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Regime jurídico da concessão para exploração de petróleo e gás natural

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Agenda 01/11/2001 às 01:00

1. A jazida de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos como bens públicos

A Constituição Federal, em seu artigo 20, IX, estabelece que "São bens da União os recursos minerais, inclusive os do subsolo"; em seu artigo 176 que "As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra"; e, finalmente, em seu artigo 177, que "Constituem monopólio da União a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos".

Assim, em relação ao regime jurídico desses bens, a Constituição Federal estabelece três regras básicas:

-em relação à propriedade: o art. 20, IX,.

-em relação à exploração de forma ampla: art. 176 e parágrafos

-em relação, especialmente, às atividades relativas ao petróleo e gás natural.

Em qualquer dessas hipóteses, porém, o legislador constituinte estabeleceu a dominialidade da União, no sentido dado por Marcello Caetano, para quem "o domínio público corresponderá, pois, ao conjunto dos direitos reais que a Administração Pública tem por lei sobre o território e seus espaços, coisas próprias nele individualizadas ou bens alheios, conferidos para serem exercidos no regime peculiar do Direito Público".(1)

Esse é o entendimento de Celso Bastos, para quem "as jazidas petroliferas compõem a dominialidade pública. São bens públicos que integram o patrimônio da União".(2) Também Ives Gandra, ao analisar o artigo 20, IX, da Constituição Federal, afirma que "os recursos minerais são considerados bens da União".(3) No mesmo sentido, Pinto Ferreira, quando afirma que "os recursos minerais são bens públicos da União". (4)

Em se tratando de jazida de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos flúidos de bens públicos, importante classificá-las.

Como ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro, os bens públicos podem ser de uso comum do povo, de uso especial e dominicais, para concluir que "o critério dessa classificação é o da destinação ou afetação dos bens: os da primeira categoria são destinados, por natureza ou por lei, ao uso coletivo; os da Segunda ao uso da Administração, para consecução de seus objetivos, como os imóveis onde estão instalados as repartições públicas, os bens móveis utilizados na realização dos serviços públicos (veículos oficiais, materiais de consumo, navios de guerra), as terras dos silvícolas, os mercados municipais, os teatros públicos, os cemitérios públicos; os da terceira não têm destinação pública definida, razão pela qual podem ser aplicados pelo poder público, para obtenção de renda; é o caso das terras devolutas, dos terrenos de marinha, dos imóveis não utilizados pela Administração, dos bens móveis que se tornem inservíveis".(5)

Dentro dessa clássica classificação, nos parece que as jazidas de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos são bens públicos de uso especial, uma vez que tem uma destinação pública definida constitucionalmente, qual seja, a exploração e aproveitamento de seus potenciais; bem como, sob o seu aspecto jurídico, esses bens públicos são do domínio público do Estado.

Assim, não se deve perder de vista que, mesmo à partir da EC n.º 9/95, a União permaneceu com a titularidade do domínio sobre os recursos minerais, inclusive em relação ao petróleo e o gás natural, conforme já analisado o artigo 20, IX da CF, porém, a nova redação do parágrafo primeiro do artigo 177, passou a permitir à União uma opção, qual seja, a possibilidade de escolher entre a manutenção do sistema de pesquisa e lavra atual ou a adoção de um novo sistema, com a conseqüente contratação de empresas estatais ou privadas, nos termos da lei.

2. A atividade de exploração e produção de petróleo e gás natural enquanto atividade econômica. A questão do monopólio em face da alteração do art. 177 da Constituição Federal pela EC n.º 9/95.

Entendemos que a atividade de exploração e produção de petróleo e gás natural constitui atividade econômica, pois não se encontra no rol daquelas funções típicas do Poder Público que direcionam-se à satisfação das necessidades básicas da coletividade; mas sim, em virtude de imperativos da segurança nacional e de relevante interesse coletivo, a própria Constituição (art. 176) e a legislação infra-constitucional entenderam por bem prever a intervenção estatal no domínio econômico, de maneira a reservar ao Estado a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos.

Saliente-se, porém, como feito por Eros Grau, que o serviço público constitui uma espécie de atividade econômica, cujo desenvolvimento compete de forma essencial ao Poder Público. Ensina o citado autor que "a prestação de serviço público está voltada à satisfação de necessidades, o que envolve a utilização de bens e serviços, recursos escassos. Daí podermos afirmar que o serviço público é um tipo de atividade econômica. Serviço público – dir-se-á mais – é o tipo de atividade econômica cujo desenvolvimento compete, preferencialmente ao setor público. Não exclusivamente, note-se, visto que o setor privado presta serviço público em regime de concessão ou permissão. Desde aí poderemos também afirmar que o serviço público está para o setor público assim como a atividade econômica está para o setor privado".(6)

São tênues as diferenças existentes entre a prestação de serviço público e a participação na atividade econômica por parte do Estado, sob monopólio.

