1 INTRODUÇÃO
É fato incontroverso que somente procedimentos céleres preenchem a finalidade do processo, conferindo-lhe efetividade.
A antecipação genérica dos efeitos da tutela, instituída em nosso ordenamento jurídico através da Lei n.º 8.952/1994, foi justamente concebida com esse propósito.
Entretanto, tão logo restou publicada o referido instrumento normativo, intensa discussão doutrinária surgiu sobre a possibilidade de seu deferimento em face da Fazenda Pública.
Ao longo dos anos, aqueles que defendiam o seu não-cabimento elencaram diversas circunstâncias que, supostamente, impediriam a concessão da medida antecipatória em apreço em detrimento de entes públicos.
É justamente no estudo dos principais óbices suscitados por essa corrente doutrinária que reside o escopo do presente trabalho científico.
Nesse diapasão e considerando-se que a matéria em comento é questão presente em demandas judiciais em que figura como ré a Fazenda Pública, revela-se de significativa importância o desenvolvimento de um estudo que se proponha a analisá-la, à luz das principais críticas doutrinárias tecidas sobre o assunto ao longo dos anos.
Destarte, este trabalho científico, tomando por base a natureza, o fundamento e as particularidades do instituto da tutela antecipada, tem como escopo analisar eventuais impedimentos ao deferimento desta em face da Fazenda Pública, de modo a confirmar ou rechaçar sua existência, sem perder de vista o atual posicionamento adotado pela jurisprudência.
Quanto à metodologia, este trabalho científico se desenvolveu mediante pesquisa bibliográfica, procedendo-se à revisão literária da doutrina e da jurisprudência pertinente ao tema, tendo como principais fontes de coleta livros e sites do poder judiciário.
O presente estudo foi dividido, sistematicamente, em três capítulos.
O primeiro capítulo abordará os aspectos gerais do instituto da tutela antecipada, seu conceito, natureza jurídica, pressupostos e distinção frente à medida cautelar e à liminar, com realce a sua finalidade precípua de conferir efetividade ao processo.
Complementando essas informações introdutórias, o segundo capítulo tratará do ente Fazenda Pública, abordando de forma breve o seu conceito e prerrogativas, como meio de identificar a razão pela qual é conferido àquela tratamento processual diferenciado, lançando-se, ainda, às bases da problemática existente, envolvendo a compatibilização das prerrogativas dispensadas à Fazenda Pública com o instituto da tutela antecipada.
A partir dos conhecimentos explanados nos capítulos precedentes, o terceiro capítulo, enfim, discorrerá sobre os principais óbices que, em tese, impediriam a concessão da tutela antecipada contra a Fazenda Pública, examinando-os um a um para confirmá-los ou rechaçá-los, de acordo com a doutrina majoritária e a jurisprudência dominante, observando eventuais restrições ao instituto.
2 PANORAMA GERAL DO INSTITUTO DA TUTELA ANTECIPADA
Hodiernamente, a morosidade dos processos é, sem discussão, o principal problema da justiça brasileira.
Nesse sentido, preleciona brilhantemente Tucci (apud MARINONI, 2011, p. 22) que “o fator tempo [...] constitui, desde há muito, o principal motivo da crise da justiça, uma vez que a excessiva dilação temporal das controvérsias vulnera ex radice o direito à tutela jurisdicional, acabando por ocasionar uma série de gravíssimos inconvenientes para as partes e para os membros da comunhão social”.
Em meio a esse cenário, sobressai-se, porém, como verdadeira esperança, o instituto da tutela antecipatória, que, como se sabe, foi idealizado por processualistas civis para o fim precípuo de tornar o processo apto a realizar seus objetivos, de modo a melhor servir a sociedade.
Para melhor compreensão, vejamos, a seguir, algumas noções gerais sobre o mecanismo em foco.
2.1 Conceito e Natureza Jurídica
Conceituar o instituto da tutela antecipada não parece ser tarefa árdua.
Segundo lição de Donizetti (2010, p. 341), “dá-se o nome de tutela antecipada ao adiantamento dos efeitos da decisão final, a ser proferida em processo de conhecimento, com a finalidade de evitar dano ao direito subjetivo da parte”.
A medida em comento se apresenta, assim, como verdadeiro mecanismo que, ao ser posto em prática, antecipa os efeitos da tutela definitiva, permitindo a sua pronta fruição.
