3 – Conclusão
Ante todo o exposto, entende-se que as “revisões substantivas” aos atos complementares devem se coadunar com o posicionamento do TCU sobre o tema (Acórdão 1339/2009). Assim, a Administração, na elaboração e implementação deste tipo de ato, deve observar, além das demais orientações já expostas, as seguintes, sucessivamente:
Verificar a viabilidade da execução das atividades previstas no Pedido de Revisão Substancial ser realizada por próprios servidores públicos (justificando fundamentadamente a conclusão);
Acaso Demonstrada a incapacidade de a Administração executar as atividades por meio dos seus servidores, verificar se estas atividades podem ser prestadas por entidades privadas, contratadas com base nas determinações da Lei n° 8.666/93, que rege as licitações e contratações públicas;
Uma vez comprovada a impossibilidade de se contratar entidade privada, por meio de licitação, que a Administração demonstre a adequação do conteúdo da Revisão com os termos do respectivo “Acordo Básico”, e promova a elaboração de novo ajuste complementar, na forma prevista no Decreto nº 5.151, de 22 de julho de 2004, na Portaria – MRE nº 717, de 09/12/2006, e no entendimento consolidado no Acórdão – TCU – Plenário nº 1339/2009, devendo todos os termos que resultem em pactos serem submetidos previamente à análise jurídica da Consultoria Jurídica competente.
4 – Referências
Constituição Federal.
Lei Complementar nº 101, de 04 de maio de 2000.
Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.
Decreto nº 5.151, de 22 de julho de 2004.
Portaria – MRE nº 717, de 09/12/2006.
www.tcu.gov.br .
Notas
[1] Vejam-se os seguintes exemplos (com a indicação, entre parênteses, da data e página de publicação dos editais na Seção 3 do Diário Oficial e do número do projeto de cooperação): contratações Via UNESCO: “contratação de consultor especializado na área de Comunicação Social para o desenvolvimento de estratégias (...) com o objetivo de ampliar aparições na mídia e melhorar a fluidez do tema junto à opinião pública” (06/02/2008, p. 83, 914BRA3031); “prestação de serviços de montagem e desmontagem de estande para atender (...) encontro nacional” (18/03/2008, p. 91, 914BRA3026); “aquisição de suprimentos de informática” (9/04/2008, p. 87, 914BRA3026); “contratação de empresa para produção de vídeo institucional” (28/05/2008, p. 102, 914BRA3026); Via PNUD: “regularizar os prazos de análises de prestação de contas dos processos (...) que aguardam análises e emissão de pareceres conclusivos, de modo a evitar o acúmulo de passivo” (13/05/2008, p. 100, BRA/00/022); “contratação de serviços de hospedagem, alimentação e local para realização de evento a ser realizado em Manaus/AM” (16/05/2008, p. 135, BRA/03/004); “contratação de 20 (vinte) profissionais (...) para as áreas de Biblioteconomia, Arquivologia, Webdesigner, Análise de Sistema, Marketing, Comunicação Social e Administração” (24/04/2008, p. 61, BRA/04/047); “aquisição de Servidores, Estações de Trabalho, HSH (Gerador Aleatório de Chaves), e Rack Cofre” (02/06/2008, p. 78, BRA/04/029); “contratação de consultores para viabilizar e monitorar a emissão de passagens e diárias efetuadas por meio do Projeto” (28/05/2008, p. 135, BRA/03/032); “contratação de consultores para viabilizar e monitorar os contratos e pagamentos efetuados por meio do Projeto” (28/05/2008, p. 135, BRA/03/032). A relação de fls. 22/58, da ABC, permite evidenciar que os projetos indicados contam com financiamento exclusivamente nacional.
[2] Quanto a esse aspecto, há diferença significativa entre os projetos financiados exclusivamente com recursos internos e aqueles decorrentes de operações de crédito externas, como será visto no item 4.1.
[3] Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, aprovada pela Resolução 128 (41) da Assembléia Geral da ONU, de 4 de dezembro de 1986.
[4] Declaração sobre o Uso do Progresso Científico e Tecnológico no Interesse da Paz e em Benefício da Humanida, aprovada pela Resolução 3384 (30) da Assembléia Geral da ONU, de 10 de novembro de 1975.
[5] Nos termos do item 1.1, § 2°, das “Diretrizes” publicadas pela ABC, “as experiências, conhecimentos e tecnologias aplicadas ao desenvolvimento podem ser encontradas no exterior como no próprio país (neste último caso, geralmente de forma fragmentária ou isolada)” (Anexo 5, fl. 24-V).
[6] José Cretella Neto, Tratado Geral das Organizações Internacionais. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 442.
