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O teletrabalho e a subordinação estrutural

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Agenda 13/01/2014 às 16:20

A teoria da subordinação estrutural é responsável em trazer para dentro do Direito do Trabalho trabalhadores que se encontram inseridos nas novas formas de organização do trabalho, e, por conseguinte, afastados do conceito tradicional e objetivo de subordinação jurídica.

 

1. INTRODUÇÃO

O presente ensaio visa estabelecer as dimensões da subordinação jurídica, bem como o novo critério da subordinação estrutural, hoje já incorporado, de certo modo, pela nova redação do art. 6º e parágrafo único da CLT.

A teoria da subordinação estrutural, que tem como precursor o Ministro do TST Maurício Godinho Delgado é responsável em trazer para dentro do Direito do Trabalho trabalhadores que se encontram inseridos nas novas formas de organização do trabalho, e, por conseguinte, afastados do conceito tradicional e objetivo de subordinação jurídica. É em decorrência das novas formas de gestão administrativa ou de reestruturação produtiva advindas dos efeitos da globalização na organização produtiva e do trabalho que o legislador brasileiro teve o objetivo de traçar o critério de subordinação estrutural, tendo como instrumento a introdução da Lei nº 12.551/2011 ao art. 6º, da CLT.


2. A SUBORDINAÇÃO JURÍDICA NO DIREITO DO TRABALHO

O Direito do Trabalho surgiu como uma necessidade de correção das desigualdades materiais entre empregados e empregadores, vivenciadas durante o final do século XVIII e durante o curso do século XIX na Europa e nos Estados Unidos.

Essas transformações inseriram a relação de trabalho subordinado como o núcleo motor do processo econômico de produção do sistema capitalista. Por isso, diz-se que o Direito do Trabalho surgiu como consequência do desenvolvimento do modo de produção capitalista.

Nessa ótica, estatui Maurício Godinho Delgado:

O Direito do Trabalho é, pois, produto cultural do século XIX e das transformações econômico-sociais e políticas ali vivenciadas. Transformações todas que colocam a relação de trabalho subordinado como núcleo-motor do processo produtivo característico daquela sociedade. Em fins do século XVIII e durante o século XIX se manifestaram, na Europa e Estados Unidos, todas as condições fundamentais de formação do trabalho livre, mas subordinado e de concentração proletária, que propiciaram a emergência do Direito do Trabalho.[2]

Conforme Thiago Chohfi, pode-se considerar, assim, a subordinação jurídica como o próprio Direito do Trabalho por integrar a sua essência e por definir seu grau e campo de incidência.[3]

Segundo Sidnei Machado, a subordinação jurídica representa uma condição necessária para a definição do contrato de trabalho e critério lógico-dedutivo para o reconhecimento da relação de emprego.[4]

De acordo com Marlon Marcelo Murari, a subordinação representa requisito essencial da relação de emprego. Sem ela, a relação de emprego não se caracteriza. Sendo assim:

No conjunto de regras e princípios que compõem o Direito do Trabalho, o empregador tem o condão de subordinar o empregado para organizar os fatores da produção, ou seja, o seu poder de direção é uma espécie de “competência outorgada pelo Direito e não uma força que deixa mandar, simplesmente”. A subordinação é uma situação objetiva direcionada à forma de prestação do trabalho e não uma sujeição pessoal do empregado.[5]

A subordinação é o elemento diferenciador da relação de emprego. É cediço que existem diversas espécies de prestação de trabalho que são concretizadas sem vínculo empregatício. A relação de emprego, por sua vez, somente irá se configurar na medida em que a subordinação se verificar no âmbito laboral. É através da relação de emprego que nasce, para o empregador, o poder empregatício e, por consequência, para o empregado, o dever de obediência, que se exterioriza por intermédio da subordinação jurídica.

A CLT aborda o instituto da subordinação por meio da palavra “dependência” quando, em seu art. 3º, define empregado como: “toda pessoa física que presta serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário”. Desse modo, o termo “dependência”, adotado pelo art. 3º, da CLT, corresponde à subordinação jurídica.

Cabe destacar, então, que o principal critério adotado pelo Direito do Trabalho para a distinção entre os vários tipos de relações de trabalho é exatamente a existência de subordinação jurídica.

