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Ação que objetiva retificação de registro civil para inclusão do sobrenome materno ou paterno: possibilidade jurídica e inexistência de prazo decadencial

Agenda 09/07/2014 às 08:44

O direito a acrescer sobrenome de genitor, seja da mãe ou do pai, é direito personalíssimo que não se submete a prazo decadencial, seja aquele previsto no art. 56 da Lei 6.015/73 ou a qualquer outro.

I – INTRODUÇÃO

O direito a acrescer sobrenome de genitor, seja da mãe ou do pai, é direito personalíssimo que não se submete a prazo decadencial, seja aquele previsto no art. 56 da Lei 6.015/73 ou qualquer outro, em razão da prevalência do princípio da dignidade da pessoa humana, consubstanciado, no caso, no direito à individuação conforme a origem familiar, em respeito e homenagem às raízes familiares, não havendo ofensa à segurança jurídica tampouco prejuízo a terceiros.


II – RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL PARA INCLUSÃO DE SOBRENOME MATERNO

Durante muitos anos, seguiu-se o costume de acrescer apenas o patronímico, o sobrenome paterno, e omitir-se o matronímico ao nome dos filhos. O sobrenome da mulher, inclusive, não raras vezes era omitido com o casamento, para que ela passasse a utilizar somente o do marido.

Apesar de a Constituição Federal de 1988 prever a igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres (art. 5.°, I), somente com a entrada em vigor do Código Civil de 2002 é que a questão de sobrenomes ganhou previsão legal literal hábil à mudança dos costumes até então.  É o que se vê do art. 1.565, parágrafo 1.°, do Código Civil de 2002, que prevê que “qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro.”

Nesse contexto histórico, de igualdade de direitos entre homens e mulheres, surge maior interesse, por questão de justiça, de direito de personalidade quanto à identificação da origem familiar, de respeito à origem dos pais biológicos ou adotivos, de acrescer ao nome o sobrenome materno, aquele omitido na época do nascimento por ocasião do costume observado por seus genitores.

E maior interesse surge para aqueles filhos que tiveram acrescido ao seu nome apenas o sobrenome paterno e, após o divórcio dos genitores, ficou sob a guarda exclusiva da mãe. A essas pessoas, ainda crianças ou mesmo depois de adultas, a necessidade de identificação não só com a família do pai, mas especialmente com a da mãe, é inegável.

É da jurisprudência:

RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO PELA PROCURADORIA DE JUSTIÇA. POSSIBILIDADE. AUTONOMIA FUNCIONAL (ART. 127, §1º, DA CF/88). OBSERVÂNCIA. REGISTRO CIVIL. ALTERAÇÃO. PATRONÍMICO MATERNO. ACRÉSCIMO. POSSIBILIDADE. RESPEITO A ESTIRPE FAMILIAR. IDENTIFICAÇÃO, NA ESPÉCIE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.1. Admite-se o manejo de recurso especial interposto pelo Procurador de Justiça por força do princípio da autonomia funcional (art. 127, §1º, da CF/88).2. O sistema jurídico exige que a pessoa tenha os patronímicos que identifiquem sua condição de membro de sua família e o prenome que a individualize entre seus familiares.3. Portanto, a alteração do nome deve preservar os apelidos de família, respeitando, dessa forma, a sua estirpe, nos exatos termos do artigo 56, da Lei n. 6.015/73. Identificação, na espécie.

4. Recurso especial provido.

(STJ. REsp 1.256.074/MG, Rel.: Min. Massami Uyeda, Julgado em: 14/08/2012, DJe 28/08/2012)

DIREITO CIVIL REGISTRO PÚBLICO. RETIFICAÇÃO DO NOME DA GENITORA POR MODIFICAÇÃO DECORRENTE DE DIVÓRCIO. LEGITIMIDADE CONCORRENTE. DA GENITORA. AVERBAÇÃO À MARGEM DO ASSENTO. DE REGISTRO DE NASCIMENTO DE SEUS FILHOS MENORES. POSSIBILIDADE. ATENDIMENTO AOS PRINCÍPIOS DA VERDADE REAL E DA CONTEMPORANEIDADE. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O princípio da verdade real norteia o registro público e tem por finalidade a segurança jurídica. Por isso que necessita espelhar a verdade existente e atual e não apenas aquela que passou. 2. Nos termos de precedente deste STJ "É admissível a alteração no registro de nascimento do filho para a averbação do nome de sua mãe que, após a separação judicial, voltou a usar o nome de solteira; para tanto, devem ser preenchidos dois requisitos: (i) justo motivo; (ii) inexistência de prejuízos para terceiros" (REsp 1.069.864-DF, 3ª Turma, Rel. Ministra Nancy Andrighi, julgado em 18/12/2008). 3. No contexto dos autos, inexistente qualquer retificação dos registros, não ocorreu prejuízo aos menores em razão da averbação do nome de solteira de sua mãe, diante do divórcio levado a efeito. 4. Recurso especial não-provido.

