituição. Essa incompatibilidade não deve perdurar, porquanto contrasta com o princípio da coerência e harmonia das normas do ordenamento jurídico, entendido, por isso mesmo, como a reunião de normas vinculadas entre si por uma fundamentação unitária. [05]

Com efeito, deve-se partir dos conhecimentos pelos quais os tratados internacionais se transformam em Decretos e ingressam no ordenamento jurídico com status de lei ordinária federal, e desse modo, "não existe hierarquia entre as normas ordinárias de direito interno e as decorrentes de atos ou tratados internacionais." [06] . Assim como as demais normas infraconstitucionais, os Decretos, que internalizaram os tratados internacionais, estão sujeitos ao controle concentrado e difuso de sua constitucionalidade, assim como qualquer outra espécie normativa [07].

Isso se deve ao fato de que os compromissos assumidos pelo Brasil em virtude de atos, tratados, pactos ou acordos internacionais de que seja parte, devidamente ratificados pelo Congresso Nacional e promulgados e publicados pelo Presidente da República, apesar de ingressarem no ordenamento jurídico constitucional (CF, art. 5º, § 2º), não minimizam o conceito de soberania do Estado-povo na elaboração de sua constituição, devendo, pois, sempre serem interpretados com as limitações impostas pela Constituição.

Como decorrência da supremacia das normas constitucionais em relação aos tratados e atos internacionais, mesmo que devidamente ratificados pelo Congresso Nacional (CF, art. 49, I) e promulgados e publicados pelo Presidente da República (CF, art. 84, VIII), visualiza-se plena possibilidade de incidência do controle de constitucionalidade [08].

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Para melhor esclarecimento cumpre-nos lembrar que o estudo sistematizado sobre controle de constitucionalidade das normas classifica-se o controle em: preventivo e repressivo. O preventivo ocorre enquanto ainda não há espécie normativa e o repressivo atua sobre a norma, pronta e acabada. Para tanto, discute-se acerca de qual seria o momento genésico das normas e neste ponto, existem duas correntes quanto a este momento: a primeira assegura que as normas entram em vigor no ordenamento jurídico a partir da publicação oficial; a segunda corrente que é minoritária, assevera que com a promulgação a norma já teria sido concluída e estaria apta a gerar seus efeitos, mesmo antes de sua publicação.

Todavia, numa interpretação literal do artigo 84, I, CF, a norma somente terá a sua eficácia na ordem jurídica interna com a publicação do Decreto, pelo Presidente da República, por ser esse ato a última fase do processo de aceitação da norma jurídica oriunda dos tratados e acordos internacionais [09].

O controle preventivo da constitucionalidade das normas, de acordo com a primeira corrente, que é a majoritária, incide até a publicação da norma. No que tange ao controle repressivo, este ocorrerá a partir da publicação.

Quanto aos tratados internacionais, que depois de internalizados transformam-se em Decretos, são uma espécie normativa assim como qualquer outra norma e padecem da mesma indagação, isto é, a partir de quando passam a gerar efeitos no ordenamento jurídico interno - se antes ou depois da publicação do Decreto.

A esse respeito existe uma discussão doutrinária, comum no Direito Internacional, isto é, sobre qual o momento de vigência dos tratados internacionais no ordenamento jurídico brasileiro, se antes da publicação do Decreto ou se depois de sua publicação no órgão oficial. A corrente minoritária defende que, após a ratificação e a sua promulgação, os Decretos já passam a gerar efeitos, antes mesmo de sua publicação, podendo ser aplicados a partir dessa data; isto porque já teria havido a publicidade do tratado internacional, pela publicação do Decreto Legislativo, na terceira fase do processo de internalização [10].

Outra corrente, a majoritária, defende que o Decreto só passa a gerar efeitos jurídicos após a publicação, como ocorre com qualquer outra norma do nosso ordenamento jurídico interno.

A propósito, Alexandre de Moraes [11] assevera que "com a promulgação do tratado através de decreto do Chefe do Executivo recebe esse ato normativo a ordem de execução, passando, assim, a ser aplicado de forma geral e obrigatória." Esse autor defende o posicionamento no qual, após a promulgação do Decreto, pelo Presidente da República, este adquire vigência no ordenamento jurídico interno brasileiro, não precisando aguardar a publicação pelo órgão federal [12].

