6.6.3 Controle administrativo
Rodrigo Santos Neves (2009), apoiado no entendimento de Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2008), expõe que o controle administrativo consiste naquele exercido pela própria Administração Pública (em geral) sobre sua própria atividade. “...é o poder de fiscalização e correção que a Administração exerce sobre sua própria atuação sob os aspectos delegalidade e mérito, por iniciativa própria ou mediante provocação”.30
Esse poder de controle sobre a própria atividade também é chamada de auto-tutela. No âmbito das agências reguladoras existem inúmeras formas de controle administrativo, que pode ser interno, isto é, exercido pelos seus próprios agentes, ou externo. O regulamento da Anatel é mais detalhado sobre o assunto, trazendo uma série de exemplos. Emseu artigo 31 prevê a suspensão do salário do conselheiro caso utilize-se de atos protelatórios com a finalidade de atrasar andamentos dos trabalhos da agência, até que dê andamento ao feito:
Art. 31 – O Conselheiro Diretor decidirá por maioria absoluta, nos termos fixados no Regimento Interno.
§ 3º O Conselheiro que impedir, injustificadamente, por mais de trinta dias, a deliberação do Conselho, mediante pedido de vista ou outro expediente de caráter protelatório, terá suspenso o pagamento de seus vencimentos, até que profira seu voto, sem prejuízo da sanção disciplinar cabível.
Outra forma de controle administrativo exercido sobre as agências são suas Procuradorias, que exercem papel importante na legalidade dos seus atos normativos, na análise prévia destes, bem como dos editais, licitações e contratos a serem firmados nos termos do art. 56, V, do Regulamento:
Art. 56, inciso V – assistir as autoridades no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem praticados, inclusive examinando previamente os textos de atos normativos, os editais de licitação, contratos e outros atos dela decorrentes, bem assim os atos de dispensa e inexigibilidade de licitação.
Verifica-se ainda a figura do Ombudman como mais uma forma de controle administrativo. A expressão e o instituto têm origem sueca, do início do século XIX, e era vinculada ao Poder Legislativo, tendo poderes de fiscalizar até mesmo decisões judiciais e de altos funcionários do governo. Este era um representante da sociedade no seio da AdministraçãoPública. Já no nosso sistema essa figura aparece na forma de Ouvidor.
Apesar de não ter as mesmas prerrogativas do Ombudman, fica condicionado a receber denúncias e reclamações, para logo após cobrar das autoridades que imponham as medidas necessárias ao atendimento do interesse público.
Existe ainda a possibilidade de qualquer cidadão exercer o direito de peticionar, na forma do artigo 69 do Regulamento da ANATEL, para que a agência exerça tais controles internos, bem como recorrer contra ato da agência, no prazo de trinta dias, contados da publicação do ato, devendo a agência formular resposta fundamentada no prazo de até noventa dias, contados do protocolo da petição.
Outra modalidade é o controle administrativo externo, pois ainda que as agências disponham de independência funcional, elas não são imunes ao controle no âmbito da Administração. No exercício desta modalidade, podem os órgãos centrais de vinculação ao setor da agência, no caso específico da ANATEL, o Ministro das Comunicações, instaurarprocesso administrativo disciplinar para apurar irregularidades no exercício das funções dos conselheiros, podendo assim provocar a extinção de seus mandatos, lembrando ainda que o processo pode ser instaurado diretamente pelo Presidente da República:
Art. 40 – Os integrantes do Conselho Consultivo perderão o mandato, por decisão do Presidente da República, a ser tomada de ofício ou mediante provocação do Conselho Diretor da Agência, nos casos de:
I – conduta incompatível com a dignidade exigida pela função;
II – mais de três faltas não justificadas consecutivas a reuniões do Conselho;
III – mais de cinco faltas não justificadas consecutivas a reuniões do Conselho (Regulamento da Anatel).
Por fim, verifica-se uma outra situação híbrida de controle,intitulada como controle administrativo intersetorial, que consiste na necessidade sentida de coordenar as atividades regulatórias das diversas agências quando atuem em setores tão próximos que possam suscitar conflitos de competência. Pode-se verificar este caso na Resolução conjunta nº 01, de 24 de novembro de 1999, entre a Anatel, a ANP e a Aneel, tratando sobre o compartilhamento de infra-estruturas entre os trêssetores econômicos.
6.6.4 Controle político
O controle político é exercido antes mesmo do surgimento da agência, por meio do projeto de lei que a cria, por meio dele são fixadas suas competências, a estrutura da administração, o valor da taxa de regulação, bem como a organização e remuneração de seus agentes.
Ademais, cabe ressaltar que as agências deverão, por força de lei, implementar as diretrizes políticas traçadas pelos órgãos da Administração direta, conforme disciplinam o artigo 7º da Lei nº 9.478/97, a qual institui a Agência Nacional do Petróleo – ANP, artigo 2º da Lei nº 9.427/96 que cria a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, artigo 19, incisos XXIX e XXX, da Lei nº 9.472/97, que cria a Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL.
Pelo fato de ser uma autarquia, a agência reguladora está sujeita ao poder de supervisão e tutela, exercido pelo Poder Executivo, que com ela celebra um contrato de gestão contendo as diretrizes políticas de sua atuação administrativa, consubstanciando importante instrumento de controle e de avaliação de desempenho dos dirigentes.31
Apesar das decisões das agências reguladoras estarem sujeitas à supervisão da Administração direta, elas não se submetem ao recursohierárquico impróprio, funcionando, portanto, como última instância administrativa para julgamentos dos recursos contra seus atos.
O controle do pelo Chefe do Executivo pode dar-se também por ato normativo, mediante decreto, com a alteração do regulamento da agência, restringindo sua atuação, além da edição de medidas provisórias.