Segundo Amauri Mascaro Nascimento:

Trabalho subordinado é aquele no qual o trabalhador volitivamente transfere a terceiro o poder de direção sobre o seu trabalho, sujeitando-se como consequência ao poder de organização, ao poder de controle e ao poder disciplinar deste.[6]

Para o autor em destaque, a subordinação decorre da relação contratual estabelecida entre as partes, em que há a limitação da autonomia da vontade do empregado, a fim de que seja transferida, ao empregador, a direção da atividade que será por ele desenvolvida.[7]

Portanto, registre-se o pensamento de Marlon Marcelo Murari:

A principal característica da relação de emprego é a atividade pessoal e produtiva do empregado, prestada sob subordinação jurídica ao empregador. Esta subordinação, embora não configure uma submissão pessoal, gera um estado de poder para o empregador.[8]

Maurício Godinho Delgado, ao estabelecer o conceito de subordinação jurídica, assevera:

A subordinação corresponde ao polo antitético e combinado do poder de direção existente no contexto da relação de emprego. Consiste, assim, na situação jurídica derivada do contrato de trabalho, pela qual o empregado compromete-se a acolher o poder de direção empresarial no modo de realização de sua prestação de serviços.[9]

Também conforme Maurício Godinho Delgado:

A subordinação seria o polo reflexo e combinado, na relação de emprego, do poder de direção empresarial, também de matriz jurídica. A figura é encarada, pela ordem jurídica, sob um prisma objetivo, atuando sobre o modo de realização da prestação pactuada. A subordinação não gera um estado de sujeição pessoal (prisma subjetivo) do prestador de serviços. Embora esse estado de sujeição possa surgir em exemplos (não são poucos, é verdade) da prática intra-empresarial concreta, ele não é da natureza (da substância) da relação jurídica assalariada. A diferença é fundamental por importar em se concluir que o salário pode ser pensado e concretizado sem tal elemento de sujeição (embora que seja inerente à subordinação).[10]

A subordinação jurídica representa, assim, o elemento característico do contrato de trabalho, que permite distingui-lo dos demais contratos afins. É por intermédio, então, da dependência que se extrai a existência da subordinação, que é a jurídica e não a meramente econômica ou técnica no contrato de trabalho.

O critério da subordinação econômica acontece em decorrência de o salário representar o meio de subsistência do empregado. Trata-se, portanto, de um “critério essencialmente monetário, ou seja, haveria relação de emprego em virtude de estar o empregado vinculado ao empregador, pelo salário.”[11]

Na subordinação econômica, “o empregado recebe ordens porque depende do salário pago pelo empregador como única ou, pelos menos, a principal fonte de sustento próprio e de sua família.”[12]

Ainda de acordo com Nilson de Oliveira Nascimento:

É concebida de acordo com o grau de dependência econômica do empregado ante o seu empregador e segundo a qual o empregado é economicamente mais fraco em relação àquele que lhe (sic) emprega. O patrão, por ser o dono do capital e dos meios de produção, reúne maior capacidade econômica que os empregados, que por esta razão aceitam se subordinar às ordens do empregador.[13]

Todavia, existem trabalhadores que auferem uma condição econômica mais significativa que a do seu empregador.

Relata Eduardo Gabriel Saad: “A dependência não deve ser necessariamente de caráter econômico, de vez que não é impossível haver empregado com fortuna maior do que a do seu empregador. A dependência é de natureza jurídica”.[14]

Além disso, esse mesmo trabalhador poderá se dedicar a uma outra atividade que lhe renda além do trabalho subordinado. Pode, assim, trabalhar de forma subordinada, bem como prestar serviços de maneira autônoma. Há, também, da mesma forma, a situação dos empregados que laboram para mais de um empregador. Portanto, ainda que o empregado não dependa economicamente do empregador, continuará subsistindo a subordinação jurídica.