O conteúdo de direito material nos tratados internacionais, devidamente aprovado pelo Poder Legislativo e promulgado pelo Presidente da República, transforma-se em Decreto e ingressa no ordenamento jurídico brasileiro como ato normativo infraconstitucional.

Pela leitura do texto constitucional, extrai-se que, depois que o tratado internacional é internalizado por meio do Decreto, este adquire status de lei lato sensu, pois não há disposição expressa na Constituição brasileira que mencione a sua hierarquia no ordenamento jurídico; ou seja, se estes tratados estariam abaixo das leis ou a elas se sobreporiam em caso de conflito; se as revogariam ou se seriam por elas revogados [13].

Na verdade, os tratados internacionais, mesmo já tendo passado por controles prévios de sua constitucionalidade durante as fases de negociação [14], assinatura e de referendo [15], pode estar eivado de vícios, que para o nosso sistema jurídico são vícios graves e que devem ser expurgados por meio de um controle eficaz e célere.

Com isto, arrazoado posicionamento do Supremo Tribunal Federal brasileiro, na apreciação da constitucionalidade, seja por via direta ou indireta, não faz diferença entre os Decretos, cujo conteúdo seja tratado internacional ou de leis nos processos de controle.

O Supremo Tribunal Federal tem, excepcionalmente, admitido ação direta de inconstitucionalidade em face de Decreto, desde que este seja um Decreto autônomo, que não seja um Decreto que regulamente lei. Desta forma, os Decretos presidenciais (CF, art. 84, IV) podem ter seu conteúdo apreciado em sede de ADIn [16]. Assegura o STF que:

(...) não havendo lei anterior que possa ser regulamentada, qualquer disposição sobre o assunto tende a ser adotada em lei formal. O decreto seria nulo, não por ilegalidade, mas por inconstitucionalidade, já que supriu a lei onde a Constituição exige [17].

De outra parte, os Decretos, cujo conteúdo seja tratado internacional, são autônomos e não há qualquer discussão sobre isso. A discussão apassivada, como ficou demonstrado, pelo STF, diz respeito aos Decretos que não são autônomos, aqueles que regulamentam leis. Neste caso, havendo disparidade de conteúdo entre a lei e o seu decreto regulamentador, não se trata de inconstitucionalidade, mas, sim, de conflito de legalidade entre a lei e o seu decreto regulamentador [18].

A ação declaratória de constitucionalidade, por sua vez, pressupõe controvérsia a respeito da constitucionalidade da lei, o que é aferido diante da existência de um grande número de ações onde a inconstitucionalidade da lei é impugnada. Logo, essa modalidade de ação se caracteriza como meio de paralisação de debates em torno de questões jurídicas de interesse coletivo, exatamente porque seu exercício pressupõe a existência de decisões generalizadas em processos concretos reconhecendo a inconstitucionalidade de lei em situações opostas a interesses governamentais. Visa, pois, essa ação, solucionar esse estado de controvérsia generalizado via da coisa julgada vinculante, pela inconstitucionalidade da lei, com o que se encerram os processos concretos em favor dos autores, quer reforme essas decisões com a declaração da constitucionalidade.


2. Modos de aplicação dos princípios constitucionais aos Tratados e Acordos Internacionais

Nesta senda, surge uma questão relevante para a compreensão do que se está discutindo, que é a hermenêutica constitucional. É no Informativo 158, do Supremo Tribunal Federal, que faz menção ao tipo de interpretação utilizada pelos Tribunais pátrios para elidir a norma inconstitucional do ordenamento jurídico brasileiro. Mas é o eminente professor Vicente de Paulo Barreto, em seu artigo intitulado "Da Interpretação à Hermenêutica Constitucional", pp. 369-370, que define a hermenêutica aplicada da seguinte forma:

