1. Introdução
Aos Tribunais de Contas, além de outras competências, foi atribuída a relevante função de auxiliar o Poder Legislativo no exercício do controle externo dos gastos públicos. Contudo, essa função essencial de auxílio não permite concluir que há subordinação dos Tribunais de Contas ao Poder Legislativo.
Dentro da estrutura dos órgãos de contas da União, Estados e Municípios de São Paulo e Rio de Janeiro, destacam-se, respectivamente, os Ministros e Conselheiros, os quais, além de outros requisitos, devem possuir conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública. Nas ausências dos Ministros ou Conselheiros, haverá a substituição por Auditores, os quais devem, igualmente, ter conhecimentos em alguma das áreas indicadas aos titulares.
O presente estudo tem por objetivo elucidar a natureza jurídica, competência e importância dos tribunais de contas. Além disso, pretende-se destacar as funções do cargo de Auditor Substituto, e, após uma análise dos requisitos para exercício desse cargo, mostrar a inconstitucionalidade da Lei Orgânica do Tribunal do Estado do Rio Grande do Sul.
2. A natureza jurídica dos Tribunais de Contas
A Constituição Federal, em seu art. 37, impõe à administração pública a observância dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. O cumprimento de tais princípios e, em especial, a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, considerando-se também a legitimidade, economicidade e aplicação de subvenções, é feita mediante controle interno de cada Poder ou mediante controle externo. Nesse último caso, tal competência é exercida, no âmbito da União, pelo Congresso Nacional, com auxílio do Tribunal de Contas da União (TCU).
Dentre as inúmeras competências inseridas no controle externo podem ser destacadas a apreciação anual das contas do Presidente da República, o julgamento das contas de administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público Federal, e, ainda, apreciação, para fins de registro, da legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração pública direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, além das concessões de aposentadorias, reformas e pensões. Não se incluem como atos sujeitos a apreciação para fins de registro as nomeações para cargos de provimento em comissão, os quais são de livre nomeação e exoneração.
Assim, o Tribunal de Contas da União, além de competências próprias, é fundamental no apoio ao Poder Legislativo para o desempenho do controle externo.
Por vezes, porém, tal Tribunal é visto equivocadamente como um órgão do Poder Legislativo. Tal confusão, resumidamente, advém do fato de que o regramento constitucional referente ao Tribunal de Contas da União e aos Tribunais de Contas dos Estados está inserido no capítulo destinado ao Poder Legislativo, e, também, porque na Lei de Responsabilidade Fiscal, quando se estabelecem os limites de despesas do Poder Legislativo com pessoal nas esferas federal[i], estadual[ii] e municipal[iii], menciona-se que tais limites incluem os respectivos Tribunais de Contas. Além disso, outro fator que contribui para essa errônea conclusão reside no fato de que, exemplificativamente, o Poder Legislativo Municipal pode[iv], com quórum qualificado de dois terços, rejeitar o parecer prévio emitido pelo Tribunal de Contas Estadual sobre as contas que o Prefeito Municipal deve prestar anualmente.
Convém salientar que, com exceção dos municípios de São Paulo e do Rio de Janeiro, que já tinham tribunais de contas, a Constituição Federal impede que municípios criem seus próprios tribunais de contas.
Pode, porém, o Estado ter dois tribunais: um para fiscalizar a aplicação dos recursos pelo Governo Estadual ou dos recursos repassados pelo Estado aos governos municipais, e outro para fiscalizar a aplicação dos recursos municipais pelos governos municipais. Assim, é possível, como já ocorre nos Estados da Bahia, Ceará, Goiás e Pará, haver um Tribunal de Contas do Estado e um Tribunal de Contas dos Municípios. Para ilustrar tal situação, merece aqui a transcrição do que consta na Constituição Federal:
Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei.
§ 1º - O controle externo da Câmara Municipal será exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver.
