União estável difere de casamento por ser ela uma situação de fato, enquanto o casamento, um ato institucional complexo.
Muitas vezes não é possível dizer a partir de quando um casal passou a viver em regime de companheirismo. Com o casamento, há um marco na vida das pessoas, em que é alterado o estado civil. A partir do casamento estão casados. E ponto.
Como estado fático, é possível declarar a convivência, que se assume em determinado momento, o que não garante a continuidade. Supondo que o casal assuma a união estável e registre uma declaração, nada impede que no dia seguinte estejam separados.
O tempo do relacionamento não é elemento suficiente para comprovar a união estável. São conhecidos namorados que mantiveram o relacionamento por dez, quinze, vinte anos. E continuaram namorados.
O que diferencia o namoro qualificado da união estável? O desejo de ambos (não de um, apenas) de constituir família.
Constituir família não é necessariamente ter filhos. Você pode ter filhos por acidente, sem a intenção de tê-los. Ou ter filhos porque quis tê-los, sem a intenção de constituir família.
Um juiz analisará o caso, em geral, segundo indícios deixados pelo casal. O primeiro deles é o como se apresentam publicamente. Se como marido e mulher, é um forte fator a ser considerado. Há casais que ninguém desconfia que não são casados. Nada mais razoável que sejam considerados companheiros.
Morar junto não é ponto preponderante, assim como ter uma conta (corrente ou poupança) conjunta. É possível que um casal se dê bem, que ele (ou ela) tenha sucesso na vida e que resolva dar uma mesada ou garantir o futuro do outro.
São, entretanto, indícios fortes. Indícios, e não provas.
Assim, se moram juntos, há seguro de vida de um para o outro, pagam as contas comuns, tem conta conjunta, quase (e disse quase) seguramente pode um deles, se reivindicado em juízo, ter a seu favor uma sentença de mérito reconhecendo a união.
Mas o fator mais importante sempre haverá de ser a publicidade: como os outros os conhecem.
A propósito: em uma palestra do curso de pós graduação em Direito Civil da Escola Paulista de Magistratura, no ano passado, aventou-se o caso contrário: um amigo, em consulta ao palestrante, quis saber "como comprovar que não vivia em união estável". Ele tinha uma namorada de muitos anos, com quem se dava muitíssimo bem. Sua empresa, em pouco tempo, decolou, e ele teve dinheiro para gastar. Quis então dar mais conforto para a namorada, que quis manter namorada: pagava-lhe uma pensão, com o que ela pode comprar melhores roupas e alimentos; fez seguro de vida em seu favor. Comprou uma casa grande e a instalou. Tudo porque, se antes os dois passaram necessidades, queria ele agora proporcionar maior conforto à moça, sem com isso assumir compromisso maior. Ele podia ou não despender em favor dela, sem que isso caracterizasse a união estável?
Sim, podia. Mas existiam vários indícios que depunham em sentido contrário. Foi recomendado, então, que registrassem uma declaração, na qual comunicavam "não viver em união estável, pois não existia a intenção de constituir família".
Perfeito. A declaração negativa é tão forte quanto a positiva. Como a união estável é um estado fático, nada impede que, no dia seguinte, tenham os dois o intuito de constituir família.
De volta à estaca zero/ Qual a solução, para ele, então?
Fazer a mesma declaração anualmente. A moça fica garantida temporariamente, no sentido de continuar recebendo os benefícios atuais, sem a necessidade de uma lide. Afinal, namoro não garante direito nenhum. E ele tem um documento em que os dois negam a união estável. Afinal, a declaração que confirma pode também desmentir.