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A concessão do benefício da assistência judiciária gratuita em prol das pessoas jurídicas sem fins lucrativos no âmbito da Justiça do Trabalho

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2. Das Pessoas Jurídicas

2.1. Conceito

Conforme dispõem Chaves e Rosenvald (2011, p.141), pessoa é todo aquele que “[...] titulariza relações jurídicas na órbita do Direito, podendo se apresentar como sujeito ativo ou como sujeito passivo, além de reclamar um mínimo de proteção necessária ao desempenho de suas atividades”.

Diniz (2009, p.115) relaciona o conceito de pessoa com o de sujeito de direito, quando informa que:

Para a doutrina tradicional “pessoa” é o ente físico ou coletivo suscetível de direitos e obrigações, sendo sinônimo de sujeito de direito. Sujeito de direito é aquele que é sujeito de um dever jurídico, de uma pretensão ou titularidade jurídica, que é o poder de fazer valer, através de uma ação, o não-cumprimento do dever jurídico, ou melhor, o poder de intervir na produção da decisão judicial.

Dos conceitos, acima transcritos, surgem duas espécies de pessoas reconhecidas pelo ordenamento jurídico: a pessoa natural ou física e a pessoa jurídica.

Segundo Diniz (2009, p.148), pessoa natural é “o ser humano considerado como sujeito de direitos e obrigações”.

Para analise deste artigo, é necessário adentrarmos apenas na esfera da segunda hipótese apresentada, pois, conforme vimos anteriormente, o objetivo é demonstrar que, em virtude dos diversos tipos de pessoas jurídicas, não há porque tratá-las igualmente, principalmente no momento da concessão da assistência judiciária gratuita.

 Pamplona Filho e Gagliano (2011, p.224) conceituam pessoa jurídica como sendo:

[...] o grupo humano, criado na forma da lei, e dotado de personalidade jurídica própria, para a realização de fins comuns. [...] Enquanto sujeito de direito, poderá a pessoa jurídica, por seus órgãos e representantes legais, atuar no comércio e sociedade, praticando atos e negócios jurídicos em geral.

A pessoa jurídica surge, conforme pontifica Gomes (2000, p.191), em virtude da “necessidade de personificar o grupo, para que possa proceder a uma unidade, participando do comércio jurídico, com individualidade”.

Segundo Coelho (1998, p.11) há três pressupostos existenciais básicos para o surgimento de uma pessoa jurídica, quais sejam: “a vontade humana criadora, a observância das condições legais para a sua instituição e a licitude de seu objeto”.

A vontade humana é imprescindível, não sendo concebido a formação de uma pessoa jurídica por simples imposição, sob pena de prejuízo da autonomia negocial e da livre iniciativa.

A observância das condições legais deve ser considerada também, no sentido de que, para a aquisição da personalidade jurídica, exige-se, “na forma da legislação em vigor, a inscrição dos seus atos constitutivos (contrato social ou estatuto) no registro peculiar” (PAMPLONA FILHO; GAGLIANO, 2011, p.229).

Finalmente, deve ocorrer a licitude de seu objetivo e finalidade, não havendo como se reconhecer existência legal e validade à pessoa jurídica com objeto ilícito ou proibido por lei. A autonomia da vontade não chega ao ponto de autorizar esse tipo de atuação, sob pena de violar todo o ordenamento jurídico vigente.

Sendo assim, pessoa juridica é uma entidade formada pela soma de esforços de pessoas naturais ou por um patrimônio, dotada de personalidade jurídica própria, visando uma finalidade específica comum lícita.

Segundo Plácido e Silva (2001, p.1041), diz-se jurídica porque “[...] se mostra uma encarnação da lei, e, quando não seja inteiramente criada por ela, adquire vida ou existência legal somente quando cumpre as determinações fixadas por lei”.

Desse modo, ao contrário da pessoa física, cuja existência legal se inicia pelo nascimento, a pessoa jurídica somente terá existência quando o Direito o lhe impuser.

2.2. Das Pessoas Jurídicas Com e Sem Fins Lucrativos

Entre tantas classificações, os doutrinadores costumam classificar as pessoas jurídicas quanto a sua órbita de atuação, dividindo-se em de direito público e de direito privado, sendo esta última subdividida, de acordo com o quanto disposto no art. 44 do Código Civil, em associações, sociedades, fundações, partidos políticos e organizações religiosas.

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O objetivo da referida classificação é, na verdade, demonstrar que as pessoas jurídicas de direito privado possuem diversas finalidades e objetivos a que destinaram na sua criação, existindo tanto as que possuem fins lucrativos como sem o chamado animus lucrandi.

As associações, as fundações, as organizações religiosas e os partidos políticos, por exemplo, são pessoas jurídicas que, em regra, reúnem os seus esforços para a realização de fins não econômicos, enquanto a sociedade, em face do disposto no Código Civil, é pessoa jurídica de direito privado para o exercício de atividade econômica e para a partilha dos resultados, entre os sócios.