Pietro Virga aponta a inexistência de definição pacífica na doutrina sobre serviço público, apontando, porém, que o mesmo se caracteriza por uma atividade prevalentemente direcionada a fornecer ao cidadão uma utilidade pública.(7)

Como define Pinto Ferreira, citando Gross, monopólio estatal é "a deliberada subtração de certas atividades privadas das mãos do particular, a fim de colocá-las sob o controle da nação por motivo de interesse público". (8)

Assim, a diferença básica entre serviço público e monopólio estatal poderia ser apontada em relação à natureza da atividade, pois enquanto no primeiro caso a atividade é eminentemente pública, no segundo, o Poder Público subtraiu uma atividade do particular, em face de relevante interesse público.

Ensina Eros Grau, que "monopólio é a atividade econômica em sentido estrito. Já a exclusividade da prestação de serviços públicos não é expressão senão de uma situação de privilégio.(9) Note-se que ainda quando estes sejam prestados, sob concessão ou permissão, por mais de um concessionário ou permissionário – o que nos conduziria a supor a instalação de um regime de competição entre concessionárias ou permissionárias (é o caso da navegação aérea – art. 21, XII, c, da Constituição – e dos serviços de transporte rodoviário – art. 21, XII, e; 30, V e 25,§1º, da Constituição), ainda então o prestador do serviço o empreende em clima diverso daquele que caracteriza a competição, tal como praticada no campo da atividade econômica em sentido estrito. O que importa salientar é a não intercambialidade das situações nas quais de um lado o serviço público é prestado, titulares ainda os concessionários ou permissionários de certo privilégio, por mais de um deles e o regime de competição que caracteriza o exercício da atividade econômica em sentido estrito em clima de livre concorrência".(10)

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Igualmente, como ressaltado por Celso Bastos, ao analisar os monopólios previstos no artigo 177 da Constituição Federal, "o monopólio de que se trata aqui não é aquele de fato, isto é, que surge pela desnaturação do regime de competição, fazendo emergir um único fornecedor de um dado produto. Este monopólio é reprimível. O que faz a Constituição é autorizar a criação por lei, em favor do Poder Público, do regime de monopólio. Não há que se confundir no nosso sistema constitucional o monopólio com o serviço público. Este também leva a um regime monopolístico, mas não se cifra a isso. Há também, neste caso, um regime jurídico especial. No monopólio esta especialidade de regime não é de sua essência".(11)

Constatada essa diferenciação e fixada a premissa de que a atividade estatal de exploração de petróleo e gás natural não constitui prestação de serviço público, mas sim intervenção estatal no domínio econômico, devemos analisar se após a EC n.º 9/95, essa intervenção continua a ser exercida em regime de monopólio estatal.

Uma atividade de monopólio pode ser desenvolvida em virtude de três motivos:

A hipótese de exploração de petróleo e gás canalizado, historicamente, trata-se de monopólio legal, pois à partir da Lei n.º 2.004/53, se instituiu o monopólio da União sobre atividades petrolíferas no país, excetuando-se, somente, a distribuição. Esse monopólio foi transformado em norma constitucional pela Constituição de 1967, e alterações promovidas pela EC n.º 01/69, que em seu art. 169 previu "a pesquisa e a lavra de petróleo em território nacional constituem monopólio da União, nos termos da lei".

Ocorre, porém, que esse monopólio legal do petróleo e do gás canalizado, sempre caracterizou-se como intervenção estatal no domínio econômico por absorção, ou seja, a assunção integral pelo Estado, que age como sujeito econômico, dos meios de produção nesse setor da atividade econômica.