A palavra hermenêutica origina-se do latim tardio, hermeneuticus, que por sua vez deita sua raiz no grego, hermeneuem. A palavra como em latim, refere-se às atividades da inteligência humana que, de uma forma ou de outra, lembram as façanhas do deus grego Hermes. Deus de Segunda categoria, não se posicionando no nível mais alto da hierarquia do Olimpo, Hermes, entretanto, representou no mundo mitológico helênico qualidades e características, que também podem ser encontradas na hermenêutica contemporânea. Desde as primeiras vinte e quatro horas de sua vida, Hermes, filho de Zeus e da ninfa Maia, demonstrou habilidades que o diferenciaram dos demais deuses gregos. No dia de seu nascimento, fugiu do berço e, encontrando uma tartaruga, matou-a e fabricou a primeira lira; no mesmo dia, chegou a Piréia, onde roubou 50 cabeças de gado pertencentes a Apolo, matou duas delas e fez o primeiro sacrifício religioso, com carne animal, oferecido aos deuses. Hermes foi, também, o emissário de importantes missões divinas, tendo sido ele que, como mensageiro de Zeus, transmitiu o ultimato a Prometeus. Como mensageiros dos deuses, Hermes tinha três qualidades: conhecia a língua dos deuses e a língua dos homens e, mais importante, sabia como interpretar a vontade dos deuses. Por todos os seus feitos, Hermes é um deus hábil, mais interessado em convencer do que em impor a sua vontade, sendo conhecido por seus dotes de disfarce, mágicos, de engano, e por isso foi chamado nos hinos homéricos de príncipe dos ladrões. Era, portanto, um mensageiro qualificado que servia de canal de comunicação entre o Olimpo e o mundo dos homens levando para esses as mensagens, as notícias e as ordens dos deuses. Hermes é, portanto, um deus que para bem cumprir a sua missão conhecia múltiplas técnicas e as artes da magia. Trata-se, portanto, de um personagem habilidoso em esconder seus reais objetivos, como usar sandálias para disfarçar as marcas de seus pés. Exatamente, por recorrer mais à inteligência do que à força, Hermes é o menos guerreiro dos deuses mitológicos, preferindo a persuasão ao uso das armas, sendo com frequência considerado como o patrono dos oradores.

Com a merecida persuasão, o STF, apreciando a constitucionalidade da Convenção de n. 158 da Organização Internacional do Trabalho, concluiu que essa Convenção deveria ser interpretada conforme a Constituição [19]. Com efeito, a orientação da Corte suprema tem como base o significado da interpretação conforme, e, assim, pode-se dizer que:

(...) no caso de normas com várias significações possíveis, deverá ser encontrada a significação que apresente conformidade com as normas constitucionais, evitando sua declaração de inconstitucionalidade e consequente retirada do ordenamento jurídico [20].

Há que se destacar que a interpretação conforme somente será possível quando a norma apresentar vários significados, uns compatíveis com as normas constitucionais e outros a elas contrários. Tem de haver um tipo de espaço de decisão para que se possa escolher qual a melhor opção a se adotar [21]. Por esta razão, não pode haver contrariedade do texto analisado frente à Constituição, pois o Judiciário não pode suplantar a função legislativa de forma a criar um novo texto legal. Caso ocorra esta contrariedade, o Judiciário deve, sim, declarar a inconstitucionalidade da norma contrária à Constituição. A finalidade desta técnica de interpretação é possibilitar a manutenção no ordenamento jurídico brasileiro das espécies normativas editadas pelo Poder competente que não sejam integral e expressamente incompatíveis com a Constituição.

