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A poluição do meio ambiente marinho e o princípio da precaução

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Agenda 01/08/2002 às 00:00

V. A poluição do meio ambiente marinho e o princípio da precaução

[32].

1. Introdução ao princípio da precaução.

A fim de desenvolver políticas efetivas em relação ao meio ambiente, os negociadores das Convenções precisam ter em mãos os melhores dados científicos, especialmente quanto à sua precisão. Entretanto, ao lado de poucas certezas, pairam muitas incertezas científicas, as quais podem ser consideradas, inter alia, como a evidência epidemiológica do nexo causal entre as atividades e os seus impactos, situação na qual os danos tornam-se mais significantes ou até mesmo irreversíveis, por vezes cumulativos por longo tempo ou provocando a combinação de efeitos poluentes. Estas incertezas têm historicamente dificultado muito a criação de leis internacionais de proteção ao meio ambiente. Para evitar uma paralisia causada pela incerteza, alguns instrumentos de direito internacional de proteção ao meio ambiente criados a partir dos anos 80 têm permitido (ou compelido) os Estados partes a proceder termos de um precautionary appoach. Esta abordagem foi pioneira na legislação ambiental alemã durante os anos 70 e 80, onde foi denominada de "princípio da precaução", ou "Vorsorgeprinzip", e não nos supreende vê-lo inserido em Convenções das quais faça parte a República Federal da Alemanha.

O precautionary approach tem sua origem na rejeição dos conceitos inerentes ao princípio da capacidade assimilativa. Este princípio de meio ambiente é baseado na premissa de que a ciência poderia determinar com precisão a capacidade assimilativa do meio ambiente a qual, de sua vez, poderia determinar o tempo suficiente para a tomada de medidas preventivas para sua correção. De acordo com ELEN HEY [33], este princípio está baseado em certas premissas relativas ao relacionamento entre o meio ambiente, a ciência, a tecnologia e a economia.

De forma simples, o princípio da capacidade assimilativa assume que: a ciência pode prover soluções técnicas para mitigar os danos ambientais uma vez que estes podem ser previstos; se podem ser previstos, então há tempo suficiente para agir; agindo desta forma há melhor emprego de recursos financeiros.

As falhas na aplicação deste princípio baseado na prevenção que, portanto, necessita de provas científicas de que os efeitos danosos de atividades e substâncias podem vir muito mais tarde, levou à adoção do precautionary approach.

HEY assevera que o conceito requer que os políticos adotem um princípio que reconheça que os erros são cometidos ao lado do excesso de proteção ao meio ambiente e que podem requerer uma ação de precaução antes da prova científica do efeito danoso. Qualquer formulação do princípio da precaução é, antes de tudo, uma ferramenta para decisão em situação de incerteza científica a qual, efetivamente, altera a lista de dados científicos.

Por outro lado, é questão de política estratégica que direciona a maneira pela qual os políticos, com o intuito de proteger o meio ambiente, aplicam a ciência, a tecnologia e a economia. O princípio da precaução é baseado em novas premissas que incluem a vulnerabilidade do meio ambiente, as limitações da ciência em prever os efeitos dos danos ambientais e a disponibilidade de alternativas sobre processos e produtos menos poluentes. Alguns especialistas perceberam a importância deste approach como um paradigma para o direito internacional ambiental, a partir de uma perspectiva predominantemente econômica e antropocêntrica dirigida primariamente a um ecocêntrica ponto de vista.

A adoção deste approach inicialmente tendeu ser restrita a situações específicas a às atividades associadas com riscos sérios de danos. Este approach pode ser justificado a partir da premissa de que todo dano pode ser irreversível ou ser indenizado por altos custos. Entretanto, a adoção deste approach em uma larga variedade de instrumentos internacionais e a sua consolidação na Declaração do Rio 92 [34] têm incitado em alguns autores, como MCINTYRE e MOSEDALE, a idéia de que este princípio da precaução teria se cristalizado como um costume de direito internacional [35].

