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Ação declaratória incidental e questão prejudicial

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Agenda 01/03/2002 às 00:00

Sumário: Introdução; Capítulo 1 - A Ação Declaratória, 1.1 - Breve histórico, 1.2 – Características, 1.3 - Natureza da ação declaratória, 1.4 - Eficácia da sentença; Capítulo 2 - Questões Prejudiciais, 2.1 – Generalidades, 2.2 - Questões prejudiciais e questões preliminares, 2.3 - Prejudicialidade homogênea e heterogênea, 2.4 - Relação entre questão prejudicial e declaração incidente; Capítulo 3 - A Ação Declaratória Incidental, 3.1 – Histórico, 3.2 - Natureza jurídica, 3.3 – Conceito, 3.4 - Finalidade , 3.5 - Limites da coisa julgada, 3.6 - Interesse de agir, 3.7 - Procedimento no direito brasileiro; Capítulo 4 - A Ação Declaratória Incidental e sua Relação com as Questões Prejudiciais, 4.1 – Explicação, 4.2 - A questão prejudicial até o Código de 1939, 4.3 - A coisa julgada, 4.4 - Diferença entre o inciso III do art. 469 e o art 470 do CPC; Conclusão; Referências Bibliográficas


INTRODUÇÃO

Dentre as modificações introduzidas pelo vigente Código de Processo Civil, aparece como das mais relevantes, do ponto de vista teórico, a declaração incidente e as questões prejudiciais. O tema é realmente complexo, suscitando fundadas dúvidas e divergências doutrinárias e jurisprudenciais mesmo naqueles países, como a Alemanha, Áustria e Itália que o consagram há muito tempo.

Pode ocorrer que, algumas vezes, uma das partes pretenda ver definitivamente resolvida uma questão prejudicial, com força de coisa julgada, de modo a evitar novas discussões futuras. Para atender a essa situação, contemplou o legislador, a exemplo de algumas legislações estrangeiras, a figura da ação declaratória incidental.

O presente trabalho, então, tem como objetivo estabelecer algumas considerações acerca da ação declaratória incidental, das questões prejudiciais e, por fim, relacionar ambas, para que se tenha exata noção da importância delas em nosso ordenamento jurídico.

Para isso é necessário apresentar-se todos os enredos que a ação declaratória incidental despertou desde o seu nascedouro, analisando, claro, sua nascente, a ação declaratória, sua fonte, a questão prejudicial, e relacionando-as, tendo em vista que são diretamente ligadas.

Primeiramente, se fará uma abordagem da ação declaratória pois a ação declaratória incidental corresponde a uma ação declaratória embutida no processo cujo objeto inicial era outra relação jurídica a cujo respeito se formulara outro pedido.

Depois, tratar-se-á das questões prejudiciais que são a fonte da ação declaratória incidental, tendo em vista que a declaração incidente resulta do aparecimento de uma questão prejudicial que interferirá no julgamento da lide, sendo então necessária, a requerimento da parte, seu julgamento com força de coisa julgada.

A ação declaratória incidental será tratada logo a seguir, procurando-se trazer todos os detalhes e curiosidades sobre esta tema que, como falam todos os juristas, é muito importante com relação a coisa julgada nos limites do que indefere ou não o pedido.

E, por fim, relacionar-se-á a ação declaratória incidental com as questões prejudiciais, tendo em vista serem diretamente ligadas, para que se possa ter exata noção da interferência das questões prejudiciais na ação declaratória incidental, principalmente, com relação a coisa julgada.


Capítulo 1 - A AÇÃO DECLARATÓRIA

1.1 - Breve Histórico

A ação declaratória começou a aparecer na época do sistema formulário, em Roma, quando passou-se a utilizar de uma forma de processo não condenatório. Nas fórmulas daquele sistema havia a "Demonstratio, que continha o fundamento jurídico da demanda, a Intentio, em que se exprimia a intenção do autor, a Condemnatio, na qual o magistrado dava ao juiz o poder de condenar ou absolver e a Adjucatio, em que se atribuía ao juiz o poder de adjudicar bens aos litigantes"[1] que eram as partes da ação.