Como dito, a interpretação conforme, bem ilustrada pelo STF quando do julgamento da ação de constitucionalidade da Convenção nº 158 da OIT, conforme a decisão initio littis:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - CONVENÇÃO Nº 158/OIT - PROTEÇÃO DO TRABALHADOR CONTRA A DESPEDIDA ARBITRÁRIA OU SEM JUSTA CAUSA - ARGÜIÇÃO DE ILEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DOS ATOS QUE INCORPORARAM ESSA CONVENÇÃO INTERNACIONAL AO DIREITO POSITIVO INTERNO DO BRASIL (DECRETO LEGISLATIVO Nº 68/92 E DECRETO Nº 1.855/96 - POSSIBILIDADE DE CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE DE TRATADOS OU CONVENÇÕES INTERNACIONAIS EM FACE DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA - ALEGADA TRANSGRESSÃO AO ART. 7º, I, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AO ART. 10, I DO ADCT/88 - REGULAMENTAÇÃO NORMATIVA DA PROTEÇÃO CONTRA A DESPEDIDA ARBITRÁRIA OU SEM JUSTA CAUSA, POSTA SOB RESERVA CONSTITUCIONAL DE LEI COMPLEMENTAR - CONSEQUENTE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DE TRATADO OU CONVENÇÃO INTERNACIONAL ATUAR COMO SUCEDÂNEO DA LEI COMPLEMENTAR EXIGIDA PELA CONSTITUIÇÃO (CF, ART. 7º, I) - CONSAGRAÇÃO CONSTITUCIONAL DA GARANTIA DE INDENIZAÇÃO COMPENSATÓRIA COMO EXPRESSÃO DA REAÇÃO ESTATAL À DEMISSÃO ARBITRÁRIA DO TRABALHADOR (CF, ART. 7º, I, C/C O ART. 10, I DO ADCT/88) - CONTEÚDO PROGRAMÁTICO DA CONVENÇÃO Nº 158/OIT, CUJA APLICABILIDADE DEPENDE DA AÇÃO NORMATIVA DO LEGISLADOR INTERNO DE CADA PAÍS - POSSIBILIDADE DE ADEQUAÇÃO DAS DIRETRIZES CONSTANTES DA CONVENÇÃO Nº 158/OIT ÀS EXIGÊNCIAS FORMAIS E MATERIAIS DO ESTATUTO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO - PEDIDO DE MEDIDA CAUTELAR DEFERIDO, EM PARTE, MEDIANTE INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO. PROCEDIMENTO CONSTITUCIONAL DE INCORPORAÇÃO DOS TRATADOS OU CONVENÇÕES INTERNACIONAIS. - É na Constituição da República - e não na controvérsia doutrinária que antagoniza monistas e dualistas - que se deve buscar a solução normativa para a questão da incorporação dos atos internacionais ao sistema de direito positivo interno brasileiro. O exame da vigente Constituição Federal permite constatar que a execução dos tratados internacionais e a sua incorporação à ordem jurídica interna decorrem, no sistema adotado pelo Brasil, de um ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação de duas vontades homogêneas: a do Congresso Nacional, que resolve, definitivamente, mediante decreto legislativo, sobre tratados, acordos ou atos internacionais (CF, art. 49, I) e a do Presidente da República, que, além de poder celebrar esses atos de direito internacional (CF, art. 84, VIII), também dispõe - enquanto Chefe de Estado que é - da competência para promulgá-los mediante decreto. O iter procedimental de incorporação dos tratados internacionais - superadas as fases prévias da celebração da convenção internacional, de sua aprovação congressional e da ratificação pelo Chefe de Estado - conclui-se com a expedição, pelo Presidente da República, de decreto, de cuja edição derivam três efeitos básicos que lhe são inerentes: (a) a promulgação do tratado internacional; (b) a publicação oficial de seu texto; e (c) a executoriedade do ato internacional, que passa, então, e somente então, a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno. Precedentes. SUBORDINAÇÃO NORMATIVA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS À CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. - No sistema jurídico brasileiro, os tratados ou convenções internacionais estão hierarquicamente subordinados à autoridade normativa da Constituição da República. Em consequência, nenhum valor jurídico terão os tratados internacionais, que, incorporados ao sistema de direito positivo interno, transgredirem, formal ou materialmente, o texto da Carta Política. O exercício do treaty-making power, pelo Estado brasileiro - não obstante o polêmico art. 46 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (ainda em curso de tramitação perante o Congresso Nacional) -, está sujeito à necessária observância das limitações jurídicas impostas pelo texto constitucional. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DE TRATADOS INTERNACIONAIS NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO. - O Poder Judiciário - fundado na supremacia da Constituição da República - dispõe de competência, para, quer em sede de fiscalização abstrata, quer no âmbito do controle difuso, efetuar o exame de constitucionalidade dos tratados ou convenções internacionais já incorporados ao sistema de direito positivo interno. Doutrina e Jurisprudência. PARIDADE NORMATIVA ENTRE ATOS INTERNACIONAIS E NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS DE DIREITO INTERNO. - Os tratados ou convenções internacionais, uma vez regularmente incorporados ao direito interno, situam-se, no sistema jurídico brasileiro, nos mesmos planos de validade, de eficácia e de autoridade em que se posicionam as leis ordinárias, havendo, em consequência, entre estas e os atos de direito internacional público, mera relação de paridade normativa. Precedentes. No sistema jurídico brasileiro, os atos internacionais não dispõem de primazia hierárquica sobre as normas de direito interno. A eventual precedência dos tratados ou convenções internacionais sobre as regras infraconstitucionais de direito interno somente se justificará quando a situação de antinomia com o ordenamento doméstico impuser, para a solução do conflito, a aplicação alternativa do critério cronológico ("lex posterior derogat priori") ou, quando cabível, do critério da especialidade. Precedentes. TRATADO INTERNACIONAL E RESERVA CONSTITUCIONAL DE LEI COMPLEMENTAR. - O primado da Constituição, no sistema jurídico brasileiro, é oponível ao princípio pacta sunt servanda, inexistindo, por isso mesmo, no direito positivo nacional, o problema da concorrência entre tratados internacionais e a Lei Fundamental da República, cuja suprema autoridade normativa deverá sempre prevalecer sobre os atos de direito internacional público. Os tratados internacionais celebrados pelo Brasil - ou aos quais o Brasil venha a aderir - não podem, em consequência, versar matéria posta sob reserva constitucional de lei complementar. É que, em tal situação, a própria Carta Política subordina o tratamento legislativo de determinado tema ao exclusivo domínio normativo da lei complementar, que não pode ser substituída por qualquer outra espécie normativa infraconstitucional, inclusive pelos atos internacionais já incorporados ao direito positivo interno. LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA CONVENÇÃO Nº 158/OIT, DESDE QUE OBSERVADA A INTERPRETAÇÃO CONFORME FIXADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. - A Convenção nº 158/OIT, além de depender de necessária e ulterior intermediação legislativa para efeito de sua integral aplicabilidade no plano doméstico, configurando, sob tal aspecto, mera proposta de legislação dirigida ao legislador interno, não consagrou, como única consequência derivada da ruptura abusiva ou arbitrária do contrato de trabalho, o dever de os Estados-Partes, como o Brasil, instituírem, em sua legislação nacional, apenas a garantia da reintegração no emprego. Pelo contrário, a Convenção nº 158/OIT expressamente permite a cada Estado-Parte (Artigo 10), que, em função de seu próprio ordenamento positivo interno, opte pela solução normativa que se revelar mais consentânea e compatível com a legislação e a prática nacionais, adotando, em consequência, sempre com estrita observância do estatuto fundamental de cada País (a Constituição brasileira, no caso), a fórmula da reintegração no emprego e/ou da indenização compensatória. Análise de cada um dos Artigos impugnados da Convenção nº 158/OIT (Artigos 4º a 10).

