Resumo: Como, via de regra, os modelos de administração de cada um dos noventa e um tribunais brasileiros são estanques, não havendo ainda um salutar intercâmbio entre eles, se faz necessária a troca de experiências pessoais entre magistrados amealhadas ao longo da carreira e a reprodução das boas práticas judiciais e de gestão.
Palavras-chave: Poder Judiciário – Hermetismo – Papel do magistrado.
I. Considerações Iniciais
Sem dúvida, uma das críticas mais recorrentes contra o Judiciário brasileiro é o hermetismo. Nesse diapasão, é necessário que a magistratura se valha de todas as oportunidades que dispuser para buscar demonstrar à sociedade o quanto o Poder Judiciário é importante e essencial para o fortalecimento e manutenção do Estado Democrático de Direito em que o Brasil se constitui – conquistado a duras penas ao longo da história –, conforme reza o art. 1º, caput, de nossa Lei Fundamental, e que vem fazendo sua parte e cumprindo seu papel constitucional com um trabalho sério, engajado, comprometido e, cada vez mais, acessível, transparente e afinado com os anseios da população.
Para tanto, mister se faz uma aproximação maior entre magistrados e sociedade, estabelecendo-se com ela uma linguagem dialógica, interagindo e inserindo o Judiciário no seu seio, saindo de seus gabinetes e desenvolvendo projetos e iniciativas junto à comunidade e, na medida do possível, demonstrando a sua realidade e dificuldades enquanto Poder da República responsável pela importante missão de pacificação social.
II. Análise do Tema
Dentro de uma filosofia de interação com a sociedade temos buscado, ao longo de quase uma década de magistratura, conciliar as funções de julgador e transformador do meio social, pondo em prática projetos no âmbito das varas judiciais, diretorias de foro e zonas eleitorais que titularizamos nas comarcas onde jurisdicionamos em Mato Grosso – Chapada dos Guimarães (2003 e 2004), Sorriso (de 2004 a 2013) e Rondonópolis (de 2013 em diante).
À guisa de exemplo, desenvolvemos em 2010 em Sorriso/MT (cidade do médio-norte mato-grossense, reconhecida recentemente como “A Capital Nacional do Agronegócio” pela Lei n.º 12.724, de 16 de outubro de 2012) o Projeto Minuto Eleitoral, durante mais de 3 meses anteriores àquele pleito eleitoral, como juiz titular da 43ª Zona Eleitoral de Mato Grosso (que conta com mais de 50.000 eleitores e abrange os municípios de Sorriso, Nova Ubiratã e Ipiranga do Norte), consistente em veicular várias vezes ao dia, até a realização das eleições (1º e 2º turnos), vinhetas de nossa autoria (com áudio e também áudio e vídeo nosso) nas três emissoras de rádio e nas cinco emissoras de TV locais, oportunidade em que buscamos trazer esclarecimentos e informações aos candidatos e eleitores sobre o papel da Justiça Eleitoral, dúvidas recorrentes e pontos importantes relativos à legislação eleitoral, tudo tendo por escopo a lisura, transparência e tranquilidade do pleito – enfatizando o voto consciente como instrumento de cidadania.
Ao todo, foram onze inserções com textos distintos, de duração média de um minuto (daí intitularmos o projeto de “Minuto Eleitoral”), em que falamos de forma clara, objetiva e concisa de temas como os procedimentos preparatórios às eleições, o trabalho contínuo dessa Justiça especializada nas diversas fases do processo eleitoral, a forma simplificada de denunciar práticas ilícitas, as condutas que configuram os principais crimes eleitorais, a propaganda eleitoral irregular, além dos crimes eleitorais mais comuns, a prática de boca de urna, a corrupção eleitoral e a conduta esperada dos eleitores e candidatos no dia das eleições.
A iniciativa nasceu de uma experiência pessoal como servidor de carreira da Justiça Eleitoral de Mato Grosso do Sul, após um curso que realizamos no Tribunal Superior Eleitoral em Brasília/DF em 1998, oportunidade em que fomos designados a palestrar para mais de 2.000 mesários, coordenadores e membros de Juntas Eleitorais da 18ª e 43ª Zonas Eleitorais de Dourados/MS nas Eleições Gerais de 1998, ocasião em que divisamos o quanto são bem-vindas e necessárias essas orientações.
Já havíamos adotado praxe semelhante em Mato Grosso quando juiz eleitoral titular da 34ª Zona Eleitoral (que abrange os municípios de Chapada dos Guimarães, Nova Brasilândia e Planalto da Serra) nas Eleições Municipais de 2004. Naquela ocasião, com o mesmo projeto, fizemos uso de vinte vinhetas inseridas na Rádio FM Natureza de Chapada, sendo que os frutos da experiência foram altamente positivos para todos, pois as eleições locais foram as mais tranquilas dos últimos anos, o que nos levou a reproduzir a ideia em Sorriso em 2010.