Em todas as fórmulas encontrava-se a Intentio. Com relação a Condemnatio, existia em quase todas as fórmulas, menos em uma, específica, que eram as chamadas praejudiciales que eram compostas apenas da Intentio. Assim, passou-se a conceber ações que não tinham finalidade condenatória mas simples declaração de fato de ou direito. Como o praejudicium não tendia a condenação, distinguia-se da ação propriamente dita mas, sendo um judicium, qualificavam-no, também, de actio. Essas fórmulas, visando a simples declaração, eram chamadas de praejudiciales, e tinham por objeto não apenas relações de status mas de natureza patrimonial.

Então, nessa época, os prejudicia passaram a constituir-se casos típicos de ação declaratória, tal como é hoje admitida.

No período de Justiniano, as actiones praejudiciales foram restringidas as questões relativas ao estado das pessoas.

Com o declínio do direito romano, as ações prejudiciais desapareceram e, criaram-se lacunas no que diz respeito as situações jurídicas que demandavam aquele tipo de remédio processual.

Assim, foram criados os juízos provocatórios, revestidos de idéias romanas e com essência germânica, que tinham as seguintes características.[2]

"a) Esses institutos geralmente não são ações mas sim remédios jurídicos, o que se demonstra porque a maior parte desses processos não se inicia por um libellus, como as ações mas sim por uma imploratio officii judicis, uma súplica, portanto, ao juiz, um apelo a sua equidade.

b) Esses processos tem geralmente a forma provocatória, isto é, visam a obrigar o demandado a agir, a provocar sua atividade. No juízo provocatório não é examinada a relação de direito. Esse juízo provocatório, portanto, não constitui ação declaratória, tala como hoje a entendemos, se bem que, no resultado prático, frequentemente se chegasse ao mesmo fim."

Do direito comum, os juízos provocatórios passaram ao dos Estados Modernos da Europa continental, inclusive Portugal. Na Itália foram utilizados até meados do século XIX, desaparecendo na unificação legislativa, sem serem, entretanto, expressamente substituídos pela ação declaratória.[3]

Como conhecida modernamente, a ação declaratória aparece, primeiramente, em uma codificação, na ordenação processual alemã de 1877 (no texto atual, artigo 256), com origem no direito francês que utilizava um tipo de ação destinada ao reconhecimento de escritos e títulos, a action en reconnaissance d´ecrit ou de titre. A redação atual do art. 256 do Código de Processo Civil alemão é.

"Pode-se demandar a declaração da existência ou inexistência de uma relação jurídica e o reconhecimento de uma autenticidade ou a declaração da fasidade de um documento, se o demandante tem interesse jurídico em que a relação jurídica ou a autenticidade ou a falsidade do documento seja declarada imediatamente por decisão judicial."[4]

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Inspirados no Código alemão, vários outro Códigos inseriram, em seus textos, a admissibilidade da ação declaratória, como o Código austríaco de 1895, o norueguês de 1915, o búlgaro de 1930, o polonês de 1933, o japonês de 1926 e o chinês de 1935.

Na Inglaterra ações declaratórias típicas eram conhecidas desde o início do século XIX mas limitadas a casos específicos.

Portugal, como os demais países da Europa Ocidental, recebeu do direito comum os juízos provocatórios e as exceções prejudiciais e os usou frequentemente. Mas somente em 1939, o Código Português veio a consagrar o instituto, dando uma larga amplitude pois admitia a declaração de existência ou inexistência de direito e de fato.

No direito brasileiro, o Código filipino trouxe os juízos provocatórios e as exceções prejudiciais. Entretanto, o reconhecimento legislativo para a ação declaratória, só chegou com a República, introduzida que foi em alguns dos Códigos estaduais de processo civil. Primeiramente se deu no Código de Processo Civil do Distrito Federal de 1924, inspirado pelo Código alemão. Em 1939, O Código de Processo Civil, estendeu, a todo país, as vantagens da ação declaratória, inspirando-se, outra vez, no código alemão, reproduzindo quase completamente o texto deste. E o Código de Processo Civil de 1973, em seu art. 4º, admite a ação declaratória, em redação equivalente a do Código anterior.