Ainda que se pudesse estabelecer o princípio da precaução como um costume de direito internacional, o que não é objeto deste estudo, outras incertezas permanecem sem resposta, em particular devido ao fato de que ele aparece através de uma variedade de formas, fazendo com que o conteúdo preciso da obrigação que ele encerra permaneça objeto de incertezas.

2. O princípio da precaução no direito internacional do meio ambiente.

Diferentes formulações do princípio da precaução podem ser encontradas em uma grande variedade de instrumentos internacionais. Estes instrumentos incluem acordos obrigatórios e não obrigatórios, instrumentos de abrangência e aplicação global e regional, instrumentos relativos a meio ambientes ou atividades ambientais específicas e instrumentos que encerram princípios gerais de ação ambiental.

O princípio da precaução tem recebido suporte consistente em instrumentos relativos à poluição do meio ambiente marinho. Uma das primeiras expressões podem ser encontradas no Preâmbulo da Declaração Ministerial de Bremen de 1984, apresentada na Conferência Internacional sobre Proteção do Mar do Norte permitindo aos Estados anteciparem suas ações, não esperando por provas conclusivas dos efeitos prejudiciais de determinada atividade para agirem [36]. Subseqüentemente, em 1987, a Declaração Ministerial de Londres na II Conferência sobre o Mar do Norte, mencionou de modo específico o princípio da precaução [37]. Os Estados participantes deram uma indicação de como o princípio seria implementado por meio de um acordo em aceitar o princípio de salva guarda do ecossistema marinho do Mar do Norte pela redução das emissões poluentes de substâncias persistentes, tóxicas e passíveis de bio-acumulação na origem pelo uso da melhor tecnologia disponível e outras medidas apropriadas [38].

Na III Conferência do Mar do Norte, realizada na Haia em 1990, os Ministros novamente endossaram o princípio, garantindo a continuidade de sua aplicação. De acordo com FREESTONE [39], a inclusão de um compromisso de continuar a aplicação do princípio do Preâmbulo da Declaração da Haia é de grande significância, pois ela representa que todas as áreas de trabalho da Conferência se sujeitaram ao princípio.

Uma recomendação de 1989 (Recomendação PARCOM 89/1), adotada pela Comissão criada em 1974 pela Convenção de Paris sobre Prevenção da Poluição do Meio Ambiente Marinho Originária de Fontes Terrestres [40], declarou que a Convenção abrangia o princípio da precaução e reproduziu integralmente o texto do parágrafo XVI, 1, da Declaração de Londres de 1987. Outra recomendação passada na mesma reunião enfatizou a lista de aplicações da melhor tecnologia disponível para dar efeito ao princípio geral da precaução. Numa recomendação subsequente, a Recomendação PARCOM 90/1 da Comissão de Paris, forneceu-se os primeiros passos para uma aplicação mais concreta do princípio pela definição da melhor tecnologia disponível para alguns setores específicos da indústria, mais precisamente sobre o setor de ferro e aço.

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Instrumentos mais recentes sobre poluição marinha em estreita ligação com conceitos de prevenção e precaução têm expressado o princípio da precaução em termos mais precisos. Por exemplo, a Convenção de Paris para a Prevenção do Meio Ambiente Marinho no Nordeste do Atlântico, de 1992 [41], indicou que medidas preventivas serão tomadas quando houver razoáveis concordâncias de interesses, até mesmo quando não há provas conclusivas do nexo causal entre as substâncias (quantidade) e seus alegados efeitos [42]. Esta previsão foi implementada tendo como parâmetro a "Prior Justification Procedure" da Comissão de Oslo [43], por meio da qual substâncias não podem ser introduzidas se estas tiverem sido indicadas com uma margem aceitável de incerteza de que não causam danos ao meio ambiente. Quando este requerimento não for possível, à sustância deve ser aplicada o mais genérico nível de aplicação da melhor tecnologia ou prática disponível.