Complementando, vale, porém, ressaltar que a tutela antecipada se encontra marcada por duas características essenciais, a saber: (I) a sumariedade da cognição, pois se baseia em um exame superficial do objeto da causa, conduzindo a um juízo de probabilidade; e (II) a precariedade de efeitos, já que pode ser revogada ou modificada a qualquer tempo, se verificada, no curso do processo, a alteração do estado de fato ou do estado de prova.
Por tais razões, necessário é ainda enfatizar que o instituto supracitado, além de ser evidentemente dotado de cunho antecipatório, detém caráter provisório e precário, encontrando-se, portanto, inapto a se cristalizar em coisa julgada material.
Afora tais considerações, não há mais o que se acrescentar.
Tarefa não tão simples, entretanto, é apontar a natureza jurídica do mecanismo em exame, já que existem ainda discussões no meio doutrinário sobre o tema.
Dinamarco (1995, p. 140), por exemplo, defende a natureza satisfativa, ou seja, não-cautelar do instituto, afirmando que equivale à procedência da demanda inicial, com a diferença representada pela provisoriedade.
De modo semelhante se posicionam Nery Junior e Nery (2002, p. 612-613), para quem a tutela antecipatória “é tutela satisfativa no plano dos fatos, já que realiza o direito, dando ao requerente o bem da vida por ele pretendido com a ação de conhecimento”.
Contrariamente, todavia, é o entendimento esposado por Didier Junior, Braga e Oliveira (2012, p. 470), para os quais a tutela antecipada, a depender de sua base legal, poderia ter natureza satisfativa (atributiva), se fundada nas hipóteses do art. 273 do Código de Processo Civil, ou natureza cautelar (conservativa), se repousada no art. 804 desse mesmo diploma legal (BRASIL, 1973, não paginado).
Defendendo já o caráter unicamente cautelar, firma-se, por outro lado, Bedaque (1998, p. 287), o qual, acerca da matéria, obtempera não ver “motivo para criação de forma autônoma de tutela, com todas as características da cautelar, apenas pelo caráter antecipatório da medida ou pelo rigor eventualmente maior quanto à probabilidade de existência do direito”. Compreende, destarte, tal doutrinador, que a cautelar seria gênero, do qual a tutela antecipada seria espécie.
Não obstante tais contrastes, revela-se, no entanto, majoritária a corrente que defende não se tratar de tutela de natureza cautelar, mas de tutela efetivamente satisfativa.
Nesse sentido, também lecionam Marinoni (2011, p. 106) e Theodoro Júnior (2007, p. 739).
Feito esse breve introito, observemos agora os pressupostos da tutela antecipatória.
2.2 Pressupostos
Os pressupostos necessários à concessão da tutela antecipada podem ser de ordem geral ou alternativa, encontrando-se alinhados no artigo 273, caput, incisos I e II e §2º, do Código de Processo Civil (BRASIL, 1973, não paginado), o qual, in verbis, estatui:
Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
§1º Omissis
§ 2º Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.
[...]
Analisemos um a um, de acordo com o caráter que possuem.
2.2.1 Gerais
Para que seja viável a antecipação da tutela almejada, mostra-se incontroversa a necessidade de se verificar a presença simultânea e cumulativa de dois pressupostos genéricos, previstos no artigo 273, caput e §2º, do Código de Processo Civil, essenciais a sua concessão (BRASIL, 1973, não paginado). São eles: (I) a prova inequívoca e a verossimilhança das alegações; e (II) a reversibilidade dos efeitos do provimento.
Vejamos.
2.2.1.1 Da prova inequívoca e da verossimilhança das alegações
É patente a propriedade autoexplicativa das expressões prova inequívoca e verossimilhança das alegações, que, inclusive, encontram-se evidentemente entrelaçadas.
Não é, pois, à toa, que Marinoni (2011, p. 210), ao defini-las, o faz de uma só vez, ao afirmar que “a denominada ‘prova inequívoca’, capaz de convencer o juiz da ‘verossimilhança da alegação’, somente pode ser entendida como a ‘prova suficiente’ para o surgimento do verossímil”.
Entretanto, malgrado a sua clareza, duas ressalvas merecem ser feitas acerca das expressões em foco.