1.2 - Características

A ação declaratória é uma ação de conhecimento que tem por objetivo uma declaração judicial quanto à determinada relação jurídica. Como o litígio se concentra exatamente na incerteza da relação jurídica, a declaração judicial torna certo aquilo que é incerto. Depreende-se que a ação declaratória não pretende mais do que declarar a existência ou inexistência de uma relação jurídica. O fundamento legal da ação declaratória se apresenta no art. 4º do CPC, que diz: "O interesse do autor pode limitar-se à declaração: I - da existência ou da inexistência de relação jurídica; II - da autenticidade ou falsidade de documento".

A declaração, na ação declaratória, é o principal elemento pois existem ações em que a declaração não é e elemento mais importante, não interessando, assim, para o estudo da ação declaratória.

Nas ações declaratórias, o conflito entre as partes está na incerteza da relação jurídica, que a ação visa a desfazer, tornando certo aquilo que é incerto, desfazendo a dúvida em que se encontram as partes quanto à relação jurídica.

O interesse de agir consiste apenas na obtenção de uma decisão declarando a existência ou inexistência de uma relação jurídica ou a autenticidade ou falsidade de um documento.

Moacyr Amaral Santos[5] fornece sobre o assunto o seguinte exemplo:

"Quero efetuar um empréstimo num banco. Entretanto alguém propala que lhe sou devedor de vultosa quantia, ou que não costumo pagar minhas dívidas. Porque o banco tem no seu cadastro informações colhidas na praça sobre a situação dos seus clientes, à vista daquele boato, nega-me o empréstimo. Poderei, sabedor de quem seja esse inimigo gratuito, propor contra ele ação de perdas e danos, exigir que me indenize pelo mal que me causa. Mas pode ser que essa pessoa seja insolvável. Que me adiantará exigir-lhe indenização? Então, vou a Juízo e proponho uma ação declaratória da inexistência de relação de débito e crédito entre mim e essa pessoa. Peço que o Juiz declare que entre mim e essa pessoa não há relação de devedor e credor, ou que nunca houve relação de devedor e credor. A sentença apenas declarará isso, estabelecerá a certeza quanto a uma relação jurídica duvidosa"

Assim, as ações declaratórias tem como elemento predominante o de enunciado de fato. Nelas se diz, em primeiro plano, que algo existe ou que algo não existe.

1.3 - Natureza da ação declaratória

Várias foram as teorias que buscaram esclarecer qual a natureza jurídica da ação declaratória. Sustentou-se a existência de um "duplo espírito", baseado na Exposição de Motivos do Código alemão, que se separaria no direito a prestação em si e o direito a segurança da relação. Também sustentou-se a ação declaratória como remédio preventivo de litígios mas se viu que a função preventiva na realidade não existe. A teoria da cautio diz que toda relação jurídica deriva um direito a garantia da relação, a sua segurança mas também esta teoria não foi aceita, tendo em vista que mesmo que a finalidade pretendida pelo legislador ao instituir a ação declaratória seja assegurar direitos, o conteúdo da sentença não é dessa natureza. E menos satisfatória foi a teoria que pretendia ver a ação declaratória com uma ação sem pretensão pois trata-se de claro retrocesso as concepções medievais, a filiar o instituo ao processo provocatório.

Citado por Lopes da Costa,[6] Costa Manso formula interessantes anotações à natureza da ação declaratória, in verbis:

"A ação meramente declaratória é um remédio preventivo dos litígios. Por ela, exerce o Estado a ação tutelar que lhe compete, não só assegurando a paz entre os cidadãos, mas também garantindo os direitos subjetivos, quando, ainda não violados, sofram grave ameaça ou se tornem incertos, daí resultando diminuição de sua importância social. Sou portador de um título não vencido. Quero descontá-lo, porque necessito de dinheiro. Encontro, porém, sérios obstáculos, porque o devedor propalou na praça, ou declarou, mediante protesto judicial, que o título é falso, que a dívida já foi paga. Não posso intentar a ação de cobrança para demonstrar o meu direito. Mas a lei me assegura a faculdade de descontar o título, de transformá-lo imediatamente em dinheiro. Impor-me paralelamente o sacrifício de aguardar o vencimento da dívida, para só então agir, será tornar ilusória a garantia, será diminuir a extensão de meu direito.

