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Considerações acerca das máximas da razoabilidade e da proprocionalidade

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Agenda 20/11/2011 às 14:47

5. A máxima da proporcionalidade

Na tentativa de fixar garantias às liberdades individuais, em face da atuação legislativa e administrativa do Poder Público, controlando assim os desmandos do Governo caracterizados pelo conhecido ‘excesso de poder’, germinou com enorme repercussão a máxima da proporcionalidade, notadamente no Direito Administrativo alemão.

Não obstante a proporcionalidade do Direito europeu estar intimamente ligado à razoabilidade do Direito estadunidense, em uma relação de identidade e reciprocidade, ambos apresentam pontos de distanciamento. Afora a diferença de origem, há que se notar, ainda, uma considerável diferença de conteúdo. Enquanto aquela se consolidou em verdadeira máxima de ponderação, esta representa a evolução substancial do princípio do "due process of law".

Semelhante ao que ocorre com a razoabilidade, a máxima da proporcionalidade se encontra expressamente positivada pelo ordenamento jurídico de alguns países, sendo que, em outros, decorre do próprio Estado de direito. No Brasil, não há consenso por parte da doutrina acerca de sua sedes materiae, sendo que parte da doutrina, acompanhada pela jurisprudência do STF, tende a reconhecer que o status constitucional da proporcionalidade deve ser buscado na cláusula do devido processo legal, disposta no artigo 5°, LIV da CRFB, o mesmo dispositivo que encerra a razoabilidade [37].

O entendimento de que a proporcionalidade está constitucionalmente sediado no princípio do devido processo legal substancial, portanto, com sedes materiae comum à razoabilidade, decorre, em grande medida, da propalada sinonímia defendida por parte da doutrina nacional. Sinonímia que, conforme defendido, não se sustenta ante uma análise criteriosa dos dois institutos, quer por questões de origem, quer por diferença de estrutura e aplicação. A inexistência de completa identidade entre as duas máximas justifica o estudo de outros possíveis espaços de justificação da proporcionalidade na ordem constitucional brasileira.

Discutindo acerca do status constitucional da proporcionalidade, Bonavides sustenta que tal princípio (máxima) "pode não existir enquanto norma geral de direito escrito, mas existe como norma esparsa no texto constitucional". Segundo o constitucionalista pátrio, a proporcionalidade se infere de outros princípios afins, como a igualdade, "sobretudo em se atentando para a passagem da igualdade-identidade à igualdade-proporcionalidade, tão característica da derradeira fase do Estado de direito" [38].

Trata-se, portanto, de instituto implícito e positivado em nosso ordenamento constitucional que, muito embora ainda não formulado como norma jurídica global, decorre "do espírito que anima em toda sua extensão e profundidade o § 2° do art. 5°, o qual abrange a parte não-escrita ou não expressa dos direitos e garantias da Constituição". Aninha-se, portanto, juntamente com "aqueles direitos e garantias cujo fundamento decorre da natureza do regime, da essência impostergável do Estado de Direito e dos princípios que este consagra e que fazem inviolável a unidade da Constituição" [39].

Esse, realmente, parece ser o verdadeiro status da proporcionalidade na ordem constitucional brasileira, uma máxima implicitamente reconhecida pela Constituição, que decorre diretamente do Estado constitucional de direito, do regime e dos princípios que informam o nosso modelo constitucional, gozando da proteção prescrita no artigo 60, § 4°, IV da CRFB, em virtude do disposto em seu artigo 5°, § 2°, quando assegura que "os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte".

Se na esfera constitucional há certa celeuma doutrinária a respeito da sua sedes materiae, no âmbito infraconstitucional a proporcionalidade já se encontra devidamente positivada no artigo 2° da Lei n° 9.784/99, que regula o procedimento administrativo no âmbito da União.

Parece interessante atentar que, enquanto nos Estados nacionais europeus a máxima da proporcionalidade se consolidou como uma reação dos cidadãos ao arbítrio do rei, a razoabilidade estadunidense evoluiu de tensões sociais e não da tentativa de limitar um poder soberano, sendo esta uma considerável diferença entre os dois institutos constitucionais.

Por certo, tanto a proporcionalidade como a razoabilidade têm por escopo oferecer critérios à limitação da atuação do Poder Público, suporte jurídico ao controle judicial da atividade administrativa e legislativa. Cabe, primeiramente, um breve apanhado acerca da origem e evolução da proporcionalidade no Direito europeu, a fim de que, posteriormente, seja estabelecida a sua trajetória na doutrina e jurisprudência nacionais.