Como se vê, o controle externo do município é feito pelo Poder Legislativo respectivo, ressaltando-se, novamente, o auxílio prestado pelos Tribunais de Contas. Tal auxílio não representa subordinação, dependência ou vinculação hierárquica. O Tribunal de Contas é um órgão autônomo, que desempenha funções previstas na Constituição, as quais têm como objetivo apoiar o titular do controle externo, que é o Poder Legislativo.
Moraes (2005, p. 390) leciona que
O Tribunal de Contas da União é órgão auxiliar e de orientação do Poder Legislativo, embora a ele não subordinado, praticando atos de natureza administrativa, concernentes, basicamente, à fiscalização.
No mesmo sentido, Pascoal (2013, p. 140) afirma que
O Tribunal de Contas é um órgão constitucional dotado de autonomia administrativa e financeira, sem qualquer relação de subordinação com os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Embora as competências dos Tribunais de Contas estejam constitucionalmente inseridas no Capítulo I do Título IV, dedicado ao Poder Legislativo, esse fato não enseja uma interpretação no sentido de que haja qualquer subordinação administrativa ao Parlamento. O TC é órgão de permeio, agindo ora numa posição de colaboração com o Poder Legislativo, ora no exercício de competências próprias e específicas.
Ainda, apesar da denominação de “tribunal”, tais órgãos não fazem parte do Poder Judiciário[v].
3. A estrutura dos Tribunais de Contas e o cargo de Auditor Substituto de Conselheiro
A Constituição Federal estabelece que o Tribunal de Contas da União é composto por nove ministros e tem quadro próprio de pessoal.
Para ocupar o cargo de ministro, há que se satisfazer, cumulativamente, os seguintes requisitos[vi]: a) ter mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade; b) ter idoneidade moral e reputação ilibada; c) ter notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública; e, d) ter mais de dez anos de exercício de função ou de efetiva atividade profissional que exija os conhecimentos mencionados no item anterior.
A indicação para os cargos de ministro é feita da seguinte forma: um terço pelo Presidente da República[vii] e dois terços pelo Congresso Nacional[viii]. Os indicados pelo Presidente da República deverão ser aprovados pelo Senado Federal, em sessão aberta e mediante voto secreto[ix].
Ainda em relação às indicações a serem feitas pelo Presidente da República, surge a primeira menção ao cargo de Auditor Substituto, uma vez que duas dessas três indicações devem ser feitas, de forma alternada, entre auditores e membros do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, indicados em lista tríplice, de acordo com critérios de antiguidade e merecimento.
Além disso, em relação especificamente ao cargo de Auditor, a Constituição Federal estipula que, quando da substituição a Ministro, terá as mesmas garantias e impedimentos do titular, e, quando estiver no exercício das demais atribuições da judicatura, terá as mesmas garantias de juiz de Tribunal Regional Federal.
Salienta-se, apenas para não causar perplexidade, que o termo “judicatura” refere-se às decisões proferidas nos processos administrativos sob análise do Tribunal de Contas da União. Sobre o tema, Pascoal (2013, p. 144), esclarece que
Não obstante os respeitáveis argumentos, o fato é que a MAIOR PARTE da doutrina e da jurisprudência dos Tribunais Superiores confere NATUREZA ADMINISTRATIVA às decisões do Tribunal de Contas. A base da conclusão está em que o ordenamento jurídico brasileiro, a partir da regra insculpida no citado art. 5º, XXXV, da Lei Maior, adotou o sistema de jurisdição una, também conhecido de monopólio da tutela jurisdicional pelo Poder Judiciário, de sorte que as decisões administrativas dos Tribunais de Contas, enquanto atos administrativos, estão sujeitas ao controle jurisdicional. O entendimento dominante é que não existe no Brasil o chamado contencioso administrativo.
