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Sistema eleitoral proporcional: a reforma necessária

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Agenda 14/04/2014 às 10:28

Sistema Proporcional com Dois Turnos

Nesse novo sistema, cada partido deve estabelecer o conteúdo do seu programa partidário em consonância com as diretrizes estatutárias e elaborar as listas preordenadas de pré-candidatos às eleições proporcionais, definidas em eleições internas (convenções) entre os filiados e sob a supervisão da Justiça Eleitoral e Ministério Público (art. 5º, §§ 2º, 3º e 4º). No sistema atual a lista é elaborada pelo partido, mas sem ordem de classificação de candidatos.[21]

Definidas as listas de pré-candidatos de cada partido, inicia-se o primeiro turno de eleição no qual o eleitor vota apenas na agremiação de sua preferência. O resultado definirá o número de cadeiras que a legenda terá direito, ou seja, seu quociente partidário (QP). Quanto mais votos receber, mais cadeiras terá o partido, vez que alcançará mais vezes a quantidade mínima de votos para garantir uma cadeira, que corresponde ao quociente eleitoral (QE).

O sistema proporcional em dois turnos mantém a aplicação dos quocientes eleitoral e partidário. O projeto, porém, erroneamente chamou o quociente eleitoral de quociente partidário no art. 5º, §§ 5º e 6º. Exige uma pequena correção.

Distribuídas as cadeiras entre os partidos, passa-se ao segundo turno de votação, no qual o eleitor escolherá os candidatos que ocuparão essas cadeiras. O eleitor votará apenas nos candidatos integrantes das listas previamente ordenadas pelos partidos e registradas na Justiça Eleitoral.

Concorrerão apenas candidatos em número correspondente ao dobro de cadeiras obtidas pelo partido ou coligação no primeiro turno. Ou seja, se o Partido A obteve 5 cadeiras, poderá registrar 10 candidatos para o segundo turno.

Nesta fase, o eleitor poderá votar no candidato de sua preferência ou só no partido. Ao votar no candidato, o eleitor poderá alterar a ordem da lista elaborada pelo partido, pois a lista preordenada pelo partido é flexível. Caso vote na legenda, o eleitor estará dando um voto de confiança à ordem da lista preordenada do partido.

Veja-se que o sistema reforça os partidos, já que eles passam a ser “candidatos” no primeiro turno. Essa candidatura lhes exigirá mais compromisso com a ideologia partidária e com a seleção de seus candidatos. Vale dizer, uma vez que os partidos voltam ao centro das atenções do eleitor, as agremiações terão que se organizar, aumentando a institucionalização para se diferenciar uma das outras com propostas concretas e alinhadas ao programa e princípios partidários. A responsabilidade do partido com a elaboração da lista de candidatos nas convenções é maior, pois a qualidade dos candidatos pode aumentar ou diminuir o interesse de escolha do eleitor.

Ademais, como no segundo turno participam apenas candidatos em número correspondente ao dobro de cadeiras obtidas pelo partido no primeiro turno, há uma considerável redução no número de candidatos nas eleições.

Segundo o juiz Marlon Jacinto Reis[22], que também foi um dos idealizadores da Lei do Ficha Limpa, caso o “Voto Transparente” houvesse sido observado em 2012, em lugar de 432.867 candidatos a vereador no Brasil disputando as 57.434 vagas, ter-se-ia um total de 114.868 candidatos disputando o segundo turno. Haveria uma redução de 73,5% no número total de candidatos.[23]

Com menos candidatos, o custo das eleições é menor, o espaço no horário eleitoral é maior para cada candidato e o debate entre as propostas fica mais claro e intenso.

O “Voto Transparente” também corrige as principais distorções do sistema atual. Além de reforçar os partidos, o que, consequentemente, propiciará uma melhor qualidade dos representantes eleitos, o novo sistema permite que as agremiações que não alcancem o quociente eleitoral disputem as vagas remanescentes pela maior-média (art. 5º, § 7º). Por fim, o sistema conserva a palavra final do eleitor, mantendo-se seu voto direto no candidato de sua preferência sem que isso possa resultar em transferência de voto para outro candidato (art. 5º, § 10).

Fica evidente que o sistema proporcional com dois turnos é mais fácil de ser compreendido pelo eleitor. O peso e destino do voto ficam mais transparentes. Em suma: no primeiro turno se vota no partido para definir a distribuição das cadeiras, com aplicação dos quocientes (eleitoral e partidário), enquanto no segundo turno se vota no candidato para se definir os eleitos, com utilização do sistema majoritário relativo.

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De fato, no primeiro turno o eleitor escolhe o partido já conhecendo a lista preliminar de candidatos. Assim, o eleitor tem a oportunidade de conhecer o programa e princípios partidários divulgadas pelo partido em sua propaganda nas eleições e os candidatos vinculados. Isso melhora consideravelmente os objetivos do sistema proporcional, reforçando a fidelidade partidária e o compromisso dos candidatos com o partido e os eleitores. O sistema, portanto, é muito mais compreensível que o atual e os partidos passam a ser mais institucionalizados e fortes, contribuindo para uma melhora sensível na qualidade dos candidatos, e, por consequência, aumentam a eficiência e autenticidade da representação democrática.