Nesses termos, a pessoa jurídica que possui animus lucrandi é aquela que objetiva beneficiar-se, trazendo um engrandecimento ou enriquecimento a seu patrimônio, seja por meio de bens materiais ou simplesmente de vantagens patrimoniais. Já as chamadas pessoas jurídicas sem fins lucrativos são aquelas cujas atividades e definições estatutárias não visam lucros.

2.2.1. Pessoas Jurídicas Sem Fins Lucrativos

A definição das pessoas jurídicas sem fins lucrativos, bem como a sua forma de atuação, tem previsão vasta no nosso ordenamento jurídico, em virtude do seu caráter excepcional.

A Lei n. 9.532/97 conceitua as pessoas jurídicas sem fins lucrativos, no seu artigo 12, §3º, quando informa que:

Considera-se entidade sem fins lucrativos a que não apresente superávit em suas contas ou, caso o apresente em determinado exercício, destine referido resultado, integralmente, à manutenção e ao desenvolvimento dos seus objetivos sociais.

Além disso, a Lei n. 9.970 de 23 de março de 1999, que trata sobre as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, considera, no parágrafo primeiro do artigo 1º, que:

Para os efeitos desta Lei, considera-se sem fins lucrativos a pessoa jurídica de direito privado que não distribui, entre os seus sócios ou associados, conselheiros, diretores, empregados ou doadores, eventuais excedentes operacionais, brutos ou líquidos, dividendos, bonificações, participações ou parcelas do seu patrimônio, auferidos mediante o exercício de suas atividades, e que os aplica integralmente na consecução do respectivo objeto social.

Prevendo a sua forma de atuação, o Código Tributário Nacional, no seu artigo 14, dispõe que não devem distribuir qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas; devem aplicar integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais e manter escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

Normalmente, estas pessoas jurídicas prestam, gratuitamente, serviços à sociedade, atuando, por exemplo, na proteção da família, da saúde para as crianças, aos adolescentes, e à velhice, bem como promovendo assistência educacional ou de emprego, entre outros.

Sobre tal atuação, a Lei n. 9.970/99 dispõe que:

Art. 3º A qualificação instituída por esta Lei, observado em qualquer caso, o princípio da universalização dos serviços, no respectivo âmbito de atuação das Organizações, somente será conferida às pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujos objetivos sociais tenham pelo menos uma das seguintes finalidades:

I - promoção da assistência social;

II - promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico;

III - promoção gratuita da educação, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei;

IV - promoção gratuita da saúde, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei;

V - promoção da segurança alimentar e nutricional;

VI - defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável;

VII - promoção do voluntariado;

VIII - promoção do desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza;

IX - experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócio-produtivos e de sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito;

X - promoção de direitos estabelecidos, construção de novos direitos e assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar;

XI - promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e de outros valores universais;

XII - estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos que digam respeito às atividades mencionadas neste artigo.

Parágrafo único. Para os fins deste artigo, a dedicação às atividades nele previstas configura-se mediante a execução direta de projetos, programas, planos de ações correlatas, por meio da doação de recursos físicos, humanos e financeiros, ou ainda pela prestação de serviços intermediários de apoio a outras organizações sem fins lucrativos e a órgãos do setor público que atuem em áreas afins.

Em virtude do caráter humanitário existente nesse tipo de pessoa jurídica, bem como da inexistência do animus lucrandi, o legislador brasileiro, em diversas áreas do direito, previu a concessão de benefícios, com o objetivo de incentivar a sua criação.

O Código Tributário Nacional, por exemplo, no seu artigo 9º, veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, cobrar impostos sobre o patrimônio, sobre a renda ou sobre serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, e das instituições de educação e de assistência social, todos esses sem a chamada a lucratividade como objetivo para a sua criação.

Especificamente sobre o imposto de renda, o artigo 150, IV, “b” e “c” da Carta Magna prevê a imunidade aos templos de qualquer culto, aos partidos políticos, inclusive suas fundações, às entidades sindicais de trabalhadores, as instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos.

Para a aplicação da referida imunidade, a Lei n. 9.532/97, no artigo 12, §2º, exige que as instituições sem fins lucrativos atendam a certos requisitos, senão vejamos:

Para o gozo da imunidade, as instituições a que se refere este artigo, estão obrigadas a atender aos seguintes requisitos:

a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados;

b) aplicar integralmente seus recursos na manutenção e desenvolvimento dos seus objetivos sociais;

c) manter escrituração completa de suas receitas e despesas em livros revestidos das formalidades que assegurem a respectiva exatidão;

d) conservar em boa ordem, pelo prazo de cinco anos, contado da data da emissão, os documentos que comprovem a origem de suas receitas e a efetivação de suas despesas, bem assim a realização de quaisquer outros atos ou operações que venham a modificar sua situação patrimonial;

e) apresentar, anualmente, Declaração de Rendimentos, em conformidade com o disposto em ato da Secretaria da Receita Federal;

f) recolher os tributos retidos sobre os rendimentos por elas pagos ou creditados e a contribuição para a seguridade social relativa aos empregados, bem assim cumprir as obrigações acessórias daí decorrentes;

g) assegurar a destinação de seu patrimônio a outra instituição que atenda às condições para gozo da imunidade, no caso de incorporação, fusão, cisão ou de encerramento de suas atividades, ou a órgão público;

h) outros requisitos, estabelecidos em lei específica, relacionados com o funcionamento das entidades a que se refere este artigo.