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Quanto à subordinação técnica, caberiam apenas ao empregador os conhecimentos técnicos e científicos para a realização do trabalho. Convém destacar que, não raras vezes, a qualificação técnica de um empregado é muito maior que a de seu empregador. Assim, quanto maior for o grau de qualificação profissional do empregado, menor será o seu grau de sujeição em relação às ordens do empregador, “chegando ao ponto de o empregador depender tecnicamente da prestação de serviços do empregado e não o contrário.”[15]

Desse modo, ainda de acordo com Marlon Marcelo Murari:

Para o empregado tradicional, o poder diretivo deve ser mais intenso, pois a subordinação é maior, ao passo que, para o empregado altamente qualificado, exercente de cargo de confiança ou gerência, o poder diretivo seria menos intenso, sempre respeitando os limites constitucionalmente assegurados.[16]

Pedro Paulo Teixeira Manus acentua que quanto maior o grau de escolaridade exigido pela função e quanto mais qualificado tecnicamente for o empregado mais tênue se torna a subordinação técnica exercida pelo empregador. O autor cita, como exemplo, o trabalho exercido por um técnico em computação eletrônica em uma empresa de metalurgia, cujo empregador desconhece totalmente a atividade desenvolvida por este trabalhador. Do mesmo modo, pode ocorrer com o trabalho executado por médicos, dentistas, advogados, e inúmeros outros, em que o empregador tenha conhecimentos totalmente alheios à formação do empregado.[17]

Essa subordinação mostra-se, então, insuficiente para caracterizar a relação de emprego, não sendo a que melhor caracteriza o contrato de trabalho, em virtude de existirem trabalhadores com maior grau de qualificação que o empregador, pois, “à medida que a empresa vai-se tornando mais complexa e o avanço tecnológico está exigindo um nível de preparação mais elevado, torna-se difícil ao empregador deter maior conhecimento do que todo e qualquer funcionário seu.”[18]

Sendo assim, ainda conforme Simone Cruxên Gonçalves:

Em virtude da crescente especialização das profissões, frequentemente muitos empregados detêm maior conhecimento do que seu empregador na parte que concerne aos serviços executados. Tal pode ocorrer, por exemplo, com médicos, advogados, analistas de sistemas, administradores, entre outros.[19]

A esse respeito, Pedro Paulo Teixeira Manus destaca que há uma quase total ingerência do empregador quando a prestação de serviços do empregado é prestada sem qualquer qualificação técnica. Neste caso, torna-se necessário o patrão determinar o que fazer, como fazer e quando fazer. De outro modo, revela que quanto maior for o grau de escolaridade exigido pela função e quanto mais qualificado tecnicamente for o empregado, mais tênue torna-se a sua subordinação hierárquica ou jurídica.[20]

Tal também é a visão de Simone Cruxên Gonçalves:

A subordinação está presente em todos os contratos de trabalho, às vezes de forma mais acentuada, às vezes de forma mais diluída. O grau de subordinação é variável, dependendo da natureza da atividade e da função do empregado, do grau de instrução necessário para o desempenho do cargo, do local de trabalho, da organização empresarial, etc. A subordinação torna-se menor à medida que o trabalho é mais técnico e intelectual, e acentua-se à medida que é mais manual.[21]

Portanto, a subordinação jurídica está presente em todos os contratos de trabalho, podendo apenas variar de intensidade em decorrência da atividade que é executada pelo empregado.

A subordinação social também se revela inadequada para fins de caracterização da relação de emprego por demonstrar a ideia de que o empregado somente se insere socialmente por meio da empresa.

Ao apresentar críticas à subordinação social, Marlon Marcelo Murari cita o exemplo do professor de música que é bem posicionado social e economicamente e que, em razão disso, não precisa do empregador para inserir-se socialmente.[22]

Sandra Lia Simón assevera que, muito embora a maioria dos trabalhadores dependa economicamente de seu empregador, não há descaracterização do contrato de trabalho pelo fato de o empregado possuir outras fontes de renda. Várias são as relações de emprego nas quais o trabalhador tem conhecimentos técnicos superiores aos de seu empregador. Por isso, tanto a subordinação econômica quanto a técnica podem funcionar como “indícios” da existência de verdadeiro pacto laboral, mas não representam os seus elementos essenciais.[23]

Quanto à subordinação jurídica, esta deve ser vista sob um prisma objetivo, de forma a atuar sobre o modo de realização da prestação de serviços do empregado e não sobre a sua pessoa. Em razão disso, revela-se incorreta a visão subjetiva da subordinação, que faz com que a mesma recaia sobre a pessoa do trabalhador, colocando-o em estado de sujeição perante o empregador.[24]