Depois, no segundo turno, o eleitor vota no candidato das listas apresentadas que melhor represente as propostas partidárias, sendo eleitos os que tiverem obtido as maiores votações. Nessa fase, o eleitor poderá conhecer melhor os candidatos por meio da propaganda eleitoral gratuita, que oferecerá tempo maior de rádio e TV para cada candidato, já que o número de candidatos será menor.

O novo sistema, contudo, não impede que os candidatos puxadores de grande quantidade votos consigam o maior número de cadeiras para o partido, pois seu nome já estará na lista no primeiro turno. Essa atração de votos, entretanto, ocorre de forma clara para o eleitor, que estará consciente de que seu voto contribui para levar maior número de parlamentares da lista de um partido para o segundo turno.

Certamente, o sistema proporcional com dois turnos apresenta inúmeras vantagens em relação ao sistema atual, porque retifica distorções e pontos fracos, contribuindo, sobretudo, para o incremento da eficiência e autenticidade da representação democrática.


CONCLUSÃO

O sistema proporcional com dois turnos de votação corrige distorções do sistema atual e pode representar o caminho de retomada da confiança do brasileiro nos partidos e candidatos eleitos. Ao colocar o partido no centro das atenções do eleitor, como “candidato” nas eleições, o novo sistema propicia uma maior organização institucional das agremiações para que sejam fiéis aos seus programas e princípios partidários e selecionem candidatos melhores, a fim de garantir um maior número de cadeiras no parlamento. Com partidos mais institucionalizados e candidatos melhores, a representação democrática elevada ao poder terá maior autenticidade e poderá corresponder melhor às expectativas dos cidadãos.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FERREIRA, Pinto. Manual de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 1989.

LINS, Rodrigo Martiniano Ayres. Direito Eleitoral Descomplicado. Rio de Janeiro : Ed. Ferreira, 2011.

RAMAYANA, Marcos. Direito Eleitoral. 12ª ed. Niterói: Impetus, 2011.

MARLON REIS. <http://www.marlonreis.net/> Acesso em 20/8/2013.

CONJUR. <http://www.conjur.com.br/2013-abr-02/eleicao-proporcional-dois-turnos-deixa-decisao-final-eleitor>. Acesso em 20/8/2013.

Câmara dos Deputados. <http://www2.camara.leg.br/>. Acesso em 20/8/2013.


Notas

[2] A democracia é o regime político baseado na vontade popular, expressa nas urnas, com uma técnica de liberdade e igualdade, variável segundo a história, assegurando o respeito às minorias” (FERREIRA, 1989, p. 207).

[3] Lamounier, 1992, 1994, 1999, Mainwaring & Scully, 1995; Mainwaring, 1992, 1999; Kinzo, 1993; Meneguello, 1994; Lima Jr., 1993. DE PADUA, 2012, p. 763.

[4] Ao julgar as Consultas nºs 1.398 e 1.407, em 2007, o Tribunal Superior Eleitoral concluiu que o mandato pertence ao partido. Na ocasião, consignou, ainda: “Conforme já assentado pelo Tribunal, o mandato pertence ao partido e, em tese, estará sujeito à sua perda o parlamentar que mudar de agremiação partidária, ainda que para legenda integrante da mesma coligação pela qual foi eleito.”

[5] Câmara dos Deputados. <http://www2.camara.leg.br/>. Acesso em 20/8/2013.

[6] No sistema majoritário adotado no Brasil, aplicável nas eleições para presidente da república, governadores, prefeitos e vices, e senadores e suplentes, será eleito o candidato que obtiver o maior número de votos válidos, não se computando votos para os seus partidos. O sistema majoritário pode ser absoluto ou relativo. No sistema absoluto, para que o candidato seja eleito ele deve obter a maioria absoluta dos votos nominais válidos, ou seja, metade mais um dos votos. É aplicável às eleições para presidente da república, governador e prefeito de município com mais de 200 mil habitantes. Nesses casos, se um candidato não alcançar a maioria absoluta dos votos, deve ser realizado um segundo turno de votação com o sistema majoritário relativo, no qual será eleito o candidato que alcançar a maior a quantidade de votos em relação ao seu oponente, ainda que a votação não supere 50% dos votos válidos. O sistema majoritário relativo também é aplicável para a eleição de senadores e de prefeitos de municípios com até 200 mil eleitores. Quem obtiver a maior quantidade votos estará eleito. Também é utilizado para a eleição de vereadores e deputados federais e estaduais no caso de nenhum dos partidos alcançarem o quociente eleitoral.