Portanto, havendo ausência de Ministros do Tribunal de Contas, serão substituídos por auditores. E, não sendo hipótese de substituição, os auditores exercerão as suas funções relativas às competências do órgão de contas. Oliveira[x] resume da seguinte forma as principais funções dos auditores substitutos:
- atuar, em caráter permanente, junto ao Colegiado do Tribunal para o qual for designado, presidindo a instrução dos processos que lhe forem distribuídos e relatando-os com proposta de decisão por escrito, a ser votada pelos membros do Tribunal;
- exercer, no caso de vacância, as funções relativas ao cargo de Ministro ou Conselheiro, até que ocorra novo provimento;
- substituir os membros do Tribunal nas ausências e impedimentos destes, por motivo de licença, férias ou outro afastamento legal;
- substituir os membros do Tribunal para completar a composição do Colegiado, quando estes estiverem impossibilitados de comparecer à sessão; e
- votar para manter o quórum, no lugar de Ministro ou Conselheiro que declarar impedimento, bem como para desempatar votação.
Em relação aos Tribunais de Contas dos Estados, serão integrados por sete Conselheiros, aplicando-se as normas previstas na Constituição Federal para o Tribunal de Contas da União, no que couber, à sua organização, composição e fiscalização. Assim, exemplificativamente, os Conselheiros deverão atender aos mesmos requisitos para serem indicados, seja pelo Governador do Estado, seja pela Assembleia Legislativa, destacando-se o relativo a ter notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública.
Por outro lado, em relação ao cargo de Auditor Substituto, não é feita expressamente nenhuma exigência relativa às áreas de conhecimento. Contudo, por ser substituto de Ministro, no caso do Tribunal de Contas da União, ou de Conselheiro, no caso de Tribunal de Contas do Estado e/ou dos Municípios, logicamente o auditor deverá ter notório conhecimento em uma dessas áreas: jurídica, contábil, econômico e financeira ou de administração pública.
Na Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992 - Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União - consta o seguinte:
Art. 77. Os auditores, em número de três, serão nomeados pelo Presidente da República, dentre os cidadãos que satisfaçam os requisitos exigidos para o cargo de ministro do Tribunal de Contas da União, mediante concurso público de provas e títulos, observada a ordem de classificação.
Parágrafo único. A comprovação do efetivo exercício por mais de dez anos de cargo da carreira de controle externo do quadro de pessoal da secretaria do Tribunal constitui título computável para efeito do concurso a que se refere o caput deste artigo.
Art. 78. (Vetado)
Parágrafo único. O auditor, quando não convocado para substituir ministro, presidirá à instrução dos processos que lhe forem distribuídos, relatando-os com proposta de decisão a ser votada pelos integrantes do Plenário ou da Câmara para a qual estiver designado.
Art. 79. O auditor, depois de empossado, só perderá o cargo por sentença judicial transitada em julgado.
Parágrafo único. Aplicam-se ao auditor as vedações e restrições previstas nos arts. 74 e 76 desta Lei.
Portanto, no Tribunal de Contas da União, os Auditores Substitutos devem, por coerência constitucional, cumprir os mesmos requisitos dos Ministros, com o acréscimo de que deverão ser aprovados em concurso público de provas e títulos. Furtado (2007, p. 1093) ressalta que
A existência dos auditores dos Tribunais de Contas se revela medida extremamente salutar, haja vista sua seleção ser feita por meio de concurso público. O sistema de provimento do cargo de auditor cria situação peculiar em nosso sistema constitucional. Trata-se do único cargo provido por concurso público em que seus ocupantes se tornam vitalícios com a posse.