Primeiramente, quanto à prova inequívoca, necessário se faz advertir a lição de Carneiro (2004, p. 23), segundo o qual “a rigor [...] prova alguma será inequívoca, no sentido de absolutamente incontestável”.
Por certo, mesmo a escritura pública lavrada em Cartório, ainda que revestida de seus requisitos formais, mostra-se passível de impugnação, não sendo razoável dela se presumir uma verdade plena, absoluta, avessa a controvérsias.
Assim é que, por prova inequívoca, não se deve compreender o mesmo que prova irrefutável, mas sim o mesmo que prova robusta, consistente, capaz de fornecer ao julgador os elementos necessários a formação de sua convicção provisória, conduzindo-lhe, assim, a um juízo de probabilidade.
Nesse sentido, é a lição de Donizette (2010, p. 343):
Por prova inequívoca entende-se a prova suficiente para levar o juiz a acreditar que a parte é titular do direito material disputado. Trata-se de um juízo provisório. Basta que, no momento da análise, do pedido de antecipação, todos os elementos convirjam no sentido de aparentar a probabilidade das alegações.
Pouco importa se, posteriormente, no julgamento final, após o contraditório, a convicção seja outra. [...]
No que tange à verossimilhança das alegações, importante é observar que esta expressão não apenas faz referência à necessidade de o julgador alcançar a verdade provável sobre os fatos narrados, mas também à imperatividade de ele perquirir a plausabilidade da subsunção desses fatos à norma invocada.
Por certo, como bem apontam Didier Junior, Braga e Oliveira (2012, p. 501) “o magistrado precisa avaliar se há probabilidade de ter acontecido o que foi narrado e quais as chances de êxito do demandante”.
O juízo de verossimilhança, assim, repousa na convicção de que tanto as questões fáticas como as questões jurídicas verificadas em um dado processo, indicam que o postulante da tutela antecipatória faz jus àquela prestação jurisdicional (CARNEIRO, 2004, p. 48).
2.2.1.2 Da reversibilidade dos efeitos do provimento
O pressuposto supra, que estabelece a necessidade de os efeitos da tutela serem reversíveis, é, sem dúvida alguma, a marca da precariedade da medida ora estudada. Isso porque, esta última, sem aquele, poderia conduzir o requerente a uma tutela satisfativa definitiva, avessa à mera antecipação provisória.
Nesse sentido, inclusive, argumenta Zavascki (1999, p. 97), para o qual antecipar-se irreversivelmente a tutela seria o mesmo que “antecipar a própria vitória definitiva do autor, sem assegurar ao réu o exercício do seu direito fundamental de se defender, exercício esse que, ante a irreversibilidade da situação de fato, tornar-se-ia absolutamente inútil, como inútil seria, nestes casos o prosseguimento do próprio processo”.
Torna-se, desse modo, o requisito em foco, meio legítimo de se preservar o adversário contra excessos no emprego da medida, porquanto, caso não seja ela ao final confirmada, será ainda possível se retornar ao status quo ante, sem maiores prejuízos àquele.
É certo, entretanto, que a exigência sob exame deve ser sempre interpretada com sensatez e à vista do caso concreto.
A propósito, assim leciona Donizette (2010, p. 344):
O perigo da irreverssibilidade não pode ser visto em termos absolutos. O objetivo da medida antecipatória é evitar danos ao direito subjetivo das partes. Assim, é indispensável que o juiz sopese os valores dos bens em conflito, decidindo com bom senso. Em ação declaratória, na qual se questiona o ato de tombamento e a negativa para demolição, a prudência recomenda não antecipar os efeitos da decisão final. Solução diversa poderá ser dada se o imóvel, em razão de perigo de desmoronamento, acarretar grave risco para a vizinhança.
De mais a mais, se levada às últimas consequências, a interpretação do pressuposto em questão pode, de fato, conduzir à inutilização completa do instituto, como bem obtemperam Didier Junior, Braga e Oliveira (2012, p. 504):
Mas essa exigência legal deve ser lida com temperamentos, pois, se lavada às últimas consequências, pode conduzir à inutilização da antecipação de tutela. Deve ser abrandada, de forma a que se preserve o instituto.
Isso porque, em muitos casos, mesmo sendo irreversível a medida antecipatória – ex.: cirurgia em paciente terminal, despoluição de águas fluviais, dentre outros –, o seu deferimento é essencial, para que se evite um “mal maior” para parte/requerente. Se o seu deferimento é fadado à produção de efeitos irreversíveis para o requerido, o indeferimento também implica consequências irreversíveis para o requerente.