A Convenção do Mar Báltico de 1992 contém dispositivo similar quanto ao princípio e prevê que medidas preventivas serão tomadas ainda quando não houver razão para assumir que o dano pode ser causado, ainda que não exista prova conclusiva do nexo causal entre as substâncias e seus alegados efeitos [44].

Em Outubro de 1989 as partes contratantes da Convenção de Barcelona para a Proteção do Mar Mediterrâneo contra Poluição concordaram com a integral adoção do princípio da precaução em relação à prevenção e eliminação da contaminação da área do Mar Mediterrâneo [45] e determinou ao Secretariado a revisão do Protocolo de Dumping, a fim de verificar a necessidade de emendas. Também em outubro de 1989 o Conselho Nórdico da Conferência sobre Poluição dos Mares concordou sobre a necessidade de uma efetiva ação de precaução que poderia ser a salva-guarda do ecossistema marinho através, dentre outras coisas, da eliminação e prevenção das emissões poluentes sobre as quais não havia razão para acreditar que danos, ou efeitos prejudiciais, podem ser causados até mesmo quando é inadequada ou inconclusiva a prova científica do nexo causal entre as emissões e seus efeitos [46]. Na contramão desta tendência, no II Encontro das Partes da Convenção de Cartagena para Proteção e Desenvolvimento do Meio Ambiente Marinho da Região do Caribe [47], em 1983, uma proposta do México para que o princípio da precaução fosse adotado como um princípio operacional para todas as decisões que teve oposição dos Estados Unidos.

A Decisão 15/27 de 1989 do "UN Environment Programme Governing Council" asseverou que aguardar por provas científicas sobre o impacto de discargas poluentes no meio ambiente marinho pode resultar em danos irreversíveis ao meio ambiente, bem como evitável sofrimento humano, recomendando que todos os governos adotassem o princípio da ação por precaução como base de suas políticas de eliminação da poluição marinha.

Em seu relatório de 1990 sobre Direito do Mar, o Secretário-Geral da ONU expressamente reconheceu a considerável significância do princípio para ações futuras de proteção do meio ambiente marinho e conservação dos recursos marinhos, reportando-se a recentes endossos de fori internacionais [48].

Finalmente, a Comissão da ONU preparatória para a Conferência de Meio Ambiente e Desenvolvimento foi mais específica quando identificou como prioridade a aplicação do princípio da precaução, implementado-a a partir de métodos de produção menos poluentes em níveis globais, nacionais e regionais atingindo todas as substâncias sintéticas e persistentes que direta ou indiretamente atingem o meio ambiente marinho.

3. A casuística internacional de reconhecimento do princípio da precaução.

O caso dos testes nucleares entre França e Nova Zelândia e o caso NIREX.

3.1 O caso dos testes nucleares entre França e Nova Zelândia (1995) [49].

Não é preciso muito esforço para recordarmos dos testes nucleares realizados pela França no atol de Mururoa em 1995, um conjunto marítimo situado no Oceano Pacífico na região da Polinésia Francesa. Inconformada com os testes, a Nova Zelândia provocou a levou o julgamento de seu caso à Corte Internacional de Justiça, onde o caso foi julgado favoravelmente à França na segunda metade de1995. Em suas alegações a Nova Zelândia sustentou que a conduta da França era ilegal por causar, ou parecer causar, a introdução no meio ambiente marinho de material radiativo, por esta razão a França estaria obrigada, antes mesmo de executar testes nucleares subterrâneos, a fornecer provas de que os testes não resultariam na introdução deste material no meio ambiente, respeitando o princípio da precaução, amplamente aceito no direito internacional moderno.

Enquanto a maioria da Corte negou o pedido da Nova Zelândia sem a necessidade de examinar o mérito do caso, três juízes em opinião divergente entenderam que a corte deveria julgar o mérito (KONOMA, PALMER E WEERAMANTRY).