Analisando-se as leis orgânicas de alguns Tribunais de Contas dos Estados, os requisitos para exercício do cargo de Auditor Substituto são os seguintes:
- Amapá[xi]: aprovação em concurso público de provas e títulos, devendo o candidato ter título de curso superior de Direito, Ciências Contábeis, Econômicas ou de Administração Pública, além de idoneidade moral e reputação ilibada;
- Goiás[xii]: cidadãos que satisfaçam os requisitos exigidos para o cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas, mediante concurso público de provas e Títulos, em que será exigido curso superior;
Minas Gerais[xiii]: cidadãos que sejam detentores de diploma de curso superior e satisfaçam os requisitos exigidos para o cargo de Conselheiro e tenham sido aprovados em concurso público de provas e títulos;
- Paraná[xiv]: cidadãos que satisfaçam os requisitos para o cargo de Conselheiro, após aprovação em concurso público, em que será exigido nível superior com pertinência temática com as funções do Tribunal de Contas; e
- Pernambuco[xv]: cidadãos portadores de diploma de curso superior de Direito, Administração, Economia ou Ciências Contábeis e que satisfaçam os requisitos exigidos para o cargo de Conselheiro mediante concurso público de provas ou de provas e títulos.
Como se percebe, a legislação desses Estados observa os contornos delineados pela Constituição Federal ao Tribunal de Contas da União.
4. O caso do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul. Inconstitucionalidade da Lei Orgânica.
A Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, quanto à composição de seu Tribunal de Contas, assim estabelece:
Art. 74 [...]
§ 1º Os Conselheiros do Tribunal de Contas terão as mesmas garantias, prerrogativas, impedimentos, vencimentos e vantagens dos Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado e somente poderão aposentar-se com as vantagens do cargo quando o tiverem exercido efetivamente por mais de cinco anos.
§ 2º Os Auditores Substitutos de Conselheiro, em número de sete, nomeados pelo Governador do Estado após aprovação em concurso público de provas e títulos realizado pelo Tribunal de Contas, na forma de sua Lei Orgânica, terão as mesmas garantias e impedimentos dos Conselheiros, e subsídios que corresponderão a noventa e cinco por cento dos subsídios de Conselheiros, e quando em substituição a esses, também os mesmos vencimentos do titular.
Portanto, assim como na Constituição Federal, não há na Constituição do Estado do Rio Grande do Sul qualquer menção às áreas de conhecimento que devem ter os Auditores Substitutos de Conselheiro.
Todavia, a Lei Estadual nº 11.424, de 06 de janeiro de 2000, dispõe que:
Art. 10. Os Auditores Substitutos de Conselheiro, em número de 7 (sete), serão nomeados pelo Governador do Estado, dentre Bacharéis em Ciências Jurídicas e Sociais, mediante concurso público de provas e títulos, realizado perante o Tribunal de Contas.
Parágrafo único. Além dos requisitos exigidos para inscrição no concurso, deverá o candidato contar no mínimo 35 (trinta e cinco) e no máximo 65 (sessenta e cinco) anos de idade, nos termos das Constituições Federal e Estadual.
Dessa forma, a Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul restringiu o acesso ao cargo de Auditores Substitutos apenas a Bacharéis em Ciências Jurídicas e Sociais. Ocorre que, como já referido, o Auditor substitui logicamente o Conselheiro titular, sendo que este deve ter conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública. Não tendo como se justificar tal limitação, não há como se afastar, consequentemente, da conclusão de que o art. 10 da Lei nº 11.424/2000, do Estado do Rio Grande do Sul, é inconstitucional.
Tal questão, em meio à realização de um concurso público para provimento de cargos de Auditores Substitutos de Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul foi levada pela Associação dos Servidores do Tribunal de Contas do Estado (ASTC) e pelo Centro de Auditores Públicos Externos do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul ao Poder Judiciário, o qual, sem ter deferido inicialmente medida cautelar, permitindo o prosseguimento do concurso até quase a sua fase final, julgou-a da seguinte forma:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 10 DA LEI N.º 11.424/2000 - LEI ORGÂNICA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.
PRELIMINARES.
ARGUIÇÃO DE NULIDADE INVOCADA EM MEMORIAIS. ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. Intimação dos órgãos ou autoridades das quais emanou a lei ou ato normativo impugnado para prestar informações. Faculdade do relator. Ademais, o ato impugnado já está sendo defendido pela Procuradoria Geral do Estado.
Ausência de parâmetro de controle de constitucionalidade de competência do Tribunal de Justiça do Estado. Rejeição. Menção expressa a dispositivos da Carta Estadual.