Fato é que as pessoas em geral se interessam muito e dão bastante crédito ao que o juiz fala ou explica. Dessa forma, quando um magistrado vem à emissora de rádio ou de televisão ou à mídia em geral buscando informar ou sensibilizar a população quanto a um determinado tema ou projeto social o resultado é bastante positivo dada à credibilidade de que goza, o que é potencializado no interior do país, já que a população tem conhecimento pleno de que é o juiz eleitoral o responsável pela aplicação de toda a legislação eleitoral no pleito naquela localidade e que o mesmo é revestido do poder de polícia. Nesse sentido, recebemos muitos feedbacks interessantes, tanto em Chapada dos Guimarães (34ª ZE), quanto em Sorriso (43ª ZE), relativos às milhares de pessoas literalmente parando em frente ao rádio ou televisão para ouvir as explicações e alertas sobre as eleições.
Com efeito, essa praxe de orientação através da imprensa foi complementada por um trabalho exaustivo de palestras (durante manhãs, noites, sábados, domingos e feriados) para candidatos, policiais civis e militares, alunos (em escolas públicas e privadas) e população em geral, enfim, todos os participantes do processo eleitoral, sendo extremamente producente e gratificante não só como juiz presidente do processo eleitoral no âmbito local, mas, como cidadão brasileiro engajado no cumprimento da lei.
Com isso, segundo nossa percepção, do Ministério Público, Defensoria Pública, OAB, advogados e candidatos, tanto nas Eleições Municipais de 2004 quanto nas Eleições Gerais de 2010, os objetivos de nosso projeto foram plenamente alcançados – dentro de filosofia pessoal “treinamento difícil, combate fácil”, atuando com foco na prevenção para não precisarmos trabalhar tanto com a repressão –, daí procurarmos compartilhá-lo com os demais colegas de Mato Grosso (incluída aí a turma de novos 49 juízes substitutos recentemente empossados em 2012) e colegas de outros Estados da federação, conforme a publicação no AMB INFORMA, Edição 135, de janeiro de 2011, pág. 20 (http://www.amb.com.br/portal/docs/publicacoes/AMB_Informa_135site.pdf).
Como, via de regra, os modelos de administração de cada um dos noventa e um tribunais brasileiros são estanques, não havendo ainda um salutar intercâmbio entre eles, se faz necessária a troca de experiências pessoais entre magistrados amealhadas ao longo da carreira e a reprodução das boas práticas judiciais e de gestão que já deram certo em outras localidades desse Brasil continental, pois, urge que boas ideias e projetos exitosos sejam divulgados e replicados para todo o Poder Judiciário nacional, com uma visão coletiva, onde os atos do gestor ou agente público devem ser pautados pelo interesse coletivo – que deve sempre prevalecer sobre o particular –, sem olvidar, afinal, que a res é pública e que a Justiça brasileira é una, apesar das fragmentações, divisões ou ramificações segundo critérios constitucionais ou legais.
III. Considerações Finais
Sempre trabalhamos na Justiça Eleitoral de forma próxima e acessível à população com foco na informação, orientação e prevenção, buscando coibir com isso qualquer manifestação de corrupção eleitoral e frisar sempre aos eleitores a importância do voto consciente como instrumento da democracia.
Entendemos que esses esclarecimentos – como os veiculados no Projeto Minuto Eleitoral – se mostram, na prática, de grande valia para os candidatos, mesários e, principalmente, para os eleitores, já que a maioria das pessoas não tem acesso ao Código Eleitoral, à Lei das Eleições e, tampouco, às resoluções do TSE que são editadas para cada pleito. Essas informações diretas e objetivas trazem, assim, subsídios importantes e ajudam a cumprir os objetivos centrais da jurisdição eleitoral que são a completa observância por todos da legislação eleitoral e a prevalência da vontade soberana nas urnas de “Sua Excelência: o Eleitor”.
A Justiça Eleitoral, além de altamente eficiente, é bastante diferenciada da justiça comum – ante o poder de polícia que o juiz eleitoral ostenta e as suas inúmeras atribuições administrativas nos pleitos– e se mostra, também, uma atividade deveras edificante pela possibilidade de aproximação maior com a população.
Por fim, cremos que iniciativas e experiências desse naipe – não só no âmbito da eficiente Justiça Eleitoral – se mostram eficazes para o seu objetivo específico e igualmente revelam-se oportunas para desvelar à sociedade que o Judiciário não é hermético, pelo contrário, está aberto ao diálogo, reavaliando-se constantemente, procedendo a planejamento estratégico, buscando quebrar paradigmas e estabelecendo novos bem como modernizando-se a fim de cumprir sua missão constitucional de solução de conflitos e pacificação social, realizando as mudanças necessárias na sua estrutura e funcionamento para se adequar às necessidades e expectativas dos jurisdicionados nesse novo milênio.