1. Introdução
A união estável se conceitua como uma espécie de união entre o homem e a mulher que forma uma entidade familiar, em caráter informal, mas isso não quer dizer que não possa receber uma formatação legal mais elaborada, realizada por profissional na área de Direito de Família e com contrato autenticado em cartório.
Uma negociação dos aspectos afetivos e patrimoniais do relacionamento, do início ao seu término, ao invés de provocar dúvidas sobre o fim, dá mais segurança aos companheiros, similar ao que ocorre no casamento civil.
Nesse contexto, muitas pessoas com uma quantidade considerável de patrimônio realiza contratos pré-nupciais antes do casamento civil, e o mesmo pode ser realizado no que tange à união estável, pois não há impedimento legal a um contrato que regule como se dará a união estável e seu término.
2. Conceito de união estável e a diferença entre o instituto, o casamento e o concubinato
2.1. Conceito de União Estável
A Constituição Federal, no art. 226, § 3º assim dispõe a união estável: "Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento."
A regulação do dispositivo constitucional supracitado se deu com a promulgação da Lei nº 9.278/96, que traz no art. 1º o seguinte texto, suficiente para conceituar o instituto da união estável: ”É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de família."
Da mesma forma, seguindo a Carta Magna, o Código Civil de 2002 traz a seguinte disposição, no art. 1.723: "É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família."
2.2. Diferença entre união estável e casamento
A união estável e o casamento pressupõem convivência mútua entre dois parceiros, de gêneros diferentes, sendo que em muitos casos, companheiros em união estável vivem juntos como se fossem dois cônjuges, mas há distinções legais entre os dois institutos.
Em primeiro lugar, há uma informalidade na união estável, pois a vontade de um homem e de uma mulher de dividirem o mesmo teto e de formarem família já pressupõe esse tipo de união, não sendo necessária qualquer manifestação ao Estado desse interesse de estabelecer tal ligação afetiva, nem de um padrão legal para torná-la pública.
Já o casamento civil e o religioso são formais, pois seguem uma disposição legal que depende de modelos pré-determinados para sua concretização, senão, qualquer ato de casamento se torna inválido, como dispõe o art. 1.514 no Código Civil de 2002: "O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados."
O douto Flávio Tartuce trata de outras diferenças entre a união estável e o casamento com uma maestria singular:
1.ª Diferença – O casamento exige expressamente a fidelidade; a união estável exige
lealdade. Pelo senso comum, a lealdade engloba a fidelidade, mas não necessariamente. Isso
demonstra que na união estável há uma liberdade maior aos companheiros do que no
casamento, o que diferencia substancialmente os institutos, mormente se a conclusão for pela
persistência do dever de fidelidade no último.2.ª Diferença – O casamento exige expressamente vida em comum no domicílio conjugal; aunião estável não, por não exigir convivência sob o mesmo teto, conforme a remota Súmula
382 do STF.
2.3 DIFERENÇA ENTRE UNIÃO ESTÁVEL E CONCUBINATO
A diferença entre esses dois institutos parece simples, mas os dois institutos podem se confundir, pela informalidade que os dois trazem em sua configuração.
O Código Civil trata do concubinato ao diferenciá-lo do casamento, pois anteriormente era entendido como uma união estável paralela, no art. 1.727: "As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato."
No que tange à diferença entre união estável e concubinato, a linha é mais tênue: A união estável é entendida como existente quando duas pessoas se unem para constituir família, publicamente. O concubinato é como uma relação em que um dos companheiros não tem ciência dos atos que o outro está realizado, "às escondidas" - popularmente chamada de "pulada de cerca", porém, pode ser entendida como união estável após muitos anos, dependendo dos frutos que essa relação forma, como filhos.
Flávio Tartuce trata dessa diferenciação:
1.ª Corrente – Afirma que nenhum relacionamento constitui união estável, eis que a união
deve ser exclusiva, aplicando-se o princípio da monogamia. Essa corrente é encabeçada por
Maria Helena Diniz.Para essa corrente, todos os relacionamentos descritos devem ser
tratados como concubinatos.
2.ª Corrente – O primeiro relacionamento existente deve ser tratado como união estável,
enquanto que os demais devem ser reconhecidos como uniões estáveis putativas, havendo boa-fé do cônjuge. Em suma, aplica-se, por analogia, o art. 1.561 do CC, que trata do casamento putativo. Essa corrente é liderada por Euclides de Oliveira e Rolf Madaleno. A essa corrente se filia, inclusive em obra escrita com José Fernando Simão. Anote-se que essa solução já foi dada pela jurisprudência estadual, em dois julgados que merece destaque (TJRJ, Acórdão 15225/2005, Rio de Janeiro, 2.ª Câmara Cível, Rel. Des. Leila Maria Carrilo Cavalcante Ribeiro Mariano, j. 10.08.2005 e TJRS, Processo 70008648768, 02.06.2004, 7.ª Câmara Cível, Rel. Juiz José Carlos Teixeira
Giorgis, origem Lajeado).