Sendo assim, o congresso pode sustar as atos normativos das agências, isto é, sustar normas reguladoras. Caso as agências editem suas normas e invadam a competências do Congresso e a do Chefe do Executivo (de formular políticas públicas), exorbitando da competência normativa que é somente técnica, que lhes foi atribuída pela deslegalização, sendo passível de controle pelo Congresso.32
Outra modalidade de controle pelo legislativo é exercida quando da criação da agência e do mercado regulatório. Cite-se, por exemplo, a Lei 9.473/97, que instituiu a ANATEL, contendo 216 artigos. As agências devem agir conforme as disposições dessa lei, ou com outra que venha substituir suas normas reguladoras também não podem ultrapassar esseslimites.
6.6.5 Controle financeiro
Assim como toda a Administração Pública, as agências reguladoras estão sujeitas ao controle financeiro exercido pelo Congresso
Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União, em conformidade com o artigo 70 da Constituição Federal. Tal controle tem caráter técnico e, por isso deve ser realizado pelo Tribunal de Contas.
O controle financeiro deve ser exercido devido ao fato de que as agências atuam sobre seus respectivos setores com recursos públicos, devendo, dessa forma, sofrer controle de seus gastos, tendo em vista o princípio de economicidade em sua atuação, citando como exemplo o disposto no art. 5º, § 3º, do regulamento da Anatel, aprovado pelo Decretonº 2.338/97:
Art 5º, § 3º - A fixação de contas anual da administração da Agência, depois de aprovada pelo Conselho Diretor, será submetida ao Ministro de Estado das Comunicações, para remessa ao Tribunal de Contas da União – TCU, observados os prazos previstos em legislação específica.
O controle financeiro exercido pelo Tribunal de Contas deve ser realizado, por serem as agências autarquias federais e não entes com função reguladora, e sua apreciação deve limitar-se à verificação da busca do interesse público e da economicidade, e não do mérito administrativo.
Tal controle deve ser exercido apenas em relação aos atos de gestão, no tocante aos gastos da agência, e não sobre suas decisões sobre a regulação do seu setor.
6.6.6 Controle social
Assumindo papel relevante na regulação, o controle social consiste na participação intensa da sociedade, garantindo ao processo regulatório a legitimidade necessária, não apenas para a imposição de normas gerais e decisões corretas, mas também para a plena aceitação das soluções impostas aos conflitos de interesses submetidos à sua apreciação.33
O controle social esta vinculado, de certa forma, com a idéia de democracia e de transparência no exercício do poder, levando sempre em consideração a prevenção do arbítrio. Os mecanismos da audiência pública e consulta pública são os mais utilizados na forma de participação popular na atividade regulatória, em que, no primeiro caso, a sociedade erepresentantes de classe comparecem à audiência e formulam críticas e sugestões para o incremento da política pública, a sociedade e entidades de classe, representando consumidores e agentes econômicos, participam dando suas contribuições formalmente, até determinando prazo. As sugestões são recolhidas e avaliadas, sendo ou não acolhidas, de uma forma ou de outra a decisão deverá ser motivada.
Outro mecanismo de controle são as ouvidorias criadas em todas as agências, as quais apresentam as seguintes características: a) ou são centros de recolhimento de reclamações dos usuários e agentes; ou b) são pessoas com livre acesso às informações e reuniões da agência, devendo apresentar periodicamente um relatório das atividades da agência.Criado pela Anatel, o Conselho Consultivo é integrado por doze membros, dentre eles representantes indicados pelo Senado Federal, pela Câmara dos Deputados, pelo Poder Executivo, pelas entidades de classe prestadoras de serviços de telecomunicações, por entidades representativas da sociedade (dois de cada órgão), onde as decisões são por maioria simples, cabendo ao Presidente do conselho o voto de desempate.
Diante destes instrumentos de controle social, verifica-se o efetivo controle da atividade regulatória pela sociedade.
6.6.7 Controle jurisdicional
Por fim, analisamos o controle judicial como mecanismo de controle da atividade regulatória. Sua primeira finalidade é aferir a legalidade dos atos da Administração Pública, a partir da provocação daquele que se sentir lesado, através dos vários instrumentos previstos na Constituição Federal, como o mandado de segurança, a ação popular, a ação civil pública, o mandado de injunção e o habeas data.
Entretanto, a extensão desse controle não deve cingir-se ao exame estrito da legalidade e licitude do ato inquinado de vício. Cumpre também ao judiciário avaliar não apenas a conformidade do ato com a lei, mas em conjunto com a sua adequação moral-administrativa e à finalidadepública. Nesse sentido, o Judiciário deverá investigar se a norma reguladora atendeu ao princípio da participação e nesse sentido, se permitiu o acesso dos vários grupos anteriormente mencionados, que são legitimados para acompanhar as decisões.
O controle da legalidade em seu sentido amplo, envolve a chamada juridicidade, compreendendo tanto a legalidade, em sentido estrito, quanto a legitimidade, que consiste na verificação do usoantijurídico da discricionariedade e a licitude, que importa no exame de eventual desvio moral.
Salienta Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2001) que a deslegalização não abre um campo de ação arbitrária para o órgão regulador, mas um espaço discricionário de decisão, onde o legislador delimita para a Administração reguladora um âmbito decisório que esta poderá preencher com decisões normativas ou concretas, sujeitas as estritas regras de validação.34
É indispensável, portanto, que o Judiciário exerça sua função de controle, tendo em vista a adequação do novo modelo estatal à velha estrutura da Administração hierarquizada e centralizadora. Apesar da independência das esferas administrativa e judicial, cinge o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (CF, art. 5º, XXXV), não se eximindo a Administração Pública de ter seus atos apreciados e revistos pelo Judiciário.