(STJ. REsp 1.123.141/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO. Julgado em: 28/09/2010)

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DIREITO CIVIL. ALTERAÇÃO DO ASSENTAMENTO DE NASCIMENTO NO REGISTRO CIVIL APÓS A MAIORIDADE. ACRÉSCIMO DO SOBRENOME DOS PAIS DE CRIAÇÃO. ARTIGO 56 DA LEI Nº 6.015/73. ADMISSIBILIDADE.Não é absoluto o princípio da imutabilidade do nome de família, admitindo-se, excepcionalmente, a alteração do patronímico, desde que presentes a justa motivação e a prévia intervenção do Ministério Público. No caso dos autos, presentes os requisitos autorizadores, já que pretende a recorrente, tão-somente, prestar uma homenagem àqueles que a criaram, acrescendo ao seu assento de nascimento o nome de família daqueles que considera seus pais verdadeiros, nada obsta que se autorize a alteração.Recurso conhecido e provido, com as ressalvas do relator.(STJ. REsp nº 605.708/RJ, Rel.: Min. Castro Filho, Julgado em: 16/08/2007, DJe 05/08/2008).

DIREITO CIVIL. INTERESSE DE MENOR. ALTERAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. POSSIBILIDADE.1. Não há como negar a uma criança o direito de ter alterado seu registro de nascimento para que dele conste o mais fiel retrato da sua identidade, sem descurar que uma das expressões concretas do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana é justamente ter direito ao nome, nele compreendido o prenome e o nome patronímico.

2. É conferido ao menor o direito a que seja acrescido ao seu nome o patronímico da genitora se, quando do registro do nascimento, apenas o sobrenome do pai havia sido registrado.

3. É admissível a alteração no registro de nascimento do filho para a averbação do nome de sua mãe que, após a separação judicial, voltou a usar o nome de solteira; para tanto, devem ser preenchidos dois requisitos: (i) justo motivo; (ii) inexistência de prejuízos para terceiros.

4. Recurso especial não conhecido.

(STJ. REsp 1.069.864/DF. Rel. Min. Nancy Andrighi. Julgado em: 18/12/2008, DJe 03/02/2009).

Pedido de Retificação acolhido. Registro Civil. Acréscimo do patronímico materno no assento de nascimento da menor impúbere. Apelo. Alegação inadmissível. Sentença confirmada. Inexiste impedimento legal à alteração do Registro Civil, visando à inclusão do patronímico materno. Ao contrário, o art. 56, da Lei de Registros Públicos, dá suporte legal ao pedido. Apelação improvida.” (Ac. 17.663 2ª CC TJPR) Recurso de Apelação desprovido. (TJPR - 2ª C. Cível - AC 107290-4 - Curitiba - Rel.: Sidney Mora - J. 20.02.2002). 

A regra geral no ordenamento jurídico pátrio é o da imutabilidade do nome, com exceção dos casos de erro de grafia, exposição ao ridículo ou se houver relevante razão de ordem pública, conforme se depreende dos artigos 56, 57 e 58 da Lei 6.015/1973.

Em relação ao acréscimo de sobrenome de genitor ao nome, contudo, não há vedação legal nem prazo para exercício desse direito da personalidade (art. 16, CC), podendo ser realizado a qualquer tempo, inclusive sem necessidade de consentimento do outro genitor. Nesse sentido, colhe-se de julgado recente do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, cujo trecho transcreve-se:

A propósito, a Constituição Federal de 1988 proíbe quaisquer discriminações, seja qual for a origem, incluindo-se nessa relação protetiva dos direitos humanos a igualdade entre os sexos e a igualdade de direitos e obrigações entre os pais dos menores.

Por outro lado, o caso sub judice revela a necessidade de proteger o nome completo do menor, que deve ser composto, em minha opinião, dos apelidos de família materno e paterno simultaneamente.

O caso presente trata de ação que objetiva acrescer o sobrenome materno, que é um direito de personalidade do menor e pelo qual deve ter a proteção de seu pai, sendo desnecessária, portanto, a presença paterna neste feito porque seu objetivo é preencher a importante lacuna do sobrenome materno.

Porque a inclusão do apelido materno ao nome do requerente não importa em modificação do seu prenome, trancreve-se o entendimento de que "O aditamento do patronímico materno é admitido sem controvérsias. A espécie é bem resumida em aresto no qual a conclusão dispõe: A interposição do apelido da genitora não importa em alteração do nome, segundo a proibição da Lei dos Registros Públicos" (Walter Ceneviva, Lei dos Registros Públicos Comentada, 7ª ed., Saraiva: São Paulo, 1991. p.186).