Como classificado por Eros, são três hipóteses, a intervenção estatal no domínio econômico: intervenção por absorção ou participação; intervenção por direção e intervenção por indução. Dessa forma, salienta que "no primeiro caso, o Estado intervém no domínio econômico, isto é, no campo da atividade econômica em sentido estrito. Desenvolve a ação, então, como agente (sujeito econômico). Intervirá, então, por absorção ou participação. Quando o faz por absorção, o Estado assume integralmente o controle dos meios de produção e/ou troca em determinado setor da atividade econômica em sentido estrito; atua em regime de monopólio. Quando o faz por participação, o Estado assume o controle de parcela dos meios de produção e/ou troca em determinado setor da atividade econômica em sentido estrito atua em regime de competição com empresas privadas que permanecem a exercitar suas atividades nesse mesmo setor".(12)

Ora, no momento em que a Constituição Federal, à partir da EC n.º 9/95, mantém como monopólio da União a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos, mas autoriza a contratação de empresas estatais ou privadas para a realização dessas atividades, desde que observadas as condições estabelecidas em lei, acaba por conceder ao Poder Público a possibilidade de opção pela manutenção do sistema atual ou pela adoção de um sistema onde se permita a concorrência nessa atividade.

Trata-se, pois, de uma nova concepção de monopólio, não mais relacionado a intervenção estatal no domínio econômico com exclusividade no controle dos meios de produção (intervenção por absorção), mas sim relacionado ao monopólio de escolha do Poder Público, que poderá, conforme as normas constitucionais, optar entre a manutenção da pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos por uma só empresa, ou ainda, pela contratação com empresas estatais ou privadas.

A EC n.º 9/95 encerrou o monopólio estatal no exercício da atividade econômica relacionada a petróleo e gás natural, mantendo, porém, o monopólio da própria atividade, ou seja, a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos continuam constituindo monopólio da União, no sentido de que somente o Poder Público é que poderá decidir, com exclusividade, quem poderá exercer essa atividade econômica. É o que nos referimos como monopólio de escolha do Poder Público.

Nesse sentido, ao tratar da referida EC n.º 9/95, afirma Eros Grau que "Aí a perda, pela Petrobrás, de exclusividade no exercício do monopólio estatal do petróleo".(13)

Essa alteração conceitual não passou desapercebida de Gastão Alves de Toledo, ao afirmar que "na verdade, a Constituição veio permitir que a União se despojasse das prerrogativas do monopólio, quando lhe aprouvesse, para tanto propondo a edição de lei que pudesse regular o ingresso de novos participantes no cenário petrolífero. Aliás, vale recordar que o exercício do monopólio, pela Petrobrás, não subsistiu a partir da promulgação da Emenda 09, a despeito de não se terem comportado assim nem a União nem a estatal", para a seguir concluir que "toda a arquitetura jurídica em que se funda o conceito de monopólio, objeto do art. 177 da Carta Federal, está sujeita a uma substancial mudança interpretativa porque o termo monopólio neste contexto, deixou de ter o alcance que lhe é peculiar".(14)

3. Natureza jurídica do contrato de concessão de exploração de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos. Concessão de exploração de bem público.

Entendemos que a concessão de petróleo não se enquadra como modalidade de concessão de serviço público.

À partir da definição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, que ensina ser concessão "o contrato administrativo pelo qual a Administração confere ao particular a execução remunerada de serviço público ou de obra pública, ou lhe cede o uso de bem público, para que explore por sua conta e risco, pelo prazo e nas condições regulamentares e contratuais"(15), podemos afirmar que a concessão de petróleo não corresponde a concessão de serviço público, uma vez que, a Administração Pública não delegou a outrem a execução de um serviço público, mas sim, a possibilidade de exploração de um bem que é público, conforme já analisado no item 1.

Dessa forma, trata-se de concessão de exploração de bem público. Assim, estabeleceu-se um novo regime jurídico para concessões, visando a exploração da atividade econômica no campo petrolífero, cujas normas legais apresentam algum distanciamento das regras gerais estabelecidas para as concessões de serviço público.(16)

Conforme prescreve o já citado artigo 177, §1º, da Constituição Federal, "a União poderá contratar com empresas estatais ou privadas", desde que "observadas as condições estabelecidas em lei".

A lei n.º 9.478/97 estabelece, em seu art. 5º, que a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos poderão ser exercidas mediante concessão ou autorização.

Dessa forma, na hipótese de realização de contrato de concessão para exploração de bem público, serão, basicamente, as normas de Direito Público que regerão a contratação de empresas estatais ou privadas para a pesquisa e a lavra jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos, uma vez que se trata de contrato administrativo.