5.1. A proporcionalidade no Direito europeu

As raízes da proporcionalidade podem ser buscadas na passagem do Estado absolutista para o Estado liberal-individualista, quando se percebeu a necessidade de controle do poder ilimitado do monarca. O advento do Estado de direito exigiu a atenuação do "poder de polícia real" antes ilimitado e legitimado pela lei, passando a ser por ela limitado e controlado. A proporcionalidade despontou como um obstáculo aos desmandos do monarca, demarcando os meios empregáveis e os fins que poderia perseguir [40].

O germe do instituto em comento, conforme o entendimento de Suzana de Toledo Barros, deve ser buscado na idéia de garantia da liberdade individual em face dos interesses da Administração. "Essa consciência de que existiam direitos oponíveis ao próprio Estado e que este, por sua vez, deveria propiciar fossem tais direitos respeitados decorreu das teorias jusnaturalistas formuladas na Inglaterra dos séculos XVII e XVIII" [41].

Pode-se notar, segundo visto com a razoabilidade, que o fundamento de aplicação destas balizas limitadoras da ação do Estado e garantidoras dos direitos fundamentais dos cidadãos é o jusnaturalismo, essa ordem de valores imanentes à personalidade humana, tomada pelo homem a fim de viver com retidão e segundo os preceitos da justiça. Um Direito natural, fruto da história e da cultura das civilizações, com ela evoluindo e se adaptando às variações de tempo e espaço.

O Direito Administrativo consagrou a máxima da proporcionalidade como uma evolução do princípio da legalidade, sendo que, inicialmente, a idéia de proporção ligava-se somente às penas. Em um segundo momento, passou-se a exigir que os atos administrativos fossem adequados ao cumprimento das finalidades da lei, e que os meios usados não ferissem em demasia os direitos dos cidadãos [42].

O Direito francês desenvolveu o controle da proporcionalidade dos atos da Administração Pública como decorrência da evolução da teoria do desvio de poder. Trata-se de um meio de controle judicial da atividade administrativa, consistente na invalidação daqueles atos do Poder Público destoantes da finalidade inscrita na norma – finalidade esta sempre vinculada à satisfação do interesse público, ou que, embora praticados mirando o interesse público, não cumprem o fim específico prescrito na norma.

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Em determinados países essa máxima se encontra expressamente positivada pelo ordenamento jurídico, sendo que, em outros, decorre diretamente do Estado de direito. A Lei Fundamental alemã de 1949, em seu artigo 19, previu expressamente o princípio da proteção do núcleo essencial dos direitos fundamentais, estatuindo que quaisquer restrições devem ser necessárias e mantenedoras de seu conteúdo essencial, passíveis de tutela jurisdicional em caso de violações [43].

O Direito Administrativo espanhol, desde a Lei de Procedimento Administrativo de 1958, também prevê expressamente a necessidade de os atos administrativos serem adequados aos fins que os justifiquem. Na Constituição espanhola de 1978, pós-queda do regime franquista, restou fixado no artigo 53.1 o caráter vinculante dos direitos fundamentais e o necessário respeito de seu conteúdo essencial pela legislação regulamentadora [44]. No mesmo sentido, segundo Canotilho, a ordem constitucional portuguesa, com a qual o Direito Constitucional brasileiro guarda estreita relação, também logrou positivar o princípio (máxima) da proporcionalidade [45].

Pode-se dizer que o Tribunal Constitucional alemão é quem melhor vem aplicando essa máxima no Direito europeu, quando do controle das leis restritivas de direitos. Seus parâmetros vêm sendo usados para invalidar leis que são aparentemente arbitrárias, contudo, de difícil comprovação quando do seu confronto com a Constituição. O controle jurisdicional da constitucionalidade das leis, segundo critérios de proporcionalidade, desenvolvido pelo Tribunal Constitucional alemão, repercutiu em grande parte da Europa e, mais recentemente, em países da América Latina como o Brasil [46].

5.2. Significado da proporcionalidade

A proporcionalidade é uma máxima, um parâmetro valorativo que permite aferir a idoneidade de uma dada medida legislativa, administrativa ou judicial. Pelos critérios da proporcionalidade pode-se avaliar a adequação e a necessidade de certa medida, bem como se outras menos gravosas aos interesses sociais não poderiam ser praticadas em substituição àquela empreendida pelo Poder Público.