Razoabilidade é, pois, circunstância indispensável quando da análise do pressuposto em apreço.
2.2.2 Alternativos
Uma vez verificados os pressupostos cumulativos acima examinados, faz-se imperiosa a constatação de ao menos uma das circunstâncias alinhadas nos incisos I e II, do artigo 273, do Código de Processo Civil (BRASIL, 1973, não paginado). São elas: (I) fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou (II) abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu.
Passemos as suas análises.
2.2.2.1 Do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação
Para a constatação do requisito em exame indispensável, tem-se como indispensável que o chamado “fundado receio” seja concreto, atual e grave.
Concreto, pois, não deve decorrer de mero temor, nem ser hipotético ou eventual, mas sim certo e de sensível verificação. Atual, porquanto deve estar na iminência de ocorrer. Grave, porque deve ser capaz de prejudicar ou impedir a fruição de determinado direito.
O aludido “dano”, por sua vez, necessita ser irreparável, isto é, irreversível, ou ao menos de difícil reparação, ou seja, que provavelmente não poderá ser revertido.
Observe-se que essa irreparabilidade pode atingir direitos patrimoniais ou não.
Nessa linha, é a lição de Didier Junior, Braga e Oliveira (2012, p. 507):
Dano irreparável pode decorrer de violação a: i) direito não-patrimonial (direito à honra ou à imagem, por exemplo); ii) a direito patrimonial com função não-patrimonial (ex.: direito a indenização por acidente de trabalho, cuja realização é necessária para que o trabalhador restabeleça condições mínimas de saúde); iii) a direito patrimonial que não pode ser reparado de forma específica – com o retorno ao status quo ante –, mas só por equivalente em pecúnia; iv) ou a direito patrimonial que pode ser efetivamente atendido através de simples prestação pecuniária – como um simples direito de crédito não adimplido –, mas a manutenção do bem ou capital necessários para sua satisfação no patrimônio do réu, no curso do processo, implica dano grave ou irreparável ao autor – que demanda, por exemplo, sua satisfação imediata para manter a sanidade financeira da empresa.
Finalizando, impende frisar que, quando da verificação do pressuposto em comento, ter-se-á a concessão de tutela antecipada de índole assecuratória, pois a antecipação ocorrerá por medida de segurança, objetivando impedir que, no curso do processo, o bem da vida vindicado venha a sofrer dano irreversível ou dificilmente reversível.
2.2.2.2 Do abuso do direito de defesa ou do manifesto propósito protelatório
Ainda que não haja risco de dano irreparável ou de difícil reparação, a concessão da tutela antecipada será possível caso seja constatada a ocorrência de abuso do direito de defesa ou da prática de ato marcado por manifesto propósito protelatório.
Note-se que, muito embora o artigo 273, inciso II, in fine, do Código de Processo Civil (BRASIL, 1973, não paginado) faça menção apenas à figura do réu, o comportamento temerário, que autoriza a antecipação da tutela pleiteada nos moldes aqui analisados, pode ser praticado por qualquer das partes.
O primeiro comportamento autorizador, a saber, o abuso de direito de defesa, deve ser interpretado de forma ampla, abrangendo atos abusivos e protelatórios, cometidos no bojo do processo, em benefício de interesse pessoal da parte, seja pela via da contestação ou por qualquer outra manifestação.
Já o segundo comportamento, qual seja, o manifesto propósito protelatório, relaciona-se a ações dessa mesma índole, mas que são praticados fora do processo, como é o caso da ocultação de provas.
A verificação dos pressupostos em comento merece, entretanto, ser feita à vista do caso concreto e da finalidade da norma que os estabeleceu, inequivocamente voltada à garantia da celeridade da marcha processual.
Assim é que “só deve enquadrar como ato abusivo ou protelatório, aquele que consista em um empecilho ao andamento do processo, ou seja, aquele que implicar comprometimento da lisura e da celeridade do processo” (Didier Junior, Braga e Oliveira, 2012, p. 510).
A contrario sensu, tem-se que “o ato, mesmo abusivo, que não impede, nem retarda, os atos processuais subsequentes não legitima a medida antecipatória” (Zavascki, 1999, 78).
