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A dissolução da sociedade conjugal pelo erro essencial sobre a pessoa:

aspectos médico-legais e penais do art. 219, III, Código Civil

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Agenda 01/08/2002 às 00:00

Conclusões

A existência do defeito físico irremediável pode até ser facilmente identificada, o mesmo não ocorre, contudo, quanto à moléstia grave, que em certos casos pode ser curada no transcorrer da vida matrimonial, não sendo possível determinar a anterioridade ao casamento.

Só a perícia médico-legal poderá determinar se o cônjuge estaria enquadrado nos requisitos que autorizariam a anulação do casamento.

Em ambos os casos, ser anterior ao casamento e ignorado do outro cônjuge.

A prova da ignorância da moléstia preexistente à celebração do casamento pode ser feita pelos meios regulares, inclusive presunções (José Lopes de Oliveira, p. 101).

Quanto ao defeito físico, sua irremediabilidade, traduzida em:

impossibilidade de cura;

ineficácia do tratamento;

recusa ao tratamento médico; e

superveniência de repulsa, sexualmente inibitória, no outro cônjuge, após a cura.

Para a moléstia:

gravidade (na forma dita pela ciência médica);

transmissão por contágio ou herança;

risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência.

A incurabilidade e transmissibilidade das moléstias graves dependem do progresso da medicina.

Um exemplo dos avanços da medicina, a hanseníase (lepra) antes de grande gravidade e, hoje, possível a recuperação.

Até mesmo no tocante à AIDS e a outras moléstias, pode haver, no futuro, a possibilidade de inibir o contágio ou transmissibilidade à descendência, excluindo-se a mesma da lista de moléstias autorizadoras da anulação.

A jurisprudência, normalmente, tem elucidado as questões quanto às moléstias que ensejariam a anulação do casamento, o que demonstra o elastério permitido pelo legislador e, fortemente, a necessidade do laudo médico-legal a indicar o preenchimento dos requisitos autorizadores.

Desta forma, um defeito físico irremediável pode perfeitamente, com os avanços da medicina, tornar-se remediável, desconstituindo-se, assim, a causa de anulabilidade.

Dependem, porém, do estado psicológico dos cônjuges. O defeito, mesmo que venha a ser curável, poderá causar inibição psicológica, repulsa, etc.

A edição da Lei nº 13, de 29.01.1935, apesar de considerada como um "grande açodamento pelo Congresso Nacional, na frase do Ministro Alexandre Marcondes Filho" (Washington de Barros Monteiro, p.96), por modificar o marco inicial para o prazo de prescrição, demonstrou a preocupação do legislador com a possibilidade de não se detectar o defeito físico no prazo previsto na lei substantiva civil (lembrando que o Código Civil é datado de 1916, e os costumes eram outros) ou das moléstias, principalmente as chamadas mentais.

Contudo, o açodamento não permitiu uma melhor elaboração do texto legal, restringindo-se alguns aspectos, resultando na sua revogação em 1942, contemporaneamente à edição do Código Penal (vigente desde 1º de janeiro daquele ano), quando passou a ser considerado ilícito penal.

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Na exposição de motivos do CP (novembro/1940), consta a novidade, já que até então o agente ficava impune ou sujeito a mera sanção civil (anulação do casamento e, talvez, a indenização ao cônjuge enganado).

A preocupação do legislador, ao entender a antijuridicidade da questão, buscou punir aquele que, de má-fé, formava a sociedade conjugal fundada no erro essencial, evidenciando a idéia do Estado em patrocinar a proteção à família e à sociedade.


Fontes de consulta bibliográfica e jurisprudencial

BRASIL. Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal).

_____. Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916 (Código Civil).

_____. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).

_____. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 41756-2/MT, Rel. Min. Costa Leite, 3ª Turma.

_____. Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco. Apelação Cível nº 16272-3/Olinda, Rel. Des. Siqueira Campos, 3ª Câmara Cível.

_____. _____. Recurso Necessário Cível nº 19080-7/Recife, Rel. Des. Francisco Sampaio, 4ª Câmara Cível.

_____. Duplo Grau Obrigatório de Jurisdição nº 29117-2/Recife, Rel. Des. Belém de Alencar, 5ª Câmara Cível.

_____. Duplo Grau Obrigatório de Jurisdição nº 36100-8/Recife, Rel. Des. Siqueira Campos, 3ª Câmara Cível.

_____. Duplo Grau Obrigatório de Jurisdição nº 46194-3/São João, Rel. Des. Márcio Xavier, 5ª Câmara Cível.

_____. Duplo Grau Obrigatório de Jurisdição nº 74364-6/Recife, Rel. Des. Santiago Reis, 2ª Câmara Cível.

DELMANTO, Celso. Código penal comentado. Rio de Janeiro: Renovar, 1991.

GOMES, Hélio. Medicina Legal. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1970.

JESUS, Damásio E. de. Código penal anotado. São Paulo: Saraiva, 1991.

_____. Direito Penal, v. 3. São Paulo: Saraiva, 1992.

MAGALHÃES NORONHA, E. Direito Penal, v. 3. São Paulo: Saraiva, 1969.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal, v. 3. São Paulo: Atlas, 1999.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito de Família. São Paulo: Saraiva, 1968.

OLIVEIRA, José Lopes de. Manual de Direito de Família. Recife: UFPe - Imprensa Universitária, 1968.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. São Paulo: Saraiva, 1968.

Sobre o autor
Marcelo do Rêgo Barros Lapenda

Técnico Judiciário do TRF da 5ª Região, integrante da Assessoria do Gabinete da Des. Federal Margarida Cantarelli (área penal), bacharel em Administração (FCAP/UPe) e em Direito (FDR/UFPe), pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil (UNINASSAU) e pós-graduando em Direito Penal e Processual Penal (ESA/OAB-PE)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LAPENDA, Marcelo Rêgo Barros. A dissolução da sociedade conjugal pelo erro essencial sobre a pessoa:: aspectos médico-legais e penais do art. 219, III, Código Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 58, 1 ago. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3110. Acesso em: 15 nov. 2024.

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