[7] No sistema distrital puro, o território é dividido em distritos, que são distribuídos dentro das circunscrições eleitorais. Ou seja, os Estados, Distrito Federal e Municípios são divididos em distritos e cada candidato disputa votos em apenas um distrito, sendo eleito o que obtiver maior votação dentro do distrito. O ponto forte do sistema é aproximação do eleitor com o seu candidato, facilitando a fiscalização. O ponto fraco é o enfraquecimento dos partidos, pois valoriza demasiadamente a figura do candidato, que dependeria apenas do seu desempenho individual para se eleger.

[8] O sistema distrital misto, segundo o modelo em debate na reforma política, reserva metade das vagas para o sistema proporcional e a outra metade para o sistema distrital puro. A crítica ao sistema é a mesma lançada aos sistemas proporcional e distrital puro.

[9] No Sistema de Listas Partidárias, também conhecido como Sistema de Lista Fechada ou Bloqueada, os partidos políticos organizam previamente a lista dos candidatos que serão eleitos conforme o número de vagas alcançado pelo partido. O eleitor vota no partido e não no candidato. As vagas serão atribuídas aos candidatos segundo a ordem nominal da lista organizada pelo partido. Critica-se o sistema por super valorizar os partidos, entregando-se a definição das listas aos caciques partidários. Ademais, o sistema é flagrantemente inconstitucional, pois fere a cláusula pétrea do voto direto ao atribuir ao partido à escolha dos candidatos eleitos.

[10] In RAMAYANA, 2011, p. 143.

[11] Idem.

[12] Idem.

[13] Idem.

[14] CF. Art. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.

[15] O sistema proporcional brasileiro utiliza a fórmula Hare na redação do quociente eleitoral e a fórmula D’Hondt no cálculo da maior média.

[16] Depois de disputar por três vezes a Presidência da República (1989, 1994 e 1998) e uma vez a prefeitura de São Paulo (2000), Enéas Carneiro foi eleito Deputado Federal em 2002 pelo estado de São Paulo, recebendo votação recorde de 1.573.112 votos, até hoje não superada. A votação expressiva de Enéas ajudou a eleger mais cinco candidatos do seu PRONA – Partido de Reedificação da Ordem Nacional. Com carona nos votos de Enéas, Vanderlei Assis, por exemplo, se elegeu com 275 votos e superou o candidato Jorge Tadeu, do PMDB, que não se elegeu, mesmo recebendo 127.638.

[17] Tiririca conseguiu 1.353.820 votos. Sua “sobra” de 1.049.287 milhão de votos foi suficiente para eleger mais três deputados federais de sua coligação, como Siraque, que obteve 93.314 votos, Otoniel, com 95.971 votos, e o delegado Protógenes, que teve 94.906 votos.

[18] No sistema proporcional vigente no Brasil o voto é duplo. O eleitor, portanto, vota no candidato muitas vezes sem saber que também está votando na legenda (partido). Essa legenda, que também ganha com o voto do candidato, contribui no cálculo do quociente eleitoral para o destino das cadeiras dos partidos em disputa.

[19] 2011, p. 271.

[20] Acórdão n. 3.555/2010 – AL. Mandado de Segurança. Relator Ministro José Delgado.

[21] Atualmente o sistema proporcional do Brasil adota o método de lista aberta, competindo ao eleitor definir quais candidatos serão eleitos. O sistema proporcional com dois turnos adota a lista fechada no primeiro turno e a lista aberta no segundo turno. No segundo turno o eleitor não está vinculado à lista do partido, podendo alterar a sua ordem, inclusive elegendo um deputado federal de uma lista e um estadual de outra.

[22] Márlon Jacinto Reis, juiz titular da 2ª Vara da comarca de João Lisboa (MA) e integrante e co-fundador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), foi um dos idealizadores do “Voto Transparente” apresentado à Câmara dos Deputados. Disponível em: <http://www.marlonreis.net/> Acesso em 20/8/2013.

[23] Dados disponíveis em: <http://www.conjur.com.br/2013-abr-02/eleicao-proporcional-dois-turnos-deixa-decisao-final-eleitor>. Acesso em 20/8/2013. 

Sobre o autor
Edgard Manoel Azevedo Filho

Analista Judiciário Federal do Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia desde 2005. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR (2004). Advogado Eleitoral e Tributarista entre 2004 e 2005. Especialista em Direito Público (Constitucional e Administrativo) pela UNIR (2007). Especialista em Direito Eleitoral e Direito Processual Eleitoral pela Faculdade de Ciências Humanas, Exatas e Letras de Rondônia – FARO (2011). Foi Assessor-Chefe da Presidência e da Corregedoria Regional Eleitoral e Parecerista da Diretoria Geral/TRE-RO. Twitter: @edgardmanoel. Email: edgard_filho@hotmail.com.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AZEVEDO FILHO, Edgard Manoel. Sistema eleitoral proporcional: a reforma necessária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3939, 14 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27303. Acesso em: 22 nov. 2024.

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