3.ª Corrente – Todos os relacionamentos constituem uniões estáveis, pela valorização do
afeto que deve guiar o Direito de Família, corrente encabeçada por Maria Berenice Dias.
O jurista explica que: "Das três correntes, no âmbito da jurisprudência superior, o STJ tem aplicado a primeira, repudiando a ideia de uniões plúrimas ou paralelas (REsp 789.293/RJ, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, 3.ª Turma, j. 16.02.2006, DJ 20.03.2006, p. 271). Os julgados aplicam o princípio da monogamia à união estável tese com a qual não se filia, pois as entidades familiares não são totalmente semelhantes. Ademais, o convivente de má-fé, que estabelece o paralelismo, acaba sendo beneficiado, já que não terá obrigações alimentares, pela ausência de vínculo familiar."
Entende-se que se o concubinato se torna pública e de ciência do outro companheiro da união estável, se torna união estável.
3. o contrato de união estável
3.1. o regime de bens na união estável
A união estável se configura como comunhão parcial de bens, nos termos do art. 1.725. do Código Civil: "Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens."
Ainda, sob o contexto patrimonial, a Lei nº 9.278 traz as seguintes disposições legais:
"Art. 5° Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito.
§ 1° Cessa a presunção do caput deste artigo se a aquisição patrimonial ocorrer com o produto de bens adquiridos anteriormente ao início da união.
§ 2° A administração do patrimônio comum dos conviventes compete a ambos, salvo estipulação contrária em contrato escrito."
3.2. a separação e a necessidade de um contrato pré-estabelecido
Todo relacionamento de longa duração não tem data de término, mas quando acontece, não termina de forma amigável, em boa parte das situações, tanto em casamento, como na união estável, pois há a necessidade de ter uma partilha de bens e de estabelecer em como se dará a guarda dos filhos, já que não há uma previsão legal.
3.3. A vantagem da previsão contratual diante do estado atual da jurisdição nacional
A litigiosidade do término da relação provoca despesas muito maiores que a consultoria de um profissional da advocacia para a propositura e publicidade do contrato de união estável, pois pode perdurar anos e provocar muitos impactos à relação pós-união estável dos dois ex-companheiros, da hostilidade à dificuldade para o uso dos bens que os dois adquiriram no tempo da relação, até com quem ficarão os filhos.
Não é incomum que ocorram casos de alienação parental em que um ex-companheiro introduz uma imagem negativa do outro às crianças para que elas prefiram ficar com a pessoa que constroi essa imagem.
Nesse contexto, elas começam a ter sentimentos de repulsa ao outro genitor, sem que nem este tenha ciência disso, ou que os fatos apontados sejam realmente verdadeiros, quando na maioria das vezes nem o são.
3.4. COMO ESTABELECER ESSE CONTRATO
O contrato pode ser estabelecido com a presença de um advogado e que seja regulado em cartório.
O contrato é personalizado e é livre para os companheiros decidirem como será estabelecido o seu texto, com as obrigações de cada um, os direitos que cada um possui e como ocorrerá o final do relacionamento, com a divisão a que compete os bens de cada indivíduo e se há filhos, como ficará a guarda deles.
O final de uma união estável pacífica, tendo um contrato desse tipo, é como o final de um casamento de forma não-litigiosa, que não gera qualquer arrependimento quando duas pessoas já não têm mais motivo para ficarem juntas.
3.5. consequências legais
É importante ressaltar que o registro do contrato de união estável em Cartório não muda o estado civil dos companheiros, logo, continuarão solteiros, cada um, pois não é um casamento civil.
As obrigações firmadas no contrato de união estável serão levadas em consideração durante a relação e após seu desfazimento, incluindo na disposição dos bens entre os ex-companheiros e na guarda dos filhos, se houverem, conforme exposto anteriormente.
4. Conclusão
A união estável não precisa ser ao todo informal, pois pode ser estabelecido um contrato para os companheiros terem mais segurança quanto ás disposições da própria união e quanto ao término, se ocorrer.
Uma previsão que pareça um tanto desnecessária, na figura de um contrato que preveja o término de um relacionamento que não é nada agradável, para muitos casais.
Quando se está pressupondo o fim de algo que não tem duração pré-determinada, isso parece um pouco pessimista, mas é uma forma de trazer alívio quando realmente se faz necessário ter o fim do relacionamento, com a intenção de evitar uma discussão litigiosa que é muito mais indesejada que um mero contrato de união estável.
Concluindo, é uma chance interessante de trazer ainda mais estabilidade à união estável, por mais clichê que essa comparação possa ser, viável e recomendada para aqueles que tenham interesse em formar uma família sem precisar do instituto do casamento.
Bibliografia
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
BRASIL. Lei nº 9.278, de 10 de maio de 1996.
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Vol. V - Direito de Família. 23. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2014.
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014.