A esse respeito, assinala Maurício Godinho Delgado:

A subordinação jurídica é o polo reflexo e combinado do poder de direção empresarial, também de matriz jurídica. Ambos resultam da natureza da relação de emprego, da qualidade que lhe é ínsita e distintiva perante as demais formas de utilização do trabalho humano que já foram hegemônicas em períodos anteriores da história da humanidade: a escravidão e a servidão.[25]

Também Maurício Godinho Delgado, ainda sob tal prisma – o objetivo da subordinação –, defende a subordinação objetiva como elemento integrante da relação de emprego:

A subordinação objetiva, ao invés de se manifestar pela intensidade de comandos empresariais sobre o trabalhador (conceito clássico), despontaria da simples integração da atividade laborativa obreira nos fins da empresa. Com isso, reduzia-se a relevância da intensidade de ordens, substituindo o critério pela ideia de integração aos objetivos empresariais.[26]

Alice Monteiro de Barros aduz que a integração do trabalhador na organização empresarial representa uma tentativa de busca em se tentar traçar uma distinção entre o trabalho subordinado e o trabalho autônomo. Segundo a autora, a base para se definir a relação de emprego residiria no fato de o empregado constituir parte integrante da organização. Trata-se, na verdade, da substituição da subordinação-controle ou subjetiva pela subordinação-integração ou objetiva.[27]

Paulo Emílio Ribeiro Vilhena também lança essa espécie de subordinação jurídica objetiva no Direito do Trabalho. Para o autor, a subordinação integrativa é aquela que se manifesta pela participação integrativa do trabalhador nos fins e objetivos do empreendimento do tomador de serviços.[28]

A relação de emprego, assim, despontaria “como a participação integrativa da atividade do trabalhador na atividade do credor”, e, também, “como uma forma de conduta instrumentalmente voltada para um procedimento produtivo”.[29]


3. O TELETRABALHO E A SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL

Cumpre ressaltar que, em decorrência do desenvolvimento tecnológico e da descentralização dos processos produtivos no âmbito empresarial, como, por exemplo, o trabalho à distância, o teletrabalho e a alta especialização do conhecimento, o trabalhador tem revelado maior liberdade na execução da prestação de serviços, ocorrendo, então, a relativização da subordinação jurídica do empregado às formas tradicionais de trabalho. Ou tem provocado a necessidade de redefinição e de ampliação do conceito jurídico de subordinação.

Jair Teixeira Reis comenta que, modernamente, a partir da implementação de novas tecnologias à distância e de telecomunicações ou da informática, o exercício da atividade econômica se distanciou do modelo tradicional de produção, que concentrava máquinas e pessoas no interior de grandes fábricas, onde o trabalhador laborava em tempo integral sob o olhar atento do empregador e sob o método fordista de produção. Em razão dessas mudanças tecnológicas, o Direito do Trabalho passou a ser visto de uma forma redimensionada.[30]

Nesse viés, Sidnei Machado, ao discorrer sobre o teletrabalho, atesta que este representa uma nova forma de trabalho em domicílio surgida há pouco mais de vinte anos nos Estados Unidos, em decorrência do grande desenvolvimento das tecnologias de informação e de telecomunicações. Representa um trabalho em rede, flexível e à distância, fazendo uso intensivo da tecnologia da informação.[31]

Nesse sentido, o teletrabalho compreende uma nova forma de flexibilizar o emprego típico, que provocou uma mudança radical nas relações de trabalho. O teletrabalho, ao contrário do trabalho em domicílio clássico, maximiza o uso de tecnologia da informação sem a qual não seria viável a sua organização. Além disso, pressupõe um trabalho fora da empresa e também não prestado necessariamente na residência do trabalhador. No Brasil, por exemplo, o teletrabalho tem se constituído à maneira de trabalho precário, informal e de baixa remuneração.[32]

Sendo assim, o trabalhador, numa atividade considerada de teletrabalho, tem a condição de ser um trabalhador subordinado ou um trabalhador autônomo. Por isso, o teletrabalho se situa nas chamadas “zonas fronteiriças”.