A ação declaratória, entretanto, me acudirá, pois, por meio dela, afasto a dúvida suscitada, torno límpido o direito e evito o dano que estive ameaçado de sofrer. Outro exemplo: quero efetuar um empréstimo, mas encontro o meu crédito abalado, porque alguém se diz meu credor por vultosa quantia, ou me acusa de impontual, em relação a certo débito. Como sair dessa situação embaraçosa, sem auxílio do juiz? E como pedir o auxílio do juiz, sem o uso da ação meramente declaratória, pois nenhum direito exigível tenho no momento? Dir-se-á que posso recorrer à ação de perdas e danos. Mas, e se o réu estiver de boa-fé, convicto de que é meu credor? Se for insolvente, não podendo assim indenizar-me? Ainda uma hipótese.

Certa mulher, que viveu na companhia de um homem, jacta-se, depois de rompidas as relações, de ser casada com ele. Esse indivíduo se vê colocado numa situação angustiosa. Pode pretender casar e encontrará justa repulsa nas famílias, em conseqüência do suposto estado. Desejará alienar um imóvel e lhe exigirão a outorga da pretendida mulher. Dando-se-lhe, porém, a faculdade de pedir a declaração de seu estado civil, mostrará ele a sentença do juiz, e a sua situação jurídica se tornará definida. Recusar a ação declaratória, admitindo apenas a existência do remédio judicial, quando o direito se tornar exigível, é, de um lado, deixar sem garantia inúmeras relações jurídicas e, de outro, colocar o Estado na posição de um provocador de litígios, só se interpondo entre os contendores depois de travada a luta".

Para Barbi[7] a melhor teoria que explica a natureza jurídica da ação declaratória é aquela usada por Chiovenda, de ação como direito potestativo ou poder jurídico tendente a atuação da vontade da lei.

Já Fabrício[8], entende que a teoria de Chiovenda é compatível com qualquer das teorias que sustentam a autonomia do direito de agir em face do direito material, dizendo-se que ela melhor se ajusta a teoria do direito "abstrato" de agir do que a idéia de ação como direito potestativo.

Assim, a melhor teoria, no nosso entender, é aquela que diz que a certeza jurídica é, em si mesma, um bem da vida, perseguível, como qualquer outro bem juridicamente relevante, por via do processo. A doutrina anterior via o interesse sempre capaz de ser alcançado por outro meio, quando o processo não alcançar. Na verdade há bens que só o processo pode alcançar. Então, funciona o processo, nesse caso, como fonte autônoma e única possível do bem procurado pois ao direito de agir, autônomo e abstrato, correlaciona-se o dever jurídico do Estado de prestar o acertamento judicial.

1.4 - Eficácia da sentença

Declaratória é a sentença que não constitui situação jurídica, nem condena a uma prestação. Declara uma relação jurídica preexistente. Em linhas gerais, toda sentença tem um conteúdo declaratório e condenatório. O Juiz não pode constituir uma relação jurídica ou condenar a uma prestação sem reconhecer a preexistência de um direito, pois que a lei é a medida das ações humanas e a sentença, não podendo ser ato de arbítrio, terá de fundar-se na preexistência de um direito. Ao mesmo tempo, se o Juiz reconhece e declara o direito, condena o réu nas custas e nos honorários de advogado (CPC, art. 20). Em toda sentença há, pois, um conteúdo declaratório e uma disposição condenatória.

A sentença declaratória acolhe o pedido, ou acolhe em parte ou o rejeita. Toda sentença diz que a parte "tem razão" ou "não tem razão" no seu pedido. O "não tem razão" nas ações declaratórias consiste em "tem razão" para outra parte. Assim, ação declaratória tem como finalidade preponderante o enunciado "se perde quem disse que é, ganha quem disse que não é, se perde quem disse que não é, ganha que disse que não é"[9].

