4 ANÁLISE DOS REQUISITOS LEGAIS ESTABELECIDOS PARA A RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
As regras referentes à rescisão do contrato de trabalho encontram-se previstas no capítulo V, do título IV, da CLT e abarcam os artigos 477 a 491.
No presente capítulo, passa-se a estudar os requisitos estabelecidos no artigo 477, da CLT no que pertine à rescisão do contrato de trabalho.
Eis a transcrição do inteiro teor do artigo em comento:
Art. 477 - É assegurado a todo empregado, não existindo prazo estipulado para a terminação do respectivo contrato, e quando não haja ele dado motivo para cessação das relações de trabalho, o direto de haver do empregador uma indenização, paga na base da maior remuneração que tenha percebido na mesma empresa.
§ 1º - O pedido de demissão ou recibo de quitação de rescisão, do contrato de trabalho, firmado por empregado com mais de 1 (um) ano de serviço, só será válido quando feito com a assistência do respectivo Sindicato ou perante a autoridade do Ministério do Trabalho e Previdência Social.
§ 2º - O instrumento de rescisão ou recibo de quitação, qualquer que seja a causa ou forma de dissolução do contrato, deve ter especificada a natureza de cada parcela paga ao empregado e discriminado o seu valor, sendo válida a quitação, apenas, relativamente às mesmas parcelas.
§ 3º - Quando não existir na localidade nenhum dos órgãos previstos neste artigo, a assistência será prestada pelo Represente do Ministério Público ou, onde houver, pelo Defensor Público e, na falta ou impedimento deste, pelo Juiz de Paz.
§ 4º - O pagamento a que fizer jus o empregado será efetuado no ato da homologação da rescisão do contrato de trabalho, em dinheiro ou em cheque visado, conforme acordem as partes, salvo se o empregado for analfabeto, quando o pagamento somente poderá ser feito em dinheiro.
§ 5º - Qualquer compensação no pagamento de que trata o parágrafo anterior não poderá exceder o equivalente a um mês de remuneração do empregado.
§ 6º - O pagamento das parcelas constantes do instrumento de rescisão ou recibo de quitação deverá ser efetuado nos seguintes prazos:
a) até o primeiro dia útil imediato ao término do contrato; ou
b) até o décimo dia, contado da data da notificação da demissão, quando da ausência do aviso prévio, indenização do mesmo ou dispensa de seu cumprimento.
§ 7º - O ato da assistência na rescisão contratual (§§ 1º e 2º) será sem ônus para o trabalhador e empregador.
§ 8º - A inobservância do disposto no § 6º deste artigo sujeitará o infrator à multa de 160 BTN, por trabalhador, bem assim ao pagamento da multa a favor do empregado, em valor equivalente ao seu salário, devidamente corrigido pelo índice de variação do BTN, salvo quando, comprovadamente, o trabalhador der causa à mora.
4.1 Da assistência à homologação do acerto rescisório
Da mesma forma que a quitação dos créditos de salário somente se perfaz por meio de ato solene, a quitação das verbas rescisórias somente será reputada válida se atendidas às formalidades legais.
Acerca da realização do referido ato jurídico, BARROS explica que: “[...] Trata-se de formalidade essencial à validade do ato que visa à absoluta certeza na quitação realizada. Preterida tal exigência, é ineficaz o recibo, a não ser que a parte confesse o percebimento do valor”. (BARROS, 2011, p. 765)
Na hipótese de o empregado se demitir ou for dispensado e contar com mais de um ano de prestação de serviços para o seu ex-empregador, o recibo de quitação que será lavrado somente terá validade se a rescisão for realizada perante o sindicato da categoria a qual o empregado pertence, na forma disposta no § 1º supratranscrito, ou perante a autoridade responsável no Ministério do Trabalho e Emprego do domicílio do empregado. Mesmo que a época da dispensa o empregado não conte com um ano de atividades, mas, em verdade, onze meses, mais a projeção do aviso prévio, a homologação no Sindicato será plenamente cabível.
Cumpre salientar que, na hipótese de o empregado se demitir, a quitação somente será reputada válida se este for assistida pelo sindicato ou por outro autoridade competente quando da manifestação volitiva de demissão.
Sobre a hipótese em comento, CARRION nos ensina que:
A ausência daquela formalidade é mais grave no pedido de demissão do que no de pagamento. Quanto ao primeiro, deseja-se preservar não só a autenticidade de manifestação havida com a data, e ainda afastar a ausência de pressões ou abuso o estado de ânimo claudicante do empregado em virtude de algum revés momentâneo sofrido no ambiente de trabalho ou fora dele. Mesmo que se prove a autenticidade do pedido de demissão não homologado, prevalece o posterior arrependimento; idem quanto ao acordo para rescindir, devendo o empregado restituir a quantia recebida. A manifestação de vontade só deveria ter sido aceita após a obediência à forma imposta. [...] (CARRION, 2012, p. 428)
Não havendo a homologação no pedido de demissão, seja a assistência feita pelo sindicato, ou pelo Ministério do Trabalho, esta não restará perfeita, convertendo-se o pedido de demissão em dispensa injusta.