[7] Diretrizes para o Desenvolvimento da Cooperação Técnica Internacional. Brasília: Agência Brasileira de Cooperação, 2004 (An. 5, fl. 27-An. 5).
[8] Esse é o principal acordo básico mantido pelo Estado com organismos internacionais (dada a abrangência temática da ONU e suas agências especializadas), mas não o único. Com a própria UNESCO (que é uma agência especializada da ONU) há acordos específicos, a exemplo do “Acordo de Cooperação Técnica em Matéria Educacional, Científica e Técnica”, aprovado pelo Decreto Legislativo 13/1982 e promulgado pelo Decreto 87.522/1982.
[9] Os tratados internacionais típicos ou “solenes” são aqueles cuja formação obedece a um processo complexo previsto na Constituição Federal, constituído por três fases principais: (a) a negociação, conduzida no âmbito do Poder Executivo, (b) a aprovação pelo Congresso Nacional, exteriorizada por um Decreto Legislativo, que referenda o texto do tratado e autoriza o Presidente da República a ratificá-lo e (c) a ratificação, pelo Chefe do Executivo, confirmando, à outra parte contratante, a aceitação definitiva do ajuste. Após essas fases principais, seguem-se etapas complementares, em especial a promulgação por decreto presidencial e a publicação nos meios oficiais (que conferem executoriedade interna ao tratado e tornam público seu conteúdo).
[10] Há pelo menos três tipos de tratados que recebem um tratamento diferenciado: os de proteção dos direitos humanos (por força do art. 5º, §§ 2º e 3º, da CF), os relativos a matérias tributárias (por força do art. 98 do Código Tributário Nacional, cf. entendimento do STF no RE 90.824-SP) e os referentes à ordenação do transporte internacional (por força do art. 178 da CF).
[11] Tal conclusão suscita um rico debate sobre as normas de regência dos atos complementares. O tema é relevante para o controle dos projetos de cooperação internacional, mas seu desenvolvimento refoge aos objetivos específicos deste processo.
[12] A Portaria MRE 12/2001 foi revogada pela de n° 433/2004, por sua vez sucedida pela atual Portaria 717/2006, que não mais traz o capítulo de definições.
[13] Sobre o interesse da matéria à sociedade internacional, basta dizer que organizações como a ONU e a UNESCO (por exemplo) foram criadas e são mantidas pelos Estados para, entre outros propósitos, contribuírem para o esforço global de cooperação entre os povos. Ao celebrarem e implementares os acordos de cooperação, elas o fazem no cumprimento de suas finalidades institucionais.
[14] A classificação consta de Direito Administrativo Brasileiro. 30ª ed., atualizada por Eurico de Andrade Azevedo (et al.). São Paulo: Malheiros, 2005, p. 210. Evidentemente que nessa tipologia o autor se refere ao que a doutrina internacionalista denomina de tratado-contrato (que disciplina uma relação jurídica específica, a exemplo da implementação de um projeto de cooperação técnica), em oposição ao tratado-lei (de cunho predominantemente normativo, que estabelece regras gerais de conduta).
[15] Vide, por exemplo, José Francisco Rezek. Direito dos Tratados. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p: 86 e José Cretella Neto, Teoria Geral das Organizações Internacionais, ob. cit., p 11).
[16] José Francisco Rezek. Direito dos Tratados, ob. cit., p. 21.
[17] José Francisco Rezek. Direito dos Tratados. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 387.
[18] Antônio Cachapuz de Medeiros. O Poder de Celebrar Tratados. Porto Alegre: Antonio Fabris, 1995, p. 209.
[19] Antônio Cachapuz de Medeiros. O Poder de Celebrar Tratados. Porto Alegre: Antonio Fabris, 1995, p.223.
[20] A presunção decorre de serem as próprias regras de organização do Estado que conferem as competências necessárias a esses agentes. Nesse sentido, estabelece a Lei 10.683/2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, em seu art. 27, XIX, constituir áreas de competência do MRE a “participação nas negociações comerciais, econômicas, técnicas e culturais com governos e entidades estrangeiras” e os “programas de cooperação internacional”. Já o Decreto 5.979/2006, que aprova a estrutura regimental do MRE, estabelece, em seu art. 30, que “À Agência Brasileira de Cooperação compete coordenar, negociar, aprovar, acompanhar e avaliar, em âmbito nacional, a cooperação para o desenvolvimento em todas as áreas do conhecimento, recebida de outros países e de organismos internacionais e aquela entre o Brasil e países em desenvolvimento”.
[21] Vejam-se, por exemplo, o art. 13 do acordo da SEB com o PNUD (fl. 45-An.1) e o art. 9º do acordo com a UNESCO (fl. 27-An. 2).