O que é próprio da natureza da força declarativa, imediato ou mediato, é a força da coisa julgada material, em toda a extensão do decidido. Daí a sentença na ação declaratória, com ínfimos elementos de outra natureza, a fazer coisa julgada material, em toda a extensão do decidido.

Assim, a eficácia principal da sentença declaratória é a de coisa julgada material. A eficácia imediata, de regra, é a eficácia mandamental. Na ação declaratória, a sentença que transita em julgado tem eficácia para preceito e a execução do que houver sido declarado somente pode promover-se em virtude sentença condenatória.[10]


Capítulo 2 - QUESTÕES PREJUDICIAIS

2.1 - Generalidades

Para que se possa entender precisamente o que é uma ação declaratória incidental é necessário estudar as questões prejudiciais pois elas são a controvérsia da relação jurídica, sobre a qual a ação declaratória incidental diz respeito.

As questões prejudiciais foram estudadas antes mesmo de se conhecer a ação declaratória, tendo em vista que as ações declaratórias, tanto a principal como a incidente, decorrem, no processo histórico, das chamadas actio praeiudicialis do direito romano. Assim, o desenvolvimento histórico das questões prejudiciais é o mesmo da ação declaratória.

Porém, o tema da prejudicialidade poucas vezes recebeu a devida atenção no direito brasileiro, diferente da Itália, onde as questões prejudiciais podem levar a suspensão do processo.

Então, é necessário um esforço no sentido de se delimitar e identificar as questões prejudiciais, para que, assim, chegue-se a compreensão exata da ação declaratória incidental.

A questão prejudicial pode ser definida como "a relação jurídica, ou autenticidade ou falsidade de documento, de cuja decisão depende, no todo ou em parte, julgamento da lide."[11]

Esclarece ainda, Ada Pellegrini Grinover[12], que "em sentido estrito, porém, a moderna doutrina processual reservou a denominação "questão prejudicial" para as questões relativas a outros estados ou relações jurídicas, que não dizem respeito a relação jurídica controvertida, mas que, podendo ser por si só objeto de um processo independente, apresentam-se naquele determinado processo apenas como ponto duvidoso na discussão da questão principal. E as questões prejudiciais, em sentido lato, dá-se hoje o nome de questões preliminares."

Também, Athos Gusmão Carneiro[13] diz que "parece razoável definir como "prejudicial" toda a questão que constitua, em primeiro lugar, um antecedente lógico da sentença (prejudicialidade em sentido lato) e que, outrosssim, se baseie "en una relación sustancial independiente de la que motiva la litis (Hugo Alsina, Las Cuestiones Prejudiciales en el Processo Civil, EJEA, 1959, p. 63)."

Observa-se, então, que a questão prejudicial é o ponto controvertido como um antecedente lógico da decisão final ou ainda os pontos de direito controvertidos que, afora o antecedente lógico da sentença, poderiam ser objeto de ação autônoma.

2.2 - Questões prejudiciais e questões preliminares

É importante distinguir as questões prejudiciais das questões preliminares, para que não haja erro quanto a utilização de uma ou de outra no processo, com conseqüências que podem chegar até a declaração incidente se não houver correta compreensão de quando se tem uma prejudicial e quando se tem uma preliminar.

A prejudicial é questão influidora na decisão principal. Sua resolução prejudica a solução da questão principal. A questão prejudicial relaciona-se com a decisão principal.

Já a questão preliminar ou prévia, entendida como prejudicial no sentido amplo[14], é aquela que antecede a matéria de mérito de contestação ou em recurso, em sentença ou acórdão, tendo por finalidade a regularização do processo, que deve ser decidida com antecedência pois pode impedir o julgamento final.

A questão preliminar também se distingue da questão principal que é o núcleo da sentença pretendida na pretensão material da lide.