A moderna doutrina constitucional, em se tratando de restrições a direitos fundamentais, tem inquirido não apenas sobre a admissibilidade constitucional da restrição – reserva legal, mas também acerca de sua compatibilidade com a máxima da proporcionalidade. "Um juízo definitivo sobre a proporcionalidade ou razoabilidade da medida há de resultar da rigorosa ponderação entre o significado da intervenção para o atingido e os objetivos perseguidos pelo legislador..." [47].

Pela máxima da proporcionalidade é possível averiguar se o exercício da função legislativa ou administrativa não acaba por restringir – demasiada e desnecessariamente –direitos fundamentais assegurados aos cidadãos, impedindo o vilipêndio dos ditames constitucionais por leis e atos administrativos desproporcionais [48].

Defendido por Bonavides como o que há de mais novo, abrangente e relevante no constitucionalismo contemporâneo, o princípio (máxima) da proporcionalidade tem a vocação de "compatibilizar a consideração das realidades não captadas pelo formalismo jurídico, ou por este marginalizadas, com as necessidades atualizadoras de um Direito Constitucional projetado sobre a vida concreta e dotada da mais larga esfera possível de incidência", não se deixando capturar pelas "regiões teóricas, puramente formais e abstratas" [49].

5.3. As máximas constitutivas da proporcionalidade

A doutrina e a jurisprudência do Tribunal Constitucional alemã, em uma visão estrutural e funcional, estabeleceram três elementos parciais que compõem a máxima da proporcionalidade, sendo de enorme relevância enquanto níveis de averiguação de vícios substanciais das leis ou dos atos administrativos, parâmetros impositivos de limites à atuação do Poder Público. Neste sentido, a proporcionalidade é constituída pelas máximas da conformidade ou adequação dos meios, da exigibilidade ou necessidade e pela ponderação ou proporcionalidade em sentido estrito.

Cabe salientar, desde já, que existe uma relação de precedência na aplicação dessas máximas constitutivas, uma ordem pré-definida que exige seja analisada primeiramente a adequação da medida legislativa ou administrativa; posteriormente, se adequada a medida, deve-se aferir sua necessidade; e, caso adequada e necessária, há que se aplicar a máxima da ponderação.

Desta forma, resta imperioso reconhecer que nem sempre será aplicada a proporcionalidade em seus três níveis. Na verdade, além da precedência, há uma inegável relação de subsidiariedade entre os três elementos parciais constitutivos da máxima constitucional da proporcionalidade [50]. Em seguida, passar-se-á ao breve apanhado conceitual acerca de um deles.

5.3.1. Máxima da conformidade ou da adequação dos meios (Geeignetheit)

O Poder Público, na prática de seus atos, deve adotar medidas apropriadas ao alcance da finalidade prevista no mandamento que pretende cumprir. A medida adotada deve ser pertinente à consecução dos fins previstos na lei. Em outras palavras, a satisfação do interesse público deve ser buscada segundo meios idôneos, proporcionais, adequados, exigindo-se a existência de conformidade entre os meios empregados e os fins inscritos na norma.

Na esteira da doutrina alemã, Bonavides se refere ao elemento da conformidade como sinônimo de pertinência ou aptidão, pelo qual se pretende aferir "se determinada medida representa ‘o meio certo para levar a cabo um fim baseado no interesse público’, conforme a linguagem constitucional dos tribunais". Assim, o autor defende que a adequação se aproxima ou até mesmo se confunde com o princípio da vedação de arbítrio (Übermassverbot), que também é utilizado com significado idêntico à máxima geral da proporcionalidade [51].

No que toca à identidade entre a proporcionalidade e a proibição do excesso, cabe asseverar que a doutrina nacional, na sua ampla maioria, reconhece esta questão como ponto pacífico [52]. Neste sentido, sustenta Raquel Denize Stumm, amparada nos escritos de Canotilho, que o "princípio da proporcionalidade em sentido amplo é também chamado de princípio da proibição do excesso, possuindo como características que o diferenciam da proporcionalidade em sentido estrito a exigência da análise da relação de meios e fins" [53].

A defesa dessa relação de sinonímia não é acompanhada por Luiz Virgílio Afonso da Silva, que, partindo do entendimento esposado em recentes decisões do Tribunal Constitucional alemão, sustenta a separação dos dois institutos, já que ostentam contornos conceituais e âmbitos de aplicação diversos [54]. Também reconhecendo a distinção entre proporcionalidade e proibição do excesso, Ávila defende que a "proibição do excesso está presente em qualquer contexto em que um direito fundamental esteja sendo restringido", devendo, portanto, ser investigado em separado da proporcionalidade, porquanto sua "aplicação não pressupõe a existência de uma relação de causalidade entre um meio e um fim", mas sim "depende, unicamente, de estar um direito fundamental sendo excessivamente restringido" [55].