[22] Vide, como exemplo, o art. 21 do acordo da SEB com a UNESCO (fl. 30-An. 2) e os arts. 32/34 do acordo com o PNUD (fl. 48-An.1).
[23] Embora não seja objeto específico do presente trabalho, cumpre observar que os atos complementares de cooperação usualmente contemplam cláusulas de “direitos, facilidades, privilégios e imunidades” (ex: fl. 48 e 53, An. 1). Essas cláusulas, por sua vez, são sustentadas em convenções internacionais específicas, como as citadas no texto (além do disposto no tratado constitutivo dos organismos, tratados esses de que o Brasil também é signatário, no caso da ONU e da UNESCO). Dessa forma, eventuais apurações de responsabilidade no âmbito dos projetos devem ter seu cabimento analisado cuidadosamente, quando disserem respeito à imputação de falhas à contraparte externa.
A iniciativa para o exame desse tema surgiu em decorrência do Acórdão 1610/2004-1ª Câmara, que determinou à unidade executora do Programa Fundescola que exigisse “que o PNUD recupere os bens extraviados [256 videocassetes, adquiridos pelo programa e que estavam sob guarda do fornecedor, até que o programa tivesse condições de recebê-los], ou restitua à conta do Programa Fundescola os valores equivalentes”. Após tratativas infrutíferas do MEC com o PNUD, a Procuradoria Jurídica do FNDE encaminhou ao Tribunal pedido de orientações sobre que medidas adotar, “tendo em vista a imunidade do organismo internacional”. O pedido foi analisado no TC-013.526/2005-2, mas a questão da imunidade e suas implicações não chegou a ser enfrentada. Concluiu-se, na oportunidade, pelo descabimento da responsabilização do organismo internacional, sob o fundamento de que, na hipótese, a responsabilidade era exclusiva do órgão público executor do projeto, que não adotou as cautelas devidas quanto à guarda dos bens (Acórdão 2188/2007-1ª Câmara, relação 91/2007-Gab. Min. Valmir Campelo).
[24] Cachapuz de Medeiros (O Poder de Celebrar Tratados, ob. cit., p. 383) analisa a obra de vários autores, classificando como de entendimento contrário aos acordos em forma simplificada: Manoel Gonçalves Ferreira Filho, José Cretella Júnior, Pinto Ferreira, Oscar Dias Corrêa, Roberto de Bastos Lellis. Pela admissibilidade dos acordos, indica: Celso de Albuquerque Mello, Guido Fernando Silva Soares, José Francisco Rezek, José Sette Câmara, Antonio Augusto Cançado Trindade e Vicente Marotta Rangel.
[25] Vide, do autor: “Direito dos Tratados”, ob. cit.; e “Parlamento e Tratados: o modelo constitucional do Brasil”. Revista de Informação Legislativa, Brasília, a. 41, n. 162, p. 121-148, abr./jun. 2004.
[26] Francisco Rezek, Parlamentos e Tratados..., ob. cit., p. 133.
[27] As cláusulas contratuais variam consideravelmente. Mas é usual, nas operações financeiras no âmbito do BIRD e do BID, por exemplo, que despesas até determinado valor sejam licitadas de acordo com as leis nacionais; a partir de um segundo patamar (ou se referentes a determinada natureza, como consultorias técnicas), devem seguir as normas estabelecidas pela instituição financeira (que, em regra, prevêem a execução pelo PNUD). Vejam-se, como exemplo, as regras do Contrato de Empréstimo n° 1423/OC-BR, celebrado com o BID (Programa de Apoio à Modernização do TCU). Conforme o disposto na Cláusula 2.06.a desse contrato, “a aquisição de bens ou a execução de obras em montantes inferiores ao indicado nas Disposições Especiais deste Contrato [US$ 350.000,00] será regida, em princípio, pela legislação local”, assim como nas operações que não envolverem recursos do financiamento (só contrapartida nacional). Fora dessas hipóteses, aplicar-se-ão os procedimentos estabelecidos pelo financiador.
[28] Nesse sentido há precedentes da Corte Internacional de Justiça, citados por Cretella Neto (ob. cit.), asseverando que “os direitos e deveres de uma entidade como a Organização [a ONU] devem depender de seus propósitos ou funções”, e que “toda ação empreendida pela organização, desde que apropriada para a realização de suas finalidades, não pode ser considerada como ultrapassando suas atribuições”. A contrario sensu, ultrapassará as atribuições da organização tudo aquilo que não for apropriado para a realização de seus fins.
[29] Tribunal de Contas da União. Decisão 213/1998 – Plenário. DOU. 11.05.1998.
[30] Tribunal de Contas da União. Acórdão 1565/2005 – Plenário. DOU. 14.10.2005.