Na eventualidade de não existir sindicato ou órgão do Ministério do Trabalho, serão igualmente competentes para realizar a homologação da rescisão contratual o Ministério Público, o Defensor Público ou, caso na falta desses mencionados agentes públicos, o juiz de paz local[22].
O agente público competente para prestar a homologação gratuita é o servidor público em exercício no local do domicílio do empregado em que se encontra instalado o MTE[23].
Dentre às atribuições do servidor público responsável pela homologação do TRCT se podem elencar as seguintes: inquirir o empregado e confirmar a veracidade dos dados contidos no TRCT e verificar a existência de dados não lançados no TRCT, observados os prazos previstos no inc. XXIX do art. 7º da Constituição Federal.[24]
Se o servidor que proceder à homologação do TRCT, verificar a existência de vício capaz de nulificar a sua realização, não poderá fazê-lo, ficando, assim, impedido. As causas impeditivas de realização da homologação do termo de rescisão se encontram previstas no artigo 12[25], da instrução normativa em comento.
No dia marcado para a realização da homologação, o empregado e o empregador deverão comparecer, para que seja prestada à assistência à rescisão contratual[26].
Na hipótese de o empregado ser menor de 18 anos, deverá comparecer ao local designado (sindicato ou DRT) devidamente representado. O empregador, por seu turno, deverá vir representado por preposto municiado de carta de preposição, ou procurador devidamente munido de instrumento de procuração e, excepcionalmente, o procurador, munido de procuração com poderes expressos para receber e dar quitação.[27]
A assistência na homologação do acerto rescisório possui exceção legal. Nos casos em que a Administração Pública efetuar a dispensa de empregado público, não é exigida a assistência à homologação, de acordo com o que preceitua o inciso I, do artigo 1º, do Decreto-lei nº779/69[28]. A inexigência se dá em virtude de os atos da Administração Pública serem presumidamente válidos.
4.2 Da quitação dos valores e da natureza das verbas constantes do termo de rescisão do contrato de trabalho
Com o escopo de atender ao princípio da boa-fé objetiva, do termo rescisório deverão constar e serem especificados os respectivos valores de cada uma das parcelas que serão pagas ao empregado em decorrência da extinção do pacto laboral.
Assim, incumbe ao empregador, ao emitir o TRCT discriminar as parcelas que serão pagas em favor do empregado, não sendo reputada válida a quitação genérica.
Ao interpretar o parágrafo em comento, SAAD entende que:
[...]
14) É exigência “ad substantiam” do instrumento rescisório do contrato de trabalho que nele sejam discriminados as parcelas e seus valores. Mesmo no caso de rescisão contratual por acordo, a sobredita exigência há que ser atendida, sendo de nenhum valor a cláusula em que o empregado renuncia a direito tutelado por norma imperativa. (SAAD, 2004, p. 362)
O TST, por meio da Súmula n. 330[29] estabeleceu os requisitos de validade da quitação das verbas trabalhistas constantes do TRCT.
No item I da referida Súmula, se o empregador, no transcurso do pacto laboral, inadimplir determinados direitos do empregado e não paga-los nem mesmo na rescisão, estes permanecerão devidos, podendo o ex-empregador pleiteá-los por meio da competente ação trabalhista, desde que observados os prazos de prescrição. Assim, se a parcela for devida e não quitada quando da extinção do contrato, poderá ser objeto de discussão judicial posterior.
Já no item II da súmula em estudo, se determinada verba tiver sido sonegada no curso do contrato de trabalho e somente paga quando da rescisão, a quitação será válida somente quanto ao período em que foi paga, na forma constante do termo de quitação.
Comentando a referida súmula, CORREIA e SANTOS explicam que:
O item II da Súmula nº 330 também trata da limitação dos efeitos da quitação promovida pelo sindicato. O item I tratava da parcela não mencionada e seus reflexos. Esse item II trata da limitação temporal da quitação.
A quitação, portanto, somente terá efeitos liberatórios no período expressamente indicado no recibo. (CORREIA; SANTOS, 2012, p. 518)
4.3 Das formas de pagamento das verbas rescisórias
O pagamento das verbas rescisórias deverá ser feito mediante cheque visado ou em dinheiro, na forma estabelecida entre empregado e empregador.
Caso o empregado seja analfabeto, o pagamento deverá ser feito impreterivelmente em dinheiro, sob pena de ser considerado como não realizado.
Frise-se que é permitido o pagamento por meio de ordem bancária de pagamento, ordem bancária de crédito, transferência eletrônica ou depósito bancário em conta corrente ou poupança do empregado, facultada a utilização da conta não movimentável – conta salário, desde que dentro dos prazos estabelecidos no § 6º, do artigo 477, da CLT[30].