Conforme Sidnei Machado, por meio do teletrabalho, tem-se como estratégia das empresas:

Valorizar e incentivar o teletrabalho como um mecanismo de redução dos custos imobilizados e, é claro, redução do custo da mão de obra. Entre as vantagens catalogadas pela nova administração, o teletrabalho oferece ainda uma maior produtividade, já que vincula a remuneração à produção. Ou seja, o teletrabalho substitui uma obrigação de meio (tempo à disposição na empresa) por uma obrigação de resultado (produção). Com isso, está implícito, na proposta de promoção do teletrabalho, que a redução dos custos da mão de obra se dá pelo enquadramento jurídico de um teletrabalhador independente, portanto, não empregado.[33]

Segundo Sidnei Machado, o trabalho em domicílio e o teletrabalho possuem em comum um trabalho à distância com obrigação de resultado. Sem controle visual pelo empregador, o recurso às tecnologias da informação (telefone, fax, e-mail, internet, entre outras) propicia uma nova forma de controle e de subordinação do trabalhador. Ao contrário do trabalho em domicílio, o teletrabalho, em razão das facilidades da tecnologia, produz uma “teledisponibilidade”, que representa uma forma de subordinação à distância.[34]

Informa, ainda, Sidnei Machado que os aplicativos e programas de computador desenvolvidos pela engenharia da informática possibilitam não somente inúmeros cálculos, mas também um potencial infinito de controle sobre os meios utilizados na execução do trabalho, a começar pelo controle do tempo de execução de tarefas, produção por hora, dia, etc. Tudo on-line de forma interativa, em rede, e, muitas vezes, em tempo real. O fator distância, portanto, na prestação de serviço, é irrelevante por tornar o computador ou a tecnologia utilizada uma extensão da empresa que invade a vida privada e familiar do trabalhador. Além disso, as possibilidades de o empregador dar ordens ao teletrabalhador se intensificam.[35]

Consoante Sidnei Machado, por essa razão:

O teletrabalho é uma atividade executada em forma de uma espécie de telessubordinação, ou seja, uma subordinação jurídica à distância, que se diferencia do trabalho prestado na empresa por tratar-se de um modo particular de organizar o trabalho. Por outro lado, o Direito do Trabalho brasileiro ainda não possui regulamentação do teletrabalho e a jurisprudência tende a tratá-lo como uma modalidade de trabalho autônomo, por vezes, um empregado em domicílio, quando presentes todos os elementos qualificadores da relação de emprego.[36]

Ocorre que o teletrabalho constitui, efetivamente, uma nova e peculiar forma de atividade, cujas características evidenciam um modo especial de subordinação jurídica, com a inserção plena do trabalhador na atividade produtiva, presentes, ainda, o potencial controle e a direção do trabalho pelo empregador, os quais não ficam descaracterizados pela distância na execução do serviço.[37]

Em virtude disso, decisões judiciais no Brasil têm defendido a existência da subordinação estrutural, que parte da compreensão da inadequação do modelo tradicional e objetivo da subordinação jurídica para fins de reconhecimento da relação de emprego a determinados trabalhadores que se encontram em determinada zona cinzenta, como é caso do teletrabalhador.

Maurício Godinho Delgado, Ministro do TST e precursor desta teoria, leciona:

Estrutural é, pois, a subordinação que se manifesta pela inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços, independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento.[38]

Ainda à luz do que preconiza Maurício Godinho Delgado:

[...] nessa dimensão de subordinação, não importa que o trabalhador se harmonize (ou não) aos objetivos do empreendimento, em que receba ordens diretas das específicas chefias deste: o fundamental é que esteja estruturalmente vinculado à dinâmica operativa da atividade do tomador de serviços.[39]

Com a existência de novas figuras contratuais surgidas frente aos avanços tecnológicos, o conceito de subordinação jurídica não mais se funda exclusivamente no ato pelo qual o empregado se obriga a receber ordens e a obedecer diretamente às ordens do empregador na direção dos serviços prestados para os quais foi contratado.