O primeiro destes juízes, KONOMA foi o mais cuidadoso a abordar o tema da precaução, observando que havia, provavelmente, por parte da França um dever de não causar danos sérios ao meio ambiente, os quais razoavelmente podem ser evitados. Ele, entretanto, considerou que a Nova Zelândia havia levado à Corte elementos suficientes para se estabelecer um caso prima facie (o que permitia julgamento de mérito), principalmente devido à indicação de que havia provas científicas de que a contaminação do meio ambiente marinho era um risco real e decorrente dos testes subterrâneos.

O juiz PALMER concluiu que dois elementos - o princípio da precaução e a exigência específica de uma avaliação de impacto ambiental - deveriam ser tomadas em relação aos sítios onde as atividades poderiam produzir efeitos significantes sobre o meio ambiente. PALMER percebeu que, obviamente, era impossível para a Corte encontrar conclusões firmes sobre tais efeitos somente com os elementos trazidos pelas partes.

O terceiro juiz, WEERAMANTRY afirmou que o princípio da precaução (o qual ele notou estar ganhando apoio como parte do direito internacional do meio ambiente) é a resposta necessária para um problema claro e evidente mostrado neste caso. Havendo evidências suficientes de que um dano irreversível ao meio ambiente pode surgir de uma atividade, é muito difícil para uma pessoa, na posição de reclamante numa ação, provar os fatos com base em informações que estão em posse dos que desenvolvem a atividade perigosa.

WEERAMANTRY anotou que a Nova Zelândia foi capaz de levar à Corte algumas informações relevantes para o julgamento do caso a seu favor, mas era a França quem possuía as informações concernentes aos aumentos de emissões radioativas.

De acordo com as informações levadas à Corte, WEERAMANTRY concluiu que havia uma exigência prima facie por uma avaliação de impacto ambiental de acordo com as atuais exigências do direito internacional. A exigência de uma avaliação de impacto ambiental, segundo o juiz, está atrelada ao princípio da precaução.

Ainda, WEERAMANTRY considerou que a Nova Zelândia havia estabelecido um caso prima facie, mostrando que os perigos levantados perante a Corte em 1973 atinentes a testes nucleares estavam novamente presentes, pois estava quebrado o direito de todos os membros da comunidade internacional de ser verem livres da ameaça de testes nucleares que dão origem a partículas nucleares e serem preservados da injustificada contaminação radioativa do meio ambiente.

Argumentava WEERAMANTRY que havia um princípio suficientemente bem estabelecido de direito internacional para que a Corte decidisse sobre as situações de ameaça ao meio ambiente: deve-se provar que estas atividades não produzem consequências fora a área sobre a qual se desenvolvem. Neste ponto de vista, a Corte poderia considerar que o dano ao meio ambiente alegado pela Nova Zelândia é um prima facie estabelecido na ausência de provas por parte da França de que os testes nucleares são ambientalmente seguros.

No que se refere à questão sobre o local de testes ser seguro quanto à retenção dos efeitos nucleares, próprio para preservar todo o meio ambiente marinho e a alimentação humana, WEERAMANTRY declarou: "pode ser que a França disponha de material que prove que o local dos testes seja ambientalmente seguro, mas não forneceu à Corte qualquer tipo de prova a respeito. Tendo como base o curso dos eventos geológicos, a garantia de estabilidade de ilhas em formação a centenas de milhares de anos não parece ser uma garantia verossímil ou provável."

3.2. O caso NIREX [50].

O princípio da precaução também foi reconhecido pelo Governo da Irlanda num caso envolvendo o risco de entrada de material radioativo no meio ambiente marinho deste Estado. Em 1996 a Irlanda submeteu a julgamento um inquérito público no Reino Unido para investigar facilitação de testes de conveniência para depósito de lixo nuclear em uma área localizada em território britânico nas costas da Cumbria, adjacências do Mar da Irlanda. Este caso ficou conhecido como caso NIREX, o mesmo nome da companhia que realizaria o depósito do lixo.

