CONCLUSÃO:
Apesar da legislação que nos apoiamos para trabalhar com as fundações, não existe uma legislação específica para o Terceiro Setor. Quando o assunto é Fundação de Apoio, vivemos em uma realidade um tanto quanto incerta, vez que somos fundação de direito privado, devendo seguir as regras estabelecidas pelo Código Civil Brasileiro.
Entendemos que hoje, depois de uma longa história, a relação governo, universidade e fundação de apoio atinge o seu almejado estágio de maturidade, legitimidade e legalidade. Assim sendo, em que se fundamentam as alegações que visam ao enfraquecimento ou mesmo à extinção das fundações de apoio?
É certo que as dúvidas e as discussões quanto aos procedimentos que as fundações de apoio adotam para exercer seus serviços em prol das universidades advém simplesmente do aspecto da personalidade a que são instituídas, vale dizer, de direito privado, determinadas pela Lei Civil.
Todos os questionamentos têm procedência ao analisar a conjuntura que envolve a entidade de apoio e a instituição de ensino superior: recursos públicos. Veja bem, trabalhar com o Erário demanda uma infinidade de parâmetros legais e procedimentais, visando sempre a probidade; trabalhar com recursos públicos, num país assolado pela corrupção, exige uma fiscalização mais acirrada e minuciosa, ademais, exige, principalmente, que sejam pessoas jurídicas de direito público.
É essa sociedade de que, legitimamente, demanda da universidade pública respostas urgentes e qualificadas, advindas da produção e da difusão do conhecimento academicamente sustentável, que estaria sendo assim severamente prejudicada, ao serem atrofiados os organismos estrategicamente integrados à política e à gestão de IES públicas, quando se deixam pairar ao ar incertezas e questionamentos quanto ao exercício das atividades das fundações de apoio, meramente por serem privadas.
Restringir ou impedir a atuação das fundações, antes de afetar um modus operandi das nossas instituições, representa um golpe frontal contra o ensino e a pesquisa independente, de qualidade e comprometimento com o desenvolvimento cultural, social, científico, tecnológico e econômico das regiões e do País em seu todo.
Contudo, também não se pode deixar padecer dos mesmos modos em que hoje se operam, visto as inúmeras fraudes e ilegalidades que levam ao insucesso das entidades de apoio, ainda porque acaba por se tornar corriqueiro as investidas contrárias às leis para omitir receitas e fraudar licitações.
Se o próprio governo federal renuncia ao modelo estatal “inchado”, pesado, oneroso ao orçamento da União, como então se poderia apregoar uma universidade pretensamente autônoma, cartorial e burocratizada? Com os olhos postos nas histórias de nossas instituições públicas de ensino superior, queremos crer e apostar em outra realidade.
Enxerga-se, portanto, que o papel fundamental das entidades de apoio deve ser mantido, todavia, agora, num aspecto mais amadurecido, mais cauteloso e seguro, isto é, as entidades de apoio deixariam de ter este aspecto peculiar de personalidade jurídica de direito privado e se amoldaria à figura já existente na Administração Pública Indireta e com a qual é relacionada, ou seja, as fundações estatais.
A par disso, os recursos públicos seriam regidos por uma pessoa jurídica de direito público com regime jurídico de direito privado, é dizer, operariam praticamente da mesma maneira, contudo evitando-se a promiscuidade que atualmente estão sendo questionadas, haja vista que através de uma fundação estatal as regras e procedimentos não poderiam mais ser descumpridas, sob pena de atuarem ímprobas, gerando responsabilidades que realmente são punidas.
A licitude passaria a operar, pois as fundações estatais como entes apoiadores das universidades buscaria o mesmo interesse social, desenvolvendo atividades que exijam a execução obrigatória por entidade de direito público. De pronto, os interesses coletivos estariam sendo atendidos de modo lícito, moral e sem fins lucrativos.
As fundações regidas pelo direito privado não podem atuar em área que exija entidades de direito público para o desenvolvimento de suas atividades, assim, as entidades de apoio não poderiam estar gerenciando recursos públicos, pois isto é dever de uma pessoa jurídica pública. Logo, se continuar dessa forma estariam sempre sendo questionadas sobre suas atuações. Resta claro que o fim a que destina o apoio às universidades deve ser pautado pelas fundações estatais, estas sim capazes de gerir recursos do Erário Púbico sem antes prejudicar a Administração Pública.
Importante mencionar também em sede de conclusão, ainda porque corrobora diretamente com o debate aqui insculpido, que o art. 37, XIX da Constituição da República impôs ao legislador o dever de estabelecer as áreas de atuação das fundações estatais através de uma lei complementar que ainda não existe. Tal exigência é propriamente para acabar de vez com qualquer tipo de suspeita da atuação de uma fundação – suspeitas que são corriqueiras na atuação das fundações privadas – e dotá-las de mais agilidade e flexibilidade na consecução de seus serviços.
Diante isso, o Projeto-Lei 92/2007 está em fase de análise no Congresso Nacional a fim de estabelecer ao Poder Público a possibilidade de instituir fundação estatal, sem fins lucrativos, integrante da administração pública indireta, nas áreas de saúde, educação, assistência social, cultura, desporto, ciência e tecnologia, meio ambiente, previdência complementar do servidor público, comunicação social e promoção do turismo nacional.
Observe-se que a criação da fundação estatal de direito privado, ainda, tem peculiaridade no Projeto-Lei na razão de que somente poderão ser instituídas para o desempenho de atividades estatais que não sejam exclusivas do Estado, nascendo, para concatenar o estudo, a possibilidade e necessidade da fundação estatal como ente apoiador das universidades.
Conclui-se que o Estado não pode afastar de suas responsabilidades às questões sociais portando na função de encobrir e desarticular a legalidade de seus atos. Transferir responsabilidades do Estado, incluindo repasses de recursos públicos, para entidades de apoio que figuram como entes paraestatais, não atende ao principio da eficiência, mas apenas gera uma imagem de transferência de responsabilidade e uma abundante demanda lucrativa para o setor privado.
Por mais, numa análise mais específica da finalidade lucrativa, é de se entender que as entidades de apoio, ainda que criadas na forma de fundação privada sem fins lucrativos, visam, ainda que indiretamente, o lucro, tanto que recebem a taxa de administração trespassada de uma comissão quando da execução de suas atividades, e mais, quanto maior a prestação do serviço, maior a comissão. Isso atinge diretamente a Administração Pública.
De resto, assume papel inovador e correto a criação de fundações estatais para assumir o papel desempenhado pelas fundações de apoio, sob uma perspectiva legal e mais proba, mormente a Administração Pública descentralizará um de seus serviços, em prol da celeridade e eficiência, para que outra entidade pública opere com os recursos públicos alcançando o interesse público ao agir como um agente cooperador e em apoio às universidades no que tange às atividades de pesquisa, extensão e desenvolvimento.
As amarras existentes pela falta de legislação, ou mesmos as lacunas que dependem das decisões do Poder Judiciário para serem acolmatadas mostram-se como um empecilho para o desenvolvimento das pesquisas e projetos em que as fundações de apoio estão à servir para às universidades. Carece de uma legislação específica para que seja garantida uma maior agilidade na execução dos projetos e, por fim, garantido o melhor interesse público.
Essa é a verdadeira visão que a Administração Pública deve tomar para que todos os questionamentos que se dialogam contrários às entidades paraestatais, e principalmente, quanto às fundações de apoio, possam cessar e fazer com que a prestação da atividade administrativa seja cada dia mais transparente e legal. Começar pela instituição das fundações estatais como ente apoiador das universidades é uma dessas missões.
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