7. A questão da personalidade jurídica das Serventias Extrajudiciais e o problema da sujeição passiva na relação entre Fisco Municipal e Notários/Registradores
Analisando o tema, a questão primordial que se apresenta é: as Serventias Extrajudiciais possuem personalidade jurídica?
A jurisprudência dominante e atual do STJ [09], tem se posicionado no sentido de que os Cartórios Extrajudiciais são instituições administrativas, ou seja, entes sem personalidade, desprovidos de patrimônio próprio, razão pela qual, bem de ver, não possuem personalidade jurídica e não se caracterizam como empresa ou entidade, afastando-se, dessa forma, sua legitimidade passiva ad causam para responder pela ação de obrigação de fazer.
Assim, em nosso entendimento, todo lançamento tributário efetuado pelo Fisco Municipal que fizer constar a Serventia Extrajudicial como contribuinte do ISS, é nulo de pleno direito, posto que, como se viu, a Serventia não tem personalidade jurídica.
Mas - e isso é muito importante ser questionado - quem disse que quem deve ser inscrito no Cadastro Nacional das Pessoas Jurídicas é a Serventia e não o seu titular, ainda mais depois do entendimento pacificado de que o Cartório não tem personalidade jurídica?
Aqui também se faz necessário um parêntese, em relação a mais um equívoco de interpretação da Receita Federal do Brasil quanto ao tema.
Veja-se a propósito, o que prevê o art. 11, da Instrução Normativa nº1005, de 08 de fevereiro de 2010.
Art. 11. São também obrigados a se inscrever no CNPJ:
X - serviços notariais e registrais (cartórios), de que trata a Lei nº. 8.935, de 18 de novembro de 1994 (Grifos nossos).
Note-se bem. A própria Receita Federal do Brasil está a dizer e admitir, através de ato normativo expedido pelo respectivo Órgão Federal, que quem está obrigado à inscrição no Cadastro Nacional das Pessoas Jurídicas - CNPJ são os Serviços Notariais e Registrais.
Ora, e a quem a Constituição Federal, em seu art. 236, delegou tais serviços? Ao titular da Serventia Extrajudicial, que é quem recebe a delegação do Poder Público para a exploração dos Serviços Notariais e de Registros Públicos. Logicamente, então, é o titular do Estabelecimento e não à Serventia, que deve ser inscrito no Cadastro Nacional das Pessoas Jurídicas – CNPJ, já que é o primeiro que tem personalidade jurídica e capacidade para ser parte em juízo.
Este é o entendimento unânime do STJ, que em data recente assim se pronunciara:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. TABELIONATO. AUSÊNCIA DE PERSONALIDADE JURÍDICA. RESPONSABILIDADE DO TITULAR DO CARTÓRIO À ÉPOCA DOS FATOS. 1. O tabelionato não detém personalidade jurídica, respondendo pelos danos decorrentes dos serviços notariais o titular do cartório na época dos fatos. Responsabilidade que não se transfere ao tabelião posterior. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. [10] (Grifos nossos).
Quanto a saber, finalmente, se o lançamento tributário se dará em nome da pessoa física ou jurídica, o nosso posicionamento pessoal, considerando as muitas peculiaridades que o tema envolve, é de que este ato administrativo deve ser feito em nome do titular do Cartório, não como pessoa física detentora de CPF, mas como empresário, nos termos conceituados pelo art. 966, do Código Civil, lembrando que para fins tributários o mesmo é equiparado a pessoa jurídica, devendo ser cadastrado no CNPJ.
A questão da indicação do sujeito passivo no lançamento tributário em relação aos serviços Notariais e de Registros Públicos, por tudo o que se acabou de expor não é assunto fácil; este talvez seja o ponto mais tormentoso do tema aqui estudado, merecendo, por isso, uma atenção especial, devendo-se esclarecer, repita-se, que a origem da problemática está concentrada na Receita Federal do Brasil.
O assuntopode ser resumido da seguinte forma: ao mesmo tempo em que o Fisco Federal exige o CNPJ dos "Cartórios", trata o seu titular como pessoa física para o recolhimento do imposto de renda. Ainda, o mesmo Órgão Federal obriga os Notários e os Registradores a inscreverem-se no Cadastro Específico do INSS (CEI), o qual é exigido, dentre outras hipóteses, para os equiparados à empresa, como ocorre na espécie.
Concluindo: a Serventia Extrajudicial e o seu Titular, neste caso em especial – tendo em vista as distorções e contradições existentes na Receita Federal do Brasil – confundem-se, nada impedindo, em nosso entendimento, que o lançamento seja efetuado em nome do titular, com a indicação do CNPJ da Serventia porque o cadastro, como vimos anteriormente, embora efetuado em nome da Serventia deveria ser feito em nome do titular do estabelecimento nos termos do art. 11, da IN nº 1005, de 08 de fevereiro de 2010.
Forçoso é, portanto, em face de tudo o que se expôs, para fins de cumprimento dos requisitos formais da notificação fiscal respectiva, aceitar o CNPJ da Serventia Extrajudicial como sendo o do Titular da mesma, na condição de empresário, nos termos do art. 966, do Código Civil.
8. Considerações finais
Como se pôde verificar pelas singelas exposições acima evidenciadas, o tema ainda está em meio a muitas controvérsias, as quais, certamente, ainda deverão ser postas ao crivo do Poder Judiciário. Mas, uma coisa é certa: os Notários e os Registradores estão obrigados ao recolhimento do ISS não havendo liberdade para os Chefes do Poder Executivo em determinar o contrário, sob pena de responderem por improbidade administrativa, considerando, principalmente, o efeito vinculante da decisão proferida na ADI nº. 3089 pelo Supremo Tribunal Federal.