Também pode-se dizer que as preliminares são as questões cuja solução pode tornar dispensável ou inadmissível o julgamento das questões dela dependentes, enquanto as prejudiciais são as questões cuja decisão influenciará ou determinará o conteúdo da questão vinculada.[15]

Fabrício[16] faz uma correta diferenciação entre os dois tipos de questões, quando diz que a questão preliminar é aquela que, a depender do sentido em que seja resolvida, pode obstar a apreciação da principal, tornando-a desnecessária ou mesmo imprevisível, como quando uma questão relativa a legitimidade ad processum, se dirimida no sentido da ausência desse requisito, trunca aí mesmo o iter processual, impedindo o juiz de passar ao exame de outras questões, a respeito das quais fica pré-excluída qualquer apreciação.

Com relação a questão prejudicial, diz Fabrício que ela não fecha a porta a posterior apreciação da principal mas pode predeterminar o sentido em que será resolvida, como quando alguém é chamado a responder como fiador e alega, como defesa, a nulidade ou inexistência da obrigação principal, ficando a resolução judicial que acolher essa alegação, condicionada ao teor desta decisão.

Para este trabalho, importa que se compreenda a questão prejudicial pois relaciona-se, diretamente, com a ação declaratória incidental.

2.3 - Prejudicialidade homogênea e heterogênea

As questões referentes a prejudicialidade são complexas em toda a doutrina, cabendo, aqui, mais uma distinção com relação as questões prejudiciais para que se especifique o termo questão prejudicial que se utiliza neste trabalho.

A distinção entre prejudicialidade homogênea e heterôgenea está na identidade entre a questão prejudicial e a questão principal como pertencentes ao mesmo ramo do direito.

A heterôgenea envolve relações interjurisdicionais. A decisão do juízo cível pode influir na decisão do juízo criminal, hipótese em que a possibilidade de declaração incidente é afastada pela radical incompetência ratione materiae do Juiz da causa prejudicada.[17] Já a homogênea é aquela que ocorre dentro do âmbito do processo civil.

Exemplo de prejudicialidade heterôgenea está no art. 1525 do Código Civil que considera a responsabilidade civil independente da responsabilidade penal, não se podendo questionar sobre a existência do fato ou quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no crime.

Aqui, então, interessa a prejudicialidade homogênea que é aquela no âmbito do processo civil e que relaciona a questão prejudicial e a questão principal, pertencendo ao mesmo ramo do direito.

2.4 - Relação entre questões prejudiciais e declaração incidente

No que diz respeito a ação declaratória incidental, as questões prejudiciais são o ponto de partida para o conhecimento da declaração incidente, o que as deixam ligadas a ação declaratória incidental.

O conteúdo da ação declaratória incidental é sempre uma controvérsia em torno de relação jurídica cuja existência ou inexistência condiciona o julgamento da lide. Assim, essa controvérsia envolve uma questão que, relativamente a causa principal, é prejudicial.

O pedido de declaração incidente destina-se a ampliar a área a ser coberta pela coisa julgada entre as mesmas partes, em correspondência com o alargamento da área lógica sobre a qual se desenvolverá o trabalho do juiz, consequente a suscitação da questão prejudicial.

Assim, a ação declaratória incidental tem por objetivo precípuo fazer com que também sobre a questão prejudicial haja coisa julgada. Numa ação, em que tenha sido levantada questão prejudicial, desde que esta passe a ser objeto de ação declaratória incidental, o juiz assim decidindo-a, sobre a mesma pesará, igualmente aquilo que ocorre com o mérito, a autoridade da coisa julgada e, desta forma, ulteriormente, não será possível rediscutir-se tal causa prejudicial.

Como se vê, a questão prejudicial é causa para a ação declaratória incidental que evita, assim, pela formação da coisa julgada sobre a questão prejudicial, que esta venha a ser objeto de nova discussão, provas e decisão, em demandas futuras entre as mesmas partes e que tenham como objeto ou como prejudicial a mesma questão.

Sobre o autor
Rodrigo Frantz Becker

advogado em Brasília (DF)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BECKER, Rodrigo Frantz. Ação declaratória incidental e questão prejudicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 55, 1 mar. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2729. Acesso em: 24 dez. 2024.

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