Além destes requisitos, a Receita Federal do Brasil é expressa quando informa, no seu sitio[1], da necessidade de inexistir lucratividade na pessoa jurídica para a aplicação do artigo supra, como se constata:

Para efeito do disposto no art. 150, inciso VI, alínea "c", da Constituição Federal, considera-se imune a instituição de educação ou de assistência social que preste os serviços para os quais houver sido instituída e os coloque à disposição da população em geral, em caráter complementar às atividades do Estado, sem fins lucrativos.

Além das imunidades ora citadas, há ainda isenções tributárias, de acordo com o quanto disposto na Lei 9.53297, às instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico e às associações civis que prestem os serviços para os quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposição do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos.

Ainda de acordo com a Receita Federal do Brasil, para o gozo da isenção, as instituições citadas estão obrigadas a atender aos seguintes requisitos:

a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados;b) aplicar integralmente seus recursos na manutenção e desenvolvimento dos seus objetivos sociais;c) manter escrituração completa de suas receitas e despesas em livros revestidos das formalidades que assegurem a respectiva exatidão;d) conservar em boa ordem, pelo prazo de cinco anos, contado da data da emissão, os documentos que comprovem a origem de suas receitas e a efetivação de suas despesas, bem assim a realização de quaisquer outros atos ou operações que venham a modificar sua situação patrimonial;e) apresentar, anualmente, DIPJ, em conformidade com o disposto em ato da Secretaria da Receita Federal;f) as instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico deverão assegurar a destinação de seu patrimônio a outra instituição que atenda às condições para gozo da isenção, no caso de incorporação, fusão, cisão ou de encerramento de suas atividades, ou a órgão público.

Baleeiro (1999, p.309) discorre sobre o objetivo do legislador em prever estas imunidades e isenções tributárias:

Não se pode dizer que as atividades imunes, nos incisos citados, sejam instrumentos de governo. Não o são, mas configuram atividades de interesse publico no sentido lato, que são desempenhadas sem intuito de lucro, ou proveito individual privado. Enquanto atividades que, em sua essência, não configuram exploração econômica, são despidas de capacidade contributiva. [...] A imunidade, para alcançar os efeitos de preservação, proteção e estimulo, inspiradores do contribuinte, pelo fato de serem os fins das instituições beneficiadas também atribuições, interesses e deveres do Estado, deve abranger os impostos que, por seus efeitos econômicos, segundo as circunstâncias, desfalcariam o patrimônio, diminuiriam a eficácia dos serviços ou a integral aplicação das rendas aos objetivos específicos, daquelas entidades presumidamente desinteressadas, por sua própria natureza.

No âmbito da assistência judiciária gratuita, há ainda a previsão disposta no art. 51 da Lei 10.741/03, conhecida também como o Estatuto do Idoso, que dispõe que as instituições filantrópicas ou sem fins lucrativos prestadoras de serviço ao idoso terão direito à assistência judiciária gratuita independente de prova.

No Direito do Trabalho, no entanto, não há qualquer beneficio concedido a esse tipo de pessoa jurídica. Conforme destacamos anteriormente, quando figuram no pólo passivo da relação jurídica empregatícia, são, normalmente, tratadas da mesma forma que as empresas empregadoras com fins lucrativos.

Esse tratamento igualitário, no entanto, demonstra certa disparidade na medida em que as pessoas jurídicas com fins lucrativos sempre terão maiores vantagens econômicas quando estiverem defendendo os seus direitos, enquanto as sem o animus lucrandi, normalmente, dependem de doações particulares e de dinheiro público proveniente de convênios, que, certamente, possuem destinação especifica, e nem sempre é recebido regularmente.

Dessa forma, forçoso reconhecer que é necessário o tratamento diferenciado para esses dois tipos de pessoas jurídicas.

Sobre os autores
Cláudio Brandão

Mestre em Direito pela Universidade Federal da Bahia, Professor de Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho da Faculdade Ruy Barbosa.

Fernanda Brim Sampaio

Advogada tributarista, civilista e consumerista. Especializada em direito do trabalho. Pós graduanda em direito público. Formada pela Faculdade Ruy Barbosa

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRANDÃO, Cláudio; SAMPAIO, Fernanda Brim. A concessão do benefício da assistência judiciária gratuita em prol das pessoas jurídicas sem fins lucrativos no âmbito da Justiça do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3581, 21 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24234. Acesso em: 24 nov. 2024.

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