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Judiciário glosa restrições absurdas em editais de concursos

Agenda 20/05/2013 às 17:15

A jurisprudência do STF é no sentido de que apenas por meio de lei é possível impor restrição ao acesso a cargos públicos.

A PM-RJ excluiu um candidato (às suas fileiras) porque tinha tatuagem. O STF (no ARE 665.418, rel. Ayres Britto) entende que exigência desse tipo não encontra base legal. Sem lei, essas restrições discriminatórias não podem prosperar. O policial precisa ser bonito? Assim começa a matéria publicada no Valor Econômico de 26.03.13, p. E1, que enfoca o caso de um candidato à policial militar de MG que tinha acne. O TJ-MG (desembargadora Moreira Diniz) reconheceu seu direito de participar do certame (não é preciso ser bonito para ser policial). Há poucos dias a Polícia civil da BA expediu edital onde exigia “pente fino ginecológico” nas mulheres, ou prova da sua virgindade (prontamente o governo da BA revogou o absurdo).

Há restrições razoáveis (conta com bom senso). Por exemplo: um candidato com “amputação das duas pernas” não poderia ser bombeiro. Isso resulta ser razoável. Mas para ser médico de emergência no serviço público (caso concreto de São José dos Campos), como bem divulgou o Valor Econômico de 26.03.13, p. E1, não há impedimento (como reconheceu o TJ-SP, desembargador Wanderley Federighi). Inquérito policial instaurado e logo em seguida arquivado não pode servir de base para a rejeição do candidato (caso decidido pelo TJ-PR) (Veja o Valor Econômico citado, que ainda cita o caso do candidato com problema dentário, que não pode ser impedido de ingressar na polícia militar TJ-SP).

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Inclusive o Poder Judiciário já reprovou candidatos por razões médicas (Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, hoje desembargador na Justiça do Trabalho), foi reprovado em São Paulo para a magistratura trabalhista por ser cego (Valor Econômico citado). 

O Estado de Direito tem por eixo os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade, da legalidade, do direito ao trabalho, do direito à vida e da razoabilidade.

Todos os editais de concursos que fazem exigências ou restrições não contidas na lei e desarrazoadas devem ser censurados (glosados) pelo Poder Judiciário. 

A jurisprudência do STF (veja, v.g., ARE 665.418, rel. Ayres Britto) é no sentido de que apenas por meio de lei é possível impor restrição ao acesso a cargos públicos. Vêm preponderando as garantias da legalidade e da razoabilidade (ou seja: o Estado de Direito). A jurisprudência é fonte fundamental do direito. O controle de legalidade e de razoabilidade tem fundamento constitucional. Nenhum estado de direito se compatibiliza com o excesso, com aquilo que é desarrazoado. Sobretudo a Justiça tem que ser justa (equilibrada, sensata, razoável). O princípio da razoabilidade é um dos princípios mais refinados do Estado de Direito do século XXI. O juiz é o semáforo do sistema jurídico: para todo excesso ele tem que sinalizar o vermelho (do contrário, converte-se o Estado de Direito em Estado de Exceção, com chance de se chegar ao Estado de Polícia). 

Sobre o autor
Luiz Flávio Gomes

Doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri – UCM e Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – USP. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Jurista e Professor de Direito Penal e de Processo Penal em vários cursos de pós-graduação no Brasil e no exterior. Autor de vários livros jurídicos e de artigos publicados em periódicos nacionais e estrangeiros. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998), Advogado (1999 a 2001) e Deputado Federal (2019). Falecido em 2019.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOMES, Luiz Flávio. Judiciário glosa restrições absurdas em editais de concursos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3610, 20 mai. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24490. Acesso em: 22 nov. 2024.

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