A Irlanda argumenta que o princípio da precaução impunha ao governo britânico deveres em relação à sua aplicação. Em particular, o princípio é levantado em três pontos específicos: primeiramente, antes de se depositar material tóxico em área costeira, locais em áreas não costeiras deveriam ter sido pesquisados, pois nestes locais vazamentos podem ser mais bem contidos, diminuindo os riscos de poluição transfronteiriça.

Em segundo lugar, faltava qualquer evidência de que foram consideradas quaisquer avaliações de impacto ambiental do proposto depósito, em particular no meio ambiente marinho, mais uma evidência de que o princípio não estava sendo obedecido.

Finalmente, foi argumentado que o princípio da precaução invertera o ônus da prova sobre ausência de risco ambiental, retirando-o dos proponentes e atribuindo-os aos virtuais poluidores. De acordo com o princípio da precaução, bastavam estes três argumentos para que se chegasse à conclusão de que cumpria ao governo irlandês indicar a mera possibilidade de consequências adversas para a Irlanda decorrentes da implantação do depósito de lixo nuclear.

Assim, deve a companhia, e em último caso o governo britânico, demonstrar que não haveria contaminação do meio ambiente marinho, contrariamente ao que acreditava a Irlanda, um dever que falharam em cumprir. A Irlanda também assinalou em sua petição a necessidade de uma completa avaliação de impacto ambiental e de disponibilização de informações públicas concernente a locais alternativos de depósito.

Apesar dos apelos ao princípio da precaução, o caso resolveu-se com base na legislação da Comunidade Européia, sem a necessidade de aplicar normas de direito internacional [51], mas vale o caso como reconhecimento da Irlanda do princípio.

Da análise de ambos os casos concluímos que, a fim de expandir o uso do princípio da precaução Nova Zelândia e Irlanda enfatizaram o potencial perigo de certas atividades, inclusive quanto a perigos não tão visíveis, menos óbvios. Veja-se o exemplo da arbitragem Lac Lannoux [52] entre França e espanha em 1957, cujo pleito da Espanha cuidou de demonstrar os efeitos econômicos negativos e direitos sofridos por seus nacionais em razão de atividade levada a efeito dentro do território da França, efeitos facilmente identificados e quantificados por todos os Estados.

Mutatis mutandis, embora os pleitos da Nova Zelândia (testes nucleares) e Irlanda (caso NIREX) não se relacionem a perdas econômicas, mas a danos ambientais, o paralelo entre os efeitos que antecipadamente podem ser evitados indica que estes Estados estão buscando proteger seu direito em não serem afetados por efeitos de atividades danosas produzidas em outros Estados, um direito que está sendo violado. Na linha de argumentação destes dois Estados, fundada no princípio da precaução, a simples exposição ao risco de danos ambientais justifica suas ações em ter garantias e mecanismos de proteção de seus interesses, que também se estendem aos seus oponentes, França e Reino Unido, que devem dispor de mecanismos locais para minimizar os riscos de danos ambientais em áreas sob suas jurisdições.

4. O conteúdo do princípio da precaução.

Elen HEY [53], estudiosa do princípio da precaução, identificou algumas características gerais deste princípio em suas várias aplicações. A fim de assegurar que a falta de certeza científica não seja usada como razão para protelar medidas para aumentar a qualidade do meio ambiente, HEY afirma que o princípio estabelece que: a) métodos limpos de produção, melhor tecnologia disponível e melhores práticas ambientais devem ser aplicadas; b) métodos compreensivos de avaliação econômica e ambiental devem ser usados para decidir sobre medidas de aumento da qualidade do meio ambiente; c) pesquisa, particularmente científica e econômica que contribuam para melhorar a compreensão a longo prazo das opções disponíveis, devem ser simuladas; d) procedimentos legais, administrativos e técnicos que facilitem a implementação deste princípio devem ser aplicados e onde não esteja disponíveis, devem ser desenvolvidos.

5. O reconhecimento do princípio da precaução: Capítulo 17 da Agenda 21 - a proteção do meio ambiente marinho, costeiro e das ilhas.

