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Os poderes do Supremo Tribunal Federal e a PEC n.º 33/2011

O Legislativo Nacional vai de mal a pior. O STF que hoje é o responsável por definir várias questões político-institucionais do Governo vem sofrendo tentativas de redução de seus poderes. Suas decisões poderão ter que passar pelo crivo do Congresso.

Pesquisas com células tronco, aborto de fetos anencefálicos, “mensalão”, união entre casais do mesmo sexo são temas de grande relevância, abrangência e polêmica, seja no Brasil, seja em qualquer parte do mundo. Em uma sociedade bastante heterogênea como é a brasileira, dificilmente é possível se chegar a um consenso sobre os temas acima mencionados, haja vista as claras diferenças raciais, étnicas, de costumes e de religião, demonstrando um perfil bastante miscigenado da sociedade brasileira.

Assim sendo, toda essa heterogenia social acaba se refletindo na composição de nosso Poder Legislativo (Câmara dos Deputados e Senado Federal), trazendo, nessa toada, todas as preconcepções e os ideais difundidos para o texto das legislações que passam a ser produzidas e promulgadas. Ao que tudo indica, é aqui que surge a espinha dorsal do problema da Proposta de Emenda Constitucional n.º 33/2011.

Perceba-se que a Proposta de Emenda traz sérias alterações no que se refere à análise de (in)constitucionalidades dentro do sistema normativo. Isso porque, se na redação trazida ao art. 103-A, pela Emenda Constitucional n.º 45/2004, era estabelecido um quórum de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal para a aprovação de súmulas, após reiteradas decisões, agora a exigência poderá ser de quatro quintos dos membros, exigindo, portanto, um quórum que pode ser denominado de “ultra qualificado”.

Até porque, as regras até então fixada entre os dispositivos constitucionais, resumiam-se a dois terços e três quintos, a depender da matéria e da relevância do que se estava debatendo.

Contudo, as alterações não param nesse ponto. De acordo com a alteração que se almeja trazer, caberá ao Congresso Nacional aprová-la para que, assim, passe a ter efeitos vinculantes.

Veja, quando se trata de um Poder Legislativo que, de maneira pública e notória é omisso quanto a determinadas matérias, como estabelecer que a última palavra seja dele? Enquanto ele não deliberar sobre a matéria, ficará o Judiciário de mãos atadas, sendo abarrotado de ações repetidas, por um simples “capricho” dos legisladores? Por óbvio essa não é a melhor saída.

Em primeiro lugar, importante deixar claro que determinadas decisões influenciam diretamente Estados e Municípios, assim como grupos empresariais intimamente ligados aos representantes – que inclusive podem ter sido responsáveis por sua candidatura e eleição. Sendo assim, relegar ao Poder Legislativo a aprovação ou não de súmulas, faz crer que a proposta de emenda constitucional padece de flagrante inconstitucionalidade, merecendo que a Corte Constitucional se manifeste quanto à polêmica.

Informações extraídas do sítio eletrônico do Supremo Tribunal Federal dão conta de que o Ministro Dias Toffoli indeferiu pedido de liminar formulado em dois mandados de segurança (n.º 32036 e 32037), sob o argumento de que todas as regras regimentais, legais e constitucionais estão sendo respeitadas na tramitação da proposição de emenda. Contudo, a despeito da manifestação do Ministro, ousa-se discordar da referida decisão, tendo em vista que não se pode deixar que uma Proposta com essas características continue sua regular tramitação, por apresentar flagrante inconstitucionalidade material.

Isso porque o conteúdo que se pretende modificar do texto constitucional é de competência do Poder Judiciário, isso é, está inserido dentro do Capítulo III - do Poder Judiciário – da Constituição Federal. Além disso, o Judiciário não se submete à autorização ao Poder Legislativo para que atue no exercício de suas funções, por claro ferimento ao princípio constitucional da separação dos poderes.