ILEGITIMIDADE ATIVA. Rejeição. Pertinente o nexo de afinidade entre os objetivos institucionais das coautoras e o conteúdo material do texto normativo impugnado.
MÉRITO. CARGO DE AUDITOR SUBSTITUTO DE CONSELHEIRO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO. Acesso limitado aos candidatos com formação profissional de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais. Lei Estadual em descompasso com a Constituição Federal. Exegese que deve considerar que o Tribunal de Contas é um órgão auxiliar do Poder Legislativo, bem assim a natureza das atribuições desempenhadas. As normas constitucionais que estabelecem o modelo federal de organização do Tribunal de Contas da União são de observância compulsória pelas Constituições dos Estados-membros. Declaração de inconstitucionalidade, com redução de texto do ato normativo impugnado.
CONCURSO PÚBLICO AO CARGO DE AUDITOR SUBSTITUTO Nº 001/2013. Encontrando-se o concurso em fase de divulgação da prova oral, nos termos do art. 27 da Lei 9.868/99, atribuo efeito ex nunc à ADI. Necessária a preservação da segurança jurídica para assegurar a manutenção dos atos já praticados.
PROCESSO SUSPENSO, UNÂNIME. LIMINAR PARCIALMENTE DEFERIDA, POR MAIORIA.
(Tribunal de Justiça; Órgão Especial; ADIn nº 70053109856; Relator: Desembargador Glênio José Wasserstein Hekman; data do julgamento: 02/12/2013)
Do voto do relator, convém transcrever os seguintes trechos:
Como se sabe os Tribunais de Contas são órgãos públicos independentes, conforme previsão legal nos arts. 70 à 75 da Constituição Federal, exercendo, em auxílio ao Poder Legislativo, a fiscalização contábil, financeira e orçamentária da Administração Pública.
As atribuições do Tribunal de Contas da União encontram-se disciplinadas no art. 71 da Carta Magna.
A Constituição Federal, além dos cargos de Ministros e Membros do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas, traz o cargo de auditor, conforme art. 73, § 2º e 4º, que reproduzo [...]
Isto é, a Constituição Magna impõe uma conduta aos Estados, pelo princípio da simetria, os Tribunais de Contas devem ter a mesma organização, composição e fiscalização nos esteios do Tribunal de Contas da União. [...]
Como se vê, a CF é clara ao exigir conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiro ou de administração pública.
Assim, entendo que restringir ao cargo público de Auditor Substituto de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado apenas aos candidatos com gradução em Direito, não atende ao comando maior definido na Carta Magna.
Por sua vez, oportuno mencionar que o Tribunal de Contas da União, ao instituir as normas jurídicas atinentes ao sistema de controle, não estabelece restrição para o provimento do cargo de Auditor Substituto em função de determinada formação acadêmica, conforme transcrevo o art. 77 da Lei Orgânica do TCU:
“Art. 77. Os auditores, em número de três, serão nomeados pelo Presidente da República, dentre os cidadãos que satisfaçam os requisitos exigidos para o cargo de ministro do Tribunal de Contas da União, mediante concurso público de provas e títulos, observada a ordem de classificação.
Parágrafo único. A comprovação do efetivo exercício por mais de dez anos de cargo da carreira de controle externo do quadro de pessoal da secretaria do Tribunal constitui título computável para efeito do concurso a que se refere o caput deste artigo “.
No caso analisado, há evidente desrespeito ao princípio da simetria constitucional, o que implica necessariamente na declaração de inconstitucionalidade do dispositivo impugnado.
Em que pese ainda não tenha ocorrido o trânsito em julgado da decisão acima, o fato é que o Estado do Rio Grande do Sul deverá se readequar ao modelo preconizado para a União e observado pelos demais Estados, alterando a Lei Orgânica de seu Tribunal de Contas no que se refere à exigência da área de conhecimento relativamente ao importante cargo de Auditor Substituto de Conselheiro.