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O dilema de Salomão: dois pais nas famílias recompostas

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Agenda 17/05/2012 às 15:20

Considerações finais

A vigente CRFB ao estabelecer um único sistema de filiação, em realidade, assegurou o direito a todos de investigar sua verdadeira paternidade, qual seja ela, a sócio-afetiva, exercida em prol da satisfação dos interesses e das necessidades que demandam a adequada formação física, psíquica e da personalidade do ser humano em condições de participação social.

Não cabe confundir, neste passo, a paternidade sócio-afetiva, a construída ao longo do tempo entre o pai, que se sente pai e age como tal, e o filho, que se sente filho e age como se filho fosse, com o vínculo sócio-afetivo, tendo em vista que aquela é gênero e esta espécie caracterizada pelo liame sociológico.

Com efeito, tal constatação revela-se de extremo valor na composição do problema do consórcio de pais nas famílias recompostas por sucessivas uniões. Isto porque, atuantes o pai biológico e o pai sócio-afetivo, os vínculos pelos quais a paternidade se construiu, ou seja, os critérios a partir dos quais ela pode ser averiguada, não exercem (podendo, todavia, no caso concreto, exercer) influência na escolha da paternidade.

Nesta esteira, a solução do problema do consórcio de pais perpassa pela submissão do caso concreto a integração de dois comandos constitucionais de maior expressão tanto na caracterização quanto na determinação da perda da autoridade parental, a relembrar, o direito a investigar e obter declarada a verdadeira paternidade e o melhor interesse da criança e do adolescente.

Rigorosamente falando, o primeiro ponto a ser analisado nos fatos apresentados pelos pais reivindicantes é o efetivo exercício da autoridade parental e das relações afetuosas, o que somado resulta a paternidade. Assim, o mero contato ou a simples ajuda financeira ofertada por um dos pais reivindicantes justaposto à contínua assistência moral e material que faz o outro pai reivindicante e o filho reivindicado contribuir e participar ativamente da vida um do outro, não revela paternidade.

Por outro lado, se as relações paterno-filiais entre ambos os pais reivindicantes e o filho reivindicado forem equivalentes, a escolha a ser feita deverá considerar o melhor, repita-se, melhor interesse da criança adolescente.

Deste modo, o pai escolhido poderá ser tanto o pai biológico quanto o sócio-afetivo, porque, em se fazendo necessário invocar o melhor interesse da criança ou do adolescente para compor o problema do consórcio é evidente que ambos os pais também se revelaram pai sócio-afetivo lato sensu.

Assim, na análise casuística, deve-se ser indagado qual pai verdadeiramente é o pai, conseguintemente, qual verdadeiro pai atenderá melhor os interesses da criança ou adolescente em peculiar estado de desenvolvimento, e não qual a espécie de paternidade deverá prevalecer, a biológica ou a sócio-afetiva, porque ambas se equivalem e poderão na mesma intensidade servir de base para construir a verdadeira paternidade, enquanto pressuposto de dignidade de todo ser humano.

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Nota

[1] Disponível em: <http://www.estadosgerais.org/resenhas/roudinesco-entrevista.shtml>. Acesso em: 16 Set. 2010.

Sobre a autora
Pâmela Daniele Ramos Tuller

Advogada. Pós-graduada em Direito Processual pela Universidade Estadual de Montes Claros

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TULLER, Pâmela Daniele Ramos. O dilema de Salomão: dois pais nas famílias recompostas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3242, 17 mai. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21800. Acesso em: 9 mai. 2024.

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