Continuando a justificar a referida diferenciação, Ávila sustenta que a "realização de uma regra ou princípio constitucional não pode conduzir à restrição a um direito fundamental que lhe retire um mínimo de eficácia". Assim, a proibição do excesso guarda relação com a restrição ao núcleo essencial de determinado direito fundamental, ao passo que na proporcionalidade resta preservado o núcleo essencial do direito fundamental restringido [56].

Voltando à analise da máxima da conformidade, segundo Canotilho, a exigência de adequação pressupõe a investigação e a prova de que a atividade administrativa está conforme aos fins justificativos de sua adoção, um controle da relação de adequação medida-fim. "Este controlo, há muito debatido relativamente ao poder discricionário e ao poder vinculado da administração, oferece maiores dificuldades quando se trata de um controlo do fim das leis dada a liberdade de conformação do legislador" [57].

Conforme ensina Afonso da Silva, a jurisprudência alemã não exige que com o meio empregado seja alcançado o objetivo, mas sim que seja fomentada, promovida a finalidade visada. Deve-se aferir acerca da conformação entre os meios utilizados e o possível fomento do objetivo almejado [58]. Desta forma, o "controle dos atos do poder público (poderes legislativo e executivo), que devem atender à ‘relação de adequação medida-fim’, pressupõe a investigação e prova de sua aptidão para e sua conformidade com os fins que motivaram a sua adoção" [59].

Cabe ressaltar que pela máxima da adequação não se deve considerar o grau de eficácia das providências escolhidas, tidas como capazes de alcançar o objetivo almejado. A perspectiva da eficácia e o debate acerca do melhor meio para a realização da finalidade desejada – a intervenção menos gravosa ao cidadão – já transbordam o prisma da adequação e entram na órbita da máxima da necessidade [60].

O juiz, quando do controle da proporcionalidade dos atos do Poder Público, deve examinar se o meio escolhido é idôneo à obtenção do resultado pretendido pela lei, à satisfação do interesse público. Não deve, entretanto, exigir uma total e absoluta adequação entre meios e fins, deve sim examinar a conformidade da medida sob o enfoque negativo, invalidando os atos praticados em descompasso com os fins pretendidos pela norma que visavam cumprir.

5.3.2. Máxima da exigibilidade ou da necessidade (Erforderlichkeit)

No exame acerca da proporcionalidade de determinada atuação discricionária do Poder Público, compete ao juiz averiguar se a medida tomada pela Administração ou pelo Poder Legislativo, dentre as aptas à consecução do fim pretendido, é a que produz menor prejuízo aos cidadãos. Dentre as intervenções disponíveis deve ser escolhida a menos onerosa, que em menor dimensão restrinja e limite os direitos fundamentais dos cidadãos. A máxima da necessidade exige que "a medida restritiva seja indispensável para a conservação do próprio ou de outro direito fundamental e que não possa ser substituída por outra igualmente eficaz, mas menos gravosa" [61].

Como se pode notar há inegável clareza na diferença entre a necessidade e a conformidade. A análise daquela é imprescindivelmente comparativa, ao passo que o exame da adequação é imperiosa e necessariamente absoluto [62]. Conforme sustenta Heinrich Scholler, a "adequação representa a relação com a realidade empírica e deveria ser aferida em primeiro lugar, ainda que o critério da necessidade tenha a maior relevância jurídica". As medidas adequadas nem sempre serão necessárias. Por outro lado, "meios necessários serão sempre adequados" [63].

O controle jurisdicional da necessidade da providência restritiva deve apurar a possibilidade do Poder Público ter adotado outra medida, igualmente eficaz e menos desvantajosa à coletividade. "O pressuposto do princípio da necessidade é que a medida restritiva seja indispensável para a consecução do próprio ou de outro direito fundamental e que não possa ser substituída por outra igualmente eficaz, mas menos gravosa" [64].