No mesmo sentido, decidiu esta Egrégia Corte:

"CIVIL. REGISTROS PÚBLICOS. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE NOME. INCLUSÃO DO SOBRENOME MATERNO. ADMISSIBILIDADE.

É admissível a inclusão do sobrenome materno omitido no registro de nascimento, mormente quando vier a facilitar a perfeita identificação da pessoa no seio da família e da sociedade" (TJSC, 2ª Cam. Dir. Civ., Rel. Des. Luiz Carlos Freyesleben, Ap. Civ. n. 2004.003749-0, de Joaçaba, j.19-8-2004).

Outrossim, o pedido inicial tem o mesmo procedimento dos que se referem à retificação de nome, conforme art. 109 da Lei de Registros Públicos, que dispõe:

"Quem pretender que se restaure, supra ou retifique assentamento no registro, requererá, em petição fundamentada e instruída com documento ou com indicação de testemunhas, que o juiz ordene, ouvido o órgão do Ministério Público e os interessados no prazo de 5 (cinco) dias, que correrá em cartório".

De acordo com o disposto no mencionado dispositivo, o juiz deverá ouvir o Ministério Público e os interessados, em cinco dias, antes de decidir pela procedência ou não do pedido de retificação, momento em que o genitor poderá manifestar-se, caso o magistrado entenda necessário.

Destarte, ainda que o genitor não esteja representando o menor na inicial da presente demanda, sua mãe é a sua representante nesses autos, dispensando-se a presença concomitante de ambos os pais para o pedido inicial.

Em ação de retificação e registro civil ajuizada por menor representado apenas por sua mãe, decidiu a Corte Superior de Justiça:

"Direito civil. Interesse de menor. Alteração de registro civil. Possibilidade.

- Não há como negar a uma criança o direito de ter alterado seu registro de nascimento para que dele conste o mais fiel retrato da sua identidade, sem descurar que uma das expressões concretas do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana é justamente ter direito ao nome, nele compreendido o prenome e o nome patronímico.

- É conferido ao menor o direito a que seja acrescido ao seu nome o patronímico da genitora se, quando do registro do nascimento, apenas o sobrenome do pai havia sido registrado" (STJ, 3ª Turma, Relª. Minª. Nancy Andrighi, REsp n. 1.069.864/DF, j. 18-12-2008). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2013.021566-3, de Tubarão, rel. Des. Monteiro Rocha, j. 17-10-2013)


III – CONSIDERAÇÕES FINAIS

A regra geral no ordenamento jurídico pátrio é o da imutabilidade do nome. A exceção só se admite nos casos de erro de grafia, exposição ao ridículo ou se houver relevante razão de ordem pública, conforme análise contextual dos artigos 56, 57 e 58 da Lei 6.015/1973, em observância ao princípio da segurança e estabilidade jurídica.

O mesmo não ocorre em relação ao sobrenome do genitor ou da genitora, o qual representa direito da personalidade à individuação conforme a origem familiar, pois a hipótese não representa alteração de nome nos termos das restrições insertas na Lei de Registros Públicos e não denota intenção de prejudicar terceiros.

Por fim, o direito de acrescer ao prenome o sobrenome dos genitores não se sujeita a prazo decadencial, visto que se trata de direito da personalidade sem qualquer prejuízo à segurança jurídica, pelo que pode ser exercido a qualquer momento durante a vida.


IV – REFERÊNCIAS

TJSC. Agravo de Instrumento n. 2013.021566-3, de Tubarão, rel. Des. Monteiro Rocha. Julgado em: 17/10/2013.

STJ. REsp 1.256.074/MG, Rel.: Min. Massami Uyeda. Julgado em: 14/08/2012, DJe 28/08/2012.

STJ. REsp 1.123.141/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO. Julgado em: 28/09/2010.

STJ. REsp 1.069.864/DF. Rel. Min. Nancy Andrighi. Julgado em: 18/12/2008, DJe 03/02/2009.

STJ. REsp nº 605.708/RJ, Rel.: Min. Castro Filho, Julgado em: 16/08/2007, DJe 05/08/2008.

TJPR - 2ª C. Cível - AC 107290-4 - Curitiba - Rel.: Sidney Mora - J. 20.02.2002.

Sobre a autora
Suzana Gastaldi

Procuradora Federal junto à Procuradoria Federal no Estado do Paraná. Especialista em Direito e Processo do Trabalho. Graduada em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GASTALDI, Suzana. Ação que objetiva retificação de registro civil para inclusão do sobrenome materno ou paterno: possibilidade jurídica e inexistência de prazo decadencial . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4025, 9 jul. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29863. Acesso em: 18 nov. 2024.

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