Por fim, convém assinalar que, quando da verificação de um dos pressupostos aqui examinados, ter-se-á a concessão de tutela antecipada de índole punitiva, pois a antecipação ocorrerá para fins de sanção, objetivando apenar aquele que agiu de má-fé e impôs empecilhos ao regular andamento da marcha processual.
Examinados, então, seus pressupostos, cumpre ainda diferenciar o instituto da tutela antecipada de duas figuras processuais que com ela aparentam guardar relação.
2.3 Distinção de tutela antecipada, medida cautelar e liminar
Primeiramente, no que tange aos institutos da tutela antecipada e da medida cautelar, importa assinalar que a razão de alguns ainda os confundirem se deve provavelmente ao fato de ambos estarem relacionados com a preservação de direitos contra os males do tempo.
Com efeito, essas duas medidas partilham, inclusive, de uma mesma finalidade, qual seja, abrandar eventuais prejuízos que possam ocorrer em razão da morosidade processual, garantindo a efetividade da jurisdição.
No entanto, embora possuam pontos em comum, não é tarefa difícil apontar suas diferenças.
A mais evidente é a distinção existente quanto à sua função, pois enquanto a tutela antecipada se revela capaz de conferir eficácia imediata à tutela definitiva, a tutela cautelar apenas se mostra apta a assegurar a futura eficácia da tutela definitiva satisfativa.
Outro ponto de divergência diz respeito à temporariedade, pois, ao contrário da medida cautelar que sempre será temporária, a tutela antecipada, se satisfativa, pode ter seus efeitos perenizados no tempo se confirmada por tutela definitiva.
Assim é a lição de Zavascki (1999, p. 57):
[...] a cautelar é medida habilitada a ter sempre duração limitada no tempo, não sendo sucedida por outra de mesmo conteúdo ou natureza (isto é, por outra medida de garantia), razão pela qual a situação fática por ela criada será necessariamente desfeita ao término de sua vigência; já a antecipatória pode ter seus efeitos perpetuados no tempo, pois destinada a ser sucedida por outra de conteúdo semelhante, a sentença final de procedência, cujo advento consolidará de modo definitivo a situação fática decorrente da antecipação
Mais um traço distintivo que pode ser citado se refere à estabilidade dos institutos: enquanto a tutela antecipada é marcada pela precariedade – já que fundada em cognição sumária sujeita à revogação –, a medida cautelar, por sua vez, é marcada pela definitividade, na medida em que baseada em cognição exauriente, predisposta, portanto, à imutabilidade.
Um último ponto de diferenciação que pode ser citado se relaciona com os pressupostos exigidos pelas medidas em apreço, mais rigorosos na tutela antecipada que na cautelar. Por certo, enquanto a primeira, como visto, exige, dentre outros pressupostos, a constatação da chamada “prova inequívoca”, a última somente exige a verificação de verossimilhança do direito acautelado.
À vista das considerações supra, evidencia-se, então, a não equivalência das figuras da tutela antecipada e da medida cautelar, inexistindo margem para dúvidas.
Com relação à distinção concernente à liminar, não apenas clara, mas indispensável se mostra a lição de Didier Junior, Braga e Oliveira (2012, p. 507), de acordo com a qual
Por medida liminar deve-se entender medida concedida in limine litis, i.e., no início da lide, sem que tenha havido ainda a oitiva da parte contrária. Assim, tem-se por liminar um conceito tipicamente cronológico, caracterizado apenas por sua ocorrência em determinada fase do procedimento, qual seja, o seu início. Liminar não é substantivo – não se trata de um instituto jurídico. Liminar é a qualidade daquilo que foi feito no início (in limine).
Destarte, consistindo a liminar em mera designação conferida a todo provimento judicial emitido antes de efetivado o contrário – não se tratando, pois, de verdadeiro instituto processual –, razão não há para se confundi-la com quaisquer das figuras acima apreciadas. O termo liminar, por certo, apenas atua como qualificador destas últimas, já que tanto a tutela antecipada como a medida cautelar podem ser deferidas liminarmente, ou seja, no momento inicial do processo.
Diante desse cenário límpido, mostram-se dispensáveis maiores digressões.
Observados, então, os aspectos principais que permeiam o instituto da tutela antecipada, passemos ao exame do ente Fazenda Pública.