REFERÊNCIAS
Lei Complementar no. 116, de 31 de julho de 2003
ADI Nº. 3089, relator Ministro Carlos Ayres Brito.
Art. 9º., parágrafo 3º, do antigo Decreto-Lei nº. 406/68
CARVALHO, Paulo de Barros. Cobrança do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) dos prestadores de serviços notariais e registros públicos. Disponível no seguinte endereço eletrônico: <http://www.recivil.com.br/preciviladm/modulos/artigos/documentos/Parecer%20%20Cobran%C3%A7a%20do%20Imposto%20sobre%20Servi%C3%A7os%20de%20Qualquer%20Natureza%20(ISSQN)%20dos%20prestadores%20de%20servi%C3%A7os%20notariais%20e%20registros%20p%C3%BAblicos%20%20Por%20Paulo%20de%20Barros%20Carvalho.pdf > Acesso em 10 de maio de 2011.
FANTI, Guilherme. ISS Cartórios - Comentários sobre base de cálculo. Disponível no seguinte endereço eletrônico:<http://www.arpenbrasil.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1821&Itemid=83> Acesso em 11 de maio de 2011.
HARADA, Kiyoschi ISS. Base de cálculo dos serviços prestados por notários e registradores. Disponível no seguinte endereço eletrônico: <http://www.fiscosoft.com.br/a/5bbu/iss-base-de-calculo-dos-servicos-prestados-por-notarios-e-registradores-kiyoshi-harada. Acesso em 11 de maio de 2011.
Art. 20, da Lei nº 8935/94
STJ - RESP nº 1187464
STJ - RESP nº 1185119
JFSC Apelação Cível em Mandado de Segurança nº. 2010.012054-7, relator Desembargador Luiz Cézar Medeiros, julgado em 30 de junho de 2010.
Lei nº 9.534, de 10 de dezembro de 1997
Art. 30, III, da Constituição Federal
Art. 11, da Lei de Responsabilidade Fiscal
Art. 5º, § 6º, da Lei nº 7.347/1985
STF - Recurso Extraordinário nº RE 576155
Art. 37, inciso XXII, da Constituição Federal
Art. 142 e seu parágrafo único, do Código Tributário Nacional
Art. 3° da Lei n° 8.395, de 18 de novembro de 1994
Art.14, da Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994
Art. 28, da Lei n° 8.935/94
Art. 44, § 2°, da lei n° 8.935/94
Art. 150, do Decreto no. 3.000, de 26 de março de 1999
Art. 6º, alínea "d", do Decreto-Lei nº 5.844, de 1943
ADI-MC 2.602, Pleno, relator Moreira Alves, DJ 06.06.2003.
Emenda Constitucional nº 20/1998
Art. 40 da Constituição Federal
Instrução Normativa nº 971/2009
INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 971/2009 - INSS - TRANSCRIÇÃO DE MATÉRIA DA REVISTA - ARPEN/SP. Disponível no seguinte endereço eletrônico:<http://www.sinoreg-es.org.br/wcom/nota_sys.php?id_nota=103.> Acesso em 18 de maio de 2011.
Art. 150, inciso I, da Constituição Federal
Art. 146, do Código Tributário Nacional.
STJ - Resp nº 1097995
Art. 11, da Instrução Normativa nº 1005, de 08 de fevereiro de 2010.
STJ - AgRg no REsp 624975 / SC Ministra Maria Isabel Gallotti - Dje 11/11/2010.
Art. 966, do Código Civil
Notas
- ADI Nº 3089, relator Ministro Carlos Ayres Brito.
- Cobrança do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) dos prestadores de serviços notariais e registros públicos. Disponível no seguinte endereço eletrônico: <http://www.recivil.com.br/preciviladm/modulos/artigos/documentos/Parecer%20%20Cobran%C3%A7a%20do%20Imposto%20sobre%20Servi%C3%A7os%20de%20Qualquer%20Natureza%20(ISSQN)%20dos%20prestadores%20de%20servi%C3%A7os%20notariais%20e%20registros%20p%C3%BAblicos%20%20Por%20Paulo%20de%20Barros%20Carvalho.pdf > Acesso em 10 de maio de 2011.
- ISS Cartórios - Comentários sobre base de calculo Disponível no seguinte endereço eletrônico:<http://www.arpenbrasil.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1821&Itemid=83> Acesso em 11 de maio de 2011.
- ISS. Base de cálculo dos serviços prestados por notários e registradores. disponível no seguinte endereço eletrônico: http://www.fiscosoft.com.br/a/5bbu/iss-base-de-calculo-dos-servicos-prestados-por-notarios-e-registradores-kiyoshi-harada Acesso em 11 de maio de 2011.
- JFSC Apelação Cível em Mandado de Segurança nº 2010.012054-7, relator Desembargador Luiz Cézar Medeiros, julgado em 30 de junho de 2010.
- STJ - REsp 1187464 / RS Ministro HERMAN BENJAMIN DJe 01/07/2010
- ADI-MC 2.602, Pleno, relator Moreira Alves, DJ 06.06.2003.
- INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 971/2009 - INSS - TRANSCRIÇÃO DE MATÉRIA DA REVISTA - ARPEN/SP. Disponível no seguinte endereço eletrônico:<http://www.sinoreg-es.org.br/wcom/nota_sys.php?id_nota=103.> Acesso em 18 de maio de 2011.
- Resp nº. 1097995
- STJ - AgRg no REsp 624975 / SC Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI DJe 11/11/2010.