Em outra decisão, na ADIN n. 1344-1/ES, o STF, por seu Relator, o Ministro Moreira Alves, assegura que a interpretação conforme "só é utilizável quando a norma impugnada admite, dentre as várias interpretações possíveis, uma que a compatibilize com a Carta Magna, e não quando o sentido da norma é unívoco" [22].

Para melhor entender o conceito de interpretação conforme, vale citar os ensinamentos de Canotilho, que diz haver a interpretação conforme [23],destacandoa interpretação conforme com redução de texto que ocorre quando se declara a inconstitucionalidade de qualquer expressão e, a partir disso, se retira do texto impugnado tal expressão de forma que o texto reduzido se torne compatível com a Constituição [24].

Desta forma, pelo entendimento do Acórdão proferido em sede da ADIn n. 1344-ES, supra citada, vê-se que o STF faz uso da técnica de hermenêutica constitucional consagrada pela doutrina internacional. A interpretação conforme também foi utilizada pelo STF para garantir a constitucionalidade da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho.

Sobre os autores
Benedito de Sousa Barbosa

Bacharel em Direito pela Universidade Estadual do Piauí, Especialista em Direito Público e Privado lato senso pela escola Superior da magistratura do estado do Piauí - ESMEPI em convênio com a Universidade Federal do Piauí, Advogado, Analista Judicial do Tribunal de Justiça do Piauí, Consultor Jurídico de Gabinete.

José James Gomes Pereira

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Piauí. Curso de Formação de Oficiais pela APMPE em Paudalho, Pernambuco. Especialista em Direito Processual Penal pela Universidade Federal do Ceará. Desembargador no e. Tribunal de Justiça do Estado do Piauí. Especialista em História Política do Piauí pela Universidade Estadual do mesmo estado. Professor Universitário. Mestre pela Universidade Católica de Brasília – UCB. Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universida del la Museo Argentino - UMSA e Pós-Doutorando em Direito Constitucional. Università deglí Studí Messína. Itália.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARBOSA, Benedito Sousa; PEREIRA, José James Gomes. Ação direta de in/constitucionalidade dos tratados e acordos internacionais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2873, 14 mai. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19067. Acesso em: 23 nov. 2024.

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