E como ensina Maurício Godinho Delgado:

A readequação conceitual da subordinação, sem perda de consistência das noções já sedimentadas, é claro, de modo a melhor adaptar este tipo jurídico às características contemporâneas do mercado de trabalho, atenua o enfoque sobre o comando empresarial direto, acentuando, como ponto de destaque, a inserção estrutural do obreiro na dinâmica do tomador de seus serviços.[40]

Nesse sentido, não há mais necessidade de ordem direta do empregador para que seja reconhecida a subordinação jurídica. Basta que o trabalho esteja inserido na atividade produtiva do tomador de serviços por meio da concepção estruturista da subordinação para que seja considerado empregado.

Maurício Godinho Delgado, Ministro do TST, já proferiu decisão pela 1ª Turma do TRT da 3ª Região, quando Juiz daquela Corte, apresentando a subordinação em três dimensões: a clássica, a objetiva e a estrutural. Segundo ele, estando evidenciada qualquer uma dessas três dimensões, restaria caracterizada a relação empregatícia, veja-se:

EMENTA: SUBORDINAÇÃO JURÍDICA – DIMENSÕES PERTINENTES (CLÁSSICA, OBJETIVA E ESTRUTURAL) – A subordinação jurídica, elemento cardeal da relação de emprego, pode se manifestar em qualquer das seguintes dimensões: a clássica, por meio da intensidade de ordens do tomador de serviços sobre a pessoa física que os presta; a objetiva, pela correspondência dos serviços deste aos objetivos perseguidos pelo tomador (harmonização do trabalho do obreiro aos fins do empreendimento); a estrutural, mediante a integração do trabalhador à dinâmica organizativa e operacional do tomador de serviços, incorporando e se submetendo à sua cultura corporativa dominante. Atendida qualquer dessas dimensões da subordinação, configura-se este elemento individuado pela ordem jurídica trabalhista (artigo 3°, caput, CLT). (MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. RO 00173.2007.073.03.00.6. Relator: Juiz Maurício Godinho Delgado, 6ª Turma, DEJT, 12 abr).

Então, para Maurício Godinho Delgado, é trabalhador subordinado...

Desde o humilde e tradicional obreiro que se submete à intensa pletora de ordens do tomador ao longo de sua prestação de serviços (subordinação clássica), como também aquele que realiza, ainda que sem incessantes ordens diretas, no plano manual ou intelectual, os objetivos empresariais (subordinação objetiva), a par do prestador laborativo que, sem receber ordens diretas das chefias do tomador de serviços, nem exatamente realizar os objetivos do empreendimento (atividade-meio, por exemplo), acopla-se, estruturalmente, à organização e dinâmica operacional da empresa tomadora, qualquer que seja sua função ou especialização, incorporando, necessariamente, a cultura empresarial ao longo da prestação de serviços realizada (subordinação estrutural).[41]

Imperioso observar que, em 15 de dezembro de 2011, foi sancionada a Lei nº 12.551, que introduziu o parágrafo único ao art. 6º, da CLT. O seu objetivo foi o de equiparar, por meio do critério da subordinação estrutural, os efeitos jurídicos da subordinação jurídica exercida por meios telemáticos e informatizados aos da executada por meios pessoais e diretos de comando no local de trabalho, verbis:

Art. 6º.

Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.

Insta destacar que a subordinação clássica bem como a objetiva não são mais suficientes para abarcar as novas formas de organização produtiva do empregador que se encontram em determinada zona cinzenta no Direito do Trabalho. Em razão disso, a inovação legislativa teve a finalidade de atribuir à atividade prestada pelo teletrabalhador o status de legítima relação de emprego, de modo que o trabalhador possa executar o seu labor de forma não mais autônoma, mesmo porque o critério da subordinação objetiva já não se mostra suficiente para traçar a distinção entre o trabalho autônomo e o subordinado.

