APRESENTAÇÃO
Tema ainda bastante controvertido na doutrina brasileira é a natureza jurídica do pedágio, ou seja, se tem natureza do tributária ou não, se se trata de uma taxa ou de uma tarifa.
Esse é o assunto que aqui será abordado, de forma que se faz relevante trazer à baila os conceitos de tributo, taxa e tarifa, para que posteriormente possamos analisar a doutrina e definirmos a natureza jurídica do pedágio, mas sem a pretensão de esgotar o tema que, parece-nos, ainda renderá muitos debates entre os tributaristas.
CONCEITO DE TRIBUTO
O conceito de tributo está previsto na legislação infraconstitucional brasileira, mais precisamente no art. 3º do Código Tributário Nacional, in verbis:
Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.
Conforme o referido artigo, independentemente de nomenclatura, se for objeto de uma obrigação, ou seja, uma prestação jurídica, sendo pecuniária, compulsória, não se constituindo sanção de ato ilícito, se desvinculando de qualquer ilicitude anterior à ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, tendo em vista que o fato gerador é interpretado de forma objetiva (princípio da interpretação objetiva do fato gerador), se instituída em lei (princípio da legalidade) e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada, tratar-se-á de tributo.
Desta forma, o Código Tributário Nacional (66) traz em seu art. 5º que os tributos são impostos, taxas e contribuições de melhoria (Teoria Tripartite). Em que pese a previsão de apenas esses três tributos, a Constituição Federal de 1988, que é posterior ao CTN, previu em seus artigos 145, 148, 149 e 149-A, além daquelas espécies previstas código tributarista, o empréstimo compulsório e as contribuições especiais, adotando a Teoria Pentapartite.
Entretanto, este artigo tem como objetivo o estudo da natureza jurídica pedágio, de forma que este se enquadraria, se tivesse ou não natureza tributária tivesse, no conceito de taxa ou tarifa que agora passamos a analisar.
TAXA X TARIFA
Conforme prevê o art. 77 do Código Tributário Nacional, as taxas seriam tributos com fatos geradores diretamente vinculados a utilização, efetiva ou potencial, de um serviço ou do exercício regular do poder de polícia, tendo uma destinação específica, desprovido de devolutividade. Observe-se o conceito de taxa previsto expressamente no CTN:
Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.
Curial destacar que a taxa está ligada a prestação de serviços públicos específicos e divisíveis sendo que a conceituação de o que seria essa divisibilidade e essa especificidade da taxa estão previstas no art. 79 do CTN, in verbis:
Art. 79. Os serviços públicos a que se refere o artigo 77 consideram-se:
I - utilizados pelo contribuinte:
a) efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer título;
b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento;
II - específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade, ou de necessidades públicas;
III - divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários.
Resta claro que o fato gerador deste tributo é uma prestação de serviço do Estado, ligado a um fato deste ente, e não do contribuinte. Entretanto, é a partir deste ponto que surgem questionamentos acerca da diferença entre taxa e tarifa pública.
Em suma, ambas têm como objetivo uma contraprestação de serviço público, apesar de na tarifa haver um objetivo econômico, característica esta não encontrada nas taxas. As tarifas podem ser cobradas por pessoas jurídicas de direito público ou privado, mas se estiver se tratando de serviço público propriamente estatal ou essenciais ao interesse público, se obrigatório, impositivo se faz que seja a contraprestação cobrada por meio de taxa por pessoa jurídica de direito público. Quanto aos demais serviços públicos, ou seja, os não essenciais, a contraprestação ocorrerá por meio de tarifa.
Em consonância com esse entendimento, podemos destacar o autor Eduardo Sabbag (2013), que assevera:
V. A prestação de serviços: caso o Estado pretenda desempenhar atividades econômicas com o fito de lucro, assemelhando-se à empresa integrante de iniciativa privada, o que nada obsta a que o faça, poderá ver-se remunerado por prestações pecuniárias que chamamos de tarifas (ou preços públicos), regidas pelo Direito Privado. O Estado, por sua vez, irá se remunerar por meio de taxas, quando proceder à prestação dos serviços públicos (res extra commercium), se específicos e divisíveis, regidos pelo Direito Público.
Assim, a taxa é uma obrigação ex lege, ou seja, decorre da lei, sendo compulsória, até mesmo porque se trata de um tributo. Ao passo que a tarifa é uma obrigação ex voluntate, ou seja, voluntária/contratual, tratando-se de uma espécie de preço público.
A NATUREZA JURÍDICA DO PEDÁGIO: BREVE DIGRESSÃO DOUTRINÁRIA
A discussão acerca da natureza jurídica do pedágio reside no fato de que muitos doutrinadores defendem a sua natureza tributária por haver sua previsão no art. 150, V, da CC/88, na “Seção II – Das Limitações do Poder de Tributar”, ao passo de existirem aqueles que defendam a natureza de tarifa dos pedágios, pois, por exemplo, existem situações em que a sua cobrança é feita por concessionárias de serviços públicos.
Ademais, mormente existam aqueles que defendam a natureza de tarifa dos pedágios, conforme bem asseveram Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo (2009):
(...) aqueles que pretenderem afirmar que pedágio é sempre tarifa, terão, pelo menos, estes problemas: (1) estarão aparentemente contrariando a jurisprudência firmada pelo STF, que, ao tratar do selo-pedágio, decidiu que pedágio é taxa; (2) terão que afirmar que a Constituição, na seção que dispõe acerca “das limitações do poder de tributar”, tratou de instituto que não é tributo.
Ademais, como já destacado, o pedágio geralmente é arrecadado por uma pessoa jurídica de direito privado e, em não havendo via alternativa para o usuário do serviço público, aquela prestação acaba se tornando compulsória para o mesmo, havendo, consequentemente, uma compulsoriedade no pagamento de uma contraprestação que será feita, em tese, por um particular. Não obstante, curial destacar que, como bem assevera Eduardo Sabbag (2013):
VII. o art. 146, II, CF, dispõe que a lei complementar deverá dispor sobre as normas gerais de Direito Tributário e, especialmente, sobre a definição de tributo e suas espécies. Sendo assim, enquadrando-se o pedágio como uma taxa, há de haver a publicação de uma lei complementar que venha disciplinar as normas gerais de exação.
Contatam-se argumentos fortes para ambas as posições doutrinárias. Todavia, em consonância com autores como Eduardo Sabbag (2013) e Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo (2009), preferimos afirmar que o pedágio pode assumir natureza tributária ou não, ou seja, tanto pode ser taxa, como pode ser tarifa. Para a alocação da contraprestação pelo serviço público em um ou outro deve-se levar em consideração todas as características que definem as taxas e as tarifas. Assim, preferimos concluir essa breve abordagem com os ensinamentos dos autores Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo (2009):
Assim, se o legislador optar pela instituição de um pedágio-taxa, o regime jurídico será tributário, e não poderá ser cobrado por pessoas privadas. Se optar pela instituição deum pedágio-tarifa, como tem acontecido, o regime jurídico será contratual, a cobrança pode ser feita por concessionária, pessoa jurídica de direito privado. Entretanto, doutrinariamente, é defendida a necessidade de, neste caso, existir via alternativa.
REFERÊNCIAS
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Manual de Direito Tributário. 8. ed. São Paulo: Método, 2009.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1998. Brasília, 05 out. 1988.
BRASIL. Código Tributário Nacional. Brasília, 27 out. 1966.
SABBAG, Eduardo de Moraes. Manual de Direito Tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.