4.4 Do limite legal estabelecido em relação à realização de descontos no acerto rescisório
De acordo com o estabelecido no § 5º, do artigo 477, da CLT, o empregador poderá, quando da quitação das verbas rescisórias devidas ao empregado em decorrência da extinção do pacto laboral, descontar valores, os quais não poderão exceder o equivalente a um mês de remuneração do obreiro.
A CLT veda expressamente a realização de descontos nos salários do empregado, na forma preceituada pelo artigo 462, salvo se o empregado causar dano ao empregador[31].
Todavia, a regra da intangibilidade salarial comporta algumas exceções, como na hipótese de adiantamentos salariais; realização de descontos previdenciários; de contribuição sindical; imposto de renda; no caso de o empregado contrair empréstimo consignado; descontos relativos a benefícios instituídos pela categoria do empregado e por ele usufruídos; de prestações relativas ao sistema de financiamento habitacional, na forma do artigo 1º, da Lei n. 5.725/71; salário trezeno; auxílio-funeral dentre outras mais.
Cumpre salientar, entrementes, que à compensação a que se refere o parágrafo em comento é de natureza material, não sendo vedado ao empregador requerer, em ação autônoma ou em sede de defesa trabalhista apresentada em decorrência de ação judicial, à compensação de créditos já pagos ao empregado na vigência do pacto laboral.
4.5 Da penalidade imposta pelo descumprimento do § 6º, a e b, do artigo 477, da CLT, contida no § 8º do mencionado artigo
O empregador, de acordo com a redação dada ao parágrafo 6º, alíneas a e b, do artigo 477, da CLT deverá observar os prazos ali contidos para quitar as verbas constantes do termo rescisório, sob pena de pagar, em favor do empregado, uma multa referente ao valor equivalente ao salário percebido, conforme se infere da redação do § 8º.
Assim, incumbe ao empregador quitar os valores rescisórios ao empregado da seguinte forma: até o primeiro dia útil imediatamente posterior ao fim do pacto laboral, nos casos de aviso prévio trabalhado ou no término do contrato a termo ou, até o décimo dia útil, contado da data em que o empregado foi notificado da sua dispensa, tendo este cumprido o aviso ou o tendo recebido de forma indenizada, ou no caso de dispensa por justa causa.
Para que seja realizada de forma correta a contagem dos prazos supramencionado, deve-se utilizar a regra do artigo 132, do CCB/02[32], qual seja, exclui-se o dia do início da notificação da dispensa e inclui-se o dia do vencimento. O TST, inclusive, já pacificou esse entendimento por meio da Orientação Jurisprudencial, da SDI-1 de n. 162.
Na hipótese de o vencimento da obrigação ocorrer em dia não útil, prorroga-se o pagamento para o próximo dia, não havendo a incidência da multa do artigo 477, da CLT[33].
Cumpre salientar que os prazos acima referidos se aplicam a qualquer tipo de extinção contratual, sendo certo que se descumprida pelo empregador, o empregado fará jus ao seu recebimento.
A jurisprudência do TST aponta situações de incidência da multa, senão vejamos.
Caso o empregador for pessoa jurídica de direito público e incorrer em mora na quitação dos valores rescisórios devidos ao servidor empregado, a multa também é aplicável, na forma cristalizada nos termos da OJ n. 238, da SDI-1, do TST.[34]
E ainda, mesmo que haja controvérsia quanto à existência de vínculo empregatício, bem como de verbas rescisórias por meio de apresentação de defesa em ação trabalhista, a multa é devida, tendo em vista o cancelamento da antiga OJ nº 351, da SDI-I, do TST.
Quanto às hipóteses de não incidência da multa em comento são necessários alguns apontamentos.
Na hipótese de a empresa se encontrar em processo de falência, a multa em comento não é aplicável, tendo o TST cristalizado esse entendimento por meio da Súmula nº 388.[35]
A multa moratória em comento poderá ser afastada na hipótese de o empregado for responsável pela mora no pagamento, como, por exemplo, deixar de comparecer no sindicato ou à empresa para receber os valores rescisórios.
Mesmo que o empregador não ajuíze a ação de consignação de pagamento, nessa hipótese, não estará sujeito ao pagamento da multa, desde que comprove efetivamente que a mora se deu por culpa exclusiva do ex-empregado.
4.6 Da proibição de cobrança de taxa ou encargo no ato de homologação da rescisão contratual
No ato de homologação da rescisão é terminantemente vedada à cobrança de qualquer taxa ou encargo, tanto para o empregado, quanto para o empregador, na forma preceituada pelo § 7º, do artigo em comento. Ou seja, a assistência homologatória é gratuita.
O próprio TST, por sua Sessão de Dissídios Coletivos (SDC) já cristalizou o entendimento no sentido de proibir a cobrança, por meio da OJ n. 16[36].
Analisados os requisitos legais previstos no texto consolidado acerca da rescisão, passa-se a estudar a controvérsia jurisprudencial acerca da aplicação extensiva do artigo 477, no próximo capítulo.