A inconstitucionalidade material estabelece que os conteúdos a serem analisados por Projeto de Emenda Constitucional não podem abolir ou ferir as cláusulas pétreas, descritas no art. 60, §4º da Constituição. Todavia, percebe-se que a famigerada proposta de emenda constitucional tenta ludibriar e impedir que o Poder Judiciário exerça um de seus importantes papéis, qual seja, o de fiscal da legislação pátria, ferindo assim a separação dos Poderes instituídos no texto constitucional, tirando a independência Judiciária em detrimento do Legislativo.

Nesse ponto, quando a proposta de emenda constitucional tem o intuito de solicitar que as súmulas e decisões do Supremo Tribunal Federal tenham que ser debatidas e votadas pelo Congresso Nacional, em sessão conjunta, fere frontalmente a divisão de poderes instituídas pelo pacto federativo, ocasionando a sua inconstitucionalidade material.

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Sendo verificada a inconstitucionalidade material, há a possibilidade de impetração do remédio constitucional do Mandado de Segurança (“remédio heroico”) por total ferimento a um dos pilares que sustentam a República Federativa do Brasil, a separação de poderes, estatuída pelo art. 2º da Carta vigente. Entende-se dessa forma, pois não se pode deixar adentrar no ordenamento jurídico brasileiro texto de lei ou de emenda constitucional que venha a ferir os direitos basilares dos brasileiros, em hipótese alguma.

Portanto, a decisão liminar proferida pelo Ministro Dias Toffoli, traz sérios riscos à ordem jurídica nacional. Não se pode crer que, em nome do princípio da máxima eficiência da Administração Pública, estatuído pelo art. 37, caput, da Carta Constitucional vigente, o legislador almejou que propostas de lei ou emendas tramitem até o final, para depois serem subtraídas do ordenamento, por total incompatibilidade com ele.

Acaso essa hipótese prevalecesse, estar-se-iam sendo legitimadas atividades contraproducentes, inúteis e que fariam com que o Poder Legislativo caísse ainda mais em descrédito perante a coletividade. Se hoje o Legislativo e o Judiciário já não são vistos com bons olhos pela coletividade, uma alteração nessa proporção tende a aprofundar o abismo que existe quanto à crença de mudanças reais e que tragam benefícios à atividade administrativa.

Diante dessas circunstâncias, entende-se que a Proposta merece ter sua tramitação encerrada, de imediato, em decorrência dos parâmetros de inconstitucionalidade acima enunciados. Agindo dessa forma, tentar-se-á dar um novo fôlego ao Poder do Supremo de autorregular a jurisprudência pátria, além de garantir com que não existam interferências externas nas atribuições precípuas de cada um dos Poderes.

Assim como diria o Legião Urbana, “Ninguém respeita a Constituição, mas todos acreditam no futuro da nação”. E é com essa crença no futuro da nação que se espera que a PEC 33 não seja aprovada no Congresso Nacional, ou, caso mantenha sua tramitação, que sejam manejados os instrumentos cabíveis, com o intuito de arquivá-la, pois, como afirmado durante todo esse texto, trata-se de proposta absolutamente inconstitucional.

Sobre os autores
Marcelo Sant'Anna Vieira Gomes

Meste em Direito Processual Civil pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Especialista em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito de Vitória (FDV); Vice-Secretário Geral da Academia Brasileira de Direitos Humanos - ABDH. Assessor Jurídico no Ministério Público Federal do Espírito Santo.

Jackelline Fraga Pessanha

Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais pela Faculdade de Direito de Vitória - FDV. Graduada em Direito pela Faculdade de Direito de Vila Velha. Professora da Faculdade São Geraldo. Assessora do Ministério Público do Estado do Espírito Santo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOMES, Marcelo Sant'Anna Vieira; PESSANHA, Jackelline Fraga. Os poderes do Supremo Tribunal Federal e a PEC n.º 33/2011. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3778, 4 nov. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25668. Acesso em: 24 nov. 2024.

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