Vimos em nossos estudos apresentados no Capítulo IV, tópico 3.2., que a Agenda 21, documento elaborado na Convenção sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 1992) reservou o Capítulo 17 para o programa de proteção aos Oceanos e Mares.

O princípio da precaução, mencionado expressamente na Introdução ao referido Capítulo 17, aplica-se a todas as áreas abordadas no programa de desenvolvimento dos Oceanos e Mares. [54].

No programa de "gerenciamento integrado e desenvolvimento sustentável das zonas costeiras e marinhas, inclusive zonas econômicas exclusivas", princípio da precaução é mencionado como medida necessária para atingir os objetivos da Agenda. O parágrafo 17.5, d, estabelece que, inter alia, devem os Estados "adotar medidas preventivas e de precaução na elaboração e implementação dos projetos, inclusive com a avaliação prévia e observação sistemática dos impactos decorrentes dos grandes projetos".

Outra expressão clara da adoção do princípio da precaução encontra-se no parágrafo 17.6, d, que estabelece, entre os mecanismos de coordenação nacional das atividades relacionadas ao gerenciamento, "a avaliação prévia do impacto sobre o meio ambiente, a observação sistemática e o acompanhamento dos principais projetos, inclusive a incorporação sistemática dos resultados ao processo de tomada de decisões."

De modo específico ao programa de "proteção do meio ambiente marinho", o princípio é declarado no parágrafo 17.21, como própria base de ação: "(P)ara impedir a degradação do meio ambiente marinho é preciso adotar uma abordagem de precaução e antecipação, mais do que de reação. Para tanto é necessário, inter alia, adotar medidas de precaução,avaliações dos impactos ambientais, tecnologias limpas, reciclagem, controle e redução de esgotos, construção e ou melhoria das centrais de tratamento de esgotos, critérios qualitativos de gerenciamento para o manejo adequado de substâncias perigosas e uma abordagem abrangente dos impactos nocivos procedentes do ar, da terra e da água. Seja qual for a estrutura de gerenciamento adotada, ela deverá incluir a melhoria dos estabelecimentos humanos costeiros e o gerenciamento e desenvolvimento integrados das zonas costeiras."

Novamente nos objetivos de proteção ao meio ambiente, é retomado o princípio da precaução no parágrafo 17.22: "Os Estados, em conformidade com a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar relativas à proteção e à preservação do meio ambiente marinho, comprometem-se, de acordo com suas políticas, prioridades e recursos, a impedir, reduzir e controlar a degradação do meio ambiente marinho, de forma a manter sua capacidade de sustentar e produzir recursos vivos. Com esta finalidade é preciso: a) definir critérios preventivos, de precaução e de antecipação, de modo a evitar a degradação do meio ambiente marinho e reduzir o risco de haver efeitos a longo prazo ou irreversíveis sobre o mesmo; b) assegurar a realização de avaliações prévias de atividades que posam apresentar impactos negativos significativos sobre o meio ambiente marinho; c) Integrar a proteção do meio ambiente às políticas gerais pertinentes às esferas ambiental, social e de desenvolvimento econômico; d) Desenvolver incentivos econômicos, conforme apropriado, para a aplicação de tecnologias limpas e outros meios compatíveis com a internacionalização dos custos ambientais, por exemplo o princípio do "poluidor pagador", com o objetivo de evitar a degradação do meio ambiente marinho; e) melhorar o nível de vida das populações costeiras, especialmente nos países em desenvolvimento, de modo a contribuir para a redução da degradação do meio ambiente costeiro e marinho", um belo conjunto de medidas de precaução.

Sobre o autor
Rodrigo Fernandes More

advogado, professor em São Paulo,mestre e doutor em direito internacional pela USP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORE, Rodrigo Fernandes. A poluição do meio ambiente marinho e o princípio da precaução. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 58, 1 ago. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3194. Acesso em: 5 nov. 2024.

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