5 CONCLUSÃO
A realização dessa pesquisa científica, que teve como tema central o exame dos principais óbices que, em tese, impediriam o deferimento da tutela antecipada em face de entes públicos, ratificou tanto a importância do assunto sob o prisma de quem necessita de um provimento judicial célere, quanto a sua pertinência na seara jurídica, onde, como se notou, por vezes, foram travados embates doutrinários acerca do suposto não cabimento desse instituto.
Os objetivos propostos foram alcançados, na medida em que conseguimos examinar os argumentos que embasavam os alegados impedimentos ao deferimento da medida antecipatória em estudo contra a Fazenda Pública – à luz não apenas da doutrina majoritária, mas também do posicionamento jurisprudencial dominante –, fazendo-se possível notar, ao fim, a inexistência de óbices intransponíveis, mas de sim meras restrições ao uso do instituto.
Introduzindo o estudo temático, abordou-se, primeiramente, os aspectos gerais do instituto da tutela antecipada, conferindo-se relevo a sua importância frente à efetividade ao processo.
Dando sequência às noções preliminares, tratou-se do ente Fazenda Pública, restando examinada a abrangência de seu conceito e o fundamento das prerrogativas processuais que lhe são conferidas legalmente. Nesse ponto, foi possível observar que, muito embora alguns poucos doutrinadores, com base em suposta violação ao princípio da isonomia, ainda se oponham às previsões legais que, atualmente, estabelecem as referidas prerrogativas, majoritariamente tem se defendido a constitucionalidade destas, à vista do princípio da supremacia do interesse público, que seria o seu principal fundamento.
Finalizando a produção textual, discorreu-se sobre os alegados óbices que, supostamente, impediriam a concessão da medida antecipatória em comento em face da Fazenda Pública, conferindo-se maior destaque a dois, quais sejam, o regime dos precatórios e o reexame necessário.
Verificado que o primeiro apenas imporia restrições a casos que envolvessem condenações do Estado ao pagamento de quantia certa, e que o segundo, por outro lado, sequer teria o condão de fazê-lo, passou-se à apreciação da Lei n.º 9.494/97, que, ao disciplinar a medida em estudo, também suscitou controvérsias no meio doutrinário, em razão de prever vedações à concessão desta.
Nessa oportunidade, registrou-se a discussão anteriormente travada, acerca da constitucionalidade do diploma legal correspondente, tendo em vista suposta violação ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, assegurado pelo artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. Entrementes, com o julgamento procedente da Ação Declaratória de Constitucionalidade n.º 4 pelo Supremo Tribunal Federal, a questão restou superada, não havendo dúvidas sobre a legalidade das vedações previstas pelos arts.1º e 2º-B da Lei n.º 9.494/97, que com a promulgação da nova Lei do Mandado de Segurança, devem ser examinados em conjunto com o que dispõe os arts. 7º, §2º e 14, §4º, da Lei n.º 12.016/2009.
Assim sendo e relembrando a restrição decorrente do regime dos precatórios, concluiu-se que, atualmente, não se poderá conceder antecipação de tutela contra entes públicos: (I) que defira compensação de créditos tributários ou previdenciários (Súmula 212 do STJ); (II) que conceda a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior; (III) ou que determine a reclassificação ou equiparação de servidores púbicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento e qualquer natureza.
Em que pesem, porém, as restrições constatadas, certa é a inexistência de óbices intransponíveis ao uso da tutela antecipada contra entes públicos, cabendo, no entanto, ao magistrado a árdua tarefa de, à vista dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, sopesar os bens da vida envolvidos, para dar melhor solução jurídica ao caso concreto.
REFERÊNCIAS
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Notas
[1] Caso, por exemplo, de Bueno (2000, p. 224), cujos ensinamentos assim asseveram: “O Estado brasileiro, para se beneficiar quando parte em processo judicial, desde sempre manipulou a legislação [...] para criar situações inexistentes para os particulares e desarrazoadas e injustificáveis mesmo para que, por definição, conglomera interesses de toda uma coletividade. A desigualdade por ele perpetrada, para alcançar esse mister, é indesmentível”.
[2] Nesse sentido, é a de Didier Junior, Braga e Oliveira (2012, p. 549), para os quais “se o sistema de precatório é uma técnica criada para que o Poder Público programe-se para adimplir uma dívida inicialmente não prevista, não há justificativa constitucional para que uma sentença que determine o pagamento de salário, por exemplo, ou o cumprimento de uma obrigação contratual, em valor já empenhado, ambas as dívidas já previstas em orçamento, se submeta ao sistema de precatórios”.