O controle de constitucionalidade de uma limitação normativa ou administrativa deve aferir se a atuação legislativa ou executiva – além de imprescindível à garantia do exercício do direito fundamental protegido – se apresenta como o instrumento mais eficaz e menos gravoso aos cidadãos. A simples maximização de um direito fundamental não legitima a restrição de outro, havendo que se questionar acerca da necessidade da providência restritiva, ou seja, se outros instrumentos garantidores do direito a ser implementado não acarretariam menor gravame ao direito limitado.

Não constitucionalmente permitida a adoção de intervenções excessivamente restritivas a direitos dos cidadãos, simplesmente a pretexto de garantir o alcance do fim visado pela lei. A certeza na satisfação da finalidade legal não legitima a adoção de medidas que, sem necessidade real, afetam sensivelmente os direitos fundamentais. O Estado não está autorizado a valer-se de quaisquer meios para garantir o resultado pretendido, devendo agir com senso de oportunidade e razoabilidade, elegendo aquela providência que em menor escala limite direitos fundamentais dos cidadãos.

5.3.3. Máxima da ponderação ou proporcionalidade em sentido estrito (Verhältnismässigkeit)

Por vezes, tanto as medidas administrativas como as legislativas podem, muito embora adequadas e necessárias, trazer uma carga excessiva de restrições e limitações aos direitos fundamentais dos cidadãos. A providência adotada pelo Poder Público, ainda que no intuito de conferir efetividade a determinado direito constitucionalmente assegurado, acaba por ferir um outro direito também garantido pelo ordenamento constitucional, situação que acarreta demasiado prejuízo à coletividade. Nestes casos, "deve perguntar-se se o resultado obtido com a intervenção é proporcional à carga coativa da mesma. (…) Meios e fim são colocados em equação mediante um juízo de ponderação, com o objectivo de se avaliar se o meio utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim" [65].

No entendimento traçado por Barros, mesmo quando o juiz considera adequada e necessária a medida adotada pelo Poder Público, nem por isso está a chancelar um instrumento (meio) que imponha ônus demasiado ao cidadão. Por vezes, "é plenamente possível identificar um desequilíbrio da relação meio-fim, sem que se possa concluir pela desnecessidade da providência legislativa, porque não está em causa a existência de outra medida menos lesiva, mas, sim, a precedência de um bem ou interesse sobre outro" [66].

Conforme sustenta Afonso da Silva, para que uma intervenção seja taxada de desproporcional "não é necessário que ela implique a não-realização de um direito fundamental. Também não é necessário que a medida atinja o chamado núcleo essencial de algum direito fundamental". Para que seja reconhecida a afronta ao nível da proporcionalidade em sentido estrito, "basta que os motivos que fundamentam a adoção da medida não tenham peso suficiente para justificar a restrição ao direito fundamental atingido". Portanto, se "a importância da realização do direito fundamental, no qual a limitação se baseia, não for suficiente para justificá-la, será ela desproporcional" [67].

Em termos bastante semelhantes, José Carlos Vieira de Andrade sustenta que a idéia de proporcionalidade em sentido estrito impõe "que a escolha entre as diversas maneiras de resolver a questão concreta se faça em termos de comprimir o menos possível cada um dos valores em causa segundo o seu peso na situação" [68].

Nos termos da máxima da proporcionalidade em sentido estrito, a atuação levada a cabo deve estar afinada com a idéia de "justa medida". Os meios utilizados devem guardar razoável proporção com o fim almejado, demonstrando um sustentável equilíbrio entre os valores restringidos e os efetivados pela medida limitadora.

A máxima da ponderação entende os princípios como mandamentos de otimização com relação às possibilidades jurídicas, enquanto que nas máximas da adequação e da necessidade recorre-se às possibilidades fáticas. Segundo Alexy, o fundamento ao princípio (máxima) da ponderação reside nos princípios de direito fundamental, sem que se exclua, contudo, outras fundamentações como os princípios do Estado de direito, a prática jurisprudencial e o conceito de justiça [69].

O Judiciário, quando da análise de uma medida restritiva de direitos dos cidadãos, sob o prisma da proporcionalidade em sentido estrito, deve exercer um juízo de ponderação entre o direito efetivado pela providência e aquele por ela restringido, a fim de averiguar acerca da sua justiça. Deve o juiz valorar, segundo as circunstâncias e peculiaridades do caso concreto, se a medida obteve um resultado satisfatório e se o direito limitado deveria sucumbir frente ao efetivado, em uma relação de precedência condicionada. Como se pode inferir, a valoração das circunstâncias demanda considerável juízo subjetivo [70].

