Apesar das inúmeras vantagens e da grande proteção legal dos contratos de honorários advocatícios, títulos executivos extrajudiciais “ex vi” do artigo 24, da Lei nº 8906/94, muitos advogados e advogadas, país afora, realizam diuturnamente contratos verbais com seus clientes.
E, não raro, surge uma lide a respeito de tal contrato na qual busca o advogado o recebimento de valores pelos serviços prestados, desaguando tal questão em juízo, a fim do Poder Judiciário proceder ao competente arbitramento, nos termos do artigo 22, § 2º, da mencionada Lei.
Em muitos casos, o cliente (agora réu no processo) ataca a prova da contratação, a realização dos serviços e/ou o valor dos honorários avençados, buscando a improcedência do pedido do autor, seu antigo patrono.
Quanto à prova da contratação, entendo não haver maiores celeumas, pois o próprio instrumento de mandato é suficiente a ligar o cliente (agora parte “ex adversa”) ao profissional que busca o almejado arbitramento.
Afinal, não é plausível que uma pessoa, capaz, outorgue procuração a um advogado para lutar por seus direitos sem saber, absolutamente, quem é o profissional a quem confiou sua causa...
O mesmo raciocínio serve para a realização dos serviços prestados.
Ora, havendo um processo, os próprios autos são a prova de tais préstimos: as petições realizadas, os recursos tirados, os argumentos colacionados, etc.
Tudo a desaguar no efetivo (e, sem dúvida, exaustivo) trabalho dos(as) advogados(as) no feito.
A maior questão surge quanto à necessidade (ou não) de prova da contratação dos honorários previamente avençados.
Exemplifica-se: É preciso provar, no feito, que as partes (agora autor e réu) acordaram um valor X para realização de tal préstimo ou, analisando apenas a própria prestação de serviços, o juiz arbitrará os competentes honorários (usando ou não tal avença como supedâneo)?
Note-se, de plano, que tal prova (notadamente testemunhal) é muito difícil, pois, via de regra, a contratação dos serviços advocatícios – até pela própria natureza sigilosa e pela discrição que a profissão exige – se dá a portas fechadas, reunidos somente o cliente e o causídico.
Afinal, como bem disse o eminente ministro Ari Parglender, ao julgar situação pertinente ao aqui narrado:
“O contrato escrito de honorários de advogado é título executivo extrajudicial. Se inexistente o contrato, ou se ele não for reduzido a escrito, o profissional tem a seu dispor a ação de arbitramento, porque – a não ser assim – ficaria sem remuneração. Como provar um contrato verbal, quando essa tratativa se dá num âmbito de confiança, normalmente sem testemunhas, próprio da atividade advocatícia (...) ?” [1]
Ademais, se não foi feito um contrato de honorários advocatícios, também é possível se concluir que as partes tinham, ao menos, um certo conhecimento entre si, um mínimo contato, de tal maneira que o advogado confiou na palavra de seu cliente (e vice-versa) estabelecendo, ainda que de forma verbal, um valor para o patrocínio da demanda.
Entretanto, em nossos Tribunais, encontramos decisões que determinam ao advogado provar nos autos os valores que alega terem sido, mediante ajuste verbal, contratados à guisa de honorários advocatícios:
"AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS - AUSÊNCIA DE CONTRATO ESCRITO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS - ÔNUS DA PROVA.
A cobrança do montante pleiteado na exordial, pela prestação de serviços advocatícios, sem contrato escrito, havendo nos autos confissão de recebimento parcial da verba, requer do autor a comprovação efetiva do quantum almejado, sob pena de ofensa à regra do art. 333, I, do CPC". [2]
"APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS - ARTIGO 333, INCISO I, DO CÓDIGO DE Processo CIVIL - ÔNUS DA PROVA DO AUTOR - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO - CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA - POSSIBILIDADE - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. É de se julgar improcedente a ação de arbitramento de HONORÁRIOS quando o autor - advogado - não se desincumbe, com fulcro no artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil, de provar a existência de débito pendente relativamente aos serviços por ele prestados. (...)" [3]
Já para a outra corrente – majoritária, ressalte-se – basta apenas a prova da contratação e da consequente prestação de serviços, devendo o magistrado usar tais subsídios como base para arbitrar os honorários devidos.