Como ensina Jean Rivero, os contratos administrativos por natureza apresentam alguns elementos. Assim, uma das partes deve ser pessoa jurídica de direito público. Além disso, uma de duas possibilidades deve estar presente. Ou o objeto do contrato se liga à própria execução do serviço público ou o contrato deve conter cláusula exorbitante do direito comum.(17)

Nas hipóteses de concessão de exploração de bem público, como já analisado, não se trata de execução de serviço público, mesmo porque a atividade de exploração e produção de petróleo e gás natural constitui atividade econômica; mas, os outros dois elementos necessários estão presentes: presença de uma pessoa jurídica de direito público e de cláusula exorbitante do direito comum.

A pessoa jurídica de direito público presente, conforme a Lei n.º 9.478/97 é a ANP – Agência Nacional do Petróleo -, autarquia especial conforme se verifica em posterior item.

Em relação cláusula exorbitante do direito comum, ensina Jean Rivero que "fora dos casos de participação na própria execução do serviço, um contrato, mesmo que tenha por objeto um serviço público, só é administrativo se as partes tiverem manifestado vontade de se subtraírem ao direito civil, adotando cláusulas que se afastam dele. Neste caso é a cláusula exorbitante ou derrogatória do direito comum que constitui pois o critério decisivo do contrato administrativo".(18)

Na presente hipótese, a própria Lei n.º 9.478/97, em seu artigo 43, estabeleceu cláusulas essenciais aos contratos dessa espécie, que acabam por afastar as normas do direito comum, bem como diferenciá-los das tradicionais concessões, adequando-o às exigências dessa espécie de atividade econômica.

Assim, prescreve o art. 43 da citada lei que o contrato de concessão deverá refletir fielmente as condições do edital e da proposta vencedora e terá como cláusulas essenciais:

Obviamente, não devemos nos esquecer da advertência, integralmente aplicável à hipótese presente, feita por Maria Sylvia Zanella Di Pietro, ao recordar que "ainda que a concessão se faça por contrato administrativo, portanto, regido pelo direito público, e, ainda que o Poder Público conserve a plena disponibilidade sobre o serviço, exerça a fiscalização e fixe a tarifa, a execução do serviço estará entregue a uma empresa privada, que atuará pelos moldes das empresas privadas, livre de procedimentos como concursos públicos, licitação, controle pelo Tribunal de Contas e outros formalismos que emperram hoje a atuação da Administração Pública Direta e Indireta".(19)

4. Responsabilidade da concessionária perante terceiros e perante o Poder Público.

O Estado muitas vezes causa danos ou prejuízos aos indivíduos, gerando a obrigação de reparação patrimonial, decorrente da responsabilidade civil. Assim, enquanto sujeito de direito, o Estado submete-se a responsabilidade civil, prevendo a Constituição Federal que "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa" (CF, art. 37, § 6°).

Essa responsabilidade não se confunde com a responsabilidade civil contratual do Estado que deve ser analisada sobre a ótica dos contratos administrativos.

A responsabilidade civil extracontratual do Estado passou por constantes alterações e evoluções, em cada período histórico:

A Constituição Federal adotou, em seu artigo 37, §6º, a teoria objetiva do risco administrativo, ao prever que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Essa responsabilidade engloba todas as pessoas físicas ou jurídicas que exerçam funções públicas delegadas, sob a forma de entidade paraestatais ou de empresas concessionárias ou permissionárias de serviços públicos.

Assim, as características básicas do preceito constitucional consagrador da responsabilidade civil objetiva do Poder Público (CF, §6°, do art. 37) são:

Ocorre, porém, que a premissa constitucional para aplicação da Teoria da Responsabilização Objetiva do Risco Administrativo, refere-se, como já verificado, à existência de uma prestação de serviço público, o que inexiste nas hipóteses de exploração de petróleo e gás natural, seja por parte do Poder Público, seja por parte, à partir da EC n.º 9/95, da pessoa jurídica de direito privado, concessionário do Poder do Poder Público.

Trata-se, na hipótese, conforme analisado no item 2 de atividade econômica e não de serviço público e, consequentemente, conforme verificado no item 5, de concessão de exploração de bem público e não de concessão de serviço público.

Essa premissa também é salientada por Di Pietro, que adverte: "a responsabilidade do concessionário por prejuízos causados a terceiros, em decorrência da execução de serviço público, é objetiva, nos termos do artigo 37, §6º, da Constituição vigente, que estendeu essa normas às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos".(20)

Portanto, nos parece que o artigo 37, §6º, da Constituição Federal não se aplica em relação a responsabilidade da concessionária perante terceiros e perante o Poder Público, devendo ser aplicada a teoria da responsabilização subjetiva, por ausência da necessária previsão constitucional que consagre a responsabilidade objetiva também nessa hipótese.