Nessa ótica, expressa Uriarte citado por Alice Monteiro de Barros:

A inserção na organização empresarial, ainda que seja um elemento próprio da relação de trabalho, não é exclusivo da mesma, já que o empregador incorpora ao desenvolvimento da atividade empresarial não só o trabalho de seus próprios trabalhadores, mas também a atividade, contínua, porém autônoma, de colaboradores, que, mesmo não sendo empregados, estão incorporados ao cumprimento da atividade econômica organizada da empresa.[42]

É necessário invocar o critério proposto por Maurício Godinho Delgado, a fim de que o teletrabalhador ganhe contornos bem delineados como empregado quanto à subordinação estrutural, que representa a ampliação do conceito de subordinação e cuja finalidade é acoplar estruturalmente à organização e à dinâmica operacional da empresa tomadora a cultura cotidiana empresarial ao longo da prestação de serviços realizada, qualquer que seja a função do empregado.[43]

Pertinente trazer à baila o azado pensamento de Ana Paula Pavelski, segundo a qual, mesmo não estando o empregado conectado às formas tradicionais de trabalho, a tecnologia pode significar maior controle do empregado pelo empregador, aumentando contatos e espaços em que as atividades laborativas se realizam. O tempo de descanso, de recuperação física e mental do trabalhador pode diminuir, tendo em vista que esses meios de comunicação podem fazer com que o indivíduo não se desligue de suas responsabilidades perante o empregador.[44]

Em vista disso, a tecnologia pode tornar-se ainda mais intensa e exigir do candidato ao emprego um perfil mais minucioso.

Em tais condições, Amaury Haruo Mori conclui que “a tecnologia a cada dia surpreende a sociedade com novos instrumentos eletrônicos, muitos dos quais poderão ser utilizados para controlar o desempenho profissional dos trabalhadores”.[45]

Ainda de acordo com Amaury Haruo Mori:

No âmbito do contrato de trabalho, instrumentos tecnológicos acabam sendo utilizados como meio de controle da pessoa do trabalhador, seja com objetivo de aumentar a sua produtividade, seja como forma de proteger a propriedade privada e os interesses do empregador.[46]

Comenta Luiz Carlos Amorim Robortella que os empregados viajantes, externos ou representantes comerciais, naturalmente, estão menos sujeitos a determinadas exigências, por serem seus trabalhos executados, teoricamente, longe do espaço empresarial e sem controle de horário.[47]

Ocorre, entretanto, que essas modalidades de trabalho não desnaturam, de forma alguma, a superação do poder de direção e de comando exercido pelo empregador no contexto da relação de emprego.

Na mesma direção, assinala Jair Teixeira Reis:

Com as modalidades de trabalho à distância, abre-se a possibilidade de mudança do controle do tempo de trabalho para o controle dos resultados, havendo a passagem de uma cultura de "compra do tempo", proveniente da organização tradicional, para a cultura da "compra do resultado", fruto da organização informatizada. Assim, as discussões acerca da separação do tempo de trabalho e do tempo livre passam por um necessário redimensionamento, pois o local de trabalho na empresa tende a perder força. No entanto, a subordinação jurídica continuará a ter o mesmo papel na configuração do vínculo de emprego.[48]

Assegura Ana Paula Pavelski que a pessoalidade do empregado, a marca intuitu personae, dessa prestação laborativa, característica dos contratos de trabalho, é mitigada pela possibilidade dos meios de comunicação e de trabalho à distância. É o caso, mais uma vez, do teletrabalho, em que o núcleo familiar do trabalhador ajuda nas tarefas, dependendo do local onde as mesmas se realizam.[49]

Pode-se, concluir, que a teoria da subordinação estrutural é responsável em trazer para dentro do Direito do Trabalho trabalhadores que se encontram inseridos nas novas formas de organização do trabalho, e, por conseguinte, afastados do conceito tradicional e objetivo de subordinação jurídica. É em decorrência das novas formas de gestão administrativa ou de reestruturação produtiva advindas dos efeitos da globalização na organização produtiva e do trabalho que o legislador brasileiro teve o objetivo de traçar o critério de subordinação estrutural, tendo como instrumento a introdução da Lei nº 12.551/2011 ao art. 6º, da CLT.

Sobre a autora
Rúbia Zanotelli de Alvarenga

Doutora e Mestre em Direito do Trabalho pela PUC-MG. Professora de Direito do Trabalho, Processo do Trabalho e de Direito Previdenciário. Advogada.<br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVARENGA, Rúbia Zanotelli. O teletrabalho e a subordinação estrutural. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3848, 13 jan. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26377. Acesso em: 22 nov. 2024.

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