Nesta esteira, assevera Stumm que o princípio (máxima) da proporcionalidade em sentido estrito está relacionado com a pragmática da ponderação ou lei da ponderação. "Decorre da análise do espaço de discricionariedade semântica (plurissignificação, vaguidade, porosidade, ambigüidade, fórmulas vazias) presentes no sistema jurídico. Constitui requisito para a ponderação de resultados a adequação entre meios e fins". Desta forma, o "juízo de ponderação entre os pesos dos direitos e bens contrapostos deve ter uma medida que permita alcançar a melhor proporção entre os meios e os fins" [71].

Conforme a doutrina de Alexy, no que toca à colisão entre princípios constitucionais, deve ser avaliado, no caso concreto, qual dos princípios em conflito tem maior peso; segundo as circunstâncias e condições da situação, qual direito deve ser efetivado, em uma relação de precedência condicionada.

A chamada lei da ponderação deve ser aplicada a partir de três fases distintas, muito embora essencialmente relacionadas e complementares. "Na primeira fase deve ser determinada a intensidade da intervenção. Na segunda fase se trata, então, da importância das razões que justificam a intervenção. Somente na terceira fase sucede, então, a ponderação em sentido estrito e próprio". As três fases de aplicação da lei da ponderação, em uma espécie de graduação da proporcionalidade, demonstram com razoável propriedade que o ceticismo acerca da ponderação e as dúvidas quanto à racionalidade do procedimento são injustificados e incapazes de sustentação, se contrastados com o instrumental teórico oferecido [72].

Não se pode olvidar que os "princípios prima facie possuem sempre pesos relativos e pela necessidade de otimizar as possibilidades jurídicas, eles só podem ser restringidos à medida que não sejam afetados mais do que o necessário para a aplicação do outro". Assim, pode-se dizer que a lei de ponderação "não é um procedimento abstrato ou geral, ao contrário, é um trabalho de otimização que atende ao princípio da concordância prática" [73].

Discutindo acerca da importância do princípio da concordância prática à solução de colisões de direitos e sua relação com a máxima da ponderação, como mecanismos essenciais à manutenção da idéia de unidade da Constituição, Andrade defende que aquele não deve ser entendido como um regulador automático, que prescreve propriamente a realização ótima de cada um dos valores em jogo, em termos matemáticos. Trata-se "apenas de um método e um processo de legitimação das soluções que impõe a ponderação de todos os valores constitucionais aplicáveis, para que se não ignore algum deles, para que a Constituição (essa, sim) seja preservada na maior medida possível". O "princípio da concordância prática executa-se, portanto, através de um critério de proporcionalidade na distribuição dos custos do conflito" [74].

Fica conferido ao Judiciário o dever de examinar a situação concreta e decidir se a medida eleita não afrontou um direito fundamental que deveria prevalecer naquele caso, precedendo àquele outro direito efetivado. É dever do juiz, analisando as circunstâncias, ponderar acerca da proporcionalidade da restrição ao direito dos cidadãos, contrastando os resultados obtidos com a restrição efetuada, se proporcionais ou não. Pela máxima da ponderação dos resultados, deve-se examinar o grau de satisfação e efetivação daquele mandamento de otimização que a medida procurou atender. Quanto mais alto for o grau de afetação e afronta ao princípio limitado pelo meio utilizado, maior deverá ser a satisfação do princípio que se procurou efetivar.

Sobre o autor
José Sérgio da Silva Cristóvam

Professor Adjunto de Direito Administrativo (Graduação, Mestrado e Doutorado) da UFSC. Subcoordenador do PPGD/UFSC. Doutor em Direito Administrativo pela UFSC (2014), com estágio de Doutoramento Sanduíche junto à Universidade de Lisboa – Portugal (2012). Mestre em Direito Constitucional pela UFSC (2005). Membro fundador e Presidente do Instituto Catarinense de Direito Público (ICDP). Membro fundador e Diretor Acadêmico do Instituto de Direito Administrativo de Santa Catarina (IDASC). ex-Conselheiro Federal da OAB/SC. Presidente da Comissão Especial de Direito Administrativo da OAB Nacional. Membro da Rede de Pesquisa em Direito Administrativo Social (REDAS). Coordenador do Grupo de Estudos em Direito Público do CCJ/UFSC (GEDIP/CCJ/UFSC).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CRISTÓVAM, José Sérgio Silva. Considerações acerca das máximas da razoabilidade e da proprocionalidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3063, 20 nov. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20468. Acesso em: 22 nov. 2024.

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