Nesse mesmo sentido, manifestou-se Gastão Alves de Toledo, ao afirmar que "toda teoria sobre a responsabilidade objetiva do Estado se radica na sua exigibilidade, enquanto o mesmo é prestador de serviços públicos.... Ao mesmo tempo em que o Texto Constitucional ampliou os destinatários da norma, para incluir, não só as pessoas jurídicas de direito público, mas, igualmente, as de direito privado, também qualifico, restritivamente, a atividade cujo desempenho ficou submetido a esta violenta responsabilidade. Ora, não pode a lei comum ampliar a aplicação de um instituto, em si mesmo, excepcional, captado pela Constituição para gravar a atuação do Estado nesse campo (serviços públicos). Se ela (Constituição) pretendesse que outros ramos da atividade estatal fosse abrangidos pela responsabilidade objetiva extracontratual, não teria se utilizado daquela expressão, excludente dos demais setores onde ele opera. No que respeita a atuação do Estado (latu sensu), somente a Constituição pode estabelecer o grau, de responsabilidade a que estará sujeito, e bem assim, seus concessionários, pessoas de direito privado".(21)

Igualmente concordamos com o citado autor, quando aponta a inconstitucionalidade do art. 44, V, da Lei 9.478/97, que estipulou a responsabilidade objetiva nessas hipóteses.

5. O papel da ANP na atividade de exploração e produção de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos

A principal finalidade da criação da ANP – Agência Nacional do Petróleo – foi garantir a manutenção de várias prerrogativas do Poder Público na alteração de sistemas de exploração do petróleo. Assim, a passagem de um sistema tradicional de monopólio para um novo modelo, onde se permite a concorrência, tornou necessária a criação da ANP, para proteção do Poder Público.

A ANP foi instituída sob a natureza jurídica de autarquia especial, nos termos da Lei n.º 9.478;97.

Dessa forma, enquanto autarquia especial, a ANP sujeita-se à todos os princípios gerais de direito público.

Assim, prevê o artigo 7º da citada lei, que "fica instituída a Agência Nacional do Petróleo – ANP, entidade integrante da Administração Federal indireta, submetida ao regime autárquico especial, como órgão regulador da indústria do petróleo, vinculado ao Ministério de Minas e Energia".

Igualmente, em seu artigo 8º, estipula as competências da ANP, para que possa cumprir sua finalidade de promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo.

Para alcançar sua finalidade legal, deverá a ANP:

Percebe-se, claramente, pelo rol de funções da ANP que a mesma passou a assumir o papel que caberia ao Poder Público, ao planejar, implementar e promover a política nacional de petróleo e gás natural, e ainda, celebrar contratos, fiscalizar e aplicar penalidades.

A ANP, portanto, é uma pessoa jurídica de direito público – autarquia especial – com competência para atuar como agente normativo e regulador da atividade econômica, nos termos do artigo 174 da Constituição Federal que dispõe que "Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado".

Assim, a ANP deve atuar como agente normativo, nos moldes definidos por Manoel Gonçalves Ferreira Filho, para quem, "como agente normativo, cabe ao Estado fixar diretrizes para a economia. Igualmente, realizar aquilo que os economistas denominam de intervenção conforme. Ou seja, a que orienta os agentes econômicos e os influencia por meio de uma política global, financeira, monetária, social, sem lhes eliminar a livre determinação. É a que atua sobre as grandes linhas da atividade econômica – nível de demanda, condições de repartição etc.".(22)

Sobre o autor
Alexandre de Moraes

Advogado e Consultor Jurídico. Atualmente, exerce o cargo de Ministro da Justiça. É formado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – Universidade de São Paulo (USP), em 1990, onde também obteve os títulos de Doutor em Direito do Estado (2000) e Livre-docente em Direito Constitucional (2001). Chefe do Departamento de Direito do Estado da FADUSP. Professor associado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, professor titular da Universidade Presbiteriana Mackenzie e das Escolas Superior do Ministério Público de São Paulo e Paulista da Magistratura; além de professor convidado de diversas escolas da Magistratura, Ministério Público, Procuradorias e OAB. Ex-Promotor de Justiça do Estado de São Paulo (SP). Ex-Secretário de Estado da Segurança Pública de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORAES, Alexandre. Regime jurídico da concessão para exploração de petróleo e gás natural. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2426. Acesso em: 5 mai. 2024.

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