Neste sentido, mister a colação de ementas a respeito:
PROCESSO CIVIL - AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - MANDATO REVOGADO ANTES DO DESFECHO FINAL DA AÇÃO - AUSÊNCIA DE CONTRATO ESCRITO - VERBA FIXADA POR ARBITRAMENTO JUDICIAL - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 22, § 2º DA LEI 8.906/84 - CRITÉRIOS - INEXECUÇÃO DO MANDATO - PAGAMENTO DO VALOR COBRADO - AUSÊNCIA DE PROVA - ÔNUS - RÉU - ART. 333, II DO CPC - INOBSERVÂNCIA - RECURSO NÃO PROVIDO - DECISÃO MANTIDA. Nos termos do Estatuto da Advocacia - artigo 22, § 2º - , a ausência de contrato escrito não retira do advogado o direito ao recebimento dos honorários advocatícios pelo trabalho prestado. O arbitramento da verba honorária está sujeito a critérios de valoração, cuja fixação é ato do juiz em observância às peculiaridades das questões postas, sendo que correto é o entendimento de que são devidos os honorários na prestação dos serviços profissionais de advogado mesmo que revogado o mandato antes do desfecho da ação, quando deverá ser levado em conta, para o seu arbitramento judicial, as peculiaridades do caso concreto. O ônus da prova incumbe ao réu quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor - inteligência do artigo 333 inciso II do Código de Processo Civil. Restando comprovada a prestação de serviços advocatícios, sem que houvesse contrato escrito entre as partes e não provando o contratante a inexecução do mandato ou o pagamento do valor cobrado pelo advogado contratado, deve-se manter a sentença que julga procedente o pedido de arbitramento judicial de honorários.[4]
APELAÇÃO CIVIL - ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - ART. 22, § 2º, DA LEI Nº 8.096/94 - CONTRATO VERBAL - COMPROVAÇÃO DOS SERVIÇOS PRESTADOS - HONORÁRIOS DEVIDOS - RECURSO - SENTENÇA MANTIDA. Instruída a inicial com a documentação comprobatória da execução dos serviços profissionais prestados em benefício do cliente, com o ajuizamento de demanda judicial satisfativa, impõe-se o arbitramento judicial dos honorários, em face da ausência de contrato escrito, visando a justa remuneração dos serviços de advocacia e a salvaguarda da dignidade da profissão, que tem status constitucional, tendo em vista sua expressa previsão no art. 133 da CR/88. [5]
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AÇÃO DE ARBITRAMENTO. Comprovada a prestação dos serviços de advocacia, na falta de contrato escrito de honorários, é perfeitamente cabível o pedido de arbitramento judicial. Inteligência do art. 22, § 2º, da Lei n. 8.906/1994. [6]
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONTRATO VERBAL. Incontroversa a prestação do serviço de advocacia, admite-se a fixação dos honorários mediante arbitramento judicial, nos termos do art. 22, § 2º, da Lei nº 8.906/94, devendo o magistrado utilizar-se de moderação ao dimensioná-los, evitando valores irrisórios ou excessivos, de modo a atentar para o trabalho desenvolvido e a dignidade da profissão. Quantum arbitrado em consonância com o trabalho efetivamente desenvolvido pelo profissional. Sentença mantida por seus próprios fundamentos jurídicos e de direito. POR UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. [7]
Tamanha a relevância de tal questão que o Superior Tribunal de Justiça, instado a decidir a respeito, firmou-se ao lado da corrente majoritária, ora declinada, como se denota do julgado assim ementado:
HONORÁRIOS. CONTRATO VERBAL. ARBITRAMENTO. POSSIBILIDADE.
1. O advogado que não contratou por escrito os honorários tem direito de pedir em juízo o arbitramento de sua remuneração.
2. Na ação de arbitramento, não cabe ao advogado autor provar que contratou os honorários por determinado valor. É dever do juiz declarar o valor dos serviços comprovadamente prestados pelo autor. Ao advogado incumbe provar, apenas, que prestou o serviço a ser remunerado. [8]
Assim, respeitadas as abalizadas opiniões contrárias, entendo que a maneira como a corrente majoritária enfoca tal questão é a mais correta.
Com efeito, se o advogado vai a juízo buscar o arbitramento dos honorários relativos a serviço prestado, basta-lhe, apenas, provar a efetiva realização de seus préstimos impagos, não sendo plausível que não obtenha êxito em sua pretensão porque não realizou a prova dos valores de contratação.
Por sinal, ao magistrado há inúmeros instrumentos para apurar o valor pertinente como cabível e justo para tal arbitramento, tais como prova pericial, utilização da tabela de honorários da seccional da OAB ou, mesmo, dos ditames previstos no artigo 36, do Código de Ética e Disciplina.
Não pode ser aceito, “data venia”, que o cliente seja, na prática, enriquecido ilicitamente duas vezes: com a prestação de serviço pelo advogado (que, como sabemos, é árduo, exaustivo, demandando muito tempo, labor e conhecimento do profissional) a seu favor e com o não pagamento dos competentes honorários ao mesmo.
Em suma, prestado e impago o serviço jurídico, faz jus o profissional ao arbitramento dos seus honorários pertinentes, em valores condignos a seu mister, devendo este provar, apenas e tão somente, tais préstimos e não o valor antecedente avençado.
Notas
[1] In” REsp nº 799.739 - PR
[2] TJMG - Apelação Cível nº 2.0000.00.491244-1/000, Rel. Des. Mariné da Cunha, j. 16.6.2005
[3] TJMG - Apelação Cível nº 374.688-7, Rel. Juiz Batista Franco, j. 30.10.2002
[4] TJMG. Apelação Cível 1.0382.08.093641-4/001 (0936414-75.2008.8.13.0382 (1)), Relator Des. Sebastião Pereira de Souza, 16ª Câmara Cível, j. 23/09/2009
[5] TJMG. Apelação Cível 1.0220.09.012034-0/001 (0120340-43.2009.8.13.0220 (1)), Relator Des. Wanderley Paiva, 11ª Câmara Cível, j. 09/05/2012
[6] TJDFT. Acórdão n. 372844, 20080110615307APC, Relator WALDIR LEÔNCIO LOPES JÚNIOR, 2ª Turma Cível, julgado em 05/08/2009, DJ 03/09/2009 p. 28
[7] TJRS. Apelação Cível Nº 70027583988, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Angelo Maraninchi Giannakos, Julgado em 06/05/2009
[8] STJ. REsp 799739 PR 2005/0194652-0, Relator Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, j. 15/08/2007, Terceira Turma